Acórdão nº 01304/09.2BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 14 de Junho de 2013

Magistrado ResponsávelAntero Pires Salvador
Data da Resolução14 de Junho de 2013
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo: I RELATÓRIO 1 .

J..., professor associado da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto, inconformado, veio interpor o presente recurso jurisdicional da decisão do TAF do Porto, datada de 14/5/2012, que julgou improcedente a acção administrativa especial, instaurada contra a UNIVERSIDADE do PORTO - UP, onde peticiona a anulação do despacho do Reitor da UP, datado de 31/12/2008, que decidiu aplicar-lhe a pena disciplinar de multa, graduada em € 1.245,75.

* 2 .

No final das suas alegações, o recorrente formulou as seguintes conclusões: "1 - O Recorrente não pode concordar com o acórdão proferido.

2 - Essencialmente por entender que o mesmo, ao manter o ato punitivo impugnado, corrobora uma verdadeira presunção de culpa que marca e qualifica o processo disciplinar em causa.

3 - E porque o mesmo ignora do mesmo passo, o contexto pessoal e institucional em que ocorre o processo e a punição.

4 - As circunstâncias concretas do caso, além de serem por si só relevantes e necessárias no quadro da compreensão da acusação dirigida contra o Recorrente e da subsequente punição, são também relevantes do ponto de vista jurídico, à luz do disposto nos artigos 28° e 33° do Estatuto Disciplinar, na versão aplicável — circunstância que a decisão impugnada ignora por completo e que o acórdão recorrido corrobora.

5 - Os factos suscitados no processo disciplinar decorrem diretamente do contexto institucional, ao nível da FEUP, em que o Recorrente se viu envolvido e provocado, aí assumindo um particular relevo a posição da Direção da Faculdade.

6 - Os factos que foram imputados ao Recorrente na Nota de Culpa não têm, nos autos do processo disciplinar, qualquer consistência.

7 - No que diz respeito à imputação constante dos artigos 1° a 6° da Nota de Culpa, verifica-se que das diligências efetuadas a mesma não resulta minimamente sustentada, ao contrário daquilo que pretende o acórdão recorrido.

8 - Apenas resulta provado que ocorreu uma discussão — o que, manifestamente, não constitui infração disciplinar.

9 - Sendo certo que o dever de correção é seguramente recíproco, pelo que não se entende o tratamento que a esse título a acusação fez do episódio em causa acusando o Recorrente e vitimizando o participante.

10 - O acórdão recorrido, neste aspeto concreto, tolhe o Recorrente com uma verdadeira presunção de culpa.

11 - Não era ao Recorrente que cabia sustentar a sua alegação; era, diversa e inversamente, à acusação que cabia sustentar os factos imputados.

12 - Nada disso sucedeu, uma vez que dos autos não resulta comprovação concreta de tais imputações.

13 - Posteriormente à propositura da presente ação, o Recorrente veio a ser julgado em processo crime, decorrente da queixa apresentada pelo referido Professor G… pelos mesmos precisos factos que aqui estavam em causa, e foi absolvido, por manifesta e absoluta falta de prova (não obstante aí terem sido ouvidos todos os intervenientes invocados pela acusação disciplinar e ainda mais alguns), decisão que foi depois confirmada pelo Tribunal da Relação do Porto.

14 - Também no que diz respeito à imputação constante dos artigos 7° a 11º da Nota de Culpa o Recorrente entende que não existe qualquer fundamento para lhe imputar a prática de uma infração disciplinar, muito menos para o punir por tal.

15 - O dito “caso da porta” só existe, como os autos evidenciam, em consequência da incompatibilidade pessoal existente entre o Recorrente e o Diretor do Departamento de Engenharia de Minas da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto, bem como pela manifesta vontade de punição disciplinar por este alimentada relativamente ao Recorrente.

16 - Resulta dos autos do processo disciplinar que a colocação da porta foi explicada e justificada, colhendo até opinião favorável da pessoa responsável, no caso o Professor M....

17 - Ao contrário daquilo que é entendido pelo acórdão recorrido, foi formalmente autorizada pelo Conselho Executivo da Faculdade — conforme resulta do documento 2 dos autos de processo disciplinar.

18 - Não seria de todo plausível que a colocação da dita porta fosse desconhecida e não autorizada, mas a Direção da Faculdade tivesse autorizado a despesa respetiva.

19 - O acórdão recorrido não define, concretamente, onde reside a existência de infração disciplinar por parte do Recorrente, nem de onde resulta, também em concreto, o dever de obediência, para que se possa imputar ao Recorrente a respetiva violação.

20 - No que diz respeito à acusação constante dos artigos 12° e 13° da Nota de Culpa, verifica-se que o Recorrente foi acusado por ter interpelado uma aluna que vinha sendo mal educada com ele por deliberadamente não o cumprimentar conforme aliás a própria aluna queixosa reconhece.

21 - Com a agravante de, nas circunstâncias de tempo e lugar referidas na Nota de Culpa, também estar a ser mal educada na abordagem impertinente que fez, ao intrometer-se, sem sequer pedir licença, na conversa que o Recorrente estava a ter com o Eng. JG....

22 - Ou seja, o Recorrente foi acusado por ter exercido, não o direito, mas o dever, de educar.

23 - E, numa intolerável inversão de padrões, o que se sustentou com a acusação e agora vem corroborado no acórdão recorrido, foi a atitude da aluna, censurando-se quem tem o dever de educar e quem, na situação em concreto, cumpriu esse dever.

24 - Sendo que, mais uma vez, se tolhe o Recorrente com uma presunção de culpa: a versão da aluna é válida, à partida, cabendo ao Recorrente inverter tal posição.

25 - Não existe, à evidência, qualquer base para tal imputação disciplinar, a qual até se configura como implausível, estando o Recorrente a ser acusado de falta de delicadeza com quem foi mal educada consigo.

26 - E não se pode aceitar que, neste quadro, o acórdão recorrido se sustente não em factos, mas em juízos de (des)valor, para concluir, sem fundamento, que o Recorrente não chamou à atenção a aluna de forma educada.

27 - Do mesmo modo, também não se pode aceitar que a contundência concluída pelo acórdão recorrido, ou a dita “reação tão exagerada”, seja qualificada como infração disciplinar.

28 - Com o que, manifestamente, se banaliza a dignidade disciplinar, e qualquer gargalhada, qualquer discussão ou qualquer veemência passa a poder ser como tal qualificada.

29 - Verifica-se portanto, no ato impugnado e agora no acórdão recorrido uma errada integração jurídica dos factos em causa na previsão da norma que constitui o artigo 23°, alíneas b) e d) do mesmo Estatuto Disciplinar.

30 - Há pois também, no ato impugnado e agora no acórdão recorrido, uma desadequada integração jurídico-disciplinar dos factos de que o Recorrente foi acusado e pelos quais foi punido, em resultado de uma errada e incorreta qualificação jurídica dos factos reais.

31 - O ato impugnado padece efetivamente dos vícios resultantes da falta de fundamentação legal da acusação formulada contra o Recorrente; da falta de fundamentação fáctica e jurídica da mesma acusação; da falta de prova material; de erro no enquadramento jurídico dos factos reais; de erro de integração jurídica dos factos em causa na previsão das normas correspondentes ao artigo 23° do Estatuto Disciplinar.

32 - O acórdão recorrido, ao manter o ato punitivo impugnado, incorre nos mesmos vícios.

33 - O acórdão recorrido viola as normas que constituem os artigos 3°, 23° e 28° do Estatuto Disciplinar aplicável.

34 - O acórdão recorrido é, portanto, anulável, com fundamento nos invocados vícios".

* 3 .

Notificadas as alegações apresentadas pelo recorrente, supra referidas, veio a Universidade do Porto, contra alegar e assim concluiu: " Salvo o muito e devido respeito, 1ª O douto acórdão recorrido não merece qualquer reparo ou censura, fazendo correcta interpretação e subsunção dos factos ao direito, face à prova produzida nos autos.

Com efeito, 2ª Nenhuma ilegalidade pode ser assacada ao processo disciplinar, nem à punição do Autor, 3ª Sendo a mesma justa, adequada e proporcional aos factos provados no âmbito do processo disciplinar, Tanto mais que, 4ª Atenta a sucessão das infracções em tão curto espaço de tempo!...

Vejamos: 5ª Na sequência de três participações escritas (a primeira em 28-09-2007, a segunda em 05-12-2007 e a terceira em 02-01-2008) foi determinada a instauração de um processo disciplinar contra o Autor.

6ª No âmbito do referido processo, foram inquiridas as testemunhas que na perspectiva do Sr. Instrutor do Processo poderiam esclarecer os factos ocorridos em virtude de terem assistido aos mesmos, 7ª Bem como se procedeu à audição do próprio visado no processo disciplinar, 8ª O qual acabou por confessar alguns dos factos pelos quais vinha acusado, 9ª Tendo ainda a Ré, aqui recorrida, junto aos autos do processo disciplinar alguns documentos indiciadores da conduta ilícita do A....

Desde logo, 10ª E no que respeita ao incidente no elevador e no corredor entre o Autor e o Prof. Doutor JG... (factos constantes dos artigos 1º a 6º da Nota de Culpa), sempre se dirá que, 11ª A Ré, ora recorrida, teve o cuidado de ouvir todas as pessoas envolvidos no incidente, seleccionando e dando relevância jurídica aos factos que apenas foram confirmados pelas testemunhas presenciais, 12ª Inexistindo qualquer depoimento a favor da versão do Autor.

13ª Ainda que se admitisse que teria ocorrido apenas uma “mera discussão” (o que só por mera hipótese académica se concede!), sempre a mesma teria sido iniciada de forma despropositada pelo Autor, (Cfr. artº. 1º a 3º da nota de culpa) 14ª Não sendo de aceitar ou de compreender os seus modos em tão ilustre meio académico, Pelo que, 15ª O Autor não usou de correcção para com um colega, incorrendo em ilícito disciplinar.

16ª No que respeita ao incidente da porta (factos constantes dos artigos 7º a 11º da Nota de Culpa), sempre se dirá que, 17ª O Autor, no seu auto de declarações, não apresentou qualquer justificação...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT