Acórdão nº 02550/11.4BEPR de Tribunal Central Administrativo Norte, 31 de Maio de 2012

Magistrado ResponsávelIrene Isabel Gomes das Neves
Data da Resolução31 de Maio de 2012
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I - RELATÓRIO C… - Sociedade Unipessoal Lda.

, pessoa coletiva n.º 5…, com sede na Rua…, no Porto, reclamou nos termos dos art.s 276º e seguintes do CPPT do despacho do Chefe da Divisão de Gestão da Dívida Executiva da Direção de Finanças do Porto, datado de 01/06/2011, que lhe indeferiu o pedido de dispensa da prestação de garantia para efeitos de suspensão do processo de execução fiscal n.º 3182201101017160.

No Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto foi proferida sentença, em 08/02/2012, que julgou improcedente reclamação, decisão com que a reclamante não se conformou, tendo interposto o presente recurso jurisdicional.

Alegou, tendo concluído da seguinte forma: A. A Recorrente não foi notificada, no âmbito da decisão sobre o pedido de dispensa de prestação de garantia, para exercer o direito de audição prévia; B. A audição prévia não se realizou e, desta forma, a Recorrente não teve possibilidades de exercer o contraditório; C. A execução fiscal é um processo de natureza judicial, mas, contudo, existem atos e subprocedimentos, que decorrem dentro desse processo, que são materialmente administrativos; D. O pedido de dispensa de prestação de garantia é um ato materialmente administrativo e, por isso, sujeito ao direito de audição prévia estabelecido no artigo 60.° da LGT; E. O procedimento relativo à decisão sobre, o pedido de dispensa da prestação de garantia, ainda que dentro do processo de execução fiscal é um subprocedimento de natureza administrativa e, portanto, sujeito à aplicação do artigo 60.° da LGT; F. Este subprocedimento não é um mero trâmite do processo de execução fiscal, pois, a decisão do pedido de isenção de prestação de garantia qualifica-se como verdadeiro ato administrativo em matéria tributária, que não se confina nos estreitos limites da ordenação intraprocessual, antes projeta externamente efeitos jurídicos numa situação individual e concreta; G. Como ato administrativo em matéria tributária, o indeferimento do pedido pressupõe o prévio exercício do direito de audição, no termos do artigo 60.º n.° 1, alínea b) da LGT; H. A falta de notificação da Recorrente para o exercício do direito de audição constitui a preterição duma formalidade essencial, que não pode degradar-se em formalidade não essencial; I. A falta do exercício do direito de audição determina a anulação, por vício de forma, da decisão final; J. Nos termos do artigo 89.° n.° 1 do CPA, a Administração Tributária deveria ter solicitado o aperfeiçoamento do requerimento ou a junção de documentos, caso entendesse que o mesmo se encontrava deficientemente instruído - o que não fez! K. A Recorrente provou, não possuir nem nunca ter possuído, bens penhoráveis que pudessem satisfazer a quantia exequenda e o acrescido; L. Esta, em sede administrativa e de reclamação, fez a prova necessária da inexistência de dissipação de bens, com eventuais intuitos de diminuir as garantias dos credores; M. É excessiva a conclusão de que Recorrente não fez prova sobre a inexistência de bens, bem como relativamente à eventual dissipação de bens; N. A sociedade iniciou a sua atividade durante o ano de 2008, não tendo, desde essa data, adquirido qualquer tipo de bens móveis ou imóveis; O. Sem bens penhoráveis, desde a sua constituição, é impossível ter existido a referida dissipação de bens com o intuito de diminuir as garantias dos credores; P. Nos termos do artigo 52.° n.° 4 da LGT, “A administração tributária pode, a requerimento do executado, isenta-lo da prestação de garantia nos casos de a sua prestação lhe causar prejuízo irreparável ou manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e do acrescido, desde que em qualquer dos casos a insuficiência ou inexistência de bens não seja da responsabilidade do executado”; Q. Não possuindo bens suscetíveis de penhora, a Recorrente cumpriu inexoravelmente a primeira parte do artigo 52.° n.° 4 da LGT; R. Da referida disposição legal resulta que, o legislador estabeleceu, dois pressupostos, complexos e em alternativa, como condições necessárias à isenção da prestação de garantia, o prejuízo irreparável dela decorrente e a manifesta falta de meios económicos para a prestar; S. O legislador deixou claro que a isenção pode ser concedida nos casos de prejuízo irreparável ou manifesta falta de meios económicos; T. A isenção não depende, tout court, da constatação da evidenciação de que o executado não tem bens, ou que os tem em inferior medida ao necessário, para a prestação da garantia; U. O legislador impôs que a insuficiência ou inexistência dos bens não seja da responsabilidade do executado que pretende a isenção; V. O segmento final do n.° 4 do artigo 52.° da LGT, relativo à responsabilidade do executado na insuficiência ou inexistência de bens, não constitui, na esteira da teoria das normas de Rosenberg, uma qualquer “contranorma “; W. O segmento da norma faz parte da norma, enquanto hipótese estatuída que é pressuposto daquele referido direito; X. A parte final do artigo 52.° n.° 4 da LGT consubstancia, ainda, um elemento constitutivo do direito que o executado pretende fazer valer para a isenção da prestação de garantia; Y. A regra geral é a de que é ao executado que incumbe fazer a prova da factualidade pertinente, nos termos do que dispõe o artigo 342.° n.° 1 do Código Civil; Z. Apesar do segmento final do artigo 52.° n.° 4 da LGT, se apresentar, como um elemento constitutivo do direito que o executado, a coberto de tal norma, pretende fazer valer, ainda assim, neste domínio, se deve operar uma verdadeira inversão daquele ónus probatório, para que impenda sobre a Administração Tributária, a prova do facto positivo que é a que a insuficiência ou inexistência de bens do executado lhe é imputável, por os ter dissipado em prejuízo dos credores; AA. Tal sucede, porque, a prova não pode constituir, para o autor uma carga probatória tão intolerável; BB. Não descortina qual ou quais os factos positivos que o executado esteja obrigado a demonstrar que induzam a que a insuficiência ou a inexistência de bens não corresponda a uma conduta voluntária e intencional, com o intuito de diminuir a garantia dos credores; CC. Não é admissível que a norma legal se configure como uma verdadeira “prova diabólica” ou impossível na prática; DD. Não é admissível um regime probatório que onere unilateralmente a parte que invoca em seu favor a cláusula geral; EE. A sufragar-se o entendimento sustentado na decisão recorrida, neste domínio, estar-se-á, na prática, a inviabilizar ou a tornar excessivamente difícil a prova em causa por parte do executado; FF. Em conformidade com o defendido pelo ilustre Prof. Vaz Serra, quando a prova não for possível ou se tornar extremamente difícil àquele que, nos termos do artigo 342.° do CC, couber fazê-la, o ónus probatório tem de deixar de impender sobre ele para passar a recair sobre a outra parte; GG. O entendimento sufragado na sentença é contrário ao princípio da proporcionalidade, nas suas vertentes da necessidade e do equilíbrio; HH. No nosso sistema jurídico, vigora a presunção de boa fé na atuação dos contribuintes, plasmada no n.° 2 do artigo 59.° da LGT; II. A presunção de boa fé colide com a aceitação de que o executado se não provar que não agiu de forma dissipadora dos seus bens com o intuito de prejudicar os credores, o tenha, de facto, feito; JJ. No caso sub judice não podia caber à Recorrente demonstrar a verificação da condição que constitui o segmento final do artigo 52.° n.° 4 da LGT, para que lhe fosse concedida a isenção da prestação de garantia solicitada, em face da “prova diabólica”, que representa tal ónus; KK. A manifesta falta de meios económicos só pode ser aferida pelos bens penhoráveis, pelo que não pode relevar a situação dos capitais próprios da sociedade e a existência de lucros económicos, pois, tendo sido esse o critério consagrado pelo legislador não é lícito eleger um outro; LL. Portanto, estando verificado um dos dois requisitos exigidos pelo artigo 52.° n.° 4 da LGT, no caso, o da manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência ou inexistência de bens penhoráveis para o pagamento da quantia exequenda e do acrescido, e não tendo a Administração Tributária demonstrado que a insuficiência ou inexistência de bens se deve a uma atuação intencional do executado em se colocar nessa posição, com o objetivo de diminuir ou afastar a garantia dos credores, forçoso se impunha o deferimento do pedido de isenção de garantia em causa.

Pelo exposto, Deverá ser dado provimento ao presente recurso, revogada a douta decisão recorrida, sendo substituída por douta decisão deste Venerando Tribunal que julgue que o tribunal “a quo” não aplicou corretamente o Direito, relativamente à ausência de audição prévia do Recorrente (executado), e Que julgue o pedido de isenção de prestação de garantia totalmente procedente por provado, não só quanto à insuficiência e inexistência de bens, bem como, por verificado o requisito da inexistência de dissipação de bens quer por prova da Recorrente, como por falta de prova em sentido contrário.

Não houve contra-alegações.

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

Com dispensa de vistos, atenta a natureza urgente do processo, o mesmo é submetido à Secção do Contencioso Tributário para julgamento do recurso.

II - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO –QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objeto do recurso delimitado pela alegação de recurso e respetivas conclusões [nos termos dos artigos 660º, nº 2, 664º e 684º, nºs 3 e 4, todos do CPC, ex vi artigo 2º, alínea e) e artigo 281º do CPPT], que são as seguintes: da competência em razão da hierarquia deste Tribunal Central Administrativo Norte para conhecer do presente recurso...

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