Acórdão nº 00881/12.5BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 14 de Setembro de 2012

Magistrado ResponsávelAntero Pires Salvador
Data da Resolução14 de Setembro de 2012
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, no Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo:I RELATÓRIO 1 .

O MUNICÍPIO de VILA NOVA de GAIA, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF do Porto, datada de 20 de Maio de 2012, que, no âmbito da presente providência cautelar, instaurada pela recorrida "COMPANHIA P. …, SA", com sede na Travessa T. …, Lisboa, titular da exploração do estabelecimento comercial designado por "J. …" e instalado no "Arrábida Shopping", julgando procedente a providência, suspendeu a eficácia do Regulamento Municipal sobre Horários de Funcionamento dos Estabelecimentos Comerciais e de Prestação de Serviços - Regulamento n.º 10/2012, aprovado pela deliberação de 4/1/2012 da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia e de 29/2/2012 da Assembleia Municipal de Vila Nova de Gaia, mais concretamente a eficácia da norma contida na al. d) do n.º 1 do art.º 3.º desse Regulamento e também a norma contida no n.º 1 do art.º 5.º do mesmo Regulamento.

* O recorrente formulou alegações que terminou com as seguintes conclusões: "1ª- A prova do ‘fundado receio” deve ser feita pelo requerente, o qual terá não só de invocar mas também de provar factos que possam levar o tribunal a concluir que será provável a constituição de uma situação de facto consumado ou a produção de prejuízos de difícil reparação.

  1. - Ora, o único prejuízo próprio alegado pelo encerramento dos estabelecimentos aos domingos e feriados às 20.00h em vez das 22.00h (horário que praticavam) é a perda de clientela e a requerente não demonstrou tal prejuízo.

  2. - Além de que a sentença de recurso fundamenta a ocorrência de perda de clientela em pressupostos errados.

  3. - Efectivamente parte do pressuposto que: “(...) o encerramento do estabelecimento comercial da requerente, nos dias e horário indicados, terá como consequência a perda efectiva de clientela que tem por hábito fazer as suas compras nesse horário, a qual passará a acorrer a outros estabelecimentos comerciais, sitos no concelho de Vila Nova de Gaia, que, pela sua dimensão, possam continuar abertos, ou ainda deslocar-se aos estabelecimentos comerciais sitos nos concelhos limítrofes ou muito próximos.

  4. - Na verdade, o Regulamento do Horário de Funcionamento dos Estabelecimentos Comerciais e de Prestação de Serviços estipula o encerramento aos domingos e feriados às 20.00h, para todas as grandes superfícies situadas no Município e não apenas para o ‘J. …”.

  5. - Acresce ainda que o Regulamento dos Horários determina que todos os estabelecimentos do Tipo I aos Domingos e Feriados encerrem às 20.00h.

  6. - Sendo certo que os estabelecimentos do Tipo 1, que são todos os elencados no n°1 do artigo 2° do Regulamento, integram os estabelecimentos que comercializam o mesmo tipo de produtos que as grandes superfícies.

  7. - Assim, todos os estabelecimentos que comercializam o mesmo tipo de produtos que a requerente têm horário de encerramento aos domingos e feriados às 20.00h e como tal não ocorre a perda de clientela da requerente para Outros estabelecimentos de menor dimensão.

  8. - Deste modo, o Tribunal só poderia concluir pela inverificação do requisito do “periculum in mora” porquanto a única alternativa dos clientes da requerente é fazerem as compras noutro horário uma vez que todos os estabelecimentos do género encerram aos domingos e feriados às 20.00h.

  9. - É referida ainda a possibilidade da perda de clientela ocorrer por passarem a fazer as suas compras em estabelecimentos concorrentes situados noutros concelhos, contudo tal não foi demonstrado.

  10. - E a mesma a ocorrer por haver procura de estabelecimentos localizados noutros Municípios não decorre directamente do Regulamento mas da Lei dos Horários, o D. L. 48/96 (com as suas alterações) que definiu que a competência para fixação dos horários dos estabelecimentos situados na área do Município é do Município.

  11. - Por isso, sendo a competência de fixação de horários municipal, a afectação ou não da concorrência decorrente do horário tem de se circunscrever aos estabelecimentos situados no Município.

  12. - Assim, não estando preenchido este requisito, e sendo a verificação dos requisitos para a adopção da providência cumulativa, a providência da suspensão de eficácia não devia ter sido decretada, ao fazê-lo a sentença violou o disposto no artigo 1200 do CPTA, nomeadamente o disposto na alínea b) do seu n.° 1.

  13. - Também por estes motivos houve uma desadequada ponderação dos interesses públicos e privados em presença, devendo prevalecer os públicos, uma vez que o mesmo apenas foi preterido na douta sentença por se considerar que o facto dos estabelecimentos concorrentes se manterem abertos não permitia salvaguardá-lo e, o que efectivamente, se verifica é que os estabelecimentos concorrentes, sejam de grande dimensão ou de menor dimensão, têm o mesmo horário de encerramento aos domingos e feriados — 20.00h.

  14. - Ao decidir como decidiu a douta sentença recorrida violou o disposto no artigo 120.º do CPTA, devendo, por isso, ser revogada.

  15. - Por último, a sentença também decretou a suspensão da eficácia do nº 1º do artigo 5° do identificado Regulamento Municipal mas não fundamenta as razões e motivos pelos quais a mesma é decretada.

  16. - Ora, aquele normativo, como consta da matéria de farto assente, define o procedimento para a restrição concreta ao horário de funcionamento para um determinado estabelecimento e in casu, não se está perante uma concreta restrição do horário com fundamento nesse preceito.

  17. - Pelo que a suspensão de eficácia da norma contida no n°1 do artigo 5° do Regulamento Municipal em questão, deveria ser recusada, ao não ser, a douta sentença violou o disposto no artigo 120º do C.P.T.A., devendo, por via disso, ser revogada".

    * Notificadas as alegações referidas, veio a recorrida "Companhia P. …, SA" apresentar contra-alegações, elencando as seguintes conclusões: "1.ª As alíneas K) e L) dos Factos dados como provados na Sentença recorrida e os factos alegados pela Recorrida nos artigos 72.º a 76.º do Requerimento Inicial (os quais, apesar de omitidos na “Lista de Factos Provados” da douta Sentença recorrida, não podem deixar de se considerar como assentes, face à prova documental produzida) sustentam o juízo da Sentença recorrida no que se refere à verificação do requisito do periculum in mora e permitem a presunção de que o encerramento do J. … aos domingos e feriados após as 20h00, determinado pela norma suspendenda do Regulamento em causa nos autos, teria como efeito a perda da receita auferida nesses períodos.

  18. Nesta matéria, a Sentença recorrida segue a jurisprudência histórica e corrente do Supremo Tribunal Administrativo, conforme se recorda no Acórdão deste Supremo Tribunal, de 4 de Julho de 2002, tirado no processo n.º 0537/02, e bem assim a dos Acórdãos do Tribunal Administrativo Sul citados na Sentença recorrida: de 3 de Novembro de 2011 (processo n.º 8020/11) e de 17 de Novembro de 2011 (processo n.º 8028/11).

  19. Na argumentação aduzida nas suas alegações, o Recorrente não teve em linha de conta que todos os estabelecimentos de venda ao público e de prestação de serviços localizados em Centros Comerciais, independentemente do tipo de actividade comercial prosseguida, e “salvo se atingirem áreas de venda contínua” (sic), podem funcionar até às 23h00 aos domingos e feriados, de acordo com o disposto no artigo 3.º, n.º 1, alínea e), do Regulamento.

  20. A afirmação do Recorrente no sentido de que não existe qualquer perda de clientela para os estabelecimentos de tipo I localizados no município de Vila Nova de Gaia não tem qualquer correspondência com a realidade factual e jurídica, porquanto o Regulamento estabelece expressamente um regime de excepção para aqueles estabelecimentos comerciais do tipo I (designadamente grandes supermercados com área de venda até 2000m2) que se localizem em Centros Comerciais.

  21. Apesar de a Sentença recorrida (erradamente nesta parte) não ter incluído na “Lista de Factos Provados” os alegados nos artigos 72.º a 76.º do Requerimento Inicial, o Tribunal a quo assentou, e bem, a sua decisão na ocorrência de perda de clientela para estabelecimentos dos concelhos limítrofes e vizinhos próximos.

  22. Com efeito, desde logo, a existência de tais estabelecimentos comerciais é do conhecimento geral (veja-se o doc. n.º 14 que vai ao detalhe de especificar o Centro Comercial, o concelho, a morada, a insígnia e a área de venda de cada estabelecimento comercial); sendo que, por outro lado, os horários praticados por cada um desses estabelecimentos são também públicos, podendo inclusivamente ser consultados online, com muita facilidade (os horários dos Continentes em http://www.continente.pt//GeneralContact.aspx?userArea=03 e o do I. … em http://www.mosqueteiros.com/universo/onde estamos/298).

  23. Ainda que assim não fosse (e é), a Recorrida juntou aos autos documentos que comprovam não só que tais estabelecimentos comerciais existem, como também que estiveram em funcionamento num domingo após as 20h00 (vejam-se os docs. n.ºs 15 a 21 que correspondem a talões de compras efectuadas nesses estabelecimentos comerciais naquele horário).

  24. Acresce que a mera circunstância de os documentos em questão (n.ºs 14 a 21) terem sido impugnados pelo Recorrente não implica, por si só, que os mesmos não constituam coeficiente probatório a apreciar livremente pelo Tribunal, porquanto, não exigindo a lei qualquer formalidade especial para a existência ou prova de determinados factos jurídicos, sempre cabe ao Tribunal apreciar livremente as provas apresentadas, decidindo segundo a sua prudente convicção (conforme resulta, aliás, do artigo 655.º do Código de Processo Civil).

  25. A argumentação do Recorrente de que a perda de clientela, a ocorrer, não resulta directamente do Regulamento, mas sim do Decreto-Lei n.º 48/96 não tem qualquer relevância do ponto de vista do periculum in mora, pois o que importa é que a perda de clientela ocorreria efectivamente e que a mesma...

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