Acórdão nº 03009/09 de Tribunal Central Administrativo Sul, 19 de Maio de 2009

Magistrado ResponsávelJOSÉ CORREIA
Data da Resolução19 de Maio de 2009
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDA-SE, EM CONFERÊNCIA, NA 2ª SECÇÃO DESTE TRIBUNAL: 1. -A FAZENDA PÚBLICA, inconformada com a sentença proferida pela Srª. Juíza do TAF de Lisboa que julgou procedente a presente impugnação deduzida por L.................., Ldª., contra a liquidação de IVA referente aos anos de 1996, 1997 e 1998 veio aquela recorrer concluindo as suas alegações como segue: I - Pelo elenco de fundamentos acima descritos, subjaz que a douta sentença, ora recorrida, julgou a impugnação procedente e anulou e determinou a anulação das liquidações adicionais de IVA referentes aos exercícios de 1996, 1997 e 1998, no montante global de € 49.487,17, assente nas disposições legais ínsitas no âmbito da aplicação de métodos indirectos, mormente o disposto no n.° 2 do Art.° 51.° do CIRC, Art.° 81.° e 87.° ambos da LGT.

II - Neste âmbito, o thema decidendum, assenta em determinar se a Administração Tributária, espelhou no relatório de inspecção tributária os pressupostos legais para a aplicação de métodos indirectos.

III - Para tanto importa sobremaneira, transcrever a exposição dos motivos que estiveram subjacentes à aplicação de métodos indiciários pela Administração Tributária resultando no que contende à margem Bruta Praticada que " Verifica-se que as margens declaradas nesses exercícios são inferiores à margem mínima apurada pela amostragem que é de 49,8% no grupo dos outros artigos. Este grupo representa apenas cerca de 15,66% do total das vendas conforme Mapa 6. Assim se conclui que as margens declaradas não correspondem à verdade'', Relativamente à amostragem aos produtos vendidos em 1996, evidencia-se no relatório de inspecção que "Da análise a estes livros, constatou-se que todas as colunas estão escritas com esferográfica à excepção da coluna correspondente ao Preço Marcado que está escrito a lápis. Esta coluna corresponde ao preço de venda constante da etiqueta anexa ao artigo exposto para venda. A coluna Preço de Venda Efectivo é o que consta no talão de venda. (...) Nestes mapas demonstra-se a causa das margens baixas declaradas em todos os exercícios, dado que a margem declarada é a que é calculada com o preço constante do talão de venda e a margem praticada é a que é calculada com o preço efectivamente praticado que é o preço da etiqueta. (...) Assim dado que quase a totalidade dos talões de venda não são entregues aos clientes sendo posteriormente preenchidos com valores de venda inferiores aos constantes na etiqueta e que são os efectivamente praticados".

IV - Efectivamente, a tributação das empresas deverá incidir sobre o seu rendimento real, nos termos no disposto no Art.° 104.° n.° 2 da Constituição da Republica Portuguesa, resultando do disposto no Art.° 75.° da LGT, que a regularidade formal da escrita constitui presunção da sua veracidade, estendida aos seus elementos de apoio.

V - Tal presunção só cessa no caso da existência de indícios sérios de que as operações escrituradas se não realizaram, ou seja, quando, estando, embora, a escrita ou contabilidade organizada de acordo com a lei, enferme de erros ou inexactidões, ou haja "indícios fundados" de que, apesar da sua correcta organização, não reflecte a matéria tributável efectiva (cfr. sobre esta matéria, entre muitos outros, o Ac. do STA, de 24/4/2002, Rec. 0102/02).

VI - Na mesma esteira, o disposto no Art° 52.° do CIRC, em consonância com o disposto nos Art.°s 87.° a 89.° da LGT, prescrevem que a aplicação de métodos indiciários em consequência de anomalias e incorrecções da contabilidade só poderá verificar-se quando não seja possível a comprovação e a quantificação através do método directo, resultando o mesmo princípio da ai. b) do art. 87.° e do n.° l do art. 90.° ambos da LGT, enumerando o Art.° 88° da mesmo diploma, os casos em que se verifica a impossibilidade de comprovação e quantificação exacta da matéria tributável para efeitos de aplicação de métodos indirectos.

VII - No que contende ao âmbito da prova, e nos termos do disposto no Art. 74.° n.° 3 da LGT, em caso de determinação da matéria tributável por métodos indirectos impende sobre a Administração Tributária, o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, e, ao contribuinte a prova do excesso na sua quantificação.

VIII - Neste âmbito, a fixação da matéria tributável por métodos indiciários constitui, pois, um método excepcional de tributação do rendimento que, em regra, se fará com base na declaração do sujeito passivo, alicerçada nos elementos constantes da respectiva contabilidade tendo presente que é à Administração Tributária, que compete demonstrar, fundamentadamente, que a contabilidade não merece confiança e que não é possível a quantificação directa da matéria tributável, para que, na fixação desta, seja possível recorrer a estimativas ou presunções (neste sentido, SALDANHA SANCHES, Manual de Direito Fiscal, Lex -- 1998, pág. 281, e VIEIRA DE ANDRADE, Direito Administrativo e Fiscal, parte I, págs. 150 a 152.).

IX -Com efeito, avaliação indirecta visa a determinação do valor dos rendimentos ou bens tributáveis a partir de indícios, presunções ou quaisquer outros elementos de que a Administração Fiscal disponha (cfr n.° 2 do Art.° 83 da LGT), ou conforme reitera o Acórdão do TCAS referente ao Proc. n.° 01270/03 datado de 22.06.2004" São meios que, não estabelecendo directamente aqueles que visa provar estabelecem contudo a verificação de outros dos quais é possível inferir, com algum graus de certeza, através de máximas da experiência os primeiros".

X - Neste conspecto, e no que ao caso em análise contende, estamos perante liquidações de IVA calculadas mediante a aplicação de métodos indirectos, tendo em conta que se verificam os pressupostos legais para a sua aplicação, porquanto das realidades jurídico/contabilísticas a que os Serviços de Inspecção Tributária tiveram acesso, -conforme amplamente patente no Relatório de Inspecção Tributária - se extrai que o apuramento da matéria tributável, não foi efectuado directamente com base na contabilidade, por falta de crédito desta, atento às irregularidades e anomalias detectadas, tendo sido enunciados os pressupostos que originaram a aplicação de métodos indiciários.

XI - Neste desiderato, foram efectuadas amostragens à margem de comercialização, foram recolhidos os preços marcados nas etiquetas de 151 artigos expostas naquela data e os respectivos preços de custo foram retirados do livro de registo das existências.

XII - Da análise efectuada, a Administração Tributária concluiu mediante fundamentação cabal no relatório de inspecção que as margens declaradas nos exercícios de 1996,1997 e 1998 são inferiores à margem mínima apurada na amostragem, sendo que, da análise aos livros de registos das existências, e no âmbito de uma segunda amostragem, permite de forma clara e inequívoca concluir que a causa das margens baixas declaradas nos exercícios em análise, resulta do facto de que a margem declarada é a que é calculada com o preço constante no talão de venda e margem praticada é a que é calculada com o preço efectivamente praticado, ou seja com o preço da etiqueta (sublinhado nosso).

XIII - Efectivamente, denota-se com manifesta acutilância que a diferença subjacente entre a percentagem da margem declarada as margens apuradas, não se subsumem a descontos concedidos aos clientes, tendo em conta, que não são efectuados à totalidade dos clientes, nem são praticados descontos de montante tão elevado, olvidando-se ainda que quase a totalidade dos talões de venda não identifica o cliente, concluindo-se que não são entregues aos clientes, sendo posteriormente preenchidos com valores de venda inferiores aos constantes da etiqueta e que são os efectivamente praticados.

XIV - Na mesma esteira, e no âmbito dos depósitos bancários os Serviços de Inspecção Tributária detectaram que os valores apostos nos respectivos talões de depósito não são coincidentes com os valores dos talões de venda, relevando de modo inequívoco que a contabilidade não merece credibilidade, encontrando-se devidamente plasmados os pressupostos para a aplicabilidade de métodos indirectos.

XV - Idêntico entendimento foi manifestado no Laudo exarado pelo Perito Independente em sede de Comissão de Revisão, no que contende quer relativamente à detecção de irregularidades no valor das vendas na contabilidade, quer relativamente aos procedimentos que legitimam o recurso à aplicação de métodos indirectos.

XVI - Note-se ainda, que conforme devidamente espelhado no relatório de inspecção tributária, a amostragem teve carácter aleatório, a partir da escolha arbitrária de vários artigos de exposição à data da realização do procedimento inspectivo e que evidenciaram os preços de venda marcados em etiqueta, em plena conformidade com o entendimento proferido pelo Perito Independente em sede de Comissão de Revisão.

XVII - Relativamente aos descontos, subjaz do discurso fundamentador insíto nas correcções plasmadas no Relatório de Inspecção, que atento à continuada experiência da Administração tributária com os operadores económicos, tendo em conta que se trata de valores necessariamente indicativos de médias generalizadas e que não é usual no sector a prática de tão elevados descontos a todos os clientes, acrescentando-se ainda que a serem participados obstaria inequivocamente à demonstração através nomeadamente da identificação dos clientes a quem foram concedidos e em que artigos foram praticados, não logrando ter sido efectuado tal prova.

XVIII - Conforme ficou devidamente reiterado no relatório de inspecção, não e possível estarmos perante descontos tão elevados porquanto do controlo quantitativo efectuado aos exercícios inspeccionados releva de forma clara e evidente que as vendas registadas contabilisticamente não correspondem aos valores efectivamente praticados, conforme foi sancionado no entendimento vincado pelo Perito Independente em sede de Comissão de Revisão.

XIX - Destarte, e ao invés do explanado na douta sentença, ora recorrida, afere-se...

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