Acórdão nº 00105/05.1BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 11 de Outubro de 2013

Magistrado ResponsávelAntero Pires Salvador
Data da Resolução11 de Outubro de 2013
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo: I RELATÓRIO 1.

"V... - Vinícola da Beira, SA", com sede no lugar e freguesia de..., concelho de Tondela, inconformada, veio interpor o presente recurso jurisdicional do acórdão do TAF de Viseu, datado de 14 de Junho de 202, que julgou improcedente a acção administrativa especial, instaurada contra o IFAP - IP, Instituto Financiamento à Agricultura e Pescas - IP (sucessor legal, por extinção do INGA - Instituto Nacional de Intervenção e Garantia Agrícola - arts. 21.º do Dec. lei 209/2006, de 27/10 e 17.º do Dec. Lei 87/2007, de 29/3), com vista à declaração de nulidade ou anulação da deliberação do Conselho de Administração do INGA, de 15/10/2004, pela qual foi determinada a devolução da quantia de € 85.890,01, acrescida de juros legais até ao respectivo reembolso.

* 2.

A recorrente apresentou alegações, terminando-as com as seguintes conclusões: "1 - Compete ao poder judicial escolher os factos merecedores de censura ético-penal ou contra-ordenacional, não tendo a autoridade administrativa ora recorrida qualquer poder de escolher os factos que considera revestirem e não revestirem dignidade penal ou contra-ordenacional; 2 - Ao seleccionar os factos que devem ser objecto de procedimento criminal e aqueles que devem ser objecto de procedimento administrativo, o ora Recorrido usurpou o poder judicial, violou o princípio da separação de poderes, e feriu o seu acto de nulidade, pelo que, haverá que concluir que a decisão recorrida ao julgar improcedente o vício da usurpação de poder, violou o disposto no art. 133°, n.° 2, alínea a) do CPA, devendo, como tal, ser revogada.

3 - Nos termos do disposto no n° 3 do art. 101° do CPA, a ora Recorrente requereu exame pericial colegial, com pelo menos um perito indicado pela requerente, aos pressupostos de facto em que assenta o relatório de instrução, em particular tendo em consideração as divergências articuladas na sua resposta, em quesitos a formular oportunamente; 4 - Com tal requerimento, a Recorrente pretendia estabelecer os factos em que assenta a decisão atinentes aos registos da empresa, estabelecendo o contraditório sobre relatórios periciais (ou melhor, o relatório de inspecção) unilaterais e que, obviamente, não podem fazer fé pública, e que enfermam de erros materiais; 5 - O ora Recorrido indeferiu tais diligências de forma ilegal, tendo violado o disposto no art. 104° do CPA que lhe confere, nesta matéria, um poder vinculado (“podem” as “diligências complementares que se mostrem convenientes”) e não discricionário; 6 - No caso concreto em apreço, não está em causa a manifesta irrelevância da prova requerida ou o seu intuito meramente dilatório, únicos casos em que a diligência poderia ter sido indeferida.

7 - Bem pelo contrário, tratar-se-ia de procurar estabelecer os factos em que assenta a decisão, atinentes aos registos da empresa, estabelecendo o contraditório sobre os exames periciais vertidos no relatório de inspecção, unilaterais e que, obviamente, não podem fazer fé pública, e que estão eivados de erros materiais – cf. artigos 69 a 123 da petição inicial 8 - Isto mesma foi invocado pela Recorrente, no momento próprio, como fundamento para as diligências de prova complementares requeridas, (cf. documento n.º 2 junto com a petição inicial).

9 - As razões invocadas pelo Recorrido para indeferir a realização do exame pericial requerido pela Recorrente são absolutamente inaceitáveis.

10 - Não obstante os inúmeros vícios, erros e omissões que a Recorrente imputou aos relatórios que serviram de base à decisão final em apreço nos presentes autos, o Recorrido entendeu que tais relatórios porquanto “as irregularidades em causa não foram detectadas, nem confirmadas, pelos autores da decisão final, mas através do recurso, precisamente, ao exame pericial da documentação disponível por dois serviços públicos, com competência especializada na matéria que interessa à decisão do presente procedimento”, a DGAIEC e o IVV.

11 - É precisamente por questionar e reputar erradas as conclusões que resultam do “exame pericial da documentação disponível” efectuado pela DGAIC e pelo IVV que a Recorrente requereu a realização de uma perícia colegial! 12 - Não pode deixar de se ter por sintomático das falhas e incongruências que resultavam de tal “exame pericial da documentação disponível” efectuado pela DGAIC e pelo IVV, ser o próprio Recorrido a reconhecer no acto impugnado que a conclusão a que chegaram foi que a inspecção não foi mais conclusiva porque …”os registos contabilísticos que a C... & C.ª possui não são suficientes” (p. 26 do acto impugnado).

13 - Do processo constam todos os registos que a Recorrente tem a obrigação de manter, ou seja, os registos que indicam as entradas e as saídas dos produtos de seu comércio (cfr. artigo 71°, n°2, do Regulamento (CEE) n°822/87 e artigo 700, n°2, do Regulamento (CE) 1493/99).

14 - Resulta demonstrada a indispensabilidade da realização das diligências de prova requeridas em sede de instrução do procedimento, pelo que as diligências requeridas são absolutamente pertinentes na medida em que o acto impugnado versa sobre a putativa questão da ausência de registos e de outros documentos exigíveis.

15 - Não é pelo simples facto de a Recorrente não ter junto, em sede de audiência prévia, novos documentos ou registos que permitissem uma nova ponderação do cumprimento da legislação que o Recorrido estava legitimado a concluir, sem mais pela desnecessidade da realização do exame pericial colegial requerido.

16 - Reconhecendo o Recorrido que o “exame pericial da documentação disponível” efectuado pela DGAIC e pelo IVV poderia ser mais conclusivo e sendo tal exame posto em causa pela aqui Recorrente, está demonstrada a necessidade da realização do exame pericial colegial requerido, que verdadeiramente se impunha.

17 - Pelo que, ao decidir julgar improcedente a preterição desta formalidade essencial, a douta sentença recorrido violou os artigos 3°, 101.º, n.°3 e 104.° do CPA.

18 – A obrigação de restituição determinada pelo acto administrativo impugnado encontra-se prescrita, porquanto já se encontra ultrapassado o prazo prescricional aplicável de 5 anos previsto no art. 40.º do Decreto-Lei n° 155/92.

19 - O recebimento da quantia em causa nos autos teve lugar em Maio de 1999 (cf. ponto 1 dos factos provados) e não se verificaram nenhuma das causas de interrupção ou suspensão da prescrição previstas no n.° 2 do referido art. 40.º, alegou a Recorrente que se encontrava transcorrido a período de cinco anos após o recebimento e, por isso, prescrita a obrigação de reposição. O disposto no Decreto-Lei n.° 155/92 é aplicável em qualquer caso de matéria de reposição de dinheiros públicos, incluindo às situações de reposição de verbas concedidas pelo e no âmbito do FEOGA — Garantia.

20 - Não colhe a tese sufragada pela sentença recorrida de que o Decreto-Lei n.° 155/92 apenas se aplica a actos de gestão corrente, na medida em que, contrariamente ao decidido, o acto administrativo em apreço é um acto de gestão corrente.

21 - O n.° 1 do art. 4° do Decreto-Lei n.° 155/92 dispõe que “a gestão corrente compreende a prática de todos os actos que integram a actividade que o serviços e organismos normalmente desenvolvem para a prossecução das suas atribuições, sem prejuízo dos poderes de direcção, supervisão e inspecção do ministro competente”.

22 - Os actos praticados em matéria de recuperação de verbas e irregularidades, como é o acto em questão nos autos, insere-se no exercício da actividade normal do Recorrido com vista à prossecução das suas atribuições normais, como aliás resulta do preambulo e dos artigos 5.º e 6.º do Decreto-Lei n.º 78/98, de 27 de Março, o que a própria sentença recorrida reconhece (cf. pág. 15).

23 - Acresce que, tal resulta, ainda, sem qualquer margem para dúvidas do Despacho n.° 24252/2003, publicado no Diário da República n° 289, II Série, de 16 de Dezembro de 2003, que tem por desiderato “1 — Proceder à alteração da distribuição das áreas de funcionamento, com republicação das mesmas de acordo com as alterações já efectuadas”; 24 - Se ainda assim dúvidas houvessem de que o acto objecto de impugnação pela Recorrente se insere numa gestão corrente e normal da actividade do Recorrido, o que se menciona por mero dever de defesa, o ponto 2 do Despacho a que nos temos vindo a referir encarregar-se-ia de as dissipar, ao dispor que foi deliberado ainda:“2 — Conceder os poderes necessários e bastantes para a prática dos actos de gestão relativos às respectivas áreas (...)”.

25 - Sempre se dirá, ainda, que nos termos das alíneas b) e h) do artigo 23.º do Decreto-Lei n.º 78/98, de 27 de Março, constituem receitas do INGA as dotações que forem destinadas a Portugal pela União Europeia no âmbito do FEOGA – Garantia, bem como os reembolso indevidamente pagos e respectivos juros e comissões (cf. também neste sentido a sentença recorrida na pág. 15), donde redunda inquestionável que o acto objecto de impugnação pela Recorrente se insere numa gestão corrente e normal da actividade do Recorrido.

26 - Acresce que, o entendimento sufragado pelo Tribunal a quo sempre seria atentatório dos princípios da não discriminação dos processos destinados a solucionar litígios comunitários relativamente aos litígios nacionais e da proporcionalidade, que vigoram e subjazem tanto ao ordenamento jurídico interno, como ao ordenamento comunitário.

27 - O legislador português, sopesando as características da nossa administração pública e a tradição jurídica interna, considerou precisamente que o prazo que era razoável para que a sua administração actuasse contra irregularidades cometidas pelos seus nacionais em prejuízo do orçamento nacional era o prazo de cinco anos – cf. artigo 40.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 155/92, de 28 de Julho.

28 - É claro que para...

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