Acórdão nº 01252/12.9BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 26 de Setembro de 2013

Magistrado ResponsávelPaula Fernanda Cadilhe Ribeiro
Data da Resolução26 de Setembro de 2013
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I – RELATÓRIO F…, casado, contribuinte fiscal n.º 1…, residente na Avenida…, Vila Nova de Gaia, não se conformando com a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou improcedente a oposição deduzida contra a sentença que decretou o arresto sobre um bem imóvel e créditos do recorrente, interpôs o presente recurso para este Tribunal Central Administrativo Norte, concluindo da seguinte forma as suas alegações (que se transcrevem): A. Na sua oposição, o Oponente aduziu toda uma nova factualidade, não tida em conta pela decisão de decretamento da providência, susceptível de a inverter.

B. Em primeiro lugar, ela mostra que estão há muito verificados os requisitos legais para suspensão do processo executivo no âmbito do qual foi praticado o arresto em crise nos autos.

C. Por um lado, o pedido vem sendo efectuado reiteradamente desde 2009.

D. Depois, a falta de meios da F... (devedora principal) é ostensivamente demonstrada pela ausência de bens penhoráveis em valor sequer aproximado ao montante exequendo, perfeitamente verificada e reconhecida (até expressamente – desde logo nos autos de penhora), também de modo reiterado, ao longo destes anos, pela AT.

E. Finalmente, a F... nunca teve, em qualquer momento da sua história ou actividade, capacidade económica sequer minimamente semelhante à necessária para de alguma forma prestar a garantia exigida, pelo que qualquer juízo de culpa incidente sobre a empresa ou o ora Oponente, quanto à insuficiência patrimonial, fica à partida prejudicado, até porque desde o início dos processos executivos, como está demonstrado, a F... não só não diminuiu o seu património como até aumentou (ligeiramente) os valores penhoráveis.

F. Aliás, quanto a este aspecto, conforme jurisprudência e doutrina unânimes, o juízo sobre a culpa deve servir para demonstrar, não uma mera responsabilidade de gestão, mas uma diminuição ou ocultação dolosas de património, com vista a defraudar o crédito tributário – o que, no caso, resulta óbvio que não aconteceu, de todo.

G. Em segundo lugar, com a reversão, temos que é a própria AT a reconhecer a incapacidade económica da F.... E, se assim é, dúvidas não restam de que sempre estiveram verificados os pressupostos da suspensão do processo executivo.

H. O que, por sua vez, implica a invalidade de todos os actos praticados posteriormente ao pedido de suspensão com dispensa de garantia, designadamente os de penhora. Desde logo, entre todos os demais – e com particular interesse nesta sede –, são inválidas a decisão de reversão e todos os procedimentos tendentes ao arresto em causa, que nessa medida deve ser revogado.

I. Ao não ter considerado devidamente toda esta factualidade, que não era do conhecimento do Tribunal no momento do decretamento do arresto, bem como os documentos juntos pela primeira vez na Oposição, a Sentença recorrida incorre em erro na apreciação da matéria de facto e na sua subsunção ao direito aplicável, devendo pois ser anulada.

J. De acordo com o n.º 1 do artigo 214º do CPPT, o arresto de bens do devedor de tributos ou do responsável solidário ou subsidiário só pode ser requerido pela Fazenda Pública – e decretado pelo Tribunal competente – se houver “justo receio de insolvência ou de ocultação ou alienação de bens”. Para que o receio em causa possa efectivamente ser julgado “justo” ou “fundado”, deve demonstrar-se a existência de um perigo real, justificando-o de forma objectiva, circunstanciada e lógica.

K. No n.º 2 do artigo 214º, prevê-se uma presunção de justo receio de insolvência ou de ocultação ou alienação de bens sempre que em causa esteja uma dívida de imposto que o executado tenha retido ou repercutido a terceiros e não entregue nos prazos legais. A previsão desta presunção é compreensível, uma vez que uma tal actuação de sonegação de montantes tributários devidos pelo rendimento de outrem, por parte de entidades a quem o Estado deposita a confiança para a cobrança e entrega dos tributos que lhe são devidos, configura uma conduta abusiva susceptível de, à partida e por si só, permitir a conclusão de que o seu autor poderá também levar a cabo uma conduta igualmente censurável, desta feita em ordem à frustração do crédito fiscal.

L. No entanto, deve sublinhar-se que, pela própria natureza da presunção – pela racionalidade que lhe está subjacente –, ela só se aplica, obviamente, a quem está sujeito à obrigação de retenção (ou de repercussão), e não a quem é apenas um responsável subsidiário: o recurso ao n.º 2 do artigo 214º do CPPT depende de quem é a pessoa ou entidade cujo património se pretende arrestar, não da natureza da dívida, pelo que o arresto não se pode fundamentar naquela presunção quanto a todos os eventuais responsáveis pela dívida (se esta resultar da não entrega de tributo retido ou que deveria ter sido retido, o arresto só se pode bastar com a presunção se incidir sobre os bens do próprio responsável legal pela retenção).

M. O preceito em causa é claro, referindo-se a dívidas de impostos que “o executado tenha retido ou repercutido a terceiros e não entregue nos prazos legais”: ou seja, a presunção só é aplicável ao sujeito passivo que concretamente tenha actuado daquela forma, sendo incontroversa a conclusão de que se não aplica se não a quem está obrigado a reter ou a repercutir um imposto e a entregar os montantes respectivos ao Estado.

N. A Fazenda Pública não pode beneficiar da presunção, portanto, quando o que pretender for arrestar bens de um responsável subsidiário. Aliás, pela mesma razão, a presunção não é também aplicável, obviamente, a quem não tem a obrigação de reter ou repercutir o imposto e entregá-lo ao Estado. Por exemplo, no caso do IVA, se o executado for aquele a quem um fornecedor de bens ou serviços cobrou (repercutiu) o imposto, que depois teria de entregar ao Estado, não se lhe pode naturalmente aplicar esta presunção.

O. No caso vertente, nada há, referido pela Fazenda Pública ou pelo Tribunal, que sirva de prova ou mero indício de que o Oponente pode vir a sonegar, ocultar ou transferir o seu património, em todo ou em parte: o arresto foi requerido e decretado sem qualquer referência, facto ou elemento objectivo que possa verdadeiramente fundamentar o risco justificado de o Oponente empreender qualquer acção que se traduza na diminuição, alienação ou ocultação do seu património, tendente a frustrar o eventual crédito da Fazenda Pública, tendo-se limitado a AT e o Tribunal a entender que se aplica ao Oponente a presunção do n.º 2 do artigo 214º do CPPT.

P. Porém, nos termos do acima exposto, a consideração de que a presunção se aplica aos responsáveis subsidiários configura uma interpretação errada e completamente oposta à letra e ao espírito da norma, pelo que, não se aplicando a presunção ao Oponente (responsável subsidiário), deveriam ter sido mobilizados indícios que revelassem com probabilidade o perigo de ele dissipar o seu património.

Q. Não tendo tal sido feito, deve dar-se por totalmente incumprida a fundamentação da verificação do periculum in mora em que se baseia a possibilidade de se lançar mão do expediente cautelar em causa.

R. Seja como for, mesmo que a presunção se aplicasse aos responsáveis subsidiários, a verdade é que, na nossa situação, ela não se aplicaria ao Oponente porque nem sequer seria aplicável à F..., responsável principal: a Sentença fez uma confusão evidente relativamente à origem das alegadas dívidas exequendas e à posição da F... na cadeia do IVA em causa. É que as alegadas dívidas não resultam de qualquer imposto que a F... tenha repercutido ou retido e não entregue ao Estado: bem pelo contrário, a F... é que aparece como repercutida – ou seja, ela é que suportou o IVA liquidado por fornecedores (os quais tinham, eles sim, de entregar o imposto ao Estado), resultando a alegada dívida da consideração de essas facturas serem fictícias.

S. Esta confusão é suficiente, por si só, para conduzir à revogação do arresto decretado.

T. Por fim, quanto à idoneidade do meio utilizado para discussão desta última questão, entende o Oponente que a alternativa estabelecida no n.º 1 do artigo 388º do CPC não significa que o requerido só possa incluir na oposição prevista na alínea b) a alegação de factos e a produção de meios de prova não tidos em conta...

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