Acórdão nº 01035/05.2BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 06 de Dezembro de 2013

Magistrado ResponsávelAntero Pires Salvador
Data da Resolução06 de Dezembro de 2013
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo: I RELATÓRIO 1.

O MUNICÍPIO de MORTÁGUA e a FREGUESIA de ESPINHO, inconformados, vieram interpor o presente recurso jurisdicional da sentença do TAF de Viseu, datada de 31 de Julho de 2012, que julgou improcedente a acção administrativa comum, sob forma ordinária, interposta pelos recorrentes, assim absolvendo do pedido os RR:/Recorridos APMA...

e marido JPPV..., identif. nos autos, onde aqueles peticionavam que os RR fossem condenados a:

  1. Reconhecerem que a totalidade do caminho, denominado “Travessa do C..." e situado no centro do lugar de S..., freguesia de Espinho, faz parte integrante do domínio público, constituindo um arruamento da povoação de S..., estando, por isso, sob a administração dos AA./recorrentes; b) Restituírem a totalidade daquele caminho ao referido domínio público, sem qualquer obstáculo que impeça a sua normal utilização; e, c) Cancelar quaisquer registos efectuados pelos réus relativamente àquele espaço público.

* 2.

Os recorrentes formularam, no final das suas alegações, as seguintes conclusões: "I) A resposta dada ao quesito 8º não corresponde à prova produzida nem à constante dos autos, pois dos depoimentos prestados pelas testemunhas MGSMV..., CSC... e SP..., cujos depoimentos se encontram gravados em suporte digital, conforme é referenciado na acta, resulta que a resposta a esse quesito não está conforme à prova produzida.

II) Resulta dos depoimentos produzidos em audiência de discussão e julgamento que o carreiro era utilizado desde tempos que as pessoas vivas já não recordam.

III) A resposta correcta ao quesito 8º deverá ser: “provado que por ele passam todas as pessoas desde há cerca de 100 anos”, no sentido de que as pessoas não recordam a data em que teve início a posse, por ser muito antiga.

IV) A testemunha MGSMV... referiu que a sua mãe dizia que aquele caminho teria mais de 200 anos.

  1. A testemunha SP... com a idade de 79 anos sempre utilizou o caminho pois vivia junto do mesmo.

    VI) A mãe da testemunha CC... que faleceu com 95 anos também não recordava a data do início do caminho.

    VII) O caminho existe desde tempo que já ninguém recorda, isto é, desde tempos imemoriais.

    VIII) Resulta da douta sentença “serão dois os requisitos caracterizadores da dominialidade publica de um caminho: a) o uso directo e imediato do mesmo pelo publico; b) e a imemorialidade desse uso. Ora estes requisitos da dominialidade publica são cumulativos e a sua prova compete a quem alega tal dominialidade ou dela pretende beneficiar.” ...

    “Ora não há duvidas, face aos factos provados, que os autores lograram provar que pelo referido caminho ou carreiro em causa sempre passaram ou transitaram as pessoas a pé ...o que fizeram ou faziam de forma indiscriminada.

    IX) A douta sentença concluiu que os recorrentes, lograram provar o requisito de uso directo e imediato do carreiro pelo público em geral, ou quem quisesse ali passar ou circular.

  2. O segundo requisito, respeitante à imemoralidade desse uso também foi provado.

    XI) Encontrando-se provados os dois requisitos da dominialidade pública, deveria ter a douta sentença recorrida concluído pelo reconhecimento do caminho como sendo um bem público.

    XII) O caminho, constitui um arruamento da povoação de S..., sendo utilizado pela generalidade das pessoas, do mesmo modo que os restantes arruamentos que constituem o núcleo central da aldeia de S....

    XIII) Os arruamentos da povoação encontram-se ligados entre si, constituindo o núcleo urbano e central dessa aldeia.

    XIV) Esses arruamentos, dada a sua localização no centro da zona urbana, não poderão ser qualificados como meros atravessadouros, pelo simples facto de encurtarem um determinado trajecto.

    XV) Mesmo que se entendesse que o caminho em questão era um atravessadouro, o que só por hipótese académica se admite, resultou provado (resposta ao quesito 24º), que o mesmo se dirige aos fontanários públicos da povoação de S....

    XVI) Apesar da qualidade da água e de existirem poucos utilizadores, trata-se de um equipamento colectivo, de uso potencialmente público, pela generalidade da população.

    XVII) Aqueles fontanários públicos constituem o único local onde existe distribuição pública e gratuita de água aos habitantes da localidade, pelo que têm utilidade para a população.

    XVIII) A douta sentença recorrida ao julgar a acção não provada e improcedente violou o disposto no artigo 84º da Constituição da Republica e artigo 1384º do Código Civil.".

    * 4.

    Notificadas as alegações, vieram os recorridos apresentar contra alegações, que assim concluíram: "

  3. Ao contrário do que os Recorrentes alegam no seu douto recurso, quer a douta decisão que versou sobre a matéria de facto, quer a douta decisão de mérito, não apresentam qualquer vício que determine a sua alteração, sendo que não houve violação de qualquer norma legal e muito menos as indicadas pelos Recorrentes; daí que deverão improceder as doutas conclusões de recurso I) a XVIII).

  4. Com efeito, o Tribunal a quo, no julgamento que fez da matéria de facto e mais concretamente no que concerne à resposta dada ao quesito 8º, teve em conta toda a globalidade da prova produzida nos autos (testemunhal, documental, pericial e com inspeção ao local) e as respostas positivas encontram correspondência nestes meios de prova e as respostas negativas na ausência de prova ou na contraprova que foi feita; dando aqui e agora, por com ela concordar, a douta fundamentação constantes da resposta aos quesitos.

  5. As testemunhas que os Recorrentes indicam e que, segundo eles, o depoimento não foi correctamente valorado, o Tribunal a quo, na fundamentação da resposta aos quesitos, teceu sobre as mesmas comentários referindo que as mesmas não foram isentas nem coerentes nas respostas que deram, pelo que nesta parte os Recorridos dão por integralmente reproduzida toda a douta fundamentação da resposta aos quesitos – cfr. páginas 18 e 19 da resposta aos quesitos.

  6. Na verdade, o Tribunal a quo concluiu que todos os depoimentos das testemunhas apresentadas pelos aqui Recorrentes foi um testemunho parcial e no sentido de favorecer a posição dessas partes e, não tanto de conhecimento directo dos factos; não tendo nenhuma das testemunhas indicadas pelos Recorrentes no seu douto recurso confirmado o que no quesito que impugnam se perguntava, para além de que a prova oferecida pelos Recorridos demonstrou realidade diversa da questionada no quesito 8º da douta base instrutória.

  7. Tanto mais que uma das testemunhas oferecidas pelos Recorrentes – a única, segundo o Tribunal a quo, testemunha dos Autores que mereceu credibilidade, JMSM... – afirmou que o “caminho / carreiro” em discussão nos autos foi feito / aberto pelo seu pai e avô da Recorrida mulher e que também foi confirmado por outra testemunha idosa.

  8. Sendo que os trechos dos depoimentos que os Recorrentes transcrevem em nada põem em causa a douta decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal a quo, até porque da globalidade da prova existentes nos autos não se provou o facto que aqueles por meio do presente recurso impugnam.

  9. O Tribunal a quo enunciou, de forma pormenorizada, os meios probatórios que relevaram, e em que termos, para a formação da sua convicção, explicitando de modo claro e inequívoco o exame crítico e a relevância de cada um dos meios de prova.

  10. Pelo que não houve qualquer erro de julgamento quanto à matéria de facto dada, quer como provada, quer como não provada, sendo que no caso do facto concreto impugnado pelos Recorrentes nenhuma prova, credível, foi feita de que o trato de terreno objecto dos presentes autos era utilizado desde tempos que as pessoas vivas já não se recordam.

  11. Por outro lado, acresce que resultou provado parte da matéria constante do quesito 9º da douta base instrutória, designadamente e no que aqui tem interesse, que os antepossuidores do prédio que hoje pertence aos Recorridos apenas toleraram que as pessoas transitassem pelo carreiro e que o mesmo só foi aberto há cerca de 50 anos e, como tal, nunca poderia ter sido aberto ou utilizado desde tempos em que os vivos já não se recordam; facto, esse, que dada a não impugnação por parte dos Recorrentes encontra-se assente.

  12. No que concerne à douta decisão de mérito da acção, atendendo a que a fundamentação jurídica da decisão recorrida está em perfeita consonância com o quadro legal aplicável ao caso sub judice e tendo sido feita, quer uma correcta aplicação das normas ao caso, quer uma correcta interpretação das mesmas, pelo que, por se concordar com a douta sentença recorrida, dá-se aqui e agora para os devidos e legais efeitos por integralmente reproduzidos todos os fundamentos expendidos pelo Meritíssimo Juiz a quo.

  13. Na verdade, ao contrário do que pelos Recorrentes é alegado, não se encontram preenchidos os requisitos de que depende a caracterização de determinado trato de terreno como sendo um caminho público, de acordo com a jurisprudência recente e conforme é referido de forma pormenorizada na douta sentença recorrida; donde terão que improceder as doutas conclusões de recurso apresentadas pelos Recorrentes.

  14. Como se depreende da matéria de facto considerada provada na douta sentença recorrida, quer para aceder aos fontanários, quer para aceder ao Largo do C..., há outros caminhos, esses sim públicos, que a população utiliza, não assistindo razão aos Recorrentes no que alegam nas conclusões XV), XVI) e XVII) – cfr. pontos 17, 18, 22, 29 e 32 dos factos provados considerados na douta sentença recorrida.

  15. Por outro lado, também ficou demonstrado que quem abriu e quem sempre cuidou do atravessadouro foram os Recorridos e os antepossuidores do seu prédio, nunca tendo os Réus procedido à limpeza e conservação do mesmo.

  16. Pelo que existindo outros caminhos para se dirigirem aos fontanários já sem qualquer utilização e ao Largo do C..., as pessoas apenas faziam uso do...

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