Acórdão nº 04319/08 de Tribunal Central Administrativo Sul, 23 de Abril de 2009

Magistrado ResponsávelRui Pereira
Data da Resolução23 de Abril de 2009
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO 2º JUÍZO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL I. RELATÓRIO António ...

, com os sinais nos autos, intentou no TAF de Loulé, previamente à interposição da acção administrativa especial de pretensão conexa com actos administrativos, uma Providência Cautelar de Suspensão de Eficácia da deliberação da Câmara Municipal de Loulé, datada de 23-1-2008, que determinou "submeter à discussão pública o projecto de alteração do loteamento denominado «Golfe Poente», Quinta do Lago, requerido em nome de Quinta do Lago - Empreendimentos Imobiliários e Turísticos, SA", mais requerendo, nos termos do artigo 112º do CPTA, que se intimasse o requerido a abster-se de aprovar o referido projecto de alteração de loteamento denominado "Golfe Poente", sito na Quinta do Lago.

O TAF de Loulé, por decisão datada de 21-7-2008, julgou improcedente a providência cautelar de suspensão de eficácia requerida e indeferiu a intimação para a abstenção da conduta peticionada.

Inconformado, veio o requerente da providência cautelar recorrer jurisdicionalmente para este TCA Sul, tendo para o efeito concluído a sua alegação nos seguintes termos: "A.

A sentença recorrida padece manifestamente de fundamento quanto aos argumentos que fundaram a rejeição das providências cautelares requeridas.

B.

Assim, e em primeiro lugar, verifica-se que o Tribunal "a quo" não apreciou todas as causas de invalidada alegadas pelo recorrente, socorrendo-se apenas de uma delas [e de modo pouco fundamentado] para sustentar o não preenchimento da alínea a) do nº 1 do artigo 120º do CPTA.

C.

Com efeito, tendo o recorrente invocado quatro causas de invalidade da deliberação em crise - i) a nulidade por impossibilidade jurídica do objecto, ii) a inexistência de deliberação da Assembleia Municipal de aprovação da desafectação e de acto de alienação da parcela desafectada à contra-interessada, iii) a ilegitimidade e falta de interesse legítimo da contra-interessada para promover a alteração pretendida, e iv) a omissão de junção dos elementos previstos na alínea b) do nº 1 do artigo 7º da Portaria nº 1110/2001, de 19 de Setembro - o Tribunal recorrido só se pronunciou perfunctoriamente acerca do segundo vício.

D.

Ora, o Tribunal a quo encontra-se obrigado a avaliar - ainda que num nível muito sumário - todas as causas de invalidade apontadas pelo recorrente, sob pena de alguma delas reflectir a "manifesta procedência" da pretensão da acção principal e não ser apreciada.

E.

Segundo o disposto no nº 2 do artigo 95º do CPTA, o tribunal deve pronunciar-se sobre todas as causas de invalidade que tenham sido invocadas - o que, aliás, é aplicável no que respeita à apreciação dos vícios apontados em sede de tutela cautelar [vd. Acórdãos supracitados e, especialmente, o Acórdão do TCA Sul, de 31 de Março de 2005 - processo nº 0482/04, e o Acórdão do TCA Norte, de 26 de Julho de 2007, processo nº 01476/06.8BEBRG-A].

F.

Nesses termos, e uma vez que o Tribunal a quo não se pronunciou acerca de todas as causas de invalidade invocadas pelo recorrente, a sentença subjudice encontra-se ferida de nulidade por omissão de pronúncia, nos termos da alínea d) do nº 1 do artigo 668º do CPCivil, aplicável "ex vi" do artigo 1º do CPTA.

G.

Em segundo lugar, a decisão do Tribunal recorrido labora em erro de julgamento, uma vez que é evidente a procedência da pretensão da acção principal, nos termos da alínea a) do nº 1 do artigo 120º do CPTA.

H.

Assim, não só devem ser considerados procedentes os restantes vícios invocados como também a causa de invalidade apreciada sumariamente pelo Tribunal a quo.

L.

Com efeito, o recorrente alegou que a deliberação em crise padecia de ilegalidades manifestas em virtude de não cumprirem as normas que regulam a desafectação do domínio público municipal.

J.

De acordo com a alínea b) do nº 4 do artigo 53º da Lei das Autarquias Locais, é à Assembleia Municipal que cabe aprovar a desafectação de parcelas do domínio público municipal, pelo que deverá esta pronunciar-se antes de a Câmara Municipal aprovar alterações a loteamentos que impliquem modificações dessas áreas. Além disso, depois de realizada a desafectação, haveria que proceder à transmissão desses terrenos para a contra-interessada.

K.

Ora, esses dois pressupostos não ocorreram, pelo que a alteração ao loteamento - e, consequentemente, a deliberação municipal que determinou a abertura da discussão pública do projecto de alteração e o acto final que vier a aprovar essa alteração - são necessariamente inválidos.

L.

Por essas razões - e ainda que não seja possível retirar uma posição inequívoca do Tribunal a quo quanto à verificação da causa de invalidade invocada pelo recorrente -, a decisão recorrida incorre em erro de julgamento ao considerar como não verificado este vício.

M.

Sublinhe-se que o recorrente não nega que as operações de loteamento possam sofrer modificações e alterações no que respeita à distribuição das ocupações urbanísticas - inclusivamente, ao nível das áreas cedidas para o domínio público municipal.

N.

Todavia, essa modificação tem requisitos acrescidos quando pressupõem a alteração de áreas que já não se encontram na disponibilidade do interessado que a promove - como é o caso das áreas de cedência para o domínio público, cuja desafectação deve ser aprovada pela Assembleia Municipal, ao abrigo da Lei das Autarquias Locais.

O.

Cumpre assinalar, neste âmbito, que a jurisprudência citada pelo Tribunal recorrido se reporta a factos anteriores à actual Lei das Autarquias Locais, quando a exigência de deliberação da Assembleia Municipal para desafectação do domínio público nem se encontrava prevista nesse diploma - pelo que não deve ser considerada relevante no julgamento do presente caso.

P.

Por estas razões - e sem prejuízo da procedência dos restantes vícios elencados pelo recorrente, que não foram apreciados -, a deliberação em apreço é manifestamente inválida, sem ser necessária uma indagação profunda quanto ao mérito da acção principal.

Q.

Em suma, e no que concerne à apreciação da alínea a) do nº 1 do artigo 120º do CPTA, verifica-se que o Tribunal a quo não apreciou cabalmente a "vexata quaestio" subjacente à invocação da causa de nulidade referida, encontrando-se a sua improcedência desprovida de fundamento.

R.

Em todo o caso, a apreciação do primeiro pressuposto de decretamento das providências cautelares requeridas padece de incongruências ao nível da sua fundamentação que o recorrente não pode deixar de apontar.

S.

A título de exemplo, o Tribunal a quo cita disposições jurídicas - como aquelas respeitantes às especificações dos alvarás de loteamento - sem justificar de que modo o seu conteúdo contende com a argumentação do ora recorrente.

T.

Por outro lado, conclui-se na sentença recorrida que o novo alvará dá lugar a uma nova apreciação da solução urbanística, mas também não se esclarece de que forma é que essa conclusão prejudica os fundamentos oportunamente aduzidos pelo ora recorrente.

U.

Finalmente, em confusão grave, o Tribunal a quo não distingue o critério da "manifesta procedência" da alínea a) do nº 1 do artigo 120º do CPTA do critério da "não manifesta improcedência" da alínea b) do mesmo número.

V.

Ora, o facto de uma pretensão não ser manifestamente procedente [conforme se exige na citada alínea a)] não é, como é óbvio, equivalente a ser considerada manifestamente improcedente, como parece entender o Tribunal a quo.

W.

Nesse sentido, também quanto a este aspecto não pode a decisão do Tribunal a quo proceder.

X.

Em terceiro lugar, ao remeter para a apreciação realizada ao nível da alínea a), a decisão do Tribunal recorrido incorre também em erro de julgamento quanto ao pressuposto de "fumus boni iuris" previsto na alínea b) do nº 1 do artigo 120º do CPTA.

Y.

Com efeito, o Tribunal a quo não procedeu, a propósito da alínea a) do nº 1 do artigo 120º do CPTA, a qualquer apreciação fundada da suposta "manifesta improcedência" da pretensão da acção principal, pelo que, ao ter remetido, no âmbito da alínea b), para o que foi exposto na alínea a), carece em absoluto de fundamento.

Z.

Em síntese, ao ter considerado como equivalentes as expressões "não manifesta procedência" e "manifesta improcedência", e ao remeter para a apreciação anterior a verificação do "fumus boni iuris" da alínea b), o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento quanto ao pressuposto previsto na alínea b) do nº 1 do artigo 120º do CPTA.

AA.

Em quarto lugar, o Tribunal a quo considerou não se encontrar verificado o requisito do "periculum in mora", igualmente previsto na alínea b) do nº 1 do artigo 120º do CPTA, uma vez que poderia ser sempre impugnado o acto cuja prática se visa impedir.

BB.

Sucede que o recorrente não se limitou a pedir a suspensão da eficácia da deliberação em crise, pois requereu também a intimação da Câmara Municipal de Loulé a abster-se de aprovar o projecto de alteração do loteamento Golfe Poente.

CC.

Ora, o que se pretende com o pedido de intimação é precisamente evitar a emissão do acto final, pelo que o requisito do "periculum in mora" sempre teria de ser dado como preenchido quanto ao segundo pedido.

DD.

Por outras palavras, verifica-se o receito de produção de um facto consumado, pois a acção principal visa evitar - com a condenação à proibição de prática do acto final - a emissão da decisão de aprovação do acto de alteração do loteamento Golfe Poente [veja-se, a este propósito, o Acórdão do TCA Sul, de 14 de Fevereiro de 2008, processo nº 03165/07].

EE.

Mas, acresce que, em qualquer caso, o primeiro pedido também pretende evitar o acto final, e por isso visa paralisar e impedir a continuação do procedimento que culminará na sua emissão. Assim, o objectivo da acção principal - onde será impugnado o acto em apreço em cumulação com o pedido de condenação à proibição de aprovação do projecto - é, em qualquer dos casos, evitar que o acto final seja emitido.

FF.

Por essa razão, verifica-se, também quanto ao requisito do "periculum in mora"...

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