Acórdão nº 00195/07.2BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 12 de Dezembro de 2007

Magistrado ResponsávelFrancisco Rothes
Data da Resolução12 de Dezembro de 2007
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

1. RELATÓRIO 1.1 No processo de execução fiscal instaurado contra “Sociedade Agrícola , Lda.” (adiante Executada, Reclamante ou Recorrida) para cobrança da quantia de € 10.956,87, proveniente de dívida de sisa de 1993 e acrescido, a Executada, invocando o disposto no art. 276.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), reclamou para o Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela do despacho que ordenou a penhora e contra a realização desta diligência.

1.2 O Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, depois de colher a informação de que a liquidação que deu origem à dívida exequenda foi anulada, em processo de impugnação judicial, julgou extinta a instância por inutilidade superveniente da lide e condenou a Fazenda Pública nas custas.

1.3 A Fazenda Pública recorreu dessa decisão para este Tribunal Central Administrativo Norte, apresentando as alegações de recurso, que resumiu em conclusões cujo teor ora reproduzimos ipsis verbis: « 1. A douta sentença recorrida considerou que a sentença do TAF de Mirandela de fls. 98 a 102, que julgou procedente a impugnação deduzida pela reclamante e anulou a liquidação que deu origem à execução a que respeita a reclamação que constitui objecto dos presentes autos … não se justifica o prosseguimento do processo para decisão do mérito da causa…; 2. A douta sentença considerou extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, nos termos do artº. 287º, alínea e) do CPC, aplicável ex vi artº. 2º CPPT; 3. A douta sentença condena a Fazenda Pública em custas por aplicação do art.º 447º CPC; 4. A Fazenda Pública defende que os factos que deram origem à Reclamação do art.º 276º, nada têm a ver com os factos da impugnação judicial.

5. Na reclamação do art.º 276º são apreciadas as decisões do órgão da execução fiscal que afectem os direitos e interesses legítimos do executado ou de terceiros; 6. Na Impugnação Judicial apreciam-se os vícios do acto impugnado (liquidação) art.º 101º e 124º do CPPT; 7. Não existe qualquer relação ou coincidência dos factos nos dois tipos de processos, logo, não existe inutilidade superveniente da lide, sendo indispensável a apreciação dos factos; 8. A decisão que ordena a penhora e respectiva penhora, são absolutamente legais, não enfermam de qualquer ilegalidade; 9. A reclamante acaba por concordar com a penhora (nº. 5 do requerimento de 08-12-2004, de fls. 49 a 51); 10. A reclamante é que deu causa ao processo, tendo requerido ao chefe do Serviço de Finanças que remetesse a Reclamação a Tribunal pretendendo obter um ganho de causa, pelo que nos termos do artº. 450º CPC, não poderá a Fazenda Pública ser condenada em custas; 11. A Fazenda Pública só poderia ser condenada em custas se fossem apreciados os factos que deram origem à Reclamação e o Tribunal criasse a convicção de que a decisão e penhora efectuadas enfermavam de determinada ilegalidade, tendo em conta que à data dos factos corria termos a impugnação judicial que poderia provocar a suspensão da execução fiscal após penhora de bens; Termos em que deverá a douta sentença recorrida ser anulada e substituída por outra que declare a legalidade da - decisão que ordenou a penhora a que se reporta o auto de penhora de 18 de Outubro de 2004, mas também a efectuação de tal penhora - reclamadas e a sua manutenção na ordem jurídica e absolva a Fazenda Pública do pagamento das custas» (() As partes entre aspas e com um tipo de letra diferente, aqui como adiante, constituem transcrições.

).

1.4 O recurso foi admitido, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.

1.5 Recebidos os autos neste Tribunal Central Administrativo Norte, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto suscitou, como questão prévia, a inadmissibilidade do recurso por o respectivo valor ser inferior à alçada dos tribunais tributários de 1.ª instância. Para tanto, considerou que: o valor da causa nos recursos é determinado nos termos do art. 11.º do Código das Custas Judiciais (CCJ), sendo este «o da sucumbência quando esta for determinável, devendo o recorrente indicar o seu valor no requerimento de interposição do recurso»; assim, não obstante a Fazenda Pública não tenha indicado o valor, «o mesmo é determinável por aplicação da tabela I anexa ao Cod. C. Jud., tomando-se em conta que o valor da execução era de 10.956,87 Euros (cf. fls. 13) e que a taxa de justiça foi reduzida a metade, pelo que a mesma seria de 1,5 unidades de conta». Assim, e considerando ainda a inexistência de qualquer norma excepcional no sentido de permitir o recurso das decisões de condenação em custas independentemente do valor da causa, considerou irrecorrível a decisão sob recurso.

1.6 Notificadas a Representante da Fazenda Pública e a Reclamante para se pronunciarem, querendo, sobre essa questão, apenas aquela o veio fazer, sustentando, em síntese, que o valor a considerar para efeitos da admissibilidade do recurso é o da execução fiscal e não o das custas, pois o recurso «não se cinge apenas à questão das custas, discutindo também a decisão relativa à inutilidade superveniente da lide», pelo que «o valor da “sucumbência” não é, no caso, equivalente ao montante das custas eventualmente devidas, correspondendo, pelo menos, ao valor da causa, isto é, a 10.956,87 €». Para a eventualidade de assim não se considerar, referiu ainda que o art. 280.º, n.º 4, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) «não faz depender a interposição do recurso do valor da sucumbência, mas apenas e tão só do valor da causa».

1.7 Foram dispensados os vistos, atento o carácter urgente do processo.

1.8 As questões que cumpre apreciar e decidir, como procuraremos demonstrar são: - a da admissibilidade do recurso face ao valor, suscitada pelo Procurador-Geral Adjunto neste Tribunal Central Administrativo Norte; e, caso se venha a concluir pela admissibilidade do recurso, se decisão recorrida fez correcto julgamento quando considerou que - a consequência sobre a reclamação da anulação da liquidação que deu origem à dívida exequenda é a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide; - a Fazenda Pública deve suportar as custas da extinção da instância.

* * *2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 DE FACTO 2.1.1 Com interesse para a decisão a proferir, há que ter presente o seguinte circunstancialismo processual: 1. Em 10 de Janeiro de 2000, foi instaurado pelo Serviço de Finanças de Bragança contra a sociedade denominada “Sociedade Agrícola , Lda.” um processo de execução fiscal, ao qual foi atribuído o n.º 100065.9/2000, para cobrança coerciva da quantia de esc. 2.196.655$00, proveniente de Imposto Municipal de Sisa (sisa) e juros compensatórios (cf. cópia da certidão de dívida, a fls. 3); 2. Para citação da Executada, o Serviço de Finanças de Bragança remeteu-lhe carta, recebida em 7 de Fevereiro de 2000 e na qual, para além do mais, lhe era comunicado que podia «querendo, no prazo de trinta dias a contar desta citação, deduzir oposição, requerer o pagamento em prestações ou a dação em pagamento» e que «[f]indo aquele prazo sem que tenha sido efectuado o pagamento da quantia exequenda, juros de mora e custas reduzidas mediante guias que deve pedir nesta Repartição de Finanças ou obtida a suspensão da execução por algum dos meios previstos no art. 255º do Código de Processo Tributário, a mesma prosseguirá os seus termos legais, designadamente para penhora de bens e mais diligências previstas no referido Código» (cf. cópia da carta, a fls. 23, e o teor do item 1.º da reclamação, a fls. 21); 3. Em 3 de Março de 2000, a Executada fez dar entrada na Direcção de Finanças de Bragança um requerimento dirigido ao processo de execução fiscal dito em 1.

e endereçado ao Juiz do Tribunal Tributário de 1.ª instância de Bragança, pedindo o apoio judiciário, nas modalidades de dispensa total de preparos e do pagamento das custas e da nomeação de patrono (cf. cópia do requerimento de apoio judiciário, bem como o carimbo de entrada que lhe foi aposto, de fls. 32 a 36, e a confirmação da entrada desse requerimento na alínea a) da informação prestada pela Direcção de Finanças de Bragança a fls. 74/75); 4. Na execução fiscal dita em 1.

o Serviço de Finanças de Bragança emitiu carta precatória, datada de 18 de Maio de 2000, solicitando ao seu congénere de Vila Real a penhora de bens da Executada (cf. carta precatória a fls. 2); 5. Em 18 de Outubro de 2004, o Serviço de Finanças de Vila Real procedeu à penhora de uma casa, identificada no respectivo auto (cf. auto de penhora a fls. 14); 6. Para notificar a Executada da penhora, o Serviço de Finanças de Vila Real remeteu-lhe carta registada com aviso de recepção, que veio devolvido assinado com data de 21 de Outubro de 2004 (cf. cópia da carta e respectivo aviso de recepção a fls. 18 e 19); 7. Em 2 de Novembro de 2004, a Executada fez dar entrada no Serviço de Finanças de Vila Real um requerimento, endereçado ao Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, invocando o disposto no art. 276.º do CPPT e pedindo a «revogação» da penhora efectuada e do despacho que a ordenou (cf. o requerimento de fls. 20 a 27); 8. Nesse requerimento, a Reclamante alegava, em síntese, que o pedido de apoio judiciário que formulou na execução fiscal (referido em 3.

) interrompeu o prazo de 30 dias que lhe foi assinalado como sendo aquele em que lhe era possível o pagamento antes da execução prosseguir para a penhora de bens (cf. o requerimento por que foi deduzida a reclamação, de fls. 20 a 27); 9. Em 12 de Novembro de 2004 a Executada juntou aos autos documento comprovativo do pagamento de uma taxa de justiça respeitante a «incidente/recurso», calculado para um valor de acção de € 7.500,01 a € 15.000,00, sendo o montante pago de € 133,50 (cf. documento de fls. 42); 10. Em 2 de Dezembro de 2004 a Executada fez dar entrada no Serviço de Finanças de Vila Real um requerimento dirigido à execução e endereçado ao Chefe daquele serviço...

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