Acórdão nº 00462/07.5BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 25 de Janeiro de 2013

Magistrado ResponsávelCarlos Lu
Data da Resolução25 de Janeiro de 2013
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO HN. … e MA. …, AA. na presente ação administrativa comum, sob forma ordinária, para efetivação de responsabilidade civil extracontratual fundada em facto ilícito, inconformados, vieram interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF de Aveiro, datada de 20.05.2011, que condenou o R.

“MUNICÍPIO DE AVEIRO” apenas no pagamento de indemnização no valor global de 18.832,58 € (13.832,58 € a título de danos patrimoniais aos AA. e 5.000,00 € referentes a danos não patrimoniais ao A. marido), valor esse acrescido de juros de mora desde a citação até integral pagamento quando havia sido peticionado um valor de indemnização de 631.070,99 € “acrescido das prestações pecuniárias que se vencerem até à data da sentença à razão de 479,45 € por dia a título de lucros cessantes”.

Formulam os AA. nas respetivas alegações (cfr. fls. 486 e segs. e fls. 525 e segs. após convite inserto no despacho de fls. 521/522 - paginação processo suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário) as seguintes conclusões que se reproduzem: “...

  1. A douta sentença recorrida enferma de uma manifesta contradição entre os factos dados como provados e a conclusão da meritíssima juiz «a quo» de que não existe um nexo de causalidade adequada entre o comportamento ilícito do R., Município de Aveiro, e a cessão da atividade empresarial do A. marido geradora do pedido indemnizatório por lucros cessantes formulado na presente ação.

  2. Na verdade dos factos dados como provados resulta, cremos que com meridiana clareza, que os AA. ficaram descapitalizados em consequência direta e necessária do comportamento ilícito do Réu pelo que deixaram de ter meios para continuar a desenvolver a respetiva atividade empresarial.

  3. Mas, mesmo que assim não se entendesse, o que só como mera hipótese de raciocínio se concebe, sempre é certo que, no caso dos autos, tendo em atenção a teoria da causalidade adequada na sua formulação negativa acima assinalada, é pelo menos manifesto que o comportamento ilícito do R. não é de todo em todo indiferente para a verificação e existência dos lucros cessantes que os AA. reclamam.

  4. E, assim sendo, sempre se terá de concluir que existe um nexo de causalidade adequado entre o comportamento ilícito do R., Município de Aveiro, e a cessação da atividade empresarial do A. marido geradora do pedido indemnizatório por lucros cessantes formulado na petição inicial.

  5. Ao decidir como decidiu, a douta sentença recorrida não interpretou adequadamente face aos factos em presença o disposto nos arts. 22.º da CRP, 2.º do Dec. Lei n.º 48051 de 21 de novembro de 1967, 483.º, 562.º, 563.º, 564.º e 566.º do CC que desse modo foram violados …”.

    Terminam pugnando pelo provimento do recurso e condenação do R. no pagamento aos mesmos da “quantia de 569.109,58 € a título de lucros cessantes vencidos até 31 de março de 2007, acrescida da quantia diária de 479,45 € até integral pagamento”.

    O R. apresentou contra-alegações (cfr. fls. 500 e segs.

    ), nas quais pugnou pela improcedência do recurso jurisdicional deduzido pelos AA., concluindo nos seguintes termos: “… A. Em causa nos autos, o pedido formulado com base na atuação desta Autarquia no âmbito dos processos de obras n.º 756/99 e n.º 634/2001, no seguimento da aprovação do licenciamento e autorização de construção de duas moradias (anexos e muros) e posterior suspensão dos procedimentos, aquando do pedido para a emissão da licença de habitabilidade de uma das edificações, porquanto se veio a detetar, entretanto, que aquelas se encontravam implantadas em zona de Reserva Ecológica Nacional (REN) conforme foi definida pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 115/95, mas que constavam da mancha urbana (Zona de Construção tipo III) do Plano Diretor Municipal (PDM) de Aveiro, e que obrigou a diligenciar uma solução, tendo sido por isso promovida a aprovação do Plano de Pormenor de Rasos para a área em questão (face à renúncia da DRAOT em integrar o caso nos regimes de exceção da REN), tendo os procedimentos ficado suspensos desde 30.04.2004 até à data de emissão dos alvarás de licença de utilização e de construção em 2 e 4.10.2007, já que só em 1.10.2007 foi publicado o referido Plano; B. Nestes termos, o pedido apreciado na presente ação de responsabilidade civil extracontratual no domínio dos atos de gestão pública, rege-se à data da prática dos factos pelo disposto no Decreto-Lei n.º 48051, de 21.11.1967, e cujos requisitos de responsabilidade assentam nos pressupostos da responsabilidade civil, previstos nos arts. 483.º e ss. do CC, o que significa que é necessário apurar se se verifica em concreto a prática de um facto (ato ou omissão) ilícito, culposo, causador de dano, demonstrado que esteja a existência de um nexo de causalidade adequada entre o facto e o dano; C. Alegando que a Meritíssima Juíza a quo entra em contradição entre os factos dados como provados e as conclusões da sentença; D. No entanto, os Autores não sofreram a perda total dos bens e que o Réu diligenciou para a obtenção de solução para o lapso detetado, pedido quer a exclusão da área, e promovendo a aprovação do Plano, em tempo útil, factos estes provados e que não se coadunam com o pedido de indemnização por lucros cessantes, efetuado pelos Autores; E. Isto porque os danos a ressarcir serão apenas e só os efetivamente sofridos em consequência do «atraso» da emissão das respetivas licenças, circunscritos ao período de tempo que mediou entre a suspensão do procedimento (30.04.2004) e a emissão das licenças de utilização (2 e 4 de 10.2007): «são assim passíveis de indemnização nesta sede, por serem os que se encontram numa relação de causalidade adequada, os danos patrimoniais decorrentes da circunstância de ilegalmente terem sido deferidos os pedidos de licenciamento de construção daquelas duas moradias e que perduraram até que, por efeito da aprovação daquele Plano de Pormenor de Rasos, deixar de haver impedimento jurídico a que os serviços do Município pudessem validamente emitir e praticar os atos administrativos pretendidos pelo Autor no que respeita àquelas duas moradias, mantendo-se, por conseguinte, as mesmas no tráfego jurídico, bem como os respetivos lotes de terreno enquanto terrenos urbanos»., cfr. a sentença; F. A Exma. Juíza concluiu (e bem!) que inexiste uma relação de causalidade adequada entre a atuação do Município e a exaustão financeira do Autor marido que o levou a cessar a sua atividade, pese embora os factos dados como provados; G. E conclui sem contradição com a factualidade dada por assente, porquanto, uma coisa é verificar que determinada ocorrência é verdadeira, outra será imputa-la à ocorrência consequente de determinado facto, sendo sempre necessário provar a existência de nexo causal entre os reclamados danos (segundo um juízo de prognose póstuma baseado em critérios de normalidade, razoabilidade, experiência comum e bom senso) e o facto, para que estes possam ser indubitavelmente considerados uma decorrência normal daquilo que provocou a lesão; H. Devendo ajuizar-se à partida que a ação tem de se revelar adequada à produção do dano, tendo ou gerando fortes probabilidades de o originar, embora não sejam ressarcíveis todos e quaisquer danos que sobrevenham ao facto ilícito, mas tão só os que ele tenha realmente ocasionado; I. Contrariamente ao peticionado, os danos sofridos em consequência do «atraso» da emissão das respetivas licenças estão circunscritos ao período de tempo que mediou a suspensão do procedimento (30.04.2004) e a emissão das licenças de utilização (2 e 4 de 10.2007), e apenas aos danos efetivamente sofridos por causa deste atraso; J. Assim, e sendo o nexo de causalidade um «pressuposto da responsabilidade civil que consiste na interação causa/efeito, de ligação positiva entre a lesão e o dano, através da previsibilidade deste em face daquele, a ponto de poder afirmar-se que o lesado não teria sofrido tal dano se não fosse a lesão (art. 563.º do C.Civil)» - Ac. do STA proferido no âmbito do Rec. 936/03, de 30.10.2003, é jurisprudência uniforme do STA, que o citado artigo «consagra a teoria da causalidade adequada na sua formulação negativa, proposta por Ennecerus-Lehman, segundo a qual a condição deixará de ser causa do dano sempre que ela seja de todo indiferente para a produção do mesmo, e só se tenha tornado condição dele em virtude de outras circunstâncias, sendo pois inadequada à sua produção» - Ac. do STA proferido no âmbito do processo 874/05, de 16.05.2006; K. A emergência do nexo causal exige assim «alta probabilidade da ocorrência do efeito, na hipótese de a causa devida substituir ‘in situ’ a ação ou omissão que indevidamente acontecera» - Ac. do STA de 20.12.2007, proferido no âmbito do processo n.º 0826/06; L. Conforme Ac. do STA de 7.06.2006, proferido no âmbito do processo n.º 1177/05-11 «À luz desta teoria, não serão ressarcíveis todos e quaisquer danos que sobrevenham ao facto ilícito, mas tão só os que ele tenha realmente ocasionado, ou seja, aqueles cuja ocorrência com ele esteja numa relação de adequação causal. Por outras palavras, dir-se-á que o juízo de adequação causal tem que assentar numa relação intrínseca entre o facto e o dano, de modo que este decorra como consequência normal e típica daquele, ou seja, que corresponda a uma decorrência adequada do mesmo. O Ac. de 16.05.2006, atrás referido, na esteira de jurisprudência anterior do STA ali citada, admite que essa relação causa/efeito possa ser indireta, afirmando que ‘subsiste o nexo de causalidade quando o facto ilícito não produz ele mesmo o dano, mas é causa adequada de outro que o produz, na medida em que este facto posterior tiver sido especialmente favorecido por aquele primeiro facto ou seja provável segundo o curso normal dos acontecimentos’. Mas, mesmo nessa linha de orientação, a subsistência do nexo de causalidade não...

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