Acórdão nº 01097/08.0BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 15 de Fevereiro de 2013

Magistrado ResponsávelIrene Isabel Gomes das Neves
Data da Resolução15 de Fevereiro de 2013
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I – RELTÓRIO A…, S.A.

, pessoa colectiva nº 5…, com sede na Avenida…, nº …, Gafanha da Nazaré, Ílhavo, impugnou a decisão administrativa proferida pelo Chefe do Serviço de Finanças de Ílhavo, que lhe aplicou a coima de € 1.734,21 pela prática da contra-ordenação tipificada no art. 114º, nº 2 e 26º, nº 4, do RGIT, em conjugação com o art. 98º, do CIRS.

No Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro foi proferida sentença, em 15.09.2011, que julgou improcedente o recurso, mantendo a condenação, decisão com que a arguida não se conformou, tendo interposto o presente recurso jurisdicional.

Alegou, tendo concluído da seguinte forma: 1) Tendo em consideração os factos dados como provados na Sentença recorrida, o tribunal a quo não poderia ter concluído, como efectivamente concluiu, pela inexistência de uma contra-ordenação continuada.

2) Com referência ao alegado pela Recorrente, o tribunal a quo, na Sentença recorrida, concluiu pela inexistência de qualquer contra-ordenação continuada, por entender, designadamente, que «tanto na altura em que foram praticadas as infracções tributárias que originaram os aludidos processos contraordenacionais, como na altura em que foi proferida a decisão recorrida, vigorava a norma pela qual as sanções aplicadas às contra-ordenações em concurso são sempre objecto de cúmulo material, não tendo aplicação a punição mediante cúmulo jurídico, decorrente da existência de “contra-ordenação continuada”».

3) Para chegar a tal conclusão, o tribunal a quo teria de ter apensado aos autos do processo em epígrafe todos os treze processos de contra-ordenação (conforme foi requerido pela ora Recorrente no recurso interposto da decisão de aplicação da colma proferida pelo Serviço de Finanças de Ílhavo em 26/04/2007), e, posteriormente, teria de ter dado como provada a respectiva existência.

4) Sucede que em momento algum dos “Factos Provado” é feita referência à existência desses treze processos.

5) Verifica-se, por isso, uma insuficiência para a decisão da matéria de facto provada (cfr. art. 410°-2/a do CPP, aplicável ex vi do disposto no artigo 3°/b do RGIT e do disposto no artigo 74°-4 do RGCO), uma vez que só dando como provada a existência dos processos n°s 0108200606016383, 0108200606016391, 0108200606016405, 0108200606016413, 0108200606016421, 0108200606016448, 0108200606016464, 0106200606016472, 0108200606016316, 0108200606016340, 0108200606016324, 0108200606016308 e 0108200606016278 é que o tribunal a quo poderia ter concluído, como efectivamente concluiu, que não assistia razão à Recorrente quanto à verificação de uma única contra-ordenação continuada.

6) Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente, ordenando-se, em consequência, o reenvio do processo ao tribunal a quo para nova decisão relativamente à concreta questão acima mencionada, proferindo-se a final nova sentença.

7) Sem conceder, 8) Ainda que assim não se entendesse, no caso em apreço não só seria admissível como se impunha a punição da Recorrente por uma única contra-ordenação continuada.

9) Perante a realização plúrima do mesmo tipo contra-ordenacional (ou tipos que protegem o mesmo bem jurídico), há que verificar, antes de mais, se é aplicável o regime da infracção continuada.

10) Se esse regime não for aplicável (v.g. por não ocorrer uma única resolução criminosa), colocar-se-á então a questão do concurso de contra-ordenações a que alude o art. 25° do RGIT.

11) Contrariamente ao que vem referido na Sentença recorrida, a punição a título de contra-ordenação continuada não está de forma condicionada pelo facto do art. 25° do RGIT impor o cúmulo material das coimas.

12) Conforme resulta da própria estatuição dessa norma, a questão do cúmulo material das coimas respeita unicamente “às contra-ordenações em concurso”.

13) Estão em causa, pois, duas realidades absolutamente distintas (contraordenação continuada e concurso de contra-ordenações), tendo cada uma delas o seu regime próprio.

