Acórdão nº 00555/10.1BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 30 de Abril de 2014

Magistrado ResponsávelPedro Nuno Pinto Vergueiro
Data da Resolução30 de Abril de 2014
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO F...

e A...

, inconformados com a sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro que, julgando improcedente a reclamação apresentada ao abrigo do artigo 276º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), não considerou verificada a prescrição da dívida em cobrança no processo de execução fiscal nº 2526200401001000, interpuseram, para o Supremo Tribunal Administrativo, recurso de tal decisão, tendo rematado as concernentes alegações com as seguintes conclusões: «1. A sentença não justifica, para além dessa referência genérica, quais os elementos em concreto que permitiram dar como provados os factos assentes como tal pela decisão recorrida.

  1. A mera referência genérica a todos os “elementos juntos aos autos”, sem indicação concreta dos específicos suportes documentais que suportam o juízo relativamente a cada facto, não constitui forma adequada e idónea de cumprir o ónus de fundamentação quanto à matéria de facto.

  2. Em sede de fundamentação de facto, o Tribunal tem de indicar e de identificar, relativamente a cada facto, qual o concreto meio de prova que lhe permitiu dar por assente uma determinada factualidade, como resulta do artigo 123.º, n.º 2, do CPPT e do 659º, nºs 2 e 3, do Código de Processo Civil (aplicável ex vi artigo 2.º do CPPT).

  3. Não tendo respeitado essas exigências com o sentido supra consignado, o Tribunal a quo fez aplicação de uma norma inconstitucional, qual seja a do artigo 123.º, n.º 2, do CPPT, interpretado no sentido de que a fundamentação da matéria de facto dada como provada não carece de indicação discriminada dos concretos suportes probatórios, o que viola o disposto no artigo 20.º, na dimensão de direito a um processo justo e equitativo - due process of law, com sentido material análogo ao inferido do artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, na medida em que dele decorre a necessidade de fundamentação das decisões judiciais, não apenas quanto ao direito aplicável, mas também quanto aos factos que o tribunal tem por provados e/ou não provados.

  4. Concomitantemente, constata-se igualmente uma insuficiência ao nível da matéria de facto porquanto o Tribunal não dá como provado nenhum facto apto a demonstrar a efectiva existência e procedência material da causa de suspensão da prescrição que, posteriormente, acabou por revelar.

  5. E, quanto a esse ponto, é manifesto, na posição dos recorrentes, que a matéria incluída no ponto “C” da respectiva “fundamentação” e que apenas se refere à existência de um despacho que determinou a suspensão da execução em virtude da dívida se encontrar garantida por uma penhora, não permite só por si o controlo da verificação dos pressupostos de facto que permitem a aplicação conjugada do regime do artigo 49.º/3, da LGT, com o 169.º do CPPT.

  6. Para isso, o Tribunal não pode deixar de ponderar, concretamente, se estavam, ou não, reunidos os pressupostos de facto que permitiam a suspensão do processo de execução, sendo certo que essa suspensão sempre teria de decorrer da lei e não de um mero despacho da AT, sendo “o que resulta, aliás, da norma constante do n.º 1 do artigo 169.º do CPPT quando estabelece que a execução fica suspensa sem que se associe este efeito à prática de qualquer acto formal pelo órgão da execução fiscal, contrariamente à solução adoptada para a isenção da prestação de garantia, por exemplo, onde se exige decisão expressa (v. artigos 52.º, n.º 4, da LGT e 170.º, n.ºs 1 e 4 e 199.º, n.ºs 3 e 7 do CPPT)” - cf. Ac. STA de 16/11/2011, Processo n.º 977/11.

  7. Nessa óptica, cabia ao Tribunal apurar qual se existia, efectivamente, causa de suspensão da execução e qual o momento a partir da qual a mesma se verificou, o qual não pode referir-se à data do despacho da AT, que não tem natureza constitutiva.

  8. Contudo, o Tribunal nem sequer especifica qual o valor das dívidas exequendas ou o valor dos bens penhorados, sem o que não podia ter decidido, como decidiu, pela existência de uma causa de suspensão da execução que decorre da lei e não de uma mera declaração administrativa que, destarte, não se sindicou, fazendo errada aplicação do referido regime legal.

  9. O Tribunal erra também, salvo melhor opinião, ao aplicar o disposto no artigo 49.º/3 da LGT a um prazo que se encontrava interrompido e que não se encontrava a correr.

  10. O artigo 49º, n.º 3, da LGT, apenas é aplicável aos casos em que esteja a decorrer o prazo de prescrição, não tendo qualquer sentido a sua aplicação perante um prazo que esteja interrompido, até porque a fortiori a interrupção é mais do que a mera suspensão conquanto inutiliza todo o tempo decorrido anteriormente.

  11. Encontrando-se o prazo de prescrição interrompido, logicamente não se lhe poderia cumular uma suspensão por manifesta inexistência de objecto: não pode suspender-se o decurso de um prazo que não está a ser contabilizado.

  12. Dessa impossibilidade material e jurídica, resulta que a contagem do prazo de prescrição apenas se deve ter por afectada em função da causa que determinou a sua interrupção.

  13. Ora, relativamente a esta, a LGT dispunha que se o processo de impugnação (e não o de execução) estivesse parado por mais de um ano por motivo não imputável ao contribuinte, cessa o referido efeito interruptivo. E foi o que sucedeu nos autos.

  14. Anote-se que este critério em nada modifica o juízo feito nos pontos anteriores. Ou seja, a sua existência não abala os princípios com que se devem relevar as causas de interrupção ou suspensão do prazo de prescrição, pois se o mesmo não existisse, como sucede actualmente, sempre se manteria o cômputo do prazo como referido no item 16.

  15. Ora, a paragem do processo de impugnação por mais de um ano por causa não imputável aos recorrentes determina que se releve todo o período posterior à cessação desse efeito interruptivo, o que determinará, in casu, a prescrição das dívidas.

  16. Caso se entenda corresponder ao melhor direito a interpretação efectuada pelo Tribunal recorrido, invocam aqui os recorrentes, ad cautelam, a inconstitucionalidade orgânica do artigo 169.º, n.º 1, do CPPT, por ausência de autorização legislativa para a sua criação, sendo certo que essa norma regula matéria respeitante a garantias dos contribuintes, o que constitui violação do disposto nos artigos 165.º/1/i), 103.º, n.º 2 e 165.º, n.º 2, da CRP.

    Termos em que e nos mais de direito deve o presente recurso ser julgado procedente e, consequentemente, revogada a sentença recorrida, com as legais consequências.».

    Admitido o recurso com subida imediata e nos próprios autos e remetido o processo ao Supremo Tribunal Administrativo, veio neste a ser proferido despacho pela Exma. Relatora declarando competente para a sua apreciação o Tribunal Central Administrativo Norte.

    Recebidos os autos neste Tribunal, veio a Exma. Procuradora Adjunta a emitir parecer no sentido do parcial provimento do recurso louvando-se no anterior parecer emitido pelo Ministério Público junto do Supremo Tribunal Administrativo.

    Com dispensa dos vistos legais, atenta a natureza urgente do processo [artigo 707º, nº 4 do Código de Processo Civil (CPC) e artigo 278º, nº 5 do CPPT], cumpre agora apreciar e decidir, visto que a tal nada obsta.

  17. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelos Recorrentes, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que a matéria em análise prende-se com a questão de saber se a sentença sob recurso é nula por falta de fundamentação da matéria de facto e bem assim se a sentença padece de erro de julgamento de facto, por os factos apurados serem insuficientes para sustentar a decisão proferida e ainda apreciar se a sentença recorrida errou de direito ao não ter considerado prescrita a obrigação tributária correspondente à dívida exequenda exigida no processo de execução nº 2526200401001000 e, consequentemente, ao ter julgado improcedente a reclamação apresentada ao abrigo do artigo 276º do CPPT.

  18. FUNDAMENTOS 3.1.

    DE FACTO Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte: “… A) Contra os Reclamantes foi instaurada execução fiscal com o nº 2526 2004 01001000, no Serviço de Finanças de Castro Daire, com vista à cobrança coerciva de IRS de 1999 e 2000; B) Relativamente às dívidas exequendas, mencionadas em A., os Reclamantes deduziram, em 25.05.2004, impugnação judicial, contra as liquidações que as originaram; C) Em 27.05.2004, foi proferido despacho pelo Órgão de Execução Fiscal a determinar a suspensão da execução fiscal mencionada em A., até à decisão da impugnação mencionada em R., nos termos do art. 169.º do CPPT, em virtude de os bens penhorados garantirem a dívida exequenda e acrescido; D) Por sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu datada de 02.09.2009, foi julgada improcedente a impugnação mencionada em B.; E) Os Executados, aqui reclamantes, solicitaram ao Exm.º Chefe do Serviço de Finanças de Castro Daire, através de requerimento apresentado em 22.11.2010, que reconhecesse a prescrição da dívida exequenda, com a consequente extinção da execução fiscal; F) O Impetrado, através de despacho de 13.12.2010, indeferiu o requerido na al. E., considerando inverificados os pressupostos da prescrição da dívida; G) A reclamação que deu origem aos presentes autos visa o despacho mencionado na al. imediatamente anterior.

    Factos não provados: Não se provaram outros factos com interesse para a decisão.

    Por relevante para a decisão da causa, acorda-se, nos termos e ao abrigo do preceituado no artigo 712° do Código de Processo Civil (actual art. 662º), e após ter sido determinada a audição das partes sobre a matéria em apreço, em aditar ao probatório a seguinte factualidade: H) As dívidas fiscais a que se reporta a alínea A) supra eram, à data de emissão das certidões de dívida, no valor de € 51.980,46 (IRS de 1999) e € 50.107,74 (IRS...

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