Acórdão nº 00100/10.9BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Apar
Data da Resolução19 de Outubro de 2012
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em Conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO No âmbito da acção administrativa comum, com processo ordinário, que a HA. … - Construções Centro, Lda., move ao Município da Figueira da Foz, ambos já melhor identificados, foi proferido, em 12/03/2012, despacho saneador pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, onde, além do mais, foi julgada procedente a excepção da prescrição do direito indemnizatório da Autora ao abrigo do regime da responsabilidade civil extracontratual das entidades públicas, prosseguindo os autos com a fixação da base instrutória.

Deste despacho, na parte em que desatendeu a falada excepção, vem interposto o presente recurso.

Na alegação a recorrente concluiu assim: 1ª O entendimento e decisão do Tribunal recorrido não podem vingar na Ordem Jurídica, desde logo por se confundirem os requisitos legais de que depende, por um lado, a impugnação contenciosa dos actos administrativos e, por outro lado, a acção/pedido indemnizatórios que aqui se pretendem fazer valer.

  1. A única questão jurídica a abordar e decidir no presente recurso consiste em determinar o momento a partir do qual se iniciou o prazo prescricional de 3 anos previsto no art. 498º do CC, para o exercício legal do direito indemnizatório da Autora ao abrigo do regime jurídico da responsabilidade civil extracontratual dos entes públicos, podendo desde já adiantar-se que apenas o entendimento/tese defendida pela Recorrente respeita o Direito aplicável e salvaguarda, de pleno, o direito constitucional a uma tutela jurisdicional efectiva (art. 20º da Constituição).

  2. Ao contrário do que entendeu o Tribunal recorrido, aquele prazo prescricional de 3 anos apenas se iniciou na data do trânsito em julgado do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 10.02.2010, notificado às partes por Ofício de 12.02.2010, que confirmou a decisão de anulação do acto do Senhor Vice-Presidente da Câmara Municipal da Figueira da Foz de 25.09.2000, que determinou a posse administrativa do terreno sub judice para a demolição coerciva do ‘edifício’.

  3. É o próprio Recorrido a admitir no art. 17º da sua Contestação que os danos sofridos pela Recorrente apenas se materializaram/produziram na sua esfera jurídica com a prática do acto administrativo que determinou a posse administrativa do terreno e a consequente demolição do “edifício” aí construído.

  4. A decisão de demolição voluntária tomada no 1º acto contém apenas um potencial/virtual (e não efectivo) prejuízo dos direitos subjectivos da Recorrente, pois, em bom rigor, esse comando administrativo poderia nunca ter sido concretizado coercivamente pela Câmara Municipal da Figueira da Foz, sem que daí resultasse, portanto, qualquer prejuízo efectivo para a Autor/Recorrente. Só com o 2º acto administrativo do Recorrido, isto é, com a determinação da posse administrativa e concretização da demolição do ‘edifício’, é que se produziram efectivamente os danos invocados pela Recorrente na presente acção.

  5. Uma coisa é a legalidade administrativa dos actos executórios ou consequentes, que justifica que se identifique o acto inicial a que se reporta o vício determinante da decisão de anulação (para efeitos de aplicação do art. 133º, nº 2, i., do CPA), e coisa bem diversa é a apreciação indemnizatória que pode ser feita a partir desse juízo de ilegalidade, tanto mais que os diversos actos administrativos, de um determinado iter procedimental, podem gerar prejuízos/danos diferentes, com prazos prescricionais igualmente distintos: a natureza consequente e executória do acto administrativo que determinou a posse administrativa do terreno da Autora para execução coerciva da ordem de demolição decidida num anterior acto administrativo do Réu, ao contrário do que se entendeu, não impede que o mesmo (e não aquele outro acto, dito primário) seja considerado como a causa adequada e directa dos danos peticionados, tanto mais que aquele primeiro acto administrativo apenas gera um dano eventual, potencial ou hipotético que, como se sabe e constitui entendimento doutrinário e jurisprudencial dominantes, não constitui sequer fonte de obrigação indemnizatória.

  6. Mais do que identificar a condição da produção dos danos, sem a qual até se poderá admitir que os mesmos não se teriam produzido, importa verificar qual o facto que constituiu, efectivamente, a causa directa e adequada dos prejuízos suportados pela Recorrente: embora se admita, como não poderá deixar de ser, que aquele 1º acto administrativo (que ordenou a demolição voluntária do ‘edifício’) representa uma condição de legalidade do seu acto de execução, a verdade é que a prática e existência desse acto administrativo não constitui por si só, por não ter essa potencialidade, causa adequada e necessária à produção dos danos sub judice; o único acto administrativo que representa essa causa directa, adequada e necessária à produção desses danos é o 2º acto administrativo praticado pelo Réu, isto é, o acto administrativo que determinou a posse administrativa do terreno da Recorrente para a demolição do ‘edifício’ que aí se encontrava implantado.

  7. Trata-se de concretizar a distinção que existe entre condicionalidade e causalidade, de acordo com a teoria da causalidade adequada, consagrada no art. 563º do CC, o que o Tribunal recorrido desconsiderou e que inquinou o julgamento efectuado.

  8. Não basta uma simples consciência ou expectativa do ‘lesado’ de que, no futuro, em razão daqueles factos ilícitos, terá direito a uma indemnização, sendo necessária a produção e verificação do dano efectivo (ainda que sem conhecimento da extensão integral desses danos, ou do respectivo valor económico, como também se prescreve no art. 498º, nº 1, do CC). Neste sentido, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 18.04.2002, Processo nº 02B950, www.dgsi.pt.

  9. Milita ainda neste sentido o facto de estarem ainda pendentes à data do trânsito em julgado daquele Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 11.01.2007 (verificada em 29.01.2007), outros recursos contenciosos de anulação de actos administrativos consequentes e de execução daquele primeiro acto ali anulado, que poderiam igualmente gerar os mesmos e/ou outros danos à Recorrente, susceptíveis de indemnização, ou até alterar os termos dessa indemnização.

  10. Em nome dos princípios da economia processual e da proibição de actos inúteis (art. 137º do CPC), e a fim de evitar a duplicação de acções com o mesmo objecto e pedido, só com a decisão final do último recurso contencioso de anulação pendente (e que, in casu, ainda para mais, coincidiu com o julgado anulatório do acto administrativo que determinou a posse administrativa do terreno para execução coerciva da demolição) poderia a Recorrente avaliar os concretos danos sofridos e as condições legais para obter a plena e integral reintegração da sua esfera jurídica violada. Neste sentido, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 25.06.2009, Processo nº 092/09, www.dgsi.pt.

  11. Precisamente porque o trânsito em julgado do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 10.02.2010 só se verificou em 26.02.2010, a conclusão de que a pretensão indemnizatória da Recorrente, fundada na responsabilidade civil extracontratual das entidades públicas...

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