Acórdão nº 01782/06 de Tribunal Central Administrativo Sul, 09 de Outubro de 2008

Magistrado ResponsávelJosé Correia
Data da Resolução09 de Outubro de 2008
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

35 Recurso nº 1782/06ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA 1ª SECÇÃO DO 2º JUÍZO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL I- RELATÓRIO A JUNTA DE FREGUESIA DE SÃO ...

(Setúbal), Ré na "acção administrativa especial de pretensão conexa com actos administrativos", contra ela interposta por HELENA ...

, veio interpor recurso de apelação do acórdão proferido pelo do TAF de Almada em 27-04-2006, a fls 360/400, que julgou a acção procedente e, em consequência, anulou a sanção de aposentação compulsiva aplicada à Autora no âmbito do processo disciplinar nº 01/2003JFSS-CJ, pedindo que a decisão judicial recorrida seja alterada na parte em que merece censura e substituída por outra que, reconhecendo o direito, a legitimidade e posição da Junta de Freguesia de São ..., mantenha aquela sanção disciplinar aplicada à ora Recorrida.

Nas suas alegações de recurso formula as seguintes conclusões: "Não é o facto de terem sido admitidos e do conhecimento dos anteriores executivos (que eram todos os mesmos), que perde relevância a censurabilidade dos factos praticados pela autora, como ganhando justificação e legitimidade, condicionando-se assim, a actuação dos actuais responsáveis pelo executivo da junta de freguesia (...) Além disso, basicamente, trata-se da violação de normas legais aplicáveis, entre as quais o POCAL, de nada importando a relevância dada ao vício formal de um regulamento dos muitos em vigor na junta de freguesia.

Assim: 1. Os factos praticados pela autora eram censuráveis e não foram nem consentidos nem autorizados pelos seus superiores hierárquicos, actual executivo; 2.

A ilicitude e infracções da autora não se resumem a um regulamento cuja norma habilitante não vem mencionada, antes resultam da violação de disposições legais e regulamentares em vigor e válidas".

A Recorrida contra-alegou, sustentando que o acórdão deve ser mantido, em síntese porque: - A Recorrente conduziu a sua alegação de recurso, considerando como factos assentes com relevância, os "factos" alegadamente assentes (ou considerados assentes) no relatório final do instrutor do processo disciplinar, em vez de apreciar os factos que foram dados por assentes na decisão judicial recorrida, ou seja, que foi elaborada uma Nota de Culpa cujo teor reproduz no ponto 18° e que foi elaborado um relatório final cujo teor reproduz no ponto 19°; - A Recorrente, quanto à questão da nulidade do regulamento cuja violação foi imputada à ora Recorrida na Nota de Culpa, deu por reproduzida, na sua alegação, como matéria de facto assente, aquela que é considerada como tal no relatório final do instrutor, que não coincide com a matéria de facto considerada assente na sentença impugnada, que apenas apurou que o regulamento dos mercados invocado pela Ré naquele relatório final (v. fls. 13 do douto Acórdão) não refere qualquer norma habilitante; - Tendo constituído fundamento da aplicação das duas sanções (pena de inactividade e pena de demissão), de acordo com o texto de fls 17 do citado relatório final, "...

que a arguida nem sequer entregou as receitas ... até ao dia 8 de cada mês, pelo que não se consegue provar se os feirantes pagaram atempadamente " e que "Em consequência a arguida violava o disposto no art. 9° n° 1 do Regulamento dos Mercados de Venda Ambulante Fixa ", uma vez que tal regulamento, por não referir a norma habilitante, é nulo, "não se verifica qualquer violação de normas que, por efeito da nulidade, são inexistentes", pelo que a sentença só podia anular a pena disciplinar aplicada à Autora; - Sendo a Junta de Freguesia o órgão executivo da respectiva Freguesia, ela é sempre a responsável, independentemente de quem sejam os seus Presidente e vogais, pelo que, tendo ficado provado que os comportamentos da Autora eram autorizados ou, pelo menos consentidos pelo executivo da Freguesia em anteriores mandatos, tal circunstância vincula os executivos posteriores se não inverterem o procedimento.

A Exmª Magistrada do M° P° junto deste Tribunal, ao abrigo do nº 1 do art. 146° do CPTA, emitiu douto parecer sobre o mérito do presente recurso, no sentido da sua improcedência e de que a decisão judicial de anulação do acto impugnado se deve manter, embora com a seguinte fundamentação: «I- (...) Nas conclusões das suas alegações a R., ora recorrente, afigura-se pretender imputar à sentença recorrida erro de julgamento, por o facto de serem conhecidos e consentidos pelo anterior executivo da Junta de Freguesia não retirar a censurabilidade da actuação da A. e a ilicitude e infracções da sua conduta não se resumirem a um regulamento, cuja norma habilitante não vem mencionada, mas antes resultarem da violação de disposições legais e regulamentares em vigor e válidas.

II (...) III- No acórdão recorrido foi decidido anular o acto que aplicou à arguida, A., a pena disciplinar de aposentação compulsiva, com fundamento em que a sua conduta não merecia censura, quer face aos factos dados como provados nos pontos 15° a 17° da matéria factual assente, ou seja, o conhecimento da prática dos actos em causa pelo anterior executivo que os admitia e de ser a prática seguida em outros mandatos, quer porque lhe atribui a infracção de um regulamento (regulamento dos mercados de venda ambulante fixa) formalmente inconstitucional (ponto 22° do probatório).

Conforme se constata no ponto 18° da matéria assente, na "nota de culpa" são imputados à arguida vários factos integrantes de infracções disciplinares, que não só aqueles a que respeita o conhecimento e consentimento pelo anterior executivo e que já eram prática de anteriores executivos.

Designadamente são-lhe imputados ainda os factos referidos nos arts 1° a 8° da nota de culpa, reportados à não observação do Dec-Regulamentar n° 92-C/84 de 28/12 e ao PROCAL (aprovado pelo Dec. Lei n° 54-A/99 de 22/02) e nos arts 25° a 29° e 31° a 34°, subsumíveis às infracções ao DL n° 24/84, referidas na mesma nota de culpa.

Nos termos do n° l do art. 3° do DL n° 24/84 de 16/01 «Considera-se infracção disciplinar o facto, ainda que meramente culposo, praticado pelo funcionário ou agente em violação de algum dos deveres gerais ou especiais decorrentes da função que exerce».

A exclusão da responsabilidade disciplinar apenas tem lugar no caso previsto no n° l do art. 10° do mesmo diploma legal, isto é, quando o funcionário ou agente actue no cumprimento de ordens ou instruções emanadas de legítimo superior hierárquico e em matéria de serviço, se previamente delas tiver reclamado ou tiver exigido a sua transmissão ou confirmação por escrito.

Sendo, por sua vez, circunstâncias dirimentes da responsabilidade disciplinar, ou seja, causas da exclusão da ilicitude e da culpa, as descritas no art. 32° do citado Dec-Lei.

Acontece que, o conhecimento e consentimento pelo anterior executivo da conduta da arguida refere-se tão-só, conforme resulta da prova produzida (pontos 15° a 17° da matéria factual assente) à prática reiterada do recebimento de cheques pré-datados e cobrança de taxas junto dos feirantes, sem cobrança de juros.

Ora, tal conhecimento e consentimento pode, em nosso entender, efectivamente, excluir a culpa da arguida, pela não exigibilidade de outro comportamento (al. d) do art. 32°), isto é, reuniram-se circunstâncias externas que «arrastam irresistivelmente o agente para a prática do facto, roubando-lhe toda a possibilidade de se comportar diferentemente»- cfr. Leal Henriques, in "Procedimento Disciplinar" e em anotação ao art. 32° do DL 24/84 - ou por falta de consciência da respectiva ilicitude, isto é, embora sabendo que a cobrança deveria ser feita na tesouraria, convenceu-se que perante o consentimento, ainda que tácito, do Presidente e do Tesoureiro do mandato anterior e por ser já prática seguida em anteriores mandatos, tal conduta lhe passou a ser lícita, o que parece resultar da sua afirmação "...

é melhor ter o cheque na mão do que não receber o dinheiro"- de acordo com o mesmo autor e anotação ao art.

  1. na obra citada «a enumeração constante do artigo tem carácter exemplificativo ou indicativo, pelo que será legítimo acrescentar a este rol outras mais circunstâncias que porventura possam ter os mesmos efeitos».

    E, mesmo que assim não se entendesse, sempre haveria de considerar diminuída em grande parte a sua culpa, sendo certo que, apesar disso, no relatório final, como na sentença se refere, a esses factos (constantes dos pontos 15° a 17° do probatório) relatados pelas testemunhas arroladas pela arguida, A., não lhes é feita qualquer referência.

    Todavia, o acórdão recorrido ao decidir que a "conduta" da arguida "não merece censura", embora sem fundamentação de direito de acordo com o atrás exarado, acabou por abranger nessa mesma não censurabilidade todas as restantes infracções que lhe foram imputadas na nota de culpa e relatório final, que não só àquelas de que se provou haver conhecimento e consentimento pelos anteriores executivos, o mesmo se dizendo relativamente ao regulamento, cuja inconstitucionalidade formal foi considerada, não se atendendo aos restantes diplomas mencionados na acusação.

    Acontece, porém, que compulsada a nota de culpa deduzida contra a arguida, verificamos estar perante a nulidade insuprível a que se reporta o disposto no n° l do art. 42° do DL n° 24/84, de conhecimento oficioso.

    Com efeito, conforme é jurisprudência unânime e o Conselheiro Leal Henriques o ensina na obra já citada "a acusação tem de ser formulada através da articulação de factos concretos e precisos, sem imputações vagas, genéricas ou abstractas, devendo enunciar as circunstâncias conhecidas de modo, lugar e tempo e as infracções disciplinares que deles derivem, correspondendo a generalidade da acusação à falta de audiência do arguido, geradora de nulidade insuprível".

    No caso em apreço, e mostrando-se provado que a arguida durante 23 anos que desempenhou funções na Junta em questão, exerceu nela várias funções e cargos ao longo desses anos, a acusação não especifica nos seus arts. 1° e 2° em quais das funções...

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