Acórdão nº 00138/04 de Tribunal Central Administrativo Norte, 21 de Maio de 2008

Magistrado ResponsávelDulce Neto
Data da Resolução21 de Maio de 2008
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: A Fazenda Pública recorre para este Tribunal Central Administrativo Norte da sentença, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, que julgou procedente a impugnação judicial que a sociedade Modelo , S.A. deduziu contra o acto de liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) referente ao exercício de 1995 e direccionada ao grupo consolidado em que se insere esta sociedade.

Terminou a sua alegação de recurso formulando as seguintes conclusões: 1) A procedência da impugnação assentou na verificação de ilegalidade no procedimento decorrente de a liquidação do imposto ter sido efectuada numa altura em que a decisão sobre o recurso hierárquico ainda não era eficaz por falta da respectiva notificação, bem como pela procedência da questão de fundo que foi posta à consideração do Tribunal, a justificar a anulação do acto impugnado; 2) Em causa estão correcções de natureza quantitativa efectuadas aos valores constantes da declaração de rendimentos em sede de IRS com referência ao exercício de 1995, ao abrigo do preceituado no art. 112º do CIRC, correcções essas com as quais a impugnante se não conformou, interpondo recurso hierárquico para S. Ex.ª o Sr. Ministro das Finanças, ao abrigo do nº 2 do citado art. 112º, tendo do indeferimento deste deduzido impugnação judicial; 3) Decorre daquele normativo que, usando da faculdade conferida pelo nº 2, mediante a interposição de recurso hierárquico para o Ministro das Finanças, da decisão deste cabe recurso para o Tribunais (o STA), nos termos do art. 26º alínea c) do ETAF, não podendo o contribuinte socorrer-se dos meios de defesa previstos no art. 111º, e no CPPT consubstanciados na reclamação e na impugnação contra o acto de liquidação por esgotamento das vias graciosas e de impugnação; Daí que, 4) A presente impugnação não constitua o meio processualmente adequado de reacção contra a decisão de indeferimento do recurso hierárquico interposto ao abrigo do nº 2 do art. 112º do CIRC, devendo por isso e com esse fundamento ser julgada improcedente; Sem conceder, 5) Caso assim não seja superiormente entendido, consideramos não existir o sentenciado vício de procedimento justificativo da anulação do acto, porquanto dependendo a eficácia do acto da sua notificação, de conformidade com o prescrito no n° 6 do art. 77° da LGT, da mesma forma que a eficácia da decisão que versou sobre o recurso hierárquico está dependente da sua notificação, também a liquidação efectuada na sequência daquela decisão estará dependente da sua notificação, sendo nesta medida irrelevante, a data aposta na nota de liquidação como sendo a data em que o imposto foi liquidado, que não já a data em que ele foi efectivamente notificado ao contribuinte, dado este que não foi levado ao probatório; 6) Tendo a decisão de indeferimento do recurso hierárquico sido tomada em 06/12/00, notificada à impugnante por oficio datado de 14/12/00, a liquidação do IRC sido efectuada em 12/12/00 mas emitida em 19/12/00, não resulta demonstrado o referido vício de procedimento, pois aquando da notificação da liquidação a decisão de indeferimento do recurso hierárquico já era eficaz por força da sua notificação; Ainda sem prescindir, 7) De acordo com o decidido, sempre a impugnação seria de proceder pela razão substancial que se prende com as especificidades do Regime de Tributação do Lucro Consolidado que justifica a desconsideração das operações internas realizadas entre as sociedades do grupo a que pertence a impugnante, como é o caso da correcção em questão nos autos que se prende com a tributação de uma mais-valia contabilística/fiscal no valor de 524.000.000$00 apurada com a venda de acções entre empresas do grupo causadoras de distorções e enquadramento no art. 57° do CIRC; 8) Resulta da prova produzida que se mostram preenchidas as condições de que depende a aplicação do disposto no art. 57° no contexto do funcionamento do quadro jurídico do art. 59° ambos do CIRC; 9) A douta sentença recorrida violou as disposições legais supra citadas.

* * * A sociedade recorrida apresentou contra-alegações para sustentar a extemporaneidade das alegações de recurso apresentadas pela recorrente no 3º dia útil subsequente ao termo do prazo previsto no art. 282º nº 3 do CPPT, para pugnar pela legalidade e manutenção do julgado e, ainda, para pedir que, no caso de provimento do recurso, fossem apreciados e julgados procedentes os outros vícios invocados na petição, que não chegaram, por prejudicialidade, a ser objecto de apreciação na sentença, tendo concluído do seguinte modo: 67. As alegações de recurso apresentadas pelo ERFP são extemporâneas e, consequentemente, o recurso deve ser julgado deserto (artigos 690º nº 3 do CPC e 282º nº 3 e 4 do CPPT).

  1. Com efeito, o princípio da igualdade não permite a apresentação das alegações no 3º dia útil posterior ao fim do prazo sem qualquer sanção - não pode a FP dispor de um prazo de 18 dias sem multa, enquanto o contribuinte dispõe apenas de um prazo de 15 dias sem multa (cfr. artigos 19º e 20º da CRP, 98º da LCT, 3º-A do CPC e § 1º do artigo 6º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, e Ac. do TC nº 516/93, de 26-10-1993, in BMJ, 430º-79).

    Sem prescindir, 69. Nem o ERFP (que nunca arguiu qualquer nulidade processual), nem a Administração Fiscal, alguma vez levantaram qualquer objecção quanto ao meio processual concretamente utilizado - a impugnação judicial - tão pouco esta matéria foi objecto de apreciação na douta sentença recorrida, à qual, aliás, não foi imputada qualquer nulidade.

  2. Na liquidação notificou-se o contribuinte de que este podia reclamar ou impugnar nos termos do artigo 111º do CIRC.

  3. A notificação da decisão de indeferimento do recurso contencioso é inválida por não conter os meios e prazos de reacção (cfr. artigos 36º nº 1 e 2 do CPPT, 77º nº 6 da LCT e 268º nº 3 da CRP), 72. pelo que tal decisão é ineficaz, i.e., não produziu os respectivos efeitos jurídicos, designadamente a perda do efeito suspensivo da liquidação ou o início do prazo para impugnar contenciosamente essa decisão.

  4. Quando muito haveria lugar à convolação deste processo na forma processual julgada adequada (cfr. artigos 37º nº 4 e 98º nº 4 do CPPT, e 97º nº 3 da LCT); nunca à improcedência da presente impugnação judicial.

  5. O nº 5 do artigo 112º do CIRC exclui a utilização dos meios de reacção previstos no artigo 111º do CIRC única e exclusivamente no que concerne à matéria recorrida.

  6. A presente impugnação judicial extravasa em muito o âmbito do recurso hierárquico.

  7. Do nº 3 do artigo 112º do CIRC extrai-se que o efeito suspensivo da interposição de recurso hierárquico refere-se à liquidação do imposto e não à notificação da liquidação do imposto.

  8. Só o indeferimento eficaz do recurso hierárquico pode legitimar a necessariamente subsequente liquidação (artigos 77º nº 6 da LGT, 36º nº 1 do CPPT e 268º nº 3 da CRP), o que não foi caso - a liquidação é anterior ao envio do oficio onde consta o despacho de indeferimento e a notificação deste último é inválida por não conter os meios e prazos de reacção - pelo que foi violado o artigo 112º nº 3 do CIRC.

  9. Do que sintomático o facto de nem a liquidação (doc. 1 junto com a p.i.) nem a correspondente nota de fundamentação (doc. 2 junto com a p.i.) observaram o prescrito na al. XXVI) do despacho do Exmo. SEAF (proferido sobre o dito recurso hierárquico (doc. 5 junto com a p.i.) - o Exmo. SEAF ordenou que a correcção positiva efectuada na "Modelo " deveria ser considerada negativamente na esfera da impugnante, por força do nº 4 do artigo 57º do CIRC, com a consequente anulação do efeito positivo daquela correcção, o que não foi observado na liquidação do imposto, conforme resulta dos autos, em violação não só do efeito suspensivo da liquidação, como do dever de obediência hierárquica.

  10. Assim, torna-se indubitável que a liquidação do imposto, “in casu” não aguardou nem respeitou a decisão proferida sobre o recurso hierárquico.

  11. Apesar de inócuo, não foi provado que a liquidação tivesse sido emitida em 19/12/2000, tão pouco que a liquidação foi recepcionada pelo contribuinte depois da recepção da decisão de indeferimento do recurso hierárquico.

  12. É entendimento unânime que a tributação segundo o regime do lucro consolidado previsto nos artigos 59º e ss. do CIRC é incompatível com a aplicação, a sociedades integrantes do mesmo perímetro de consolidação fiscal, do regime previsto no artigo 57º do CIRC.

    Sem prescindir (artigo 684º-A do CPC), 82. O acto de liquidação padece de violação do disposto na al. a) do nº 1 do artigo 60º da LGT, porquanto: 83. O disposto no artigo 13º nº 2 da Lei nº 16-A/2002, de 31/5, que conferiu carácter interpretativa ao actual nº 3 do artigo 60º da LGT, visando com isso atribuir-lhe carácter retroactivo, é (I) ilegal porquanto a "interpretação" que superveniente-mente lhe veio a ser conferida não era ao tempo uma das interpretações plausíveis (cfr. Ac. do STA supra in 45. e 13º nº 1 do CC) e porque atropela direitos fundamentais adquiridos à luz da lei vigente – artigos 12º nº 1 e 13º nº 1 do C.C.; (II) é inconstitucional porque viola o princípio geral da irretroactividade das leis fiscais plasmado no nº 3 do artigo 103º da CRP, particularmente quando estamos no âmbito das garantias fundamentais dos contribuintes, um dos elementos essenciais dos impostos ao qual se aplica com particular acuidade o princípio constitucional da legalidade, expresso, entre outros, nos artigos 103º nº 2 da CRP e 8º nº 1 da LGT.

  13. Assim, a situação “sub judice” não pode ser atingida retroactivamente pelo disposto no artigo 60º nº 3 da LGT (redacção actual).

  14. Uma vez que a Administração Fiscal usou “in casu” de meras presunções, estamos perante uma situação de avaliação indirecta da matéria tributável, conforme decorre do disposto no artigo 8352 n52 2 da LGT, 86. pelo que...

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