Acórdão nº 08226/11 de Tribunal Central Administrativo Sul, 21 de Novembro de 2013

Magistrado ResponsávelANA CELESTE CARVALHO
Data da Resolução21 de Novembro de 2013
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I.

RELATÓRIO Infarmed – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, IP, devidamente identificado nos autos, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, datada de 21/04/2011 que, no âmbito da acção administrativa especial instaurada por ... AG contra o ora Recorrente e a Contra-interessada, ...

, julgou a acção procedente, anulando os actos de Autorização de Introdução no Mercado (AIM) dos medicamentos genéricos identificados, intimou o Infarmed a não autorizar a transferência das AIM concedidas à ... , verificada que seja a vigência da patente invocada e do certificado complementar correspondente e ainda a intimação da DGAE/MEI a abster-se de emitir os PVP requeridos ou a requerer pela Contra-interessada, verificada que seja a vigência da patente invocada e do certificado complementar correspondente.

Formula o aqui Recorrente nas respectivas alegações (cfr. fls. 1252 e segs. – paginação referente ao processo em suporte físico, tal como as referências posteriores), as seguintes conclusões que se reproduzem: “1. Nos termos do artigo 40º/3 do ETAF, “nas acções administrativas especiais de valor superior à alçada, o tribunal funciona em formação de três juízes, à qual compete o julgamento da matéria de facto e de direito”.

  1. A presente acção administrativa especial tem o valor de € 30.000,01 (trinta mil euros e um cêntimo) por aplicação do artigo 34º/1 e 2 do CPTA, sendo que por aplicação dos artigos 6º/2 do ETAF e 31º/1 da Nova LOFTJ a alçada do TAC Lisboa é de € 5.000,00 (cinco mil euros).

  2. Nestes termos, a decisão do TAC Lisboa deveria ter resultado da formação de um colectivo de três juízes e não apenas um juiz singular como aconteceu, devendo por isso ter sido proferido um acórdão e não uma sentença.

  3. Assim, a douta Sentença Recorrida deve ser julgada inexistente por violação grosseira das regras da competência quanto à estrutura do tribunal, devendo ser proferida nova decisão do TAC Lisboa, sem desrespeito pela regra da formação deste Tribunal para o caso em concreto.

  4. Não resultava do Antigo Estatuto do Medicamento, como não resulta do Novo Estatuto do Medicamento, qualquer obrigação de verificar, no âmbito da concessão de AIM, a caducidade dos direitos de propriedade industrial relativos às respectivas substâncias activas ou processo de fabrico.

  5. Isto porque, não se pode confundir o procedimento de concessão de autorização de introdução de mercado com a fase de comercialização do medicamento.

  6. Na verdade, tratam-se de realidades manifestamente diferentes e que não podem ser confundidas, nomeadamente quanto aos seus efeitos legais e consequente possibilidade de reacção por quem se considere prejudicado por eles.

  7. De acordo com o Novo Estatuto do Medicamento, e demais legislação complementar, os únicos aspectos que têm de ser apreciados no procedimento tendente à concessão de uma autorização de introdução no mercado são a qualidade, a segurança e a eficácia do medicamento.

  8. Ou seja, a concessão de uma AIM pelo Recorrente constitui um acto administrativo predominantemente vinculado, pelo que, em princípio, uma vez preenchidos os respectivos requisitos, a concessão da AIM não pode ser recusada.

  9. Pelo que, será, pois, de concluir que não competia ao INFARMED, na sequência do procedimento de autorização de introdução no mercado, aferir da caducidade dos direitos de propriedade industrial, como também não constitui um pressuposto de avaliação a ponderar no procedimento de concessão de AIM.

  10. Ora, conforme referiu o douto Tribunal a quo, ao INFARMED “nos termos da lei compete-lhe inegavelmente aferir dos pressupostos de facto e de direito para a AIM do medicamento genérico requerida pela Contra-interessada”, pelo que, uma vez que no procedimento de autorização de introdução no mercado não cabe ao INFARMED verificar direitos de propriedade industrial, não se verifica nenhum, deficit de instrução no caso em concreto.

  11. A Recorrida não se subsume ao conceito de interessada previsto no art. 100º do CPA, porquanto, i) os actos de AIM não afectam a sua esfera jurídica (o que eventualmente apenas poderá acontecer com a comercialização dos medicamentos da Contra-interessada), assim como, ii) no Novo estatuto do Medicamento está previsto que no procedimento de concessão de AIM apenas intervém o requerente e o INFARMED.

  12. Assim, uma vez demonstrado que não cabe ao INFARMED, no procedimento de autorização de introdução no mercado, a verificação de direitos de propriedade industrial, assim como, que a Recorrida não se subsume ao conceito de interessada previsto no artigo 100º do CPA, improcede em absoluto a douta Sentença Recorrida que decretou procedente a presente acção administrativa especial.”.

    Pede a revogação da sentença recorrida.

    * A Recorrida contra-alegou, sem, contudo, formular conclusões (cfr. fls. 1291 e segs.).

    Conclui pedindo que seja negado provimento ao recurso e mantida a decisão recorrida.

    * Foi proferido despacho de sustentação, no qual se refere, em súmula, que no que concerne “à suscitada inexistência da Sentença, por a mesma ter sido subscrita por um único Juiz, refira-se que a questão foi objecto de pronúncia expressa na Sentença, a fls. 1228 Procº físico, na qual se refere: “Nos termos do nº 1 do art. 92º e nº 1 alínea i) do artº 27º, ambos do CPTA, dispensa-se a vista aos juízes-adjuntos, proferindo-se, consequentemente decisão, por se entender que a questão a decidir se não mostra complexa.

    ” (…)”.

    * O Ministério Público junto deste Tribunal notificado nos termos e para efeitos do disposto no artº 146.º do CPTA, emitiu parecer no sentido da procedência do recurso, julgando verificada a incompetência do juiz singular, mas que, quando assim não se entenda, defende que o Infarmed não tinha de proceder à indagação sobre a existência de eventuais patentes ou outros direitos privados (cfr. fls. 1370-1377).

    * A Recorrida pronunciou-se sobre o parecer do Ministério Público no sentido de não lhe assistir razão.

    * O Infarmed veio a juízo alegar que, em sequência da Lei nº 62/2011, de 12/12, não devem existir dúvidas sobre a interpretação a expender e que essa lei deve ser considerada na decisão a proferir (cfr. fls. 1421 e segs.).

    * Em sequência, veio a Recorrida pronunciar-se sobre o alegado no Infarmed, nos termos constantes do requerimento de fls. 1432 e segs, reiterando que deve ser negado provimento ao recurso.

    * Colhidos os vistos legais foi o processo submetido à conferência para julgamento.

    II.

    DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos arts. 660º, n.º 2, 664º, 684º, nºs 3 e 4 e 690º, n.º 1, todos do CPC, ex vi artº 140º do CPTA.

    As questões suscitadas resumem-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida enferma de: 1. Inexistência, por violação das regras de competência, em violação do artº 40º, nº 3 do ETAF; 2. Erro de julgamento, por não caber ao Infarmed verificar direitos de propriedade industrial, não existindo défice de instrução, nem se subsumir ao conceito de interessada.

    III.

    FUNDAMENTOS DE FACTO O Tribunal a quo deu como assentes os seguintes factos: “

    1. A Autora, sociedade constituída de acordo com as leis da Suíça, é uma empresa do grupo empresarial ... , cuja actividade consiste no comércio e indústria de produtos farmacêuticos e que se tem dedicado na investigação e desenvolvimento de produtos farmacêuticos.

    2. Em 18.02.1991, a ... , empresa a que sucedeu a ora Autora, apresentou, no INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial), um requerimento, onde afirmava desejar proteger em Portugal o seu invento de “Processo para a Preparação de Compostos Bifenilo” caracterizado pelas 146ª reivindicações aí referidas, e requereu a respectiva patente de invenção (documento nº 1 junto com a petição inicial); c) Nesse requerimento, a requerente declarou ter sido depositado o primeiro pedido da referida patente na Suíça, em 19.02.1990 e 5.07.1990, sob o nº 518/90-2 e 2234/90-9 (cfr. documento nº 1 junto com a petição inicial); d) Com esse requerimento, a Autora apresentou um “Resumo” do “Processo para a Preparação de Compostos Bifenilo” (cfr. documento nº 1 junto com a petição inicial); e) Em 18.02.1991 a ... apresentou também a Memória Descritiva do pedido de patente de invenção “Processo para a Preparação de Compostos Bifenilo” caracterizado pelas 146ª reinvidicações aí referidas (cfr. documento nº 1 junto com a petição inicial); f) O pedido de patente formulado em 18.02.1991 veio a ser publicado como patente de invenção nº 96799, no BPI (Boletim da Propriedade Industrial) nº 4/1991, de 31.10.1991, tendo sido averbada a transmissão, por fusão, da ... para a Autora ... AG em 9.05.1997, (cfr. documento nº 1 junto com a petição inicial); g) Por despacho de 26.06.1998 do Presidente do INPI foi concedido à ora Autora a concessão total da patente de invenção nº 96799, o qual foi publicado no BPI (Boletim da Propriedade Industrial) nº 6/1998, de 30.09.1998, contando da certidão junta com a petição inicial como documento nº 1 que estão pagas 11 anuidades e está em vigor até 26.08.2009, a patente nº 96799 vigorará até 26 de Junho de 2013, nos termos do Decreto-lei nº 141/96, de 23 de Agosto.

    3. Existe também um Certificado Complementar de Protecção concedido nos termos do Regulamento do Conselho (CEE) nº 1768/92, de 18 de Junho de 1992, concedido pelo INPI, por referência ao seu produto contendo como substância activa o Valsartan (cuja marca é o ... ), estendendo o período de protecção da Patente para qualquer produto contendo o Valsartan até 23 de Setembro de 2013.

    4. O Valsartan é um composto terapêutido, usado para o tratamento da hipertensão, com antagonistas do receptor...

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