Acórdão nº 02260/04.9BEPRT-A de Tribunal Central Administrativo Norte, 14 de Junho de 2013

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Apar
Data da Resolução14 de Junho de 2013
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO A... e mulher M... intentaram, por apenso a acção administrativa especial, acção executiva contra o Município da Póvoa de Varzim, todos melhor identificados nos autos, peticionando a execução do julgado que deve consistir na demolição da parte da habitação unifamiliar erigida no lote 11 do alvará de loteamento nº 2/02, de 25/01, na parte em que exceder 3 (três) metros de altura medidos relativamente ao lote dos Exequentes. Requereram ainda que se ordene “...a penhora de 1/3 do vencimento do 2° Executado (Sr. Presidente da Câmara), quantia essa que ascende na presente data a € 28.665,00 (vinte e oito mil seiscentos e sessenta e cinco euros), bem como a quantia vincenda, que a esse título se apurar até cumprimento integral da presente Execução de Sentença...”.

Por decisão proferida pelo TAF do Porto foi julgado assim: condeno” o Município da Póvoa de Varzim a desenvolver todos os actos necessários à realização da demolição da obra em causa que deverá ocorrer dentro do prazo de 3 meses, sob pena de condenação do titular do órgão incumbido da execução, isto é, o Senhor Presidente da Câmara Municipal da Póvoa do Varzim, no pagamento de uma quantia pecuniária por cada dia de atraso em relação ao prazo fixado, em montante diário a fixar nos termos estabelecidos no nº 2 do artº 169º do CPTA.” Desta sentença vem interposto recurso pelo Município que, em alegação, concluiu assim: I – A decisão recorrida considerou que o aqui Recorrente não deu cumprimento ao acórdão exequendo, em virtude de, ao licenciar a alteração ao alvará de loteamento n.º 2/02, incidente sobre o lote 11, e subsequentemente licenciar a construção com um recuo de 0,04m a partir da linha de meação entre os dois prédios, ter desrespeitado os termos em que foi proferido o julgado.

II – Salvaguardado o devido respeito pelo entendimento nela vertido, não pode, contudo, o ora Recorrente conformar-se com tal decisão.

III - Conforme inequivocamente resulta do disposto no n.º 1 do artigo 173º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, e a própria sentença recorrida salvaguarda, a execução de sentenças de anulação de actos administrativos pode consistir na prática de novo acto administrativo.

IV – Em qualquer caso, a execução da demolição não constitui actuação necessária/obrigatória em sede de reconstituição da situação que existiria se o acto declarado nulo não tivesse sido praticado, não podendo a demolição ser determinada se for possível assegurar a conformidade da obra com as disposições legais e regulamentares aplicáveis - artigo 106º, n.º 1 e n.º 2, do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro.

V – Conforme defendido por doutrina e jurisprudência firmes e constantes, o exercício administrativo do poder de demolição está condicionado pelo necessário respeito do princípio da proporcionalidade, constitucionalmente consagrado, que impõe que a demolição só se possa materializar após verificação prévia das possibilidades de conformação da obra não licenciada com os cânones da legalidade urbanística e apenas na hipótese de se concluir pela total inviabilidade da respectiva legalização – lógica do menor sacrifício dos particulares, erigindo-se a demolição em ultima ratio.

VI - No caso, em estrito cumprimento do apontado procedimento devido, e em face, por um lado, da alteração ao alvará de loteamento e, por outro lado, das modificações introduzidas na edificação pelo respectivo proprietário - demolição de parte da edificação -, veio a ser tecnicamente concluído que a construção erigida no lote 11 passou a estar conforme “às disposições legais e regulamentares que lhe são aplicáveis”, pelo que, em cumprimento do disposto no referido artigo 106º do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro, foi pelo Presidente da Câmara produzido acto de licenciamento (legalização) da moradia unifamiliar em referência.

VII – Com o licenciamento da alteração ao alvará de loteamento n.º 2/02 e o licenciamento da construção alterada, foi reposta a legalidade urbanística: a habitação unifamiliar erigida no lote 11, com as alterações introduzidas, encontra-se devidamente licenciada; nos termos das alterações licenciadas, não está limitada a utilização do terreno dos Exequentes, ora Recorridos, não lhes sendo imposto, como antes sucedia, uma construção geminada – não se verifica, por isso, qualquer violação do direito de edificar dos ora Recorridos.

VIII - A decisão recorrida considerou que o aqui Recorrente não deu cumprimento ao acórdão exequendo, proferido nos autos principais, em virtude de, ao praticar os identificados actos de licenciamento, alegadamente ter desrespeitado os termos em que foi proferido o julgado.

IX – Conforme expressamente feito constar do acórdão em execução, aquilo a que o ora Recorrente ficou obrigado foi a “praticar todos os actos necessários, jurídicos e materiais, de modo a remover a situação ilegal criada com os seus actos de licenciamento e que passará pela remoção da construção licenciada na parte em que viola o PDM”.

X – O que o artigo 13º do Regulamento do Plano Director Municipal da Póvoa de Varzim, ratificado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 91/95, de 22 de Setembro, estabelece é que “nenhuma construção nova ou alteração da cota de logradouros poderá criar alturas de meação superiores a 3 m, medidos relativamente aos lotes vizinhos e sempre de acordo com a legislação em vigor”.

XI – O parâmetro “alturas de meação”, estabelecido no preceito em referência, pressupõe a implantação da empena na estrema da parcela ou lote, ou seja, na meação.

XII – Sempre que haja um afastamento da empena, ainda que mínimo, relativamente à linha de meação com o prédio vizinho, já não estará em causa o referido parâmetro “alturas de meação”, ou seja, o âmbito de aplicação do referido artigo 13º do Regulamento do PDM e da proibição nele contida.

XIII – Na decisão aqui em crise, a senhora juíza afirma que tem como certo que “o recuo de 0,04m (…) não dá cumprimento ao acórdão exequendo”, sem que, contudo, tenha adiantado quaisquer fundamentos para tal conclusão e sem que, pois, de todo, se consiga perceber qual o critério considerado e aplicado.

XIV – Não se ignora que a interpretação do artigo 13º do Regulamento do PDM é geradora de muitas dúvidas, conforme ressalta da análise dos relatórios dos Senhores Peritos designados nos presentes autos, mas o ora Recorrente teve de apreciar e decidir a pretensão urbanística que lhe foi apresentada pelo proprietário da edificação – função de que não se pode demitir -, e fê-lo devidamente suportado pela competente informação técnica, na qual foi concluído que “a alteração introduzida, embora mínima, permite assegurar um remate definitivo para o conjunto urbano edificado, sendo que, em todo o caso, também não compromete nem condiciona qualquer solução que eventualmente venha a desenhar-se para o terreno confrontante” e que “não se verificam desconformidades com as normas legais e regulamentares aplicáveis, designadamente o PDM, assim como se considera que, do ponto de vista da inserção urbana, a implantação proposta para o edifício se insere de forma adequada no ambiente urbano existente”.

XV – Impõe-se, em suma, concluir que, com o licenciamento da alteração ao alvará de loteamento n.º 2/02, incidente sobre o lote 11, e o licenciamento da construção alterada, em conformidade com aquela alteração da licença de loteamento, foi assegurada a reposição da legalidade urbanística e, por conseguinte, dada integral execução ao acórdão exequendo, tendo-se extinguido o dever de executar que dele decorria para o ora Recorrente.

XVI – Assim, ao decidir como decidiu, a decisão recorrida incorreu em erro de interpretação dos factos e em erro de interpretação e aplicação da lei, designadamente do disposto no artigo 106º do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro, e no artigo 13º do Regulamento do Plano Director Municipal da Póvoa de Varzim, bem como do disposto no artigo 173º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

TERMOS EM QUE deve ser concedido provimento ao presente recurso, assim se fazendo JUSTIÇA! Os Exequentes/Recorridos juntaram contra-alegação, concluindo que: I. A Recorrente deita mão do presente recurso apenas e só como mero expediente dilatório, isto é, ganhar tempo com o único intuito de desgastar os agora recorridos, bem como este tribunal e a todos que este processo envolve.

  1. A Recorrente, desde o início deste longo e famigerado processo não tem feito outra coisa senão a de se furtar à reposição da legalidade, quando deveria esta dar o exemplo aos seus munícipes.

  2. Pode-se verificar do acórdão proferido pelo TCA Norte em 06 de Dezembro de 2007, que este acautela os direitos de todos os intervenientes de forma justa e imparcial.

  3. Pois esta construção que se pretende que seja demolida foi erigida apenas e só por culpa exclusiva do Município ora Recorrente e de todos os seus órgãos, que se julgaram acima da Lei.

  4. Portanto não se aplica o alegado pela Recorrente referindo-se nas suas Alegações de Recurso à “lógica do menor sacrifício dos particulares, erigindo-se a demolição em ultima ratio”.

  5. Pois não estaríamos perante a solução drástica (ultima ratio) de demolição se o Município e os seus órgãos tivessem ab initio cumprido o PDM do seu próprio Município.

  6. Os Recorridos deitaram mão, logo que tiveram conhecimento, de todos os meios para obstar à referida construção, que agora deve ser demolida.

  7. A Recorrente não tem qualquer legitimidade para em sede de Alegações de Recurso vir apelar ao menor sacrifício dos particulares, pois foi esta que os colocou nesta situação desvalorizando as consequências dos seus actos (ilegais) e sacrificando-os, precisamente.

  8. Os recorrentes identificam duas sub-questões que no seu entender violariam os seus direitos individuais e concretos à construção de uma moradia no seu terreno e que se encontram intimamente ligadas.

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