Acórdão nº 00350/05.0BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 17 de Janeiro de 2008

Magistrado ResponsávelDr
Data da Resolução17 de Janeiro de 2008
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção do Contencioso Administrativo do TCAN: I- RELATÓRIO “Município de Valongo” inconformado com a sentença do TAF de Penafiel, datada de 09.OUT.06, que, em ACÇÃO ADMINISTRATIVA COMUM, o condenou no pagamento da quantia de € 7 968,14 à Recorrida “S..., S.A.”, com sede na Avenida ..., Penafiel, recorreu para o TCAN, formulando as seguintes conclusões: 1- Por douta sentença o meritíssimo juiz “a quo” condenou o recorrente ao pagamento da quantia de 7.968,14€ correspondente a juros de mora em dívida pelo não pagamento do recorrente nas datas dos respectivos vencimentos de facturas apresentadas pela recorrida representativos do preço das obras executadas pela recorrida na empreitada denominada “Correcção geométrica da Rua José Joaquim Ribeiro Teles, Ermesinde” 2 – O recorrente, em sede de contestação, admitiu que os juros se encontravam por pagar, todavia, o recorrente nada deve à recorrida.

3 - O Recorrente alegou em contestação que, o recorrido, ao exigir o pagamento dos juros de mora, actua em abuso de direito, uma vez que nunca terá manifestado a intenção de exigir tais pagamentos, de acordo com o artigo 334º do Código Civil.

4 - Os juros resultantes das facturas 54, 89, 119, já estariam prescritos, uma vez que sobre a data de emissão das mesmas já decorreram mais e 3 anos.

5 - O Decreto-lei n.º 341/83 de 21 de Junho prevê no seu artigo 28º n.º 1 que “ os encargos regularmente assumidos relativos a anos anteriores serão satisfeitos da conta de verbas adequadas do orçamento que estiver em vigor no momento em que foi efectuado o seu pagamento, de acordo com o que se dispõe neste diploma”, e no n.º 3 do mesmo artigo prevê que “ o credor poderá requerer o pagamento daqueles encargos no prazo improrrogável de 3 anos a contar de 31 de Dezembro do ano que respeita o crédito”.

6 - O recorrido (credor), em obediência a este preceito, deveria ter exigido a satisfação do seu crédito até 31 de Dezembro do ano em que perfaça 3 anos sobre a emissão das facturas, e não o fez.

7 - O prazo imposto pelo artigo 28º do Decreto-lei 341/83 é um prazo de prescrição, e só a citação interrompe a prescrição.

8 - O Recorrido só foi citado judicialmente a 15.07.2005. pelo que os juros resultantes das facturas 54, 89, 119, estão prescritos por força do aludido diploma.

9 - Trata-se de uma prescrição extintiva e não se pode afastar o regime previsto dos artigos 323º a 327º do código civil.

10 – O recorrido só foi interpelado em 13.08.2004 por ofício do Conselho Superior de Obras Públicas e Transportes.

11 - E, aceitando-se tal interpelação facto interruptivo da prescrição, os juros resultantes das facturas já estão prescritos.

12 – Não pode ocorrer qualquer interrupção da prescrição, prevista no artigo 325º do C.C. (“não basta, nos termos de tal norma, para interromper a prescrição, que o credor, durante o decurso do prazo previsional, tenha diversas vezes reclamado, junto da R. o pagamento dos montantes em divida...” como se alcança do acórdão do S.T.J. de 2004.11.18 no processo G4B459 (in www.dgsi.pt).

13 - O Plano Oficial de Contabilidade das Autarquias Locais (POCAL), aprovado pelo Decreto-lei 54-A/99, de 22/02, prevê no seu ponto 2.3.4.2, alínea h) que o credor deve pedir o pagamento dos encargos regularmente assumidos e não pagos, no prazo improrrogável de 3 anos a contar de 31.12 do ano a que respeita o crédito.

14 - Os juros resultantes das facturas 54, 89 e 119 também estão prescritos, conforme e por força de exposto no POCAL.

15 - O recorrido depois de ter criado a legítima convicção no recorrente que não iria exigir os pagamentos de juros, e posteriormente vir pedi-los, actua em manifesto abuso de direito.

16 – O recorrente tendo sido citado a 15.07.2005, os juros referentes às facturas 54, 89 e 119 estão prescritos, de acordo com o Decreto-lei 341/83 e Decreto-lei 54-A/99.

20 - O meritíssimo Juiz “a quo”, entendeu que os prazos previstos nestes diplomas são prazos de caducidade, pelo que a mera interpelação extrajudicial será válida, se exercida dentro dos 3 anos, constituindo um facto impeditivo da caducidade de direito a juros.

21- Pelo que a decisão em crise violou os Decretos-leis 341/83 de 21 de Junho e 54-A/99 de 22.02 e o artigo 323º, n.º 1 do Código Civil.

22 – E, ao entender que o recorrido não actua em abuso de direito violou o artigo 334º do Código Civil.

23- Pelo que deve ser revogada a sentença posta em crise.

A Recorrida apresentou contra-alegações, formulando, por seu lado, as seguintes conclusões: 1 - O Recorrente confessa na sua Contestação que a dívida representada pelas facturas relacionadas nestes autos existe, que está em mora quanto ao seu pagamento e que em virtude dessa mora se constituiu a favor da Recorrente o direito a juros.

2 - Como se deixou alegado na petição inicial, e na Resposta à Contestação, verificou-se o reconhecimento da dívida e obrigação de pagamento por parte do devedor – facto impeditivo e interruptivo da prescrição – cfr Artºs 310º al d) e 325º, ambos do Cod. Civil.

