Acórdão nº 00352/04.3BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 27 de Novembro de 2008

Magistrado ResponsávelDr
Data da Resolução27 de Novembro de 2008
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO M…, M… (AAE n.º 361/04.2BECBR), M… (AAE n.º 362/04.0BECBR), M… (AAE n.º 363/04.9BECBR), M… (AAE n.º 364/04.7BECBR), I… (AAE n.º 365/04.5BECBR), M… (AAE n.º 366/04.3BECBR), L… (AAE n.º 367/04.1BECBR), M… (AAE n.º 368/04.0BECBR) e A… (AAE n.º 401/04.5BECBR), todos devidamente identificados nos autos, inconformados, vieram interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF de Coimbra, datada de 23/05/2007, que julgou procedente a excepção de inimpugnabilidade do acto administrativo objecto de impugnação (despacho da Sr.ª Ministra da Justiça, datado de 30/03/2004, nos termos do qual foi autorizada e homologada a abertura de concurso para atribuição de licenças de instalação de cartório notarial - ao abrigo dos arts. 34.º e 123.º do DL n.º 26/04, de 04/02 -, e que foi publicitado pelo Aviso n.º 4994/2004 inserto no DR II Série, de 20/04/2004) e absolveu da instância os RR. nas acções administrativas especiais em referência e que foram deduzidas contra o “MINISTÉRIO DA JUSTIÇA” e nas quais são contra-interessados: - AAE n.º 352/04.3BECBR: A… e outros…, todos igualmente identificados nos autos; - AAE n.º 361/04.2BECBR: A… e outros…, todos igualmente identificados nos autos; - AAE n.º 362/04.0BECBR: A… e outros…, todos igualmente identificados nos autos; - AAE n.º 363/04.9BECBR: A… e outros…, todos igualmente identificados nos autos; - AAE n.º 364/04.7BECBR: A… e outros…, todos igualmente identificados nos autos; - AAE n.º 365/04.5BECBR: A… e outros…, todos igualmente identificados nos autos; - AAE n.º 366/04.3BECBR: A… e outros…, todos igualmente identificados nos autos; - AAE n.º 367/04.1BECBR: A… e outros…, todos igualmente identificados nos autos; - AAE n.º 368/04.0BECBR: A… e outros…, todos igualmente identificados nos autos; - AAE n.º 401/04.5BECBR: A… e outros…, todos igualmente identificados nos autos.

Formulam os aqui recorrentes nas respectivas alegações (cfr. fls. 549 e segs.

- paginação do suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário) as seguintes conclusões que se reproduzem: “...

1. Depreende-se da decisão recorrida que a inimpugnabilidade do acto foi fundamentada na consideração de que não foram invocados vícios próprios do acto, mas apenas vícios do acto legislativo que executou, e de que este, dada a sua natureza, não pode ser objecto de fiscalização abstracta de inconstitucionalidade pelos Tribunais Administrativos, mas tão-somente pelo Tribunal Constitucional, sendo pois um objecto fora dos poderes de cognição daqueles; 2. Tal decisão viola frontalmente o direito constitucionalmente consagrado à tutela judicial efectiva; 3. Na verdade, constitui uma vinculação constitucional dos tribunais nacionais, de qualquer ordem, a não aplicação de normas que violam a Lei Fundamental, como resulta do artigo 204.º da CRP, o que foi requerido pela recorrente; 4. As normas jurídicas em matéria administrativa não produzem efeitos na esfera jurídica da recorrente, carecendo, para ser impugnadas contenciosamente da mediação de um acto administrativo, como o impugnado nos presentes autos; 5. O acto impugnado no presente processo vem dar execução a normas legais contidas no Estatuto do Notariado e não a actos administrativos anteriores, pelo que é inaplicável o regime previsto no artigo 151.º do CPA; 6. O acto impugnado, ao contrário do que se julgou no saneador/sentença, caracteriza-se pela sua lesividade, não é meramente preparatório, mas destacável, não teve como destinatários outros órgãos da administração pública e não esgotou os seus efeitos nas relações intra-subjectivas ou inter-orgânicas, pelo que tem eficácia externa; 7. São impugnáveis os actos administrativos com eficácia externa, especialmente aqueles cujo conteúdo seja susceptível de lesar direitos ou interesses legalmente protegidos; 8. Eficácia externa é a produção de efeitos na esfera jurídica das pessoas singulares, dos cidadãos (ou das pessoas colectivas de direito público ou privado); 9. O artigo 51.º, n.º 1, do CPTA não impõe uma lesão efectiva, admitindo, para a impugnação judicial, a susceptibilidade, a possível lesão, a aptidão dos actos para lesarem esses direitos ou interesses.

10. São impugnáveis esses referidos actos mesmo que inseridos num procedimento administrativo em decurso, isto é, quando ainda não haja acto definitivo horizontalmente, ou quando ainda não haja resolução final do procedimento administrativo, da relação jurídica estabelecida entre os cidadãos e a administração; 11. Nos presentes autos, impugna-se um acto de abertura de concurso, inserido num procedimento cujo fim - ou seja, a atribuição de licenças de instalação de cartório notarial - será necessariamente lesivo dos direitos e interesses legalmente protegidos da recorrente, nos termos descritos na p. i.; 12. Ao julgar-se não lesivo, logo inimpugnável, o acto impugnado pela recorrente, violou-se no saneador/sentença recorrido o disposto nos artigos 2.º, n.º 1, e 51.º, n.º 1, do CPTA, nos artigos 1.º, n.ºs 1 e 2, e 4.º, n.º 2, a) do ETAF e nos artigos 204.º e 268.º, n.º 4, da CRP, directamente aplicáveis; 13. Termos em que, com o douto suprimento, deve ser revogado o saneador/sentença referido, declarando-se o acto impugnado verdadeiramente impugnável e ordenar-se o prosseguimento dos autos para as fases ulteriores do processo, nos termos legais ...

”.

O R. “Ministério da Justiça”, aqui ora recorrido, veio a apresentar contra-alegações (cfr. fls. 561 e segs.) nas quais pugna pela manutenção do julgado, concluindo nos seguintes termos: “… 1) O acto impugnado - despacho da Ministra da Justiça que autorizou e homologou a abertura do concurso para atribuição de licenças de instalação de cartório notarial, proferido em 30 de Março de 2004 e tornado público pelo Aviso n.º 4994/2004, DR, II Série, de 20 de Abril de 2004 - não reveste as características de impugnabilidade enunciadas no art. 51.º do CPTA; 2) O acto impugnado resume-se a ser um acto de execução das normas do regime transitório do Estatuto do Notariado, normas estas que assumem a natureza de actos legislativos; 3) O acto impugnado inscreve-se num procedimento administrativo complexo, formado por diversas fases; 4) O processo de atribuição de licença e transformação do notariado pressupõe a tomada de uma série de actos, de diferente natureza, que culmina na atribuição de licença de instalação de cartório notarial; 5) Até que tal se verifique não se pode, nem se deve, falar de qualquer situação consolidada do ponto de vista jurídico, e não só; 6) O acto impugnado deve ser perspectivado como acto interno, enquadrando-se no âmbito das relações inter-orgânicas pelo que, consequentemente, apenas indirectamente se poderá reflectir no ordenamento jurídico geral; 7) O acto impugnado, como mero acto trâmite, preparatório e instrumental que é, limita-se a autorizar e a homologar a abertura do concurso, não sendo legítimo fazer-se do mesmo qualquer outra leitura de cariz mais abrangente; 8) Não são assacados vícios autónomos ao acto impugnado, apenas se apontam patologias aos comandos legislativos que consentiram a abertura do concurso em causa; 9) O acto de abertura do concurso propriamente apresenta-se incólume no argumentado pelos Alegantes, não se lhe assinalando quaisquer vicissitudes potencialmente geradoras de anulabilidade, nulidade ou, mesmo, de inconstitucionalidade; 10) O seriado de ilegalidades e de inconstitucionalidades sustentadas pelos AA. não concernem ao próprio acto impugnado, pelo que deverão ser desconsideradas; 11) O despacho ministerial impugnado é, sem aporias, um acto inimpugnável …”.

O Ministério Público (MºPº) junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto no art. 146.º do CPTA, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso jurisdicional (cfr. fls. 581/582), parecer esse que objecto de contraditório não mereceu qualquer resposta (cfr. fls. 586 e segs.).

Colhidos os vistos legais juntos dos Exmos. Juízes-Adjuntos foram os autos submetidos à Conferência para julgamento.

2.

DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelos recorrentes, sendo certo que, pese embora por um lado, o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, n.ºs 3 e 4 e 690.º, n.º 1 todos do Código de Processo Civil (CPC) (na redacção anterior ao DL n.º 34/08, de 26/02, tal como todas as demais referências de seguida feitas relativas a normativos do CPC - cfr. arts. 26.º e 27.º daquele DL) “ex vi” arts. 01.º e 140.º do CPTA, temos, todavia, que, por outro lado, nos termos do art. 149.º do CPTA o tribunal de recurso em sede de recurso de apelação não se limita a cassar a sentença recorrida, porquanto ainda que declare nula a sentença decide “sempre o objecto da causa, conhecendo de facto e de direito”, pelo que os recursos jurisdicionais são “recursos de ‘reexame’ e não meros recurso de ‘revisão’” (cfr. J.C. Vieira de Andrade in: “A Justiça...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT