Acórdão nº 10121/13 de Tribunal Central Administrativo Sul, 05 de Junho de 2014

Magistrado ResponsávelANA CELESTE CARVALHO
Data da Resolução05 de Junho de 2014
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I.

RELATÓRIO Centro …………………, EPE, devidamente identificado nos autos, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Ponta Delgada, datada de 09/04/2013 que, no âmbito da acção administrativa comum, sob a forma sumária, instaurada contra a Região Autónoma dos Açores, julgou a acção improcedente, relativa ao pedido de condenação da Ré ao pagamento da quantia de € 5.218,38, acrescida de juros legais.

Formula o aqui Recorrente nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem (cfr. fls. 168 e segs. do processo físico, assim como as demais referências feitas): “1º. Ao ordenar o pagamento de custas a cargo do requerente C………….violou a douta sentença o disposto no artº. 24º do DL. 34/2008 de 26/2; 2º. Ao considerar improcedente a presente acção fez a sentença uma errada interpretação do artº. 23º do DL. 11/93 de 15/1, bem como uma incorrecta aplicação do disposto na Base II da Lei nº. 48/90 de 24/8, bem como da Base XXXIII nº.2 al. b) 3º. Ao imputar ao SNS o pagamento das aludidas facturas, violou a sentença o disposto nos artº.2º do Estatuto do SNS, uma vez que os beneficiários do SRS Açores não o são do SNS.

4º. Finalmente, deveria a sentença ter levado em consideração o disposto na Circular Normativa nº. 3 de 2008 da ACSS,”.

Termina pedindo a declaração da sua isenção legal e que a sentença seja revogada e substituída por outra que condene a Ré na quantia reclamada.

* A Recorrida, notificada, apresentou contra-alegações, no âmbito das quais concluiu do seguinte modo (cfr. fls. 261): “A) A Recorrida/RAA não é um subsistema de saúde, não lhe sendo, por consequência, imputável qualquer responsabilidade pelo pagamento de cuidados de saúde prestados a cidadãos portugueses no Continente português, ainda que esses cidadãos tenham a sua residência nos Açores.

B) A sentença recorrida não poderia nunca ter levado em consideração o disposto na Circular Normativa nº 3 de 2008 da ACSS, ora junta aos autos pelo Recorrente - tratandose, além do mais, de uma circular emitida em causa própria e que não pode contrariar a lei nem sobrepor-se à Constituição da República Portuguesa, nem ao Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, nem à Lei nº 48/90 de 24/8.

C) O cartão do SNS pode ser utilizado nos Açores, a sua emissão é hoje feita de forma centralizada a nível nacional, com base de dados única, nos termos da lei, e os utentes do SRS são igualmente beneficiários do SNS.

D) A alínea b) do nº 1 do art. 23º do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, aprovado pelo Decreto-lei nº 11/93, de 15 de Janeiro, é inconstitucional, por violação do disposto nos arts. 9º/d), 64º/2, a) e 64º/3 da CRP, quando interpretada no sentido de conferir à Recorrente/RAA a responsabilidade pelo pagamento de cuidados de saúde prestados a cidadãos portugueses no Continente português, ainda que esses cidadãos tenham a sua residência nos Açores.

E) Os nºs 2, 3 e 5 do art. 149º da Lei n" 66-B/2012, de 31 de dezembro (Orçamento do Estado para 2013, quando interpretados no sentido de atribuir às unidades de saúde ou hospitais sedeados no Região Autónoma dos Açores a responsabilidade pelo pagamento das despesas resultantes da prestação de cuidados de saúde nas unidades de saúde ou hospitais sedeados no Continente, directamente afectas ao SNS (stricto scnsu), relativamente a cidadãos inscritos no Serviço Regional dos Açores, são inconstitucionais, por violação dos arts. 6º, 9º/d) e g), 64º/2, a) e 3 da CRP.”.

Pede a manutenção da sentença recorrida e a improcedência do recurso.

* O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto no artº 146º do CPTA, emitiu parecer no sentido da procedência parcial do recurso.

Pugna que o Serviço Regional de Saúde da Região Autónoma dos Açores está integrado no Serviço Nacional de Saúde e não é um subsistema de saúde, mas que tem o Recorrente razão quando defende estar isento de custas, ao abrigo do artº 24º do D.L. nº 34/2008, de 26/02.

* Colhidos os vistos legais foi o processo submetido à conferência para julgamento.

II.

DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos artºs. 660º, n.º 2, 664º, 684º, nºs 3 e 4 e 690º, nº 1, todos do CPC, ex vi artº 140º do CPTA.

As questões suscitadas, resumem-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida enferma de erro de julgamento de direito: 1. Por violação do artº 24º do D.L. nº 34/2008, de 26/02, quanto à condenação da Autora em custas; 2. Por violação do artº 23º do D.L. nº 11/93, de 15/01, incorrecta aplicação da Base II da Lei nº 48/90, de 24/08 e da Base XXXIII, nº 2, al. b) e violação do artº 2º do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde e não consideração da Circular Normativa nº 3 de 2008, da ACSS, ao julgar a acção improcedente.

III.

FUNDAMENTOS DE FACTO O Tribunal a quo deu como assentes os seguintes factos: “1) O autor prestou aos utentes identificados no doc. 1 junto com a p.i. os serviços discriminados nas facturas juntas como docs. 2 a 7 também da p.i. (docs. 1 a 7 juntos com a p.i.); 2) O autor emitiu em nome da Direcção Regional de Saúde dos Açores facturas que ascendem ao montante global de € 5218,39 (docs. 2 a 7 juntos com a p.i.); 3) Os utentes referidos no doc. 1 têm número de beneficiário do Serviço Regional de Saúde da Região Autónoma dos Açores (doc. 1 junto com a p.i.).”.

DO DIREITO Considerada a factualidade dada por assente pelo Tribunal a quo, importa entrar na análise dos fundamentos do presente recurso jurisdicional, segundo a sua ordem lógica de conhecimento.

  1. Por violação do artº 23º do D.L. nº 11/93, de 15/01, incorrecta aplicação da Base II da Lei nº 48/90, de 24/08 e da Base XXXIII, nº 2, al. b) e violação do artº 2º do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde e não consideração da Circular Normativa nº 3 de 2008, da ACSS Nos presentes autos veio a Autora instaurar acção administrativa comum, sob processo sumário, pedindo que fosse a Região Autónoma dos Açores (Direcção Regional de Saúde dos Açores) condenada a pagar ao Autor a quantia de € 5.218,39, acrescida de juros legais, visando obter da Ré o pagamento do valor dos cuidados médicos que prestou a cidadãos residentes na Região Autónoma dos Açores, porque os considera beneficiários apenas do Serviço Regional de Saúde e não do Serviço Nacional de Saúde, em cujo âmbito desenvolve a sua actividade.

    A sentença recorrida julgou a acção improcedente, fundada na interpretação das normas legais que conduzem ao entendimento de que “O Serviço Regional de Saúde não é, pois, um subsistema de saúde, mas antes parte integrante do Sistema Nacional de Saúde, tal como definido na Constituição e na Lei de Bases do Sistema Nacional de Saúde.

    Quer o Serviço Regional de Saúde quer o Serviço Nacional de Saúde (stricto sensu) têm uma natureza geral e universal.

    ”.

    A Autora e ora Recorrente, discordando do decidido, veio interpor o presente recurso jurisdicional, nos termos do qual põe em crise o julgamento de direito da sentença.

    Sustenta que o Serviço Regional de Saúde da Região Autónoma dos Açores é um subsistema com uma estrutura própria, dependente do Governo Regional, não dependendo do Serviço Nacional de Saúde, pelo que as unidades de saúde da Região Autónoma dos Açores não se integram no denominado Serviço Nacional de Saúde, segundo os artºs. 1º e 3º a 6º do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, aprovado pelo D.L. nº 11/93, de 15/01.

    Está, por isso, em causa, uma divergência da Recorrente quanto à interpretação do regime de direito aplicável, no respeitante, no essencial, a saber se o Serviço Regional de Saúde da Região Autónoma dos Açores é um subsistema de saúde, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea b), do nº 1 do artº 23º do D.L. nº 11/93, de 15/01.

    Vejamos.

    O cerne do litígio coloca-se ao nível da interpretação da noção do que constitui o Serviço Nacional de Saúde...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT