Acórdão nº 02980/11.1BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 13 de Setembro de 2013

Magistrado ResponsávelNuno Filipe Morgado Teixeira Bastos
Data da Resolução13 de Setembro de 2013
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. Relatório 1.1. C…– Sociedade Unipessoal, Lda., n.i.f. 5…, com sede indicada na Rua…Porto, recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou improcedente a presente reclamação de atos do órgão de execução fiscal, que interpôs a coberto dos artigos 276.º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário, tendo por objeto a decisão da Direção de Finanças do Porto que incidiu sobre o pedido de dispensa de prestação de garantia que formulou no processo de execução fiscal n.º 3182201101029860.

Com a interposição do recurso, apresentou as respetivas alegações e formulou as conclusões que a seguir transcrevemos: A. A Recorrente provou não possuir nem nunca ter possuído bens penhoráveis que pudessem satisfazer a quantia exequenda e o acrescido; B. Esta, em sede administrativa e de reclamação, fez a prova necessária da inexistência da dissipação de bens, com eventuais intuitos de diminuir as garantias dos credores; C. É excessiva a conclusão de que a Recorrente não fez prova sobre a inexistência de bens, bem como relativamente à eventual dissipação de bens.

D. A sociedade iniciou a sua actividade durante o ano de 2008, não tendo, desde essa data, adquirido qualquer tipo de bens móveis ou imóveis; E. Sem bens penhoráveis, desde a sua constituição, é impossível ter existido a referida dissipação de bens com o intuito de diminuir as garantias dos credores; F. Nos termos do artigo 52.º, n.º 4, da LGT, “ A administração tributária pode, a requerimento do executado, isenta-lo da prestação de garantia nos casos de a sua prestação lhe causar prejuízo irreparável ou manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e do acrescido, desde que em qualquer dos casos a insuficiência ou inexistência de bens não seja da responsabilidade do executado”; G. Não possuindo bens susceptíveis de penhora, a Recorrente cumpriu inexoravelmente a primeira parte do artigo 52.º, n.º 4 da LGT; H. Da referida disposição legal resulta que, o legislador estabeleceu, dois pressupostos, complexos e em alternativa, como condições necessárias à isenção da prestação de garantia, o prejuízo irreparável dela decorrente e a manifesta falta de meios económicos para a prestar; I. O legislador deixou claro que a isenção pode ser concedida nos casos de prejuízo irreparável ou de manifesta falta de meios económicos; J. A isenção não depende, tout court, da constatação da evidenciação de que o executado não tem bens, ou de que os tem em medida inferior do necessário, para a prestação da garantia; K. O legislador impôs que a insuficiência ou inexistência dos bens não seja da responsabilidade do executado que pretende a isenção; L. O segmento final do n.º 4 do artigo 52.º da LGT, relativo à responsabilidade do executado na insuficiência ou inexistência de bens, não constitui, na esteira da teoria das normas de Rosemberg, uma qualquer “contra-norma”; M. O segmento da norma faz parte da norma, enquanto hipótese estatuída que é pressuposto daquele referido direito; N. A parte final do artigo 52.º n.º 4 da LGT consubstancia, ainda, um elemento constitutivo do direito que o executado pretende fazer valer para a isenção da prestação de garantia; O. A regra geral é a de que é ao executado que incumbe fazer a prova da factualidade pertinente, nos termos do que dispõe o artigo 342.º n.º 1 do Código Civil; P. Apesar do segmento final do artigo 52.º, n.º 4 da LGT, se apresentar, como um elemento constitutivo do direito que o executado, a coberto de tal norma, pretende fazer valer, ainda assim, neste domínio, se deve operar uma verdadeira inversão daquele ónus probatório, para que impenda sobre a Administração Tributária, a prova do facto positivo que é a que a insuficiência ou inexistência de bens do executado lhe é imputável, por os ter dissipado em prejuízo dos credores; Q. Tal sucede porque a prova não pode constituir, para o autor uma carga probatória tão intolerável; R. Não se descortina qual ou quais os factos positivos que o executado esteja obrigado a demonstrar, que induzam a que a insuficiência ou a inexistência de bens não corresponda a uma conduta voluntária e intencional, com o intuito de diminuir a garantia dos credores; S. Não é admissível que a norma se configure como uma verdadeira “prova diabólica” ou impossível na prática; T. Não é admissível um regime probatório que onere unilateralmente a parte que invoca a seu favor a cláusula geral; U. A sufragar-se o entendimento sustentado na decisão recorrida, neste domínio, estar-se-á, na prática, a inviabilizar ou a tornar excessivamente difícil a prova em causa por parte do executado; V. Em conformidade com o defendido pelo ilustre Prof. Vaz Serra, quando a prova não for possível ou se tornar extremamente difícil àquele que, nos termos do artigo 342.º do CC, couber fazê-la, o ónus probatório tem que deixar de impender sobre ele para passar a recair sobre a outra parte; W. O entendimento sufragado na sentença é contrário ao princípio da proporcionalidade, nas suas vertentes da necessidade e do equilíbrio; X. No nosso sistema jurídico, vigora a presunção de boa-fé na actuação dos contribuintes, plasmada no n.º 2 do artigo 59.º da LGT; Y. A presunção de boa-fé colide com a aceitação de que o executado se não provar que não agiu de forma dissipadora dos seus bens com o intuito de prejudicar os credores, o tenha, de facto, feito; Z. No caso sub judice não podia caber à Recorrente demonstrar a verificação da condição que constitui o segmento final do artigo 52.º n.º 4 da LGT, para que lhe fosse concedida a isenção da prestação de garantia solicitada, em face da “prova diabólica”, que representa tal ónus; AA. A manifesta falta de meios económicos só pode ser aferida pelos bens penhoráveis, pelo que não pode relevar a situação dos capitais próprios da sociedade e a existência de lucros económicos, pois, tendo sido esse o critério consagrado pelo legislador não é lícito eleger um outro; BB. Portanto, estando verificado um dos dois requisitos exigidos pelo artigo 52.º n.º 4 da LGT, no caso, o da manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência ou inexistência de bens penhoráveis para o pagamento da quantia exequenda e do acrescido, e não tendo a Administração Tributária demonstrado que a insuficiência ou inexistência de bens se deve a uma actuação intencional do executado em se colocar nessa posição, com o objectivo de diminuir ou de afastar a garantia dos credores, forçoso se impunha o deferimento do pedido de isenção de garantia em causa.

Pelo exposto, Deverá ser dado provimento ao presente recurso, revogada a douta decisão recorrida, sendo substituída por douta decisão deste Venerado Tribunal que julgue que o tribunal “a quo” não aplicou correctamente o Direito, relativamente ao pedido de isenção de prestação de garantia, dando-se por verificado o requisito da inexistência de culpa na dissipação de bens, quer por prova da Recorrente, quer por falta de prova em sentido contrário.

».

1.2. O recurso foi admitido com subida imediata nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

A Recorrida não apresentou contra-alegações.

A Recorrente impugnou o efeito do recurso, pedindo fosse declarado que o mesmo tem efeito suspensivo.

A M.mª Juiz Conselheira Relatora julgou-se incompetente em razão da hierarquia, para conhecer do presente recurso.

Remetidos os autos a este tribunal, o Ex.mo Senhor Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer no sentido de que deve ser negado provimento ao recurso.

Com dispensa dos vistos legais (artigos 36.º, n.º 2, do Código de Processo dos Tribunais Administrativos e 707.º, n.º 4, do Código de Processo Civil), cumpre agora apreciar e decidir, visto que nada a tal obsta.

  1. Do Objeto do Recurso São as seguintes as questões a decidir, devidamente delimitadas pelas conclusões do recurso: a) Saber se a sentença recorrida incorreu em erro no julgamento de facto, por não ter dado como provado que a sociedade apenas iniciou a sua atividade durante o ano de 2008 e não adquiriu desde então qualquer tipo de bens imóveis ou móveis; b) Saber se a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento de direito, ao concluir que recai sobre o requerente da dispensa da garantia o ónus de provar os respetivos pressupostos; c) Saber se a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento na aplicação do direito aos factos por não ter concluído pela verificação dos pressupostos da dispensa da garantia.

  2. Do Efeito do Recurso Extrai-se de fls. 387 e seguintes dos autos que a Recorrente impugna o efeito do recurso e pede que lhe seja atribuído efeito suspensivo da decisão recorrida.

    Embora o meio escolhido para o fazer tenha sido o recurso e o adequado fosse o previsto no artigo 703.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do artigo 281.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, nada obsta à sua convolação no meio adequado.

    Tendo o Supremo Tribunal Administrativo julgado hierarquicamente competente para o conhecimento do recurso este Tribunal Central Administrativo Norte, é também a este tribunal que compete apreciar o eventual erro quanto ao efeito do recurso.

    Cumpre, pois decidir, visto que à parte contrária foi dada a oportunidade de se pronunciar (fls. 399) e nada disse.

    O presente recurso tem por objeto uma sentença do tribunal de primeira instância que apreciou a reclamação de uma decisão do órgão de execução fiscal, interposta ao abrigo dos artigos 276.º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário.

    Essa reclamação subiu ao tribunal logo após a decisão que indeferiu o pedido de dispensa da garantia da garantia. E subiu nos próprios autos de execução fiscal (de acordo com o artigo 97.º, n.º 1, alínea n), do mesmo Código).

    O que significa que suspendeu os ulteriores...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT