Acórdão nº 08816/12 de Tribunal Central Administrativo Sul, 06 de Junho de 2013

Magistrado ResponsávelANA CELESTE CARVALHO
Data da Resolução06 de Junho de 2013
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I.

RELATÓRIO A Conservatória dos Registos Centrais, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, datada de 07/06/2011 que, no âmbito da ação administrativa especial instaurada por Ivan .....................

, julgou a ação procedente, anulando o acto datado de 01/09/2009, de indeferimento do pedido de naturalização do autor e de condenação da entidade demandada a conceder a nacionalidade portuguesa ao autor, por naturalização, por verificação cumulativa dos requisitos previstos no artº 6º, nº 1, alíneas a), c), d) e nº 4 da Lei da Nacionalidade.

* Formula a aqui recorrente nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem: “1 - Tendo o registo de nascimento de Rodrigo ................. sido lavrado na Guiné-Bissau, no ano de 1981, isto é, após a data da independência daquele território - ocorrida em 10.09.1974 - é nítido que constitui um acto de registo civil estrangeiro, aplicando-se, inteiramente, e por esta razão, o disposto na Lei da Nacionalidade, conforme expressamente resulta do parecer da Procuradoria-Geral da República n°. 152/76, de 27 de Janeiro de 1977, publicado no Boletim do Ministério da Justiça nº. 274.

2 - Nunca se poderia admitir que, sendo o ascendente de 2º grau do requerente um nacional português, lhe pudesse ser atribuída a paternidade constante de um registo de nascimento lavrado no estrangeiro - sem a sua intervenção - em reforma de um acto de registo civil ultramarino.

3 - Com efeito, por força do disposto no artigo 56°, nº 1 do Código Civil, à constituição da filiação é aplicável a lei pessoal do progenitor, à data do estabelecimento dessa relação, pelo que é face à lei portuguesa que terá de ser aferido se a filiação de Rodrigo ..................... se encontra regularmente estabelecida, relativamente ao nacional português Alírio .........................

4 - Ora, de acordo com o disposto no artigo 1847° do Código Civil, o reconhecimento do filho nascido fora do matrimónio só pode efectuar-se por perfilhação ou decisão judicial em acção de investigação.

5 - Por outro lado, o estabelecimento da filiação na menoridade, mais do que um requisito, constitui um princípio basilar da Lei da Nacionalidade, o qual se encontra previsto no seu artigo 14º, preceito que tem inserção sistemática no Capítulo VI , sob a epígrafe “Disposições Gerais”, pelo que tem inteira aplicação a toda e qualquer situação de aquisição da nacionalidade - quer originária, quer derivada - desde que se funde numa relação de filiação, e visa precisamente impedir que seja dada relevância a reconhecimentos fraudulentos.

6 - O artigo 6º, nº 4 da LN tem subjacente uma dupla relação de filiação, pelo que, quer a filiação do requerente, quer a do seu progenitor, este último descendente directo do nacional português originário, têm de se mostrar estabelecidas na menoridade para poderem conferir o direito - pois que de um direito se trata - à naturalização como nacional português.

7 - Daí que todo aquele que, ao abrigo do disposto no nº 4 do artigo 6° da LN, requeira a aquisição da nacionalidade portuguesa, por naturalização, além da certidão do seu registo de nascimento, deve apresentar certidão do registo de nascimento do seu progenitor que for descendente do nacional português - cfr. alíneas a) e b) do nº 2 do artigo 22º do RN - a fim de se aferir se foi regularmente estabelecida a filiação entre o progenitor do requerente e o seu ascendente directo, de nacionalidade portuguesa, e na respectiva menoridade.

8 - Este entendimento encontra-se em perfeita consonância com a douta sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, em 30 de Maio de 2011, (Proc.nº 854/09.5BELSB) onde se julgou improcedente a acção, precisamente porque se não demonstrou ter sido estabelecida a filiação entre o ascendente de 1º grau e o ascendente de 2º grau, durante a menoridade do primeiro.

9 - Logo, no caso em apreço, tendo o registo de nascimento do pai do requerente sido lavrado na maioridade do seu titular, ainda que a filiação paterna dele constante se pudesse considerar regularmente estabelecida face à lei portuguesa - o que, como se disse, não acontece - sempre a mesma seria irrelevante, em matéria de nacionalidade, por força do disposto no artigo 14º da LN.

10 - A douta sentença recorrida enferma de manifesta incongruência quando sanciona o entendimento de que o artigo 14° da LN apenas tem aplicação à relação de filiação entre o requerente e seu pai - sendo ambos nacionais estrangeiros - mas já não releva para o estabelecimento da filiação do pai do requerente relativamente ao seu ascendente directo, este sim de nacionalidade portuguesa.”.

Termina pedindo a revogação da sentença recorrida.

* O recorrido não apresentou contra-alegações.

* O Ministério Público junto deste Tribunal notificado nos termos e para efeitos do disposto no artº 146º do CPTA, emitiu parecer no sentido da procedência do recurso, revogando-se a sentença recorrida e substituindo-se por outra que mantenha o acto impugnado.

* A Conservatória dos Registos Centrais pronunciou-se sobre o parecer emitido pelo Ministério Público, aderindo à sua fundamentação.

* Colhidos os vistos legais foi o processo submetido à conferência para julgamento.

II.

DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir a questão colocada pelo recorrente, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos arts. 660º, n.º 2, 664º, 684º, nºs 3 e 4 e 690º, n.º 1, todos do CPC ex vi artº 140º do CPTA.

A questão suscitada resume-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida enferma de erro de julgamento de Direito, quanto à interpretação e aplicação dos artºs. 6º, nº 4º e 14º da Lei da Nacionalidade, aprovada pela Lei nº 37/81, de 03/10, na redacção da Lei Orgânica nº 2/2006, de 17/04.

III.

FUNDAMENTOS DE FACTO O Tribunal a quo deu como assentes os seguintes factos: “A) A 3.7.2007, o Autor apresentou junto da Conservatória dos Registos Centrais o requerimento para concessão da nacionalidade portuguesa, por naturalização, com fundamento no facto de ter um ascendente do 2º grau da...

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