Acórdão nº 10232/13 de Tribunal Central Administrativo Sul, 14 de Agosto de 2013
Magistrado Responsável | ANA CELESTE CARVALHO |
Data da Resolução | 14 de Agosto de 2013 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I.
RELATÓRIO A A... PORTUGAL - Comunicações Pessoais, SA, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, datada de 19/04/2013, proferida no processo instaurado contra a ICP – Autoridade Nacional de Comunicações e as Contra-interessadas identificadas em juízo, com antecipação do juízo da causa principal, no artº 121º do CPTA, a qual julgou a acção improcedente.
Formula a aqui recorrente nas respectivas alegações (cfr. fls. 959 e segs. – paginação referente ao processo em suporte físico, tal como as referências posteriores), as seguintes conclusões que se reproduzem: “1. A sentença recorrida foi proferida na providência cautelar, após ter sido emitido despacho que decidiu sobre a antecipação do juízo da causa principal, nos termos do artº 121°, nº 1 do CPTA, por referência ao objecto da acção principal, e delimitada à análise da invalidade do artigo 12.º, n.º 10, do Regulamento n.º 114/2012, de 13 de Março 2. Foi assim proferida sentença sobre o objecto da acção principal, que decidiu que o momento em que ocorre a conclusão do acordo para a transferência do número, teria e podia ser objecto de execução no âmbito do RP, pelo ora Réu ICP-ANACOM, que não foi violado o princípio da competência e nem se verificou excesso de poder regulamentar, e que atentas as dificuldades manifestadas pelos vários operadores em sede de procedimento de consulta que antecedeu a emissão do RP/2012, o ICP-ANACOM incluiu no texto do citado nº 10 do artigo 12°, várias excepções, o que revela também a adequação da tarefa interpretativa e concretizadora do bloco da legalidade, realizada pelo Réu ICP-ANACOM na elaboração do RP.
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Usando da cautela que os seus deveres de patrocínio lhe impõem, antes da interposição do presente recurso a Recorrente apresentou RECLAMAÇÃO PARA o TRIBUNAL COLECTIVO com competência para decidir a acção principal, à luz do previsto no artigo 40° do ETAF.
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No entanto, a sentença agora em apreço, tomou a decisão que cabia à acção administrativa especial, convolando o processo cautelar em processo principal, e carece de impugnação para não se tornar definitiva, independentemente de uma sujeição a acórdão de colectivo, pelo que de acordo com o mesmo princípio de cautela, se interpõe o presente recurso.
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Verifica-se a Ilegalidade (e Inconstitucionalidade} da norma impugnada – artigo 12.º, n.º 10, do RP.
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Na versão anterior do RP, o PR (“Prestador Receptor”) tinha, em regra, três dias úteis, a partir da apresentação do pedido pelo assinante, para assegurar a implementação da portabilidade, e na nova versão do RP, o PR deve, como regra, assegurar a portabilidade, fazendo a transferência efectiva do número no prazo máximo de um dia útil, a partir da apresentação do pedido pelo assinante.
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Esclarecido o efectivo critério adoptado pela DIRECTIVA DO SERVIÇO UNIVERSAL e pela LEI DAS COMUNICAÇÕES ELECTRÓNJCAS, conclui-se que o momento do início da contagem do prazo supra identificado ora criado pelo RP para a implementação da portabilidade, constante do artigo 12.º, n.º 10, é manifestamente ilegal e inconstitucional.
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Dado que tal prazo não decorre do estabelecido no artigo 30.º, n.º 4, da Directiva de Serviço Universal (DSU), nem do disposto no n.º 3 do artigo 54.º da Lei das Comunicações Electrónicas nacional (“LCE”), o qual procedeu à transposição do artigo 30.º, n.º 4, da DSU para o direito interno.
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O artigo 30.º, n.º 4, da DSU determinou que a transferência de números e a subsequente activação destes devem ser executadas no prazo mais curto possível, devendo os assinantes que tenham concluído um acordo para a transferência de um número para uma nova empresa ter o número activado no espaço de um dia útil.
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Os trabalhos preparatórios que levaram à redacção do artigo 30.º, n.º 4, da DSU, esclarecem que a redacção inicial previa, como critério para o início da contagem do dia útil, a data de apresentação do pedido pelo assinante, redacção que foi expressamente abandonada, em favor da presente.
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O legislador nacional, ao transpor o artigo 30.º, n.º 4, da DSU para o direito português também não teve dúvidas e não contemplou o critério da apresentação do pedido do cliente para o início da contagem do dia útil, mas o da conclusão de um acordo para a transferência do número.
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A apresentação do pedido pelo assinante não constitui a conclusão de acordo para a transferência do número, pois esta implica a aceitação por parte do PR (e validação do Prestador Doador (PD)), sendo que o pedido apresentado pelo assinante consubstancia uma declaração negocial conducente à celebração de um negócio jurídico, mas é necessário que exista uma manifestação de vontade por parte do PR e ainda uma validação por parte do PD (na qualidade de prestador do serviço no momento do pedido de portabilidade).
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Ao aplicar o direito nacional derivado de uma Directiva, qualquer órgão jurisdicional nacional deverá interpretá-lo à luz do texto e da finalidade dessa mesma Directiva, de acordo com uma interpretação que assegure, no âmbito das suas competências, a plena eficácia do direito da União, quando se pronuncia sobre qualquer litígio que lhe seja submetido.
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A pretendida declaração de inconstitucionalidade e de ilegalidade deve ter lugar porque a impugnação de normas no contencioso administrativo tem por objecto quaisquer normas emanadas ao abrigo de disposições de direito administrativo, isto é, normas emitidas no exercício da função administrativa.
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Cumpre averiguar essa ilegalidade quando lhe corresponda a sanção de invalidade ou inexistência jurídica, nomeadamente, a violação do direito comunitário, a violação de preceitos legais (da respectiva lei de habilitação ou quaisquer outras leis, ordinárias ou com valor reforçado).
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E os Tribunais Administrativos, num processo que não tenha por objecto a declaração de ilegalidade com força obrigatória geral do regulamento, podem desaplicar um regulamento, que considerem inconstitucional ou qualificadamente ilegal, aos feitos submetidos ao seu julgamento, podendo julgar incidentalmente essas questões e vícios regulamentares, com efeitos circunscritos ao processo em causa.
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O Regulamento nº 114/2012 foi aprovado, segundo a referência à legislação habilitante constante do seu Preâmbulo, ao abrigo do disposto na alínea a) do artigo 9.º dos Estatutos do ICP-ANACOM, anexos ao Decreto-Lei n.º 309/2001, de 7 de Dezembro, e do n.º 7 do artigo 54.º da LCE, atentos os objectivos de regulação, em especial o fixado na alínea c) do n.º 1 do artigo 5.º da LCE.
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Mas os Estatutos do ICP-ANACOM, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 309/2001, de 7 de Dezembro, no seu artº 9°, apenas lhe permitem, no âmbito das suas competências de regulação e supervisão, elaborar regulamentos nos casos previstos na lei e quando se mostrem indispensáveis ao exercício das suas atribuições.
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E a Lei n.º 51/2011, de 13 de Setembro, que alterou e republicou a Lei n.º 5/2004, de 10 de Fevereiro - Lei das Comunicações Electrónicas - determinou no seu artº 9°, nº 7, que ao ICP apenas compete determinar as regras necessárias à execução da portabilidade, conferindo-lhe um mero poder regulamentar de execução, sujeito a uma estrita reserva legal material, dentro do princípio da primariedade ou precedência da lei claramente afirmado no nº 7° do artº 122° da Constituição.
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Se as disposições referidas apenas atribuem poderes regulamentares de execução ao ICP-ANACOM, para mera concretização de normas, não podia o ICP-ANACOM justificar com essas normas a regulamentação que estipulou com requisitos para a implementação da portabilidade - maxime, prazo - mais restritivos do que os constantes de norma geral prévia (LCE e DSU), 21. Foi assim violado o PRINCÍPIO DA COMPETÊNCIA e o EXCESSO DE PODER REGULAMENTAR, pois o ICP-ANACOM, não podia retirar da norma em causa mais do que a Lei (LCE e DSU) quiseram estabelecer, e a Constituição expressamente proíbe que lhe seja conferido um poder regulamentar originário.
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E deste modo a norma impugnada (artigo 12.º, n.º 10, do RP) é inconstitucional e viola o princípio de competência, pois que foi emanada sem prévia habilitação legal, constituindo o extravasar da competência legal conferida ao ICP-ANACOM, justificando a sua declaração de invalidade com aplicação no caso concreto dos autos, em que deve ser decretado que não há a obrigação de a A... cumprir o que consta do artigo 12.º, n.º 10, do RP referido.
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A intervenção em causa por parte do ICP-ANACOM foi também manifestamente desnecessária e desproporcional, constituindo um excesso de poder regulamentar violador dos princípios da proporcionalidade, da desburocratização e da eficiência, tal como se encontram consagrados nos artigos 266.º n.º 2 da CRP e 5.º, n.º 2 do CPA, pois aditou requisitos desproporcionados e inadequados à implementação da portabilidade, daqui também resultando a sua inconstitucionalidade.
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Está-se também perante um claro excesso de regulamentação, através da adição, pelo ICP-ANACOM, de novos requisitos que não só nada trazem de ganho, como prejudicam os clientes dos serviços de comunicações electrónicas, uma vez que são potenciadores de erros na validação dos pedidos e respectiva documentação e, por conseguinte, de portabilidades efectivadas contra a vontade dos assinantes, contrariando o disposto no n.º 4 do artigo 30.º da Directiva do Serviço que estabelece que “...as autoridades nacionais competentes têm igualmente em conta, sempre que necessário, que os assinantes estão protegidos ao longo de todo o processo de transferência e que a transferência para outro fornecedor não é feita contra a sua vontade...” (sublinhado nosso).
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Também se verifica a INCONSTITUCIONALIDADE DA SANÇÃO APLICÁVEL À INFRACÇÃO, já que o RP, ao determinar no artigo 25.º, que as infracções às suas disposições são puníveis nos termos do artigo 113.º, n.º...
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