Acórdão nº 10359/13 de Tribunal Central Administrativo Sul, 24 de Outubro de 2013

Magistrado ResponsávelRUI PEREIRA
Data da Resolução24 de Outubro de 2013
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL I. RELATÓRIO ...

, com os sinais dos autos, intentou no TAF de Leiria contra o Instituto da Segurança Social, IP uma providência cautelar de suspensão de eficácia do acto administrativo de encerramento do lar de idosos que explora, sito na Rua São Silvestre, nº 57, em Riachos.

Por sentença datada de 29-7-2013, o TAF de Leiria julgou improcedente o pedido [cfr. fls. 337/369 dos autos].

Inconformada com tal decisão, veio a requerente da providência recorrer para este TCA Sul, tendo para o efeito formulado as seguintes conclusões: “A – Vem o presente recurso interposto da decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, na qual a Mmª Juiz desse douto Tribunal decidiu não decretar a providência cautelar requerida por considerar não estarem preenchidos os pressupostos da alínea b) do nº 1 do artigo 120º CPTA.

B – A recorrente intentou no Tribunal Administrativo de Leiria procedimento cautelar contra ISS, IP – Instituto da Segurança Social, IP, pedindo a suspensão da eficácia do acto administrativo de encerramento do Lar de Idosos, sem denominação, sito na Rua de S. Silvestre, 57, Riachos.

C – A recorrente é proprietária de um estabelecimento que tem em vista a prossecução de finalidades no âmbito das respostas sociais de apoio a idosos previstas no Decreto-Lei nº 64/2007, de 14 de Março, e nele acolhe oito idosos com idades compreendidas entre os 67 e os 97 anos de idade, além da sua mãe.

D – Na sequência de uma acção inspectiva realizada em Outubro de 2012, a recorrente foi notificada pela recorrida da intenção desta de encerrar o estabelecimento de que aquela é proprietária.

E – Em sede de audição prévia, a requerente, ora recorrente procedeu à junção de documentos, arrolou e requereu a audição de testemunhas, cujo depoimento se revelava crucial para comprovar as afirmações aduzidas em sede de audiência prévia.

F – Tais testemunhas não foram porém ouvidas.

G – A mais do que, durante […] três meses, na sequência da acção inspectiva, e da informação técnica elaborada pelos serviços competentes do Instituto da Segurança Social, IP notificada em Novembro de 2012, a requerente, ora recorrente, procedeu a diversas alterações na estrutura e condições do estabelecimento de forma adequa-lo à legislação em vigor e a proporcionar aos utentes "serviços permanentes adequados" "promovendo a qualidade de vida" e "um envelhecimento sadio, autónomo, activo, e plenamente integrado".

H – Todavia, ignorando tais alterações, a requerida manteve o seu propósito e proferiu decisão final de encerramento do estabelecimento, alegando que a proprietária – ora recorrente – não efectuou quaisquer diligências no sentido de obter a licença de funcionamento do estabelecimento.

I – A decisão de encerramento do estabelecimento da recorrente, como culminar de um procedimento, em que foram invocadas, por esta, circunstâncias de facto, representa um acto administrativo não fundamentado.

J – Ao que acresce ainda que a recorrida não só se absteve de levar a cabo as diligências de prova requeridas como também se absteve de se pronunciar no relatório da decisão final sobre a prova produzida documentalmente e sobre o motivo de ter dispensado a inquirição das testemunhas.

L – A decisão final que não se pronuncia e omite a análise da prova apresentada em sede de audição prévia, não precisando sequer porque dispensou a inquirição das testemunhas, determina uma preterição de formalidade legal que inquina a decisão condenatória.

M – Alegou ainda a requerente que o encerramento do estabelecimento põe em causa os direitos dos utentes em causa a um envelhecimento saudável e acompanhado.

N – O encerramento do estabelecimento, nos termos e condições propostos pela requerida, acarretará prejuízos de grande monta para a requerente, e acima de tudo, para os idosos, uma vez que estão em causa as condições de vida dos mesmos.

O – Os critérios ou pressupostos para a concessão de providências cautelares são diferentes consoante se trate de providências cautelares de natureza conservatória ou antecipatória.

P – Assim, dispõe a alínea a) do nº 1 do artigo 120º do CPTA que, quando a procedência da pretensão principal seja evidente, o único critério de decisão é o "fumus boni iuris"; ou seja, a providência é decretada independentemente de prova do receio de facto consumado ou de difícil reparação do dano, e dos prejuízos que a concessão da medida cautelar possa causar aos interesses em causa.

Q – Nos casos em que a procedência da pretensão formulada ou a formular no processo principal não seja evidente, independentemente da natureza da providência cautelar em causa, a lei articula o critério do "fumus boni iuris" com o critério do "periculum in mora" e exige que se proceda à ponderação de todos os interesses em jogo – alíneas b) e c) do nº 1 e 2 do artigo 120º do CPTA.

S – Porém, quando, esteja em causa a adopção de uma providência conservatória, deve a mesma ser decretada quando haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e não seja manifesta a falta de fundamento da pretensão formulada ou a formular nesse processo ou a existência de circunstâncias que obstem ao seu conhecimento de mérito – alínea b) do nº 1 do artigo 120º CPTA.

T – Analisados cada um dos critérios, no que toca adopção de providências cautelares de natureza conservatória, e no que toca ao caso concreto, temos que: U – Em primeiro lugar, deve ser evidente a procedência da pretensão formulada, ou a formular no processo principal por estar em causa a impugnação de acto manifestamente ilegal, de acto de aplicação de norma já anteriormente anulada ou de acto idêntico a outro já anteriormente anulado ou declarado nulo ou inexistente.

V – A Constituição da República Portuguesa e o Código de Procedimento Administrativo exigem que o conteúdo dos actos administrativos integre a sua fundamentação [vd. artigo 268º, nº 3 da CRP].

X – A fundamentação consiste assim na explicitação dos motivos de facto e de direito que levaram o autor do acto à sua adopção.

Z – No caso em análise, a decisão de encerramento do estabelecimento comercial da requerente é manifestamente insuficiente.

AA – Tratando-se de uma decisão tão melindrosa quanto o facto de ser uma decisão susceptível de afectar todos os idosos acolhidos pela requerente.

AB – Não integra o conceito legal de fundamentação de acto administrativo [desfavorável] a invocação de que "não conseguiu – a requerente – rebater a gravidade de nenhum dos factos detectados por ocasião da acção inspectiva, tendo a resposta sido baseada em providências futuras assentes num parecer técnico que foi desfavorável".

AC – Desde logo, porque a requerida não informa expressamente quais factos que, em concreto, sustentam a enunciada gravidade.

AD – A decisão de encerramento do estabelecimento da requerente, como culminar de um procedimento, em que foram invocadas, por esta, circunstâncias de facto, ignoradas pela requerida, representa um acto administrativo não fundamentado, AE – Susceptível de lesar irreversivelmente os direitos e interesses dos utentes acolhidos pela requerente.

AF – Igualmente, a audiência de interessados é o momento por excelência da participação dos particulares no procedimento administrativo, constituindo a concretização legislativa do imperativo constitucional de participação dos interessados na formação das decisões que lhes digam respeito.

AG – Sucede porém que a requerida não só se absteve de levar a cabo as diligências de prova requeridas em sede direito de audição.

AH – Como também se absteve de se pronunciar no relatório da decisão final sobre a prova produzida documentalmente e sobre o motivo de ter dispensado a inquirição das testemunhas arroladas.

AI – Donde, resulta que a requerida omitiu assim a análise crítica da prova produzida pela requerente, em sede própria! AJ – A decisão final que não se pronuncia e omite a análise da prova apresentada, em sede de exercício de direito de audição, não precisando sequer porque dispensou a inquirição das testemunhas, determina uma preterição de formalidade legal que inquina a decisão condenatória.

AL – À luz do artigo 268º da CRP, cujo nº 3 consagra a exigência de fundamentação, bem como a da inequívoca tutela jussubjectiva da audiência de interessados partilhamos do entendimento, na esteira do Prof. Marcelo Rebelo de Sousa, de que se trata de uma situação de nulidade dos actos que pretiram a exigência do seu cumprimento.

AM – A falta de fundamentação, no caso concreto, gera a nulidade do acto, nomeadamente, nos termos e para os efeitos do artigo 133º, nº 1, alínea d) do CPA, face à natureza dos direitos em causa [direitos fundamentais ou análogos a estes últimos].

AN – Resulta pois que, em face dos alegados vícios, o acto administrativo em causa é manifestamente ilegal, sendo pois evidente a procedência da pretensão da requerente na acção principal.

AO – Vale isto por dizer que mal andou o Tribunal "a quo", oferecendo uma interpretação minimalista do artigo 133º do CPA, desconsiderando assim a gravidade do vício em causa.

AP – Resulta ainda da interpretação do artigo 120º, nº 1, alínea b) do CPTA que, nas situações em que não é evidente a procedência da pretensão material a formular no processo principal, depende a concessão da providência requerida da verificação do "periculum in mora" e do " fumus boni iuris".

AQ – Considerou o Tribunal "a quo" que "da concatenação dos documentos juntos aos autos com o depoimento das testemunhas inquiridas, em especial o da testemunha Julieta Fernandes e o emotivo depoimento da testemunha Ana Bela Direito, resultou que, pese embora ainda não licenciado e com a emissão de pareceres favoráveis condicionados por parte das autoridades competentes, "os idosos que permanecem no estabelecimento de apoio...

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