Acórdão nº 10952/14 de Tribunal Central Administrativo Sul, 02 de Abril de 2014
Magistrado Responsável | SOFIA DAVID |
Data da Resolução | 02 de Abril de 2014 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Recorrente: Cláudia ………………… Recorrido: Ministério Público Acordam na 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul Vem interposto recurso da sentença do TAC de Lisboa, que julgou procedente a oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa da ora Recorrente.
Em recurso a Recorrente formulou as seguintes conclusões: «
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A sentença recorrida é nula e ilegal, nos termos invocados do preceituado no n.º 1,do artigo 201.º, do CPC, ao violar o disposto no n.º 4 do artigo 91.º do CPTA, por não terem as Partes sido notificadas da decisão sobre a matéria de facto e para apresentação das suas alegações escritas.
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A sentença recorrida violou a Lei e peca por uma errónea interpretação e por um defeituoso julgamento dos factos relativamente aos quais se pronunciou.
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A Lei estabelece uma presunção legal de ligação efectiva à comunidade portuguesa por parte dos cônjuges dos cidadãos portugueses.
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Essa presunção não foi ilidida nem foram alegados, pelo MP, factos susceptíveis de serem considerados como bastantes para ilidir essa presunção.
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Na sentença recorrida fundamenta-se a decisão em “factos” não alegados pelas Partes, em clara violação dos Princípios legais e constitucionais que uma decisão judicial deve respeitar.
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A Recorrente está casada com um cidadão português há mais de três anos e esse casamento mantém-se válido e não foi dissolvido.
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Tudo o mais não passam de meras “presunções” sem qualquer base de sustentação credível que não podem, nem devem, servir de base a uma decisão judicial que se quer justa, equitativa, não discriminatória e moral e conceptualmente isenta.» O Recorrido formulou as seguintes conclusões nas contra alegações que apresentou: «1. Como se adiantou, estamos em presença de um processo especial de oposição à aquisição da nacionalidade que se mostra regulado no art° 56° e segs. do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa (DL237-A/06, de 14 de Dezembro ); 2. Aí se prevê no art° 58° que: Apresentada a petição pelo Ministério Publico, o réu é citado para contestar, não havendo lugar a mais articulados ou alegações escritas pelo que a Mm Juiz não teria que ordenar a notificação para a produção de alegações escritas; 3. Um dos requisitos para que possa ser concedida a nacionalidade portuguesa é a prova da ligação efectiva à comunidade nacional (artigos 9.°, alínea a) da Lei n.º 37/81, de 3 de Outubro); 4. Incumbe ao requerente da aquisição da nacionalidade portuguesa a prova da ligação efectiva à comunidade nacional (artigo 343.°, n.º 1, do Código Civil); 5. A Recorrente não fez prova efectiva de tal ligação à comunidade portuguesa; 6. Assim, bem decidiu o Tribunal a quo, ao julgar procedente a oposição deduzida pelo Ministério Público à aquisição da nacionalidade da Recorrente e ao ordenar o arquivamento do processo conducente ao registo respectivo, pelo que deve ser confirmada; e, finalmente, pelas expostas».
Por despacho de fls. 293 foi sustentada a decisão recorrida.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
Os Factos Na 1º instância foram dados por assentes, por provados, os seguintes factos, que se mantêm: 1. A R. nasceu em 20.06.67, no Rio de Janeiro, Brasil (cfr. fls. 20).
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Contraiu casamento civil, em 04.07.00, no Rio de Janeiro, com o cidadão português Jaime Filipe Talbot, natural de Lisboa e residente, à data do casamento, no Reino Unido (cfr. fls, 19 e 17).
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O casamento foi inscrito no registo civil português no ano de 2009 (cfr. fls. 19).
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A R. e o marido têm um filho, Ignacio ………………, nascido em 1999, no Rio de Janeiro, de nacionalidade portuguesa (cfr. fls. 73 e 74).
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O nascimento do filho foi inscrito no registo civil português no ano de 2011 (cfr. fls. 122).
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No dia 18 de Junho de 2011, na Conservatória do Registo Civil de Lisboa, a R. prestou a declaração para aquisição da nacionalidade portuguesa, nos termos do artigo 3° da Lei n° 37/81, de 3 de Outubro, com base no referido casamento (CfL fls. 13 e 14).
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Com base em tais declarações foi instaurado na Conservatória dos Registos Centrais processo onde se constatou não se verificarem os pressupostos da pretendida aquisição de nacionalidade, razão pela qual o registo em questão não chegou a ser lavrado.
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A Requerida é formada em hotelaria com especialização em alimentos e bebidas (cfr. fls.118 a 121).
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A Requerida trabalhou para a empresa portuguesa "T……..", como estilista, no sector da promoção e da imagem na área de confecções, de Março de 1996 a Fevereiro de 1998 (cfr. fls. 33).
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Inscreveu-se na Direcção-Geral dos Impostos em Portugal em 1996 (cfr. fls. 116).
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Durante o período de 1996 a 1998 residiu em Portugal, altura em que conheceu o marido.
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No ano de 1998 foi residir para o Brasil.
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A R. reside na Rua ………….. 24/408, L……….., Rio de Janeiro, onde foi citada (cfr. fls, 98 e 101).
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Viveu também na Suíça (declaração de fls, 13 e 14).
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A R. desloca-se regularmente a Portugal, ultimamente, cerca de duas a três vezes por ano.
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Em data que não se apurou mas, pelo menos, desde há 3 anos, desloca-se a Portugal sempre sozinha.
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Nas primeiras vezes que se deslocou a Portugal após o casamento fez-se acompanhar do marido.
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Conhece Sintra, Setúbal, Óbidos, Guimarães, Aveiro e o Algarve.
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A R. convive com portugueses que vivem no Brasil.
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Os sogros da R. estão separados.
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A sogra reside em Inglaterra há 30 anos.
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O sogro vive no Brasil há muitos anos, já desde antes do casamento da R.
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O filho da R. e do seu marido estuda num colégio em Oxford, Inglaterra, Reino Unido, em regime de internato.
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A R. não exerce de momento qualquer actividade profissional.
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O marido da R. é arquitecto e sócio da sociedade B……….. C………. Limitada (cfr. fIs. 189 e sgts.).
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O marido da R. tem residência na Rua …….., 636/301, I……….., Rio de Janeiro (cfr. doe. de fIs. 189 e sgts.).
Nos termos dos artigos 662º, n.º1 e 665º, n.ºs 1 e 2, do (novo) CPC, acrescentam-se os seguintes factos por provados: 27. Com data de 22.07.2012 foi passada por Jaime ……………. a declaração de fls. 210 a 211, que aqui se dá por reproduzida.
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Com data de 17.06.2012 foi passada por Rita ……….., a declaração de fls. 210 a 211, que aqui se dá por reproduzida.
O Direito Alega a Recorrente a nulidade decisória porque após a audiência, que teve lugar, o tribunal não notificou as partes para a apresentação de alegações escritas, nos termos do artigo 91º, n.º 4, do CPTA. Diz a Recorrente, que a tramitação prevista no artigo 58º do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa (RN) apenas se aplica à fase dos articulados, determinando que após a contestação não há lugar a mais articulados ou a alegações por escrito. Mas no caso das indicadas alegações, considera a Recorrente que se regulam pelo artigo 91º, n.º 4, do CPTA, por remissão do artigo 60º do RNP, pois ocorreu audiência de julgamento e já não se está naquela fase dos articulados.
Mais diz a Recorrente, que a decisão recorrida foi errada porque à Recorrente não se exige que faça a prova de uma ligação efectiva à comunidade portuguesa, bastando que declare a existência de tal ligação, porquanto a lei presume aquela ligação por força do casamento com um português. Considera a Recorrente, que nos autos não ficou provada pelo MP a inexistência dessa ligação, pelo que errou a decisão sindicada ao assim não entender.
Alega a Recorrente, que a «convicção» do julgador, referida na decisão sindicada, é erradamente usada para ilidir uma presunção legal e que tal «convicção» foi o fundamento para o tribunal entender que a Recorrente estava separada do marido, facto que não foi alegado por nenhuma das partes, que não decorria da prova documental e que foi considerado oficiosamente pelo tribunal a partir do depoimento das testemunhas, sendo um facto novo, que não poderia ser considerado, sob pena de violação do artigo 264º, n.º 2, do CPC.
Considera a Recorrente, ainda, que foi errado o indeferimento da prova documental junta em sede de audiência de julgamento, relativa a depoimentos, que sempre teriam de ser considerados como documentos escritos, como prova documental, que, aliás se mostrou pertinente, face ao sentido decisório e à alegada «convicção» do julgador quanto à separação de facto da Recorrente e do seu marido.
Alega a Recorrente, também, que face à prova documental e testemunhal produzida, foi errada aquela convicção do julgador e que nos autos ficou provada a ligação da Recorrente a Portugal.
Vejamos.
O presente processo não é uma acção administrativa especial, mas uma acção de oposição à aquisição de nacionalidade, regulada em primeira linha nos termos previstos nos artigos 56º a 60º do Decreto-Lei nº 237-A/2006, de 14/12, que aprovou o Regulamento da Nacionalidade Portuguesa (RN).
Nos artigos 58º e 59º deste diploma refere-se expressamente a tramitação a adoptar nesta acção de oposição à nacionalidade. E conforme artigo 60º, apenas no que não estiver regulado naquele decreto lei segue a acção de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa «os termos da acção administrativa especial, prevista no Código do Processo nos Tribunais Administrativos» (cf. ainda o artigo 26º da Lei n.º 2/2006, de 17.4, a Lei da Nacionalidade- LN).
Assim, determinam aqueles artigos 58º e 59º, n.º1, do RN, que «apresentada a petição pelo Ministério Público, o réu é citado para contestar, não havendo lugar a mais articulados ou alegações escritas. (…) Findos os articulados, é o processo, sem mais, submetido a julgamento, excepto se o juiz ou relator determinar a realização de quaisquer diligências».
Quer isto dizer, que a aplicação supletiva prevista no CPTA para a acção administrativa especial, conforme remissão do artigo 60º do RN...
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