3 - Ao longo dos anos de 2001 a 2005, o Recorrido efectuou diversas interpelações junto do Recorrente, visando a cobrança do seu crédito, conforme se extrai das suas cartas de interpelação de 27/06/2001, 08/06/2004, 31/05/2001, 04/06/2001 e 21/11/2003 e bem assim da Nota de Débito enviada ao Município Recorrente em 28/01/2003, a qual foi aceite e contabilizada por este.

4 - A recepção da aludida Nota de Débito, a sua não devolução e bem assim ao invés, o lançamento na sua contabilidade pelo Município Recorrente, traduz inequivocamente reconhecimento da dívida.

5 - Dos documentos indicados supra no requerimento probatório da Recorrida, cuja existência, teor e recebimento o Município Recorrente não nega, extrai-se que a Recorrida solicitou o pagamento da dívida de juros pelo menos seis vezes, dentro do prazo prescricional, ou seja em 27/06/2001, 08/06/2001, 31/05/2001, 04/06/2001, 27/11/2003 e 28/11/2003, o que constitui facto impeditivo seja da caducidade do direito a juros, seja da prescrição do respectivo crédito, de harmonia com a doutrina consagrada no Art.º 331º do CC.

6 - Como ficou demonstrado e em ordem a contrariar o invocado abuso de direito a Recorrida interpelou diversas vezes a Recorrente, visando a cobrança do seu crédito.

7 – Mas mesmo que assim não fosse, a oportunidade de exigir o pagamento é matéria que estava na exclusiva disponibilidade da Recorrida, não sendo exigível que fosse esta a lembrar ao Município Recorrente o dever de cumprir uma obrigação, que para ele resulta directamente da lei ( Art.º 194º do DL n.º 405/93 ).

8 - A simples não exigência pela Recorrida do pagamento dos juros no momento que o Recorrente entende que ela o deveria ter exigido, não traduz qualquer intenção de abdicar dos juros, não constituindo por isso instrumento apto a firmar a convicção do Recorrente, de que a Recorrida jamais viria a exigir o pagamento do seu crédito, razão porque, não pode operar a excepção de abuso de direito.

9 – A douta sentença recorrida, não violou qualquer normativo legal, designadamente os Decs. Leis n.ºs 341/83 de 21/06 e 54-A/99 de 22/02 e bem assim, também não violou a disposição normativa vertida nos Art.ºs 323º e 334º ambos do CC.

O Dignº Procurador-Geral Adjunto não emitiu pronúncia nesta instância. Colhidos os vistos legais, o processo é submetido à Secção do Contencioso Administrativo para julgamento do recurso.

II- QUESTÕES A DECIDIR NO RECURSO São em número de duas as questões que se colocam no presente recurso jurisdicional, a saber: a) O erro de julgamento sobre a apreciação da existência de abuso de direito quanto à exigência do pagamento de juros de mora; e b) O erro de julgamento sobre o conhecimento da excepção peremptória da prescrição dos juros de mora peticionados.

III- FUNDAMENTAÇÃO III-1.

Matéria de facto A decisão recorrida deu como provados os seguintes factos: I) A A. dedica-se à indústria de construção civil, obras públicas e particulares; II) No exercício dessa actividade, a A. participou num concurso público aberto pelo Município de Valongo, aqui R., para adjudicação da empreitada denominada de “Correcção Geométrica da Rua José Joaquim Ribeiro Teles, Ermesinde”; III) Tendo para o efeito a A. apresentado uma proposta de preço de € 174.277,64 (34.939.530$00), acrescido de IVA à taxa legal; IV) A obra foi-lhe adjudicada, por deliberação camarária de 05 de Julho de 2000 e os respectivos trabalhos, objecto de consignação - Cfr. docs. n.º 1; V) Acresce que, posteriormente e, no decurso da empreitada, esta foi objecto de um contrato adicional, outorgado em 18 de Outubro de 2001, para cobrir trabalhos não contemplados no contrato original – Cfr. docs. nºs 2 e 3; VI) De todo o modo, a A. executou todos os trabalhos contratuais e extra contratuais, que lhe foram adjudicados pelo Município R.; VII) Esses trabalhos foram medidos e levados a autos de medição; VIII) Com base nos autos de medição elaborados a A. emitiu, no que nesta parte importa apreciar, e fez chegar ao Município R. as facturas juntas, sob os n.ºs 54 (doc. n.º 4 datado de 30/03/2001), 89 (doc. n.º 5 datado de 17/05/2001), 119 (doc. n.º 6 datado de 03/07/2001), 166 (doc. n.º 7 datado de 31/08/2001), 197 (doc. n.º 8 datado de 31/10/2001) e 18 (doc. n.º 9 datado de 27/02/2003 – Cfr. docs. de fls. 14,20,25,3437 e 43; IX) O Município R. deveria ter pago as facturas no prazo de 44 dias após a data de emissão de cada uma delas; X) Certo é que essas facturas não foram pagas nas datas dos seus vencimentos, tendo sido liquidadas, respectivamente, em 18/06/2001, em 13/07/2001, em 10/12/2001, em 10/05/2002, em 03/01/2003 e em 28/07/2003 - Cfr. doc. de fls. 49; XI) Através de cartas dirigidas ao R., em 27 de Junho de 2001 (quanto à factura n.º 54) e em 08 de Junho de 2004 [quanto a todas as facturas referidas no n.º VIII) por referência a nota de débito n.º 18 emitida em 28/11/2003], a A. exigiu o pagamento de juros de mora discriminados nas relações anexas àquelas missivas – Cfr...

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