14) Atentos os condicionalismos do caso sub judice, verifica-se que, de forma distinta ao que se concluiu na Sentença recorrida, a conduta da Recorrente se integra numa única contra-ordenação continuada no tempo.

15) Uma vez que, conforme foi dado como provado naquela Sentença, à Recorrente foram aplicadas coimas, pela mesma conduta que está em causa nos presentes autos, “relativamente aos períodos 200501, 200502, 200503, 200504, 200505, 200508, 200510, 200511, 200405, 200409, 200406, 200404, 200401”, verifica-se, desde logo, que há unicidade no que respeita ao tipo de contra-ordenação em causa.

16) Por outro lado, as acções levadas a cabo pela Recorrente ter-se-ão desenvolvido sempre da mesma forma (falta de entrega do imposto retido na fonte) e num espaço temporal concentrado (períodos de “200501, 200502, 200503, 200504, 200505, 200508, 200510, 200511, 200405, 200409. 200406. 200404, 200401”).

17) Assim, a circunstância de a Recorrente, após as alegadas primeiras acções ilícitas, não ter sofrido qualquer consequência, sempre teria condicionado e facilitado a repetição dessas acções, tornando-se cada vez menos sustentável exigir-lhe que se comportasse de maneira diferente.

18) Tendo a Autoridade Administrativa (Serviço de Finanças de Ílhavo) entendido que a Recorrente praticou as supra referidas contra-ordenações, sempre a mesma teria de ter considerado, atento o acima exposto, que esse facto resultou de uma atitude menos reflectida, e que, por isso, a sua culpa estava consideravelmente diminuída para efeitos do disposto no art. 30º-2 do Código Penal.

19) Não estando prevista no RGIT nem no RGCO punição para a contra-ordenação continuada, a Autoridade Administrativa (Serviço de Finanças de Ílhavo) sempre deveria ter aplicado o preceituado no art. 79° do Código Penal (subsidiariamente aplicável ex vi do disposto nos arts. 3°/b do RGIT e 32° do RGCO) e, em consequência, punido a ora Recorrente com a coima correspondente à conduta mais grave que integra a continuação.

20) Analisando as decisões que foram enviadas à Recorrente nos autos do processo de contra-ordenação que deu origem ao processo em epígrafe e nos restantes processos de contra-ordenação, verifica-se que o maior montante de imposto em falta cifra-se em € 15.509,58 e respeita ao período de “200404”.

21) Por conseguinte, tendo a Autoridade Administrativa decidido fixar em € 3.210,49 a coima respeitante a essa infracção alegadamente praticada pela Recorrente, sempre esta, atendendo a que estava em causa uma única contra-ordenação continuada no tempo, deveria ter sido punida unicamente nesse valor.

22) Assim não tendo acontecido, ou seja, ao não ter a Autoridade Administrativa organizado um só processo de contra-ordenação, e, posteriormente, ao não ter aplicado à Recorrente uma coima única, foi cometida uma ilegalidade que inquina a decisão proferida em 26/04/2007, uma vez que a infracção que aí vem imputada à Recorrente, a ter ocorrido, se integra numa única contra-ordenação continuada.

23) Por sua vez, ao não ter o Tribunal a quo apensado todos os processos de contra-ordenação onde foram aplicadas as mencionadas coimas (cfr. arts. 24° e 29°-2 do Código de Processo Penal, aplicáveis ex vi do disposto no art. 3°/b do RGIT e do disposto no art. 41° do RGCO), e, posteriormente, ao não ter aplicado à Recorrente uma única coima correspondente à conduta mais grave que integra a contra contra-ordenação continuada, foi cometida uma ilegalidade que afecta a Sentença recorrida e que deverá determinar a respectiva revogação.

24) Termos em que deverá a douta Sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que julgue procedente o recurso interposto da decisão proferida pelo Exmo. Senhor Chefe do Serviço de Finanças de Ílhavo em 26/04/2007, com as legais consequências.

Em todo o caso, e sempre sem conceder, 25) Ainda que se entendesse que, no caso sub judice, não havia lugar à aplicação do regime da contra-ordenação continuada (no que não se concede e apenas se admite por cuidados de patrocínio), sempre o Tribunal a quo deveