Acórdão nº 00532/04.1BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 18 de Outubro de 2007

Magistrado ResponsávelDr
Data da Resolução18 de Outubro de 2007
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção do Contencioso Administrativo do TCAN: I- RELATÓRIO Freguesia de César e Município de Oliveira de Azeméis, inconformados com a sentença do TAF de Viseu, datada de 13.FEV.06, que, em ACÇÃO ADMINISTRATIVA COMUM, oportunamente, contra eles interposta por C..., residente na Rua ..., Espinho, os condenou no pedido, recorreram para o TCAN, formulando as seguintes conclusões: I. O Município de Oliveira de Azeméis e a Freguesia de César procederam ao corte e supressão de uma rampa de acesso à propriedade do A. por carro de bois e tractor, rampa essa que estava construída sobre a via municipal e que ocupava parte desta via; II. Esta actuação teve lugar quando as recorrentes procederam à execução de obras de beneficiação da via através da sua pavimentação com tapete betuminoso, e constitui o exercício de um poder/dever, ou, mais propriamente, o exercício de uma competência exclusiva das Autarquias – v. artºs 14º, 16º, al. b), 18º, nº 1, al. c), da Lei 159/99; 34º, nº 3, al. f) e nº 6, al. n), 64º, nº 3, al. f) e nº 7, al. b), da Lei 169/99; artº 2º do Regulamento Geral das Estradas e Caminhos Municipais, aprovado pela Lei nº 2110, de 19.8.1965; III. A actuação do Município e da Freguesia são, por isso, lícitos, e correspondem ao exercício de atribuições e competências que a lei lhes confere; IV. A decisão recorrida fez errada interpretação da lei aos factos ao considerar a actuação dos recorrentes como constituindo um facto ilícito e culposo subsumível nos artºs 2º e 4º do D.L. 48 051 e 483º do Código Civil; V. A situação em apreço, isto é da actuação dos recorrentes, porque lícita, poderia eventualmente decorrer responsabilidade nos termos do disposto nos artºs 8º e 9º; Porém, VI. O dever indemnizatório por actos lícitos regulado pelos artºs 8º e 9º do D.L. 48 051 tem exclusivamente por objecto “prejuízos especiais e anormais resultantes do funcionamento de serviços administrativos excepcionalmente perigosos” e desde que inexista culpa da vítima ou terceiros; Ora, VII. A rampa construída pelo A. em cima da via não foi autorizada nem licenciada pelo município, não sendo, e ainda que autorizada só o poderia ter sido a título precário atento o disposto no artº 62º do Regulamento Geral das Estradas e Caminhos Municipais; VIII. De resto a existência da rampa em apreço é proibida por lei, designadamente pelos artºs 39º, nºs 1 e 4, 5 e 12 do Regulamento citado; IX. A lei – artº 62º do mesmo Regulamento – afasta expressamente a possibilidade de indemnização pela supressão da rampa; X. Por imperativo legal decorrente das referidas disposições, não pode ser atribuída qualquer indemnização ao A.; XI. A douta decisão fez errado enquadramento legal dos factos, XII. E violou os artºs 8º e 9º (e 2º e 4º) do D.L. 48 051, 483º do C.C.; 39º, nºs 1, 4, 5 e 12 e 62º do Regulamento aprovado pela Lei nº 2110; XIII. Pelo que deve ser revogada.

Caso assim se não entenda, XIV. Deverá então revogar-se o despacho que indeferiu a reclamação dos R.R. de aditamento à Base Instrutória da matéria alegada nos nºs 29 e 30 da p.i.; XV. Afim de se apurar se o A. tinha ou não autorização dos R.R. para construir e manter a rampa sobre a via, o que constitui matéria da maior relevância por força do disposto nos artºs 8º e 9º do D.L. 48 051; XVI. Pois que, na ausência de autorização/licença a supressão da rampa constitui reposição da legalidade, como constitui (a ausência de autorização ou licença) facto culposo do A. que exclui o direito de indemnização que invoca; Consequentemente, XVII. Deve ser revogado o despacho que indeferiu a reclamação à Base Instrutória, o que implica a da sentença por força do regime da nulidade dos actos.

Finalmente, XVIII. Ao A. não assiste o direito de pedir a reposição do acesso ao rés-do-chão do prédio, pois que tal implica alteração do arruamento e das condições de circulação, pelo que também nesta parte a decisão recorrida deve ser revogada.

O Recorrido contra-alegou tendo pugnado pela improcedência do recurso.

O Dignº Procurador-Geral Adjunto emitiu pronúncia nesta instância, no sentido da procedência do recurso.

Colhidos os vistos legais, o processo é submetido à Secção do Contencioso Administrativo para julgamento do recurso.

II- QUESTÕES A DECIDIR NO RECURSO O erro de julgamento com violação do disposto nos artºs 2º, 4º, 8º e 9º do D.L. 48 051, de 21.NOV.67; 483º do CC; e 39º, nºs 1, 4, 5 e 12 e 62º do Regulamento aprovado pela L 2110, de 19.AGO.65.

III- FUNDAMENTAÇÃO III-1.

Matéria de facto A sentença recorrida deu como provados os seguintes factos: 1 - 0 prédio de casas de habitação com um pavimento, com pátio, eira, casa da eira, sito no lugar de Vilarinho, da freguesia de César, do concelho de Oliveira de Azeméis, a confrontar do norte com o caminho público, do sul e nascente com terreno do A. e do poente com o rego foreiro, descrito na Conservatória sob o n° 5 da freguesia de César e inscrito na matriz sob o artigo 270, urbano, da mesma freguesia, de que é dono e legítimo proprietário o Autor – Alínea A) da Matéria Assente.

2 - O prédio identificado na alínea A) foi adjudicado na escritura de habilitação e partilha por óbito do pai do A., C..., outorgada no 1° Cartório da Secretaria Notarial da Feira em 26.03.1987 constante do livro n° 1073-A a partir de fls. 133 - Alínea B) da Matéria Assente.

3 - O mesmo prédio está identificado na verba n° 50 do documento elaborado nos termos do art. 78° do Cod. Notariado – Alínea C) da Matéria Assente.

4 - O prédio identificado em A) confronta pelo seu lado norte, com a estrada, hoje denominada de Rua Nossa Senhora da Esperança – Alínea D) da Matéria Assente.

5 – Os RR. procederam à melhoria e beneficiação da via identificada na alínea D) – Alínea E) da Matéria Assente.

6 - A estrada, hoje denominada de Rua Nossa Senhora da Esperança, foi recentemente melhorada pelas autarquias Rés em conjunto, melhoramento que consistiu no alargamento do caminho e na colocação de piso em betuminoso – Resposta ao artigo 1.º da Base Instrutória.

7 - Antes da realização das obras levadas a cabo em conjunto por ambas as Rés, o piso do caminho era em calçada – Resposta ao Artigo 2.º da Base Instrutória.

8 - Para proceder ao alargamento do caminho, as RR, procederam ao corte duma rampa que havia, com cerca de 2,40 m. de largura, ligeiramente inclinada em sentido ascendente a partir da estrada ou caminho e sobre a qual sempre passaram carros de bois e tractores para acesso ao interior do mesmo prédio, nomeadamente ao seu logradouro – Resposta ao Artigo 3.º da Base Instrutória.

9 - Em consequência de tal obra, feita pelas RR., com o corte da rampa, foi criado um desnível com a altura que oscila entre 0,10 m junto à estrada e cerca de 0,60 m junto à parede da casa – Resposta ao Artigo 4.º da Base Instrutória.

10 - Com o corte da rampa não é possível a utilização do acesso de carros de bois e tractores ao interior do prédio, nomeadamente ao seu logradouro – Resposta ao Artigo 5.º da Base Instrutória.

11 - Antes das obras identificadas no artigo 1.º sempre que havia necessidade, o acesso era feito pela rampa – Resposta ao Artigo 6.º da Base Instrutória.

12 - Ao construírem o piso em betuminoso ao longo da parede do lado norte da casa, as RR. elevaram o nível do piso, impedindo o acesso à casa (parte mais baixa) através dum portão em chapa, com duas folhas – Resposta ao Artigo 7.º da Base Instrutória.

13 - O edifício é de condições e materiais modestos, não possui reboco ou pintura nem massas grossas, existindo fendas na parede exterior do prédio – Resposta ao Artigo 10.º da Base Instrutória.

III-2.

Matéria de direito Constitui objecto do presente recurso jurisdicional, determinar se a factualidade constante dos autos deve merecer ser enquadrada em sede de responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas de direito público no domínio dos actos de gestão pública, por actos ilícitos e culposos, regulada sob os artº s 2º e 3º do DL 48 051, de 21.NOV.67, ou antes no âmbito da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas de direito público no domínio dos actos de gestão pública, por actos lícitos, regulada sob os artºs 8º e 9º do mesmo diploma legal; e, em ambas as situações, saber se assiste no caso sub judice o dever de indemnização.

A sentença recorrida enquadrou o caso dos autos no âmbito da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas de direito público no domínio dos actos de gestão pública, por actos ilícitos e culposos, regulada sob os artºs 2º e 3º do DL 48 051.

É a seguinte a fundamentação da sentença proferida pelo Tribunal a quo: “(...) A lei aplicável aos presente autos é o D.L. n.º 48051, de 21 de Novembro de 1967, designadamente, o disposto no art. 2.º e 4.º, os quais apresentam como pressupostos, no essencial, e de acordo com jurisprudência constante do STA, os estatuídos na lei civil, ou seja, no art. 483º e seguintes do Código Civil onde se dispõe que só há responsabilidade civil se se verificarem, cumulativamente, os seguintes pressupostos: O facto: aquele que é dominável ou controlável pela vontade do órgão ou seu agente, no exercício das suas funções e por causa delas, excluindo assim os factos naturais; a ilicitude: a violação ou desrespeito de um direito subjectivo ou disposição legal destinada a proteger interesses alheios; pese embora este pressuposto e a culpa sejam realidades distintas e com regimes diferentes, quando, como “in casu”, é violado o dever de boa...

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