Acórdão nº 10300/13 de Tribunal Central Administrativo Sul, 26 de Setembro de 2013

Magistrado ResponsávelANA CELESTE CARVALHO
Data da Resolução26 de Setembro de 2013
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I.

RELATÓRIO A A...– Gestão de Resíduos, SA, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, datada de 24/06/2013 que, no âmbito da providência cautelar relativa a procedimentos de formação de contratos, instaurada nos termos do disposto no artº 132º do CPTA, movido contra a B...– Valorização e Tratamento de Resíduos Sólidos, SA e as Contra-interessadas, C..., Lda., D..., SA e E...& ENERGY, SA, julgou procedente a excepção de ilegitimidade activa, absolvendo as entidades requeridas da instância cautelar.

Formula a aqui recorrente nas respectivas alegações (cfr. fls. 201 e segs. – paginação referente ao processo em suporte físico, tal como as referências posteriores), as seguintes conclusões que se reproduzem: “

  1. A douta sentença recorrida comete erro de julgamento ao determinar que a ora Recorrente não tem legitimidade activa nos presentes autos.

    B) O Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco considera, em suma, que i) a Recorrente não alegou prejuízos na sua esfera jurídica resultantes da adopção do modelo de avaliação do procedimento dos autos, ii) que a Recorrente não alega que esse mesmo modelo de avaliação é lesivo dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, iii) que a Recorrente não retira vantagem ou utilidade da anulação das peças do procedimento e iv) que a Recorrente deveria antes ter apresentado a sua proposta no procedimento dos autos.

    C) Os presentes autos devem ser julgados, não com base na lesividade da decisão de aprovação das peças do procedimento, mas sim com base na lesividade dos regulamentos concursais que o mesmo aprova (peças do procedimento).

  2. O interesse em agir (interesse processual nos presentes autos) não se confunde com a qualidade de “interessado” (na acepção dada pelo Código dos Contratos Públicos).

    E) A Recorrente não tem interesse em participar num procedimento ilegal - como o dos autos -, pretendendo sim a anulação desse mesmo procedimento para que, posteriormente, possa participar num novo procedimento legal e com o mesmo objecto.

    F) Pelo que a lesividade directa daqueles regulamentos concursais consiste na supressão ao mercado da possibilidade de legalmente vir a contratar com a Entidade Adjudicante os serviços que aqueles regulamentos tinham por objecto.

    G) Tendo em conta que a Recorrida não apresentou resolução fundamentada, o procedimento dos autos deveria ter sido suspenso no dia em que a Recorrida foi citada para apresentar oposição, ou seja, no passado dia 19/04/2013.

    H) Se a Recorrida tivesse dado cumprimento ao disposto no artigo 128.º n.º 1 do CPTA, o procedimento teria sido suspenso ainda em fase de apresentação de propostas, razão pela qual não se teria que colocar a questão de a Recorrente não ter apresentado proposta nesse mesmo procedimento.

    I) É o artigo 55.º n.º 1 alínea a) do CPTA que regula a questão da legitimidade para a impugnação das peças do procedimento, por remissão dos artigos 100.º e 112.º do CPTA.

    J) A Recorrente sempre alegou que, por um lado, as ilegalidades apontadas no procedimento dos autos foram determinantes na sua opção de não concorrer ao mesmo, o que, naturalmente traz reflexos/prejuízos na sua esfera jurídica, na sua actividade económica e comercial, concretizados na perda de oportunidade, e que, por outro, a vantagem que a Recorrente iria obter da anulação do procedimento seria a real possibilidade de concorrer a um outro procedimento com o mesmo objecto mas que não violasse normas legais.

    K) O Tribunal Central Administrativo Norte, em acórdão datado de 22/04/2010, no âmbito do processo n.º 00647/09.0BEAVR, entendeu precisamente que tal prejuízo e tal vantagem são atendíveis para a determinação da legitimidade activa processual.

    L) Não faz sentido, salvo melhor opinião, que a Recorrente tivesse apresentado uma proposta num procedimento que considera ilegal e, posteriormente, impugnasse as peças desse mesmo procedimento.

    M) Até porque, ao apresentar proposta a Recorrente estaria tacitamente a aceitar as peças do respectivo procedimento, nomeadamente, ao assinar uma declaração de aceitação do conteúdo do Caderno de Encargos (Anexo 1 do CCP).

    N) A legitimidade activa do Requerente de uma providência cautelar para suspensão da eficácia de peças do procedimento, nos termos do disposto no artigo 132.º do CPTA, não se pode aferir em função de ter ou não apresentado proposta ou de qualquer modo participado desse procedimento.

    O) Já quanto às ilegalidades que a Recorrente identifica nas peças do procedimento dos autos, cumpre referir que as mesmas dizem respeito ao modelo de avaliação, concretamente, aos subfactores do factor “Qualidade Técnica da proposta” – “Frota”, “Experiência em Transporte de Resíduos” e “Certificado de Qualidade”.

    P) A Recorrente entende que a procedência da questão suscitada no processo principal é já perfeitamente evidente atenta a manifesta ilegalidade de que padecem as peças do procedimento dos autos.

    Q) A Recorrida é uma Entidade Adjudicante na acepção prevista na alínea a) do n.º 2 do artigo 2.º do CCP.

    R) Quanto ao subfactor “Frota”, cumpre referir que facilmente se constata que o que está em análise neste subfactor são apenas e só as características dos equipamentos - se são “recentes” - e a propriedade desses mesmos equipamentos.

    S) Quanto ao subfactor “Experiência em transporte de resíduos”, cumpre referir que claramente se percebe que, tendo em conta os descritores deste subfactor, as propostas dos concorrentes serão melhor pontuadas de acordo com o número de anos de experiência dos motoristas.

    T) Já quanto ao subfactor “Certificado de Qualidade”, refira-se que, embora as peças do procedimento sejam omissas quanto ao exacto certificado de qualidade exigido, o certo é que, sendo um certificado de qualidade, será sempre relativo à empresa concorrente e aos seus processos de fabrico, produção ou actividade e não às suas propostas.

    U) Sendo assim, facilmente se constata que, através do modelo de avaliação do procedimento dos autos, se pretende avaliar e pontuar propostas em função de aspectos relativos aos concorrentes, o que apenas é permitido no âmbito do concurso público com prévia qualificação, nos termos do disposto no artigo 165.º n.º 1 alínea c) do CCP, sob pena de violação do disposto no artigo 75.º n.° 1 do CCP.

    V) Tal constatação não carece de qualquer indagação ou demonstração argumentativa, antes é evidente, clara, imediata e cristalina.

    W) Quanto à questão da qualificação dos concorrentes e do concurso limitado por prévia qualificação, pronunciaram-se, os autores Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira, in Concursos e Outros Procedimentos de Contratação Pública, página 965 e 966, Almedina, no sentido de não ser possível a uma Entidade Adjudicante optar por um procedimento sem qualquer qualificação prévia dos candidatos e depois pretender avaliar aspectos, características ou qualidades dos próprios concorrentes.

    X) Nesse mesmo sentido, também se pronunciaram o Tribunal Central Administrativo Norte, em acórdão datado de 25/01/2013, no âmbito do processo n.º 01312/113.3BEBRG e Tribunal Central Administrativo Sul, em acórdão datado de 21/06/2012, no âmbito do processo n.º 08869112.

    Y) Sendo assim, como o é, o modelo de avaliação das propostas adaptado pela Recorrida é manifestamente ilegal, porquanto estabelece um critério de adjudicação baseado em subfactores que avaliam a capacidade técnica dos concorrentes, quando tal não é legalmente admissível num Concurso Público, sob pena de violação do disposto nos artigos 75.º n.º 1 e 162.º e ss do CCP, e que tal constatação não carece de qualquer elaborada indagação ou demonstração argumentativa, antes é evidente, clara, imediata e cristalina.

    Z) O Supremo Tribunal Administrativo em acórdão datado de 11/12/2007, no âmbito do processo n.º 0210/07, refere, nomeadamente, que ao se demonstrar, desde logo, ser evidente que a pretensão formulada pelo Requerente no processo principal irá obter êxito - por serem manifestas as ilegalidades apontadas ao procedimento - seria inútil permitir ou possibilitar que o acto ou procedimento em questão, continuasse a produzir efeitos.

    A

  3. Razão pela qual as providências requeridas - suspensão da eficácia da decisão de aprovação das peças do procedimento e das próprias peças do procedimento e suspensão do procedimento de formação do contrato - mostram-se adequadas ao fim a que se visa acautelar com o processo principal, devendo as mesmas ser decretadas nos exactos termos do Requerimento Inicial.”.

    Conclui, pedindo a procedência do recurso e a substituição da sentença recorrida por outra que decrete a suspensão da decisão de aprovação das peças do procedimento e das próprias peças e a suspensão do procedimento de formação do contrato.

    * A recorrida, B...apresentou contra-alegações (cfr. fls. 244 e segs.), assim tendo concluído: “1. A douta sentença proferida nos autos, que julgou absolver a Recorrida da instância e julgar a Requerente parte ilegítima, não merece qualquer censura.

    1. A ora Recorrente nunca alegou, nem demonstrou nos presentes autos, qual o seu interesse para intentar a presente providência.

    2. Não é facto suficiente e bastante para conferir legitimidade processual a mera alegação de no objecto social da Recorrente estar incluída a possibilidade de prestar serviços de natureza idêntica ao do procedimento pré-contratual que pretende impugnar.

    3. É imprescindível a demonstração da efectiva lesão na esfera jurídica da Recorrente para a prova da sua legitimidade.

      ...

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