Acórdão nº 10487/13 de Tribunal Central Administrativo Sul, 21 de Novembro de 2013

Magistrado ResponsávelCRISTINA DOS SANTOS
Data da Resolução21 de Novembro de 2013
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

... , com os sinais nos autos, inconformada com a sentença proferda pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra dela vem recorrer, concluindo como segue: 1. Sem que pela Ré tivesse sido feita tal prova que lhe competia e sem que tivesse tomado posição expressa sobre todos os requerimentos dirigidos à produção da prova que a Autora apresentou na p.i., o Tribunal a quo decidiu conhecer no saneador da ''pretensão da Autora"', alegando que o processo fornecia os elementos necessários", no que além de erro nos pressupostos de facto e de direito - violando as disposições processuais que expressamente invoca em seu sustento no texto transcrito no artigo 9° supra -, tal decisão, nesta parte, consubstancia ainda nulidade.

2. Porquanto, o Tribunal a quo: a) Não deu como provado o incontestado facto de "a Ré não ter notificado a A. do acto determinativo de tal ablação remuneratória", invocado no artigo 9° da pi. E, consequentemente, b) Não deu como provado o incontestado facto de "a A. desconhecer os motivos de tal corte na sua retribuição anual", invocado no artigo 11° da p.i. c) Não deu como provado - nem quesitou - o facto de os colegas da A. que exercem funções na R. em regime de contrato individual de trabalho constituírem a maioria dos trabalhadores da ... - art.° 23° da pi.; d) Não deu como provado o incontestado facto de "a A. desconhecer se a Ré fez ou não a entrega ao Estado Português das quantias descontadas aos trabalhadores do referido quadro residual, entre as quais a relativa ao subsídio de férias de 2012 da A. " invocado no artigo 24° da p.i. Mas e) Como o processo não chegou à fase devida e, por isso, não foi elaborada base instrutória, também nem sequer foi quesitado o destino dessas quantias, ou seja, se foram entregues nos cofres do Estado" e, em caso negativo, qual o destino dado a esse dinheiro", como era invocado no referido artigo 24° da p.i. E, f) Mais uma vez, porque o processo não chegou à fase devida e nem o Tribunal a quo notificou a Ré para fazer a prova das superveniências, como lhe era imposto pelos n.°s 3 e 4 do art.° 8° do CPTA - não se pronunciando sequer sobre os requerimentos da A. dirigidos à produção de prova -, e não levando em conta o declarado no artigo 10° da contestação, também não fixou como facto provado que, na pendência, a Ré fez idêntica ablação remuneratória no subsídio de Natal da A. Pelo que, 3. O saneador-sentença, em matéria de prova, sofre dos seguintes vícios: 1. Não ter dado como provados os factos que vão referidos nas alíneas a) a d) da conclusão antecedente, visto que não impugnados pela Ré, o que revela erro de julgamento da matéria de facto tal como previsto nos n.°s 1 e 2 do art.° 685° do CPC. 2. Ao não ter dado a oportunidade à A. de fazer a prova requerida na p.i., por confissão do legal representante do Réu, por documentos em poder da parte contrária e por cumprimento do dever desta de dar conhecimento ao Tribunal, ao longo do processo, das superveniências resultantes da sua actuação relacionadas com o processo (n.°s 3 e 4 do art,° 8° do CPTA), a A. ficou impedida de fazer a prova de factos por si alegados referidos nas alíneas c), e) e f) da conclusão anterior, essenciais para a boa decisão da causa, no que se mostra violado o princípio constitucional do processo equitativo ou do devido processo legal (n.° 4 do artº 20° da CRP) e implica nulidade do saneador-sentença recorrido nos termos do n.° 1 do art.° 201° do CPC; Acresce que, 3. Como claramente resulta da conclusão antecedente, a falta de elaboração da base instrutória, por supressão ilícita da respectiva fase processual, decidida no saneador-sentença recorrido, além do manifesto erro de julgamento que encerra, impediu o Tribunal de saber o destino das verbas retiradas dos subsídios de férias e de Natal da A. e esta de provar que, à data da propositura da acção as mesmas não tinham dado entrada nos cofres do Estado e bem assim, caso tivessem entretanto ingressado no erário público, apresentar pedido de intervenção do Estado na acção ao lado da Ré, a título de intervenção principal provocada, nos termos dos art.°s 325° ss do CPC, no que se impediu que contra ele dirigisse o pedido de indemnização enquanto beneficiário do sacrifício que foi imposto à A., no que o saneador-sentença é também nulo por força do disposto no n.° 1 do art.° 201° do CPC. Por outro lado, 4. Importa salientar que a questão de saber se as verbas em causa foram entregues nos cofres do Estado ou se a Ré as fez suas é essencial no plano substancial pois, por aí, se ficaria a saber se ocorre ou não desvio de fins e, consequentemente, desvio de poder.

5. Em suma, face ao que antecede, o Tribunal a quo ao proferir saneador-sentença nas circunstâncias antes descritas, objectivamente denegou justiça à Autora, no que violou o princípio da justiça e da tutela jurisdicional efectiva, consagrado no art.° 20° da Constituição da República Portuguesa. Na verdade, 6. A norma ou, melhor dizendo, o bloco normativo processual invocado no douto saneador-sentença como fundamento para a sua tão prematura prolação - interpretação combinada dos artigos 508°, n° l e 510°, n° l do Código de Processo Civil ex vi arts 35°, n° l e 42°, n° l do Código do Processo nos Tribunais Administrativos - em tal leitura, resulta materialmente inconstitucional por ofensa aos supra referidos princípios da justiça e da tutela jurisdicional efectiva bem como da equitatividade e do devido processo legal (due process of law), este ínsito no direito de acesso aos tribunais no seu inquestionável papel de garantidor os direitos fundamentais, tal como afirmado pelo Tribunal Constitucional nos seus Acórdãos n° 960/96, Proc. n° 197/95, no Diário da República, 2.a série, n.° 293, de 19.12.96 e n.° 434/2011, processo n.° 283/10, publicado no Diário da República, 2.a série, n.° 211, de 3/11/ 2011).Assim: 7. O Tribunal a quo ao pôr fim ao processo de forma prematura, proferindo saneador-sentença com base numa decisão tabelar - meramente formal e por remissão para disposições processuais, desprovida de conteúdo concreto e da necessária fundamentação -, sem ter indagado e sem se ter pronunciado directa e inequivocamente sobre se a Ré havia cumprido com os deveres que lhe eram impostos nos n.°s 3 e 4 do art.° 8° do CPTA, sem se ter pronunciado directa e inequivocamente sobre os requerimentos que na p.i. foram apresentados dirigidos à produção de prova, sem se ter pronunciado quanto à existência ou inexistência de factos controvertidos, sem ter dado oportunidade a que as partes se pronunciassem sobre a implícita decisão de não proceder à elaboração da base instrutória e de não abrir período destinado à produção da prova, proferiu uma decisão ilegal porquanto, além de infundamentada como se viu, não tem base material que a sustente, pelo que a norma da ai. b) do n.° 1 do art.° 510° do CPC, na interpretação que foi feita no saneador-sentença recorrido quanto aos poderes que são conferidos ao Mmo. Juiz em sede de despacho saneador, briga directamente com o disposto no art.° 20° da CRP e, assim, revela-se materialmente inconstitucional pois, pelas sobreditas razões, viola os já citados princípios na densificação que deles faz o Tribunal Constitucional tal como supra transcrito que, com a devida vénia, aqui se aproveita. Para além do que antecede, 8. O douto saneador-sentença peca ainda por errada interpretação e aplicação do Direito na questão de fundo do vertente caso, o que implica novo erro de julgamento. Porque, 9. Em síntese, o Tribunal a quo: a) depois de considerar e registar - e bem - que "o art 19° da Lei do Orçamento de Estado para 2011" se aplica a "um universo de pessoas pagas por dinheiros públicos, identificadas no n" 9", e que "A medida em causa" destinava-se a reduzir os gastos públicos e a equilibrar as finanças públicas", b) de transcrever os n.°s 1 e 2 do art.° 21° da LOE 2012, que dizem, no que aqui interessa, "como medida excecional de estabilidade orçamental é suspenso o pagamento de subsídios de férias e de Natal (...), às pessoas a que se refere o n.° 9 do artigo 19.° da Lei n.°55-A/2010" e "Aspessoas a que se refere o n. °9 do artigo 19.°da Lei n.°55-A/2010, de 31 de dezembro (...) cuja remuneração base mensal seja igual ou superior a (euro) 600 e não exceda o valor de (euro) 1100, ficam sujeitas a uma redução nos subsídios ou prestações previstos no número anterior, auferindo o montante calculado nos seguintes termos: subsídios/prestações = 1320 -1,2 x remuneração base mensal c) de consignar que "A Santa Casa da Misericórdia de Lisboa é (...), uma pessoa coletiva de direito privado e utilidade pública administrativa" d) contraditoriamente, concluiu que, "atenta a natureza do vínculo contratual da Autora e demais colegas integrados no quadro residual do pessoal da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, aplica-se o disposto no art 21º da LOE 2012 e artº l9°,n°9,al p) da LOE 2011." O que, 10. Só por si revela o erro de raciocínio em que lavra o saneador-sentença recorrido: se a medida em causa (suspensão do pagamento dos subsídios de férias e de Natal) é excepcional e só se aplica ao universo de pessoas pagas por dinheiros públicos, destinando-se a reduzir os gastos públicos e equilibrar as finanças públicas, se a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa é uma pessoa colectiva de direito privado - como de facto é -, se as remunerações da Autora são exclusivo encargo da SCML e, por consequência, não é paga por dinheiros públicos e muito menos os seus vencimentos oneram as finanças públicas, então a circunstância de o vínculo da Autora ser de natureza pública nada tem a ver com a aplicabilidade ao seu caso do disposto no "art 21° da LOE 2012 e art 19°, n° 9, al p) da LOE 2011", invocada no aresto recorrido. Na verdade, 11. Em momento algum do aresto recorrido se encara e muito menos demonstra que as remunerações da Autora sejam pagas por verbas públicas ou, sequer, que Santa Casa da Misericórdia de Lisboa onere, seja de que modo for, as...

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