Acórdão nº 00332/04.9BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 28 de Fevereiro de 2014

Magistrado ResponsávelCarlos Lu
Data da Resolução28 de Fevereiro de 2014
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO “MASSA INSOLVENTE DE E... - INDÚSTRIA DE PORCELANA, LDA.”, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF de Viseu, datada de 26.09.2012, que, no âmbito dos autos de ação administrativa comum, sob forma ordinária, para efetivação de responsabilidade civil extracontratual por si deduzida contra o “Município de Ovar”, julgou procedente a exceção de prescrição invocada, absolvendo o R. do pedido de indemnização no valor de 5.546.872,00 €, valor esse acrescido de juros de mora à taxa legal desde a citação até efetivo pagamento.

Por decisão inserta a fls. 1200/1201 v. dos autos foram estes remetidos ao STA dada a interposição pela aqui A. de recurso jurisdicional de revista “per saltum” nos termos do art. 151.º do CPTA.

Na sequência de despacho do Exm.º Juiz Conselheiro Relator de fls. 1232 dos autos e pelos fundamentos nele vertidos foi determinado que aquele recurso jurisdicional fosse julgado como de apelação.

Formula a A., aqui recorrente, nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem [cfr. fls. 1005 e segs.

- paginação processo suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário]: “...

1 - A prescrição do direito da autora à indemnização pelos danos que a conduta do réu lhe causou, não se verificou.

2 - Com o devido respeito, não é correto dizer-se que o prazo de prescrição em causa começou a contar no dia 18 de outubro de 2000, data em que transitou o, douto, acórdão do Supremo Tribunal Administrativo que ratificou a, douta, decisão que anulou a deliberação que licenciou o loteamento industrial e que o direito da autora está prescrito.

3 - A citação do réu para o «Recurso de Anulação» interrompeu o prazo de prescrição do direito da autora.

4 - A citação do réu para a posterior ação administrativa comum, que com o n.º 457/97, correu termos pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Coimbra, interrompeu o prazo de prescrição em causa, que, apenas, começou a correr quando a, douta, decisão nele proferida, transitou em julgado.

5 - Para além disso, para efeitos da propositura da presente ação de indemnização, beneficiou a autora do prazo estabelecido no n.º 3 do art. 71.º da LPTA, dado que o Ac. do T.C. n.º 144/2002, que julgou tal norma inconstitucional, com força obrigatória geral, só foi publicado no D.R. de 09/05/2002.

6 - Por outro lado, dispõe a norma do art. 41.º, n.º 1 do CPTA, que, citando, sem prejuízo do disposto na lei substantiva, a ação administrativa comum pode ser proposta a todo tempo.

7 - Por aqui e porque aquela lei não contraria esta norma, ainda, não operou a prescrição.

8 - A conclusão que contém o, douto, despacho/saneador/sentença recorrido, no sentido de que a autora tomou pleno conhecimento dos direitos que lhe assistiam, com o trânsito em julgado do, douto, acórdão do S.T.A. que confirmou a decisão que anulou a deliberação tomada pelo réu, é, com o devido respeito, arrojadamente, subjetiva e de fraca consistência jurídica.

9 - Se é certo que o, douto, Tribunal «a quo» tem o dever e a responsabilidade de definir tal momento, não menos certo é de considerar que tal definição nem sempre é correta.

10 - O momento da convicção da autora, tanto poderá o, douto, Tribunal recorrido encontrá-lo a jusante como a montante da data em que transitou em julgado o, douto, acórdão do S.T.A..

11 - Mas esse momento tem, a nosso ver e com o devido respeito, que ser encontrado após o dia 18 de outubro de 2000.

12 - Esta convicção resulta de dois factores: a) O facto da autora não ter formulado o pedido que formulou na presente ação, naquela ação n.º 457/97, que a precedeu; e, b) O facto da autora, ter pedido o parecer, à identificada auditora, apenas, em dezembro de 2003.

13 - Só nesta data ou a partir desta data, é que a autora se convenceu do seu direito e ficou em posição de o exercer.

14 - Aliás, o próprio princípio da economia processual aconselhava que todos os pedidos fossem formulados naquela ação n.º 457/97.

15 - Se a autora os não formulou, é porque, ainda, não estava convencida que os poderia formular.

16 - Este facto foi, rigorosamente, ponderado pela autora, que usou, assim, da presente ação.

17 - Ainda quanto ao momento em que a autora teria, empiricamente, a convicção de que lhe assistia o direito indemnizatório plasmado na presente ação, sempre será razoável e de raciocínio lógico, a existência de uma dúvida que não habilita o, douto, Tribunal «a quo» a decidir como decidiu.

18 - E, assim, sendo, se não for mais, sempre deveria decidir contra o réu, que é a quem a declaração de prescrição aproveita.

19 - Com o devido respeito pela interpretação, quiçá, ousada que aqui faz a autora, pese embora tenha presente a norma dos n.ºs 1 e 2 do art. 11.º do C. Penal, à autora deverá ser reconhecido o direito de beneficiar do prazo dos 5 ou 8 anos, contidos no art. 218.º, n.º 1 e n.º 2 do C. Penal.

20 - Na verdade, o réu, com intenção, e só, de retirar, para si benefício ilegítimo, pelo menos, assim, sem ofensa, pensamos, que não poderia desconhecer, do seu lamentável procedimento, enganou a autora, fazendo-a acreditar na legalidade do mesmo, investindo da forma como investiu e acreditando da forma como acreditou, que a poderia levar à falência.

21 - Este engano, como está demonstrado, até pela sua, atual, insolvência, causou à autora elevadíssimos prejuízos patrimoniais, os quais jamais teriam ocorrido se o réu agisse com a legalidade ou licitude que lhe era, e é, exigida.

22 - Este procedimento do réu, configura a prática de crimes, que, embora, por eles não seja punido, também, não lhe não é legítimo aproveitar, como aproveita.

23 - De todo em todo, sempre seria razoável e prudente esperar, em caso de dúvida, pelo conhecimento da prescrição em audiência de julgamento.

23 - Assim, mal foi, com o devido respeito, o, douto, Tribunal «a quo» ao decidir, como decidiu, pela prescrição do direito da autora a ser indemnizada pelos prejuízos que o réu lhe causou.

- Sempre com a devida reserva, somos de entender que o, douto, despacho/saneador/sentença violou, entre outras, as normas dos arts. 323.º, n.ºs 1 e 4, 325.º, n.º 2, 327.º, n.º 1, 498.º, n.º 1 do C. Civil; art. 659.º, n.ºs 2 e 4 do C.P. Civil; art. 41.º, n.º 1 do CPTA e art. 218.º, n.ºs 1 e 2 do C. Penal …”.

Termina no sentido do provimento do recurso e revogação da decisão judicial recorrida.

O R., ora recorrido, notificado apresentou contra-alegações [cfr. fls. 1074 e segs.

], tendo concluído que: “… 1. A Autora teve conhecimento dos factos que estão na origem dos alegados direitos de indemnização, pelo menos, desde 1995.

  1. Contudo, pode aproveitar da interrupção da prescrição derivada da citação referente ao recurso contencioso de anulação da deliberação da Câmara Municipal de Ovar de 1981 (… Processo n.º 221/96), nos termos da jurisprudência dominante nos tribunais administrativos, pelo que o prazo só começa a correr em 18/10/2000.

  2. Doutro passo, a citação realizada no âmbito do Proc. n.º 457/97 não interrompe o prazo de prescrição dos direitos alegados no processo sub judicio, pois naquela ação a Autora queria fazer valer direitos distintos dos que pretende fazer valer no processo em análise, uma vez que, e citamos o Supremo Tribunal Administrativo - «quando o artigo 498.º, n.º 1, do Código Civil nos diz que o direito à indemnização prescreve no prazo de 3 anos, está a referir-se a um concreto direito à indemnização» (...) «havendo uma pluralidade de pedidos, temos que averiguar se existe um ou vários direitos de indemnização em causa, e, relativamente a cada um deles, se ocorreu ou não a respetiva prescrição», donde, no caso concreto, relativamente aos direitos agora invocados, já se operou a prescrição, como bem decidiu a douta sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu.

  3. Com efeito, cada direito de crédito tem uma vida autónoma, nascendo e extinguindo-se em momentos próprios, pelo que a citação no processo de responsabilidade civil fundado nos danos alegados em 1997, não pode aproveitar à Autora, para intentar uma outra ação com base em danos distintos, de forma extemporânea. Tal configuraria, parece-nos, uma fraude processual, uma vez que tal interpretação conduziria a ignorar, de uma só vez, institutos do pedido genérico, da ampliação da matéria de facto, da utilização de articulados supervenientes e, no Direito Civil, da prescrição, colocando em causa o valor da paz e segurança jurídicas.

    Assim, 5. Porque o Proc. n.º 457/97 não interrompeu o prazo de prescrição relativamente aos direitos de indemnização do processo sub judice; 6. Uma vez que já decorreram mais de 3 anos, relativamente à data da propositura desta ação (cuja petição inicial data de 11/3/2004, sendo que a citação se presume feita nos cinco dias posteriores [artigo 323.º, n.º 1 do Código Civil]), sobre o trânsito em julgado da decisão que declarou nulo o licenciamento da unidade industrial em causa da autora, no Acórdão do STA, de 18/10/2000; 7. Porque a declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória e geral, tem efeito ex tunc, donde o prazo de 6 meses previstos no já revogado artigo 71.º, n.º 2, da antiga LPTA, nunca produziu qualquer efeito; 8. bem como porque - para além da, no texto, alegada ineptidão das alegações relativas ao art. 41.º n.º 3 do CPTA e, de qualquer forma, sua irrelevância para o que se discute - a declaração de inconstitucionalidade sempre seria na situação vertente espúria, não podendo pois o prazo de prescrição iniciar-se jamais na data da publicação do acórdão do Tribunal Constitucional assim erigido, sem qualquer fundamento, em momento a partir do qual se conhece o direito 9. e, finalmente, porque o «conhecimento do direito», para efeitos do n.º 1, do artigo 498.º do Código Civil, se baseia, não em critérios subjetivos e arbitrários da «convicção do lesado», mas antes...

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