Acórdão nº 08574/12 de Tribunal Central Administrativo Sul, 11 de Abril de 2013

Magistrado ResponsávelPAULO CARVALHO
Data da Resolução11 de Abril de 2013
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Recorrente: Município de ……...

Recorrido: Águas do Zêzere e Coa, S. A..

Vem o presente recurso interposto da Sentença proferida nestes autos que decidiu: “O tribunal decide, julgar totalmente procedente a ação, pelo que : - condena o réu a pagar à autora a quantia de 182.339,30 € (cento e oitenta e dois mil e trezentos e trinta e nove euros e trinta cêntimos), acrescida de juros moratórios vencidos e vincendos, à taxa dos juros comerciais, desde o vencimento (como assinalado supra), até efetivo e integral pagamento; - absolve a autora da instância quanto ao que vem em reconvenção.” Foram as seguintes as conclusões do recorrente: 1) Vem o presente recurso interposto da, aliás, douta sentença e à qual o recorrente/município imputa vários vícios de deficiente interpretação das norma jurídicas, in casu, aplicáveis; 2) O recorrente na sua contestação apresentou defesa por exceção e deduziu pedido reconvencional baseado no facto de o contrato de concessão não abranger a água de nascente da denominada “Fonte Paulo …………….”.

3) A água de nascente da “Fonte Paulo …………….” é quanto à sua qualificação jurídica uma água do domínio privado do município recorrente pelo que não está afeta ao contrato concessão, celebrado entre o recorrente e recorrida, que só abrange, pela via da figura jurídica da afetação, o domínio público dos municípios utilizadores. Cfr - artigos 98º nº 1 e 2º nº 2 da Lei da Água (Lei nº 58/2005), e da alínea b) do nº 3 do artigo 1º do DL 90/90 de 18 de março que se encontra plenamente em vigor.

4) O tribunal recorrido errou na qualificação jurídica da água de nascente ao considerá-la como água do domínio público municipal e assim, deste, modo impediu o prosseguimento do processo, mediante a elaboração da base instrutória, para conhecer da factualidade alegada, em sede de contestação e de reconvenção.

5) O regime jurídico de acesso ao direito e aos tribunais não abrange as pessoas coletivas públicas e só se aplica aos tribunais estaduais não sendo extensível aos tribunais arbitrais. Cfr artigo 8º e 17º nº 1 da Lei nº 47/2007 de 28 de agosto.

6) O município recorrente na sua tréplica circunstanciou detalhadamente (através da junção de documentos cuja idoneidade é inquestionável), a sua incapacidade económico-financeira superveniente que não lhe permite cumprir, sem culpa sua, a convenção arbitral pelo que não pode o tribunal “a quo” negar o acesso ao direito e aos tribunais estaduais para dirimir o presente conflito que opõe o recorrente e recorrida.

7) As “taxas” de recursos hídricos não são juridicamente taxas, mas, isso sim, contribuição especial de financiamento de serviço público.

8) Enquanto contribuições financeiras estão sujeitas ao princípio da legalidade da administração (existência prévia de lei habilitante) e ainda a um princípio da legalidade tributária reforçada, traduzido na reserva de competência legislativa do parlamento para determinação do regime geral (lei-quadro) destes tributos. Ex. vi. artigo 165º nº 1 alínea i) da CRP.

9) A inexistência de lei-quadro ou um regime legal de lei emitida pela assembleia da república determina a inconstitucionalidade orgânica das taxas de recursos hídricos.

10) A douta sentença recorrida, violou, por deficiente interpretação: os artigos 2º nº 2 e 98º nº 1 da lei da Água (lei nº 58/2005) e a alínea b) do nº 3 do artigo 1º do DL 90/90 de 18 de março e os artigos 274º nº 2, alínea a), 487º nº 2, 501º nº 1 e 510º e ss do CPC, in casu, aplicável, por força do preceituado no artigo 1º do CPTA; o artigo 8º e 17º nº 1 da lei nº 47/2007 de 28 de agosto e o artigo 20º da CRP; o artigo 165º nº 1 alínea i) da CRP.

Foram as seguintes as conclusões do recorrido: I. No que concerne à questão da Fonte Paulo …………, que, segundo invoca, agora, o Recorrente, foi objeto de defesa por exceção, entende este que, relativamente ao pagamento do serviço de abastecimento de água reclamada pela Recorrida, deveria ser descontado o valor das notas de débito identificadas na contestação, uma vez que nas faturas peticionadas na presente lide se incluiria água de nascente da fonte “Paulo ……….”, para abastecimento de água de consumo doméstico dos munícipes, pertencente ao domínio privado do Recorrente, água de nascente relativamente à qual o Município tem licença de estabelecimento para exploração que terá cedido a terceiro, garantindo, nos termos do contratado, a divisão da água entre esse terceiro e o próprio Município.

  1. O Tribunal recorrido sufragou o entendimento de que o” (…) direito oposto não pode ser reconhecido, nos termos em que vem, conquanto, ao contrário do que o réu sustenta, a água em questão não cabe no seu domínio privado. Antes pertence ao domínio público - art.º 7º, a), da Lei nº 54/2005, de 15/11 (Estabelece a titularidade dos recursos hídricos). Estando atribuída a exploração e gestão - serviço público atribuído em exclusivo -, à concessionária do sistema multimunicipal, no caso à autora - artºs. 3º, nº 1, e 3º-A, do DL nº 379/93, arts.º 2º, nº 1, e 3º do DL nº 319/94, artºs. 2º, nº 1 e 3º, nº 1, do DL nº 162/96, DL nº 121/2000, de 04/07. “ – o sublinhado e destacado é nosso -.

  2. A questão da água da Fonte Paulo …………. não caber no domínio privado do Recorrente, por pertencer antes ao domínio público, já foi decidida no despacho saneador, transitado em julgado em 23/11/2011, proferido no âmbito do processo nº199/10.8 BECTB que correu termos, entre a aqui AUTORA e o aqui RÉU, pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, onde foi decidido que o ”(…) direito oposto não pode ser reconhecido, conquanto, ao contrário do que o réu sustenta, a água em questão não cabe no seu domínio privado. Antes pertence ao domínio público - art.º 7º, a), da Lei nº 54/2005, de 15/11 (Estabelece a titularidade dos recursos hídricos). Estando atribuída a exploração e gestão – serviço público atribuído em exclusivo -, à concessionária do sistema multimunicipal, no caso à autora (…) cujo aditamento (de 18/05/2001) (…) ao contrato de concessão até faz expressa menção à captação de água na Fonte Paulo ……….”, conforme despacho que se junta com nota de trânsito (DOC. 1), o qual já se encontra junto à réplica, mas sem tal menção – Cfr. DOC. 5 –, uma vez que, à data da apresentação deste articulado, tal despacho ainda não havia transitado em julgado - o sublinhado e destacado é nosso -.

  3. O instituto do caso julgado encerra em si duas vertentes, que, embora distintas, se complementam: uma, de natureza positiva, quando faz valer a sua força e autoridade, que se traduz na exequibilidade das decisões; a outra, de natureza negativa, quando impede que a mesma causa seja novamente apreciada pelo mesmo ou por outro tribunal – Cfr. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Vol. III, pág. 93. - V.

    “A autoridade de caso julgado importa a aceitação de uma decisão proferida em ação anterior, que se insere, quanto ao seu objeto, no objeto da segunda, visando obstar a que a relação ou situação jurídica material definida por uma sentença possa ser validamente definida de modo diverso por outra sentença, não sendo exigível a coexistência da tríplice identidade, prevista no art.498 do Código de Processo Civil”” – Cfr. Ac. da R.C., de 28.09.2010, tirado no processo nº 392/09.6TBCVL.C1 -.

  4. Ora, no caso em apreço, constata-se que o Tribunal recorrido já decidiu, a favor da Recorrida, por despacho saneador transitado em julgado, proferido na ação nº 199/10.8 BECTB, que a água em questão não cabe no seu domínio privado do recorrente, antes pertence ao domínio público - art.º 7º, a), da Lei nº 54/2005, de 15/11 (Estabelece a titularidade dos recursos hídricos), estando atribuída a exploração e gestão – serviço público atribuído em exclusivo -, à concessionária do sistema multimunicipal, no caso à Recorrida, não podendo, por conseguinte, voltar a ser discutido nesta ação que a água da Fonte Paulo ……………. é do domínio privado do Recorrente, uma vez que aquela decisão impõe-se nesta ação, sob pena de contradição entre julgados sobre a mesma questão, pondo em causa o princípio da certeza jurídica que está subjacente ao caso julgado.

  5. A extensão do caso julgado abrange não só os fundamentos invocados pelo autor, mas também os meios de defesa invocados pelo réu, as exceções invocadas e as que poderia ter invocado e não invocou, pois toda a defesa deve ser deduzida na contestação, sob pena de preclusão (nº 1 do artº 489º do CPC), contra o pedido deduzido.

  6. Repare-se, aliás, que o efeito útil visado pelo Recorrente, ao pretender que a Recorrida seja condenada a reconhecer que a água da fonte “Paulo ………..” está excluída do contrato de concessão, é, sem dúvida, pôr em causa a sua dominialidade pública e que a exploração e gestão da mesma não está atribuída à Recorrida, o que já foi, definitivamente, fixado e assente na ação nº 199/10.8BECTB.

  7. É que, com a prolação do despacho saneador proferido na ação nº 199/10.8 BECTB, com ele precludiram as exceções, invocadas ou invocáveis, não podendo o Recorrente vir sustentar que a água da fonte “Paulo …………..” está excluída do contrato de concessão com base em factos anteriores ou contemporâneos à celebração do aditamento ao contrato de concessão e, como tal, anteriores à referida ação, podendo e devendo ali ter sido invocados.

  8. O sucesso da tese sufragada, quer na contestação quer na reconvenção, quanto à água da fonte “Paulo ………… e o efeito útil através dela prosseguido pelo Recorrente, só será alcançado se o mesmo abalar os fundamentos em que se estribou a decisão proferida na ação nº 199/10.8 BECTB, pois que, através do pedido reconvencional formulado, nada mais pretende o Recorrente do que discutir de novo a matéria já definitivamente resolvida, visando, assim, a obtenção de decisão diversa da anteriormente proferida, anulando os seus efeitos, o que equivaleria, na prática, a ser admissível a própria anulação do efeito da autoridade do caso julgado material, resultado que a lei não permite.

  9. Logo, se o Tribunal ad quem, embora não o devendo...

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