Acórdão nº 00133/04 de Tribunal Central Administrativo Norte, 15 de Julho de 2004

Magistrado ResponsávelDr. Carlos Lu
Data da Resolução15 de Julho de 2004
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DE ARCOS DE VALDEVEZ inconformado veio interpor recurso jurisdicional da sentença do TAF do Porto – 1º Juízo, datada de 25/03/2004, que julgou procedente o pedido de intimação deduzido por …. e o intimou a, no prazo de cinco dias, permitir a consulta do processo de licenciamento da construção da unidade industrial da “…, S.A.”. --- Formula, nas respectivas alegações, as seguintes conclusões: “(...) I. Não sendo interessado directo no procedimento, o particular que requeira o acesso a um processo administrativo terá, minimamente, de indicar qual o interesse na consulta, por forma a que a respectiva entidade possa avaliar da sua qualidade de interessado na obtenção de informação ou consulta de processos.

  1. O recurso ao meio processual acessório previsto nos arts. 82º a 85 LPTA tem como pressuposto fundamental a recusa (por parte da Administração) de acesso (pelos interessados) aos documentos cuja consulta foi requerida, se a essa consulta houver lugar.

  2. Não deve ser um interesse ilegítimo, nem sequer a mera curiosidade, o intuito de espreitar ou voyerista que deve fundamentar o acesso aos documentos da Administração.

  3. No requerimento apresentado pelo recorrido em 6.11.2003, não indicou o mesmo qualquer facto donde resultasse ter qualquer interesse no acesso ao processo cuja consulta pediu, sendo que o mesmo não tinha tido a mais leve intervenção no mesmo.

  4. Tal requerimento foi apresentado pela Exma. Senhora Advogada nele identificado, mas em representação do requerente, que expressamente identificou, ou seja, limitou-se a Ilustre Mandatária do ora recorrido a apresentar um requerimento no nome daquele.

  5. Se ao requerente era exigido o cumprimento dos citados requisitos, não pode a sua verificação ser dispensada pelo mero facto de o requerimento ter sido assinado por Advogado constituído, pois que, se é invocada essa qualidade, se o Advogado age, no caso, em representação do seu constituinte, não pode deixar de se exigir o controle do interesse no acesso aos documentos que seria feito se o mesmo requerimento fosse assinado pelo próprio requerente.

  6. O requerimento nunca chegou a ser indeferido, tendo sido o requerente notificado para suprir a falta de alegação de interesse no acesso aos documentos em causa, jamais tendo o mesmo suprido tal deficiência, pelo que falta o pressuposto da recusa exigido pelo art. 82º/1 e 2 da LPTA para que pudesse ter sido lançado mão do pedido de intimação, havendo recusa, sim, mas por parte do requerente no suprimento da referida deficiência.

  7. Nos itens 5º, 6º, 9º e 10º do requerimento inicial, o ora recorrido confessa expressamente que quem tinha interesse na consulta do processo não era ele próprio, mas antes a Associação de que o mesmo se diz presidente, a qual tinha já instaurado no Tribunal Judicial de Arcos de Valdevez uma providência cautelar não especificada relacionada com a matéria e que a consulta se destinava a bem fundamentar a dita providência cautelar.

  8. Perante tal confissão expressa havia que indeferir o pedido de intimação apresentado, pois que é confessado expressamente que pelo próprio, requerente da intimação, não tinha qualquer interesse na consulta do processo que agora, com o deferimento da intimação, lhe é facultada.

  9. Tal Associação nada requereu ao ora recorrente, não é parte nos autos, não tem qualquer legitimidade para justificar o pedido de intimação, sendo que não é legítima a confusão que o recorrido faz permanentemente entre si próprio, a pessoa individual e cidadão …., e a pessoa colectiva que é a referida Associação que, quando muito, será representada por um Presidente que, no caso, será, porventura, o cidadão ... .

  10. Nenhum interesse, sequer, era invocável pelo requerente e ora recorrido na consulta aludida, como ele acaba por confessar, o que apenas veio confirmar e dar razão ao ora recorrente, quando ordenou que o mesmo viesse suprir a deficiência do seu requerimento.

  11. Ao ser julgado procedente o pedido de intimação apresentado, acaba por ser admitido o acesso ao processo de alguém que, representado ou não por Advogado, nenhum interesse confessadamente tem nessa consulta, ao passo que a pessoa (colectiva) que, pelos vistos, tem esse interesse, acaba por nada requerer e acaba por não ser parte nos autos.

  12. É irrelevante que o recorrente tenha sido representado por Advogado aquando do pedido de acesso, quando, afinal, ele próprio vem a confessar no processo que não era ele que tinha interesse no acesso ao citado processo administrativo.

  13. O que importa considerar é a confissão feita nos autos acerca da inexistência de interesse na consulta pedida, sob pena de se fazer revelar uma construção completamente formal, em detrimento da verificação efectiva dos pressupostos do direito de acesso aos documentos da Administração e da verificação substancial do interesse de cada um nesse acesso.

  14. Salvo devido respeito, foram violadas as normas dos arts. 268º/1 da CRP, 61º e 64º do CPA, 82º a 85º da LPTA, 110º/3 do RJUE aprovado pelo DL 555/99, de 16.12, com as alterações introduzidas pelo DL 177/2001, de 4.12 e 63º/1 do Estatuto da Ordem dos Advogados. (...)”.

Termina concluindo no sentido de que “(...) uma vez admitido o recurso, deve ser dado provimento ao mesmo e, em consequência, ser revogada a douta sentença recorrida, substituindo-se por nova decisão que julgue o pedido de intimação totalmente improcedente (...)”.

O agravado não apresentou contra-alegações.

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso e manutenção da decisão recorrida (cfr. fls. 103 e 103 v.).

Sem vistos, dado o disposto no art. 78º, n.º 4 da L.P.T.A., foi o processo submetido à Conferência para julgamento.

  1. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo recorrente, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos arts. 660º, n.º 2, 664º, 684º, n.ºs 3 e 4 e 690º, n.º 1 todos do Código de Processo Civil (C.P.C.) “ex vi” art. 102º da L.P.T.A..

    As questões suscitadas são, em suma, determinar se na situação vertente estão preenchidos os pressupostos ou requisitos enunciados para o deferimento do pedido e intimação para consulta de documentos, em especial, a existência de um interesse legítimo no objecto de consulta por parte do requerente aqui ora recorrido.

  2. FUNDAMENTOS 3.1.

    DE FACTO Da decisão recorrida resultaram provados os seguintes factos: I) Por escritura pública, datada de 26/09/2003, no cartório Notarial de Arcos de Valdevez, foi constituída pelo requerente e outros intervenientes melhor identificados no documento ora referido, uma associação denominada “Associação dos Defensores da Natureza da Terras de ….-ADN, com sede no lugar de Mato, caixa …, na freguesia de Tabaçô, do concelho de Arcos de Valdevez, extraindo-se da citada escritura que a citada associação “tem por objecto a...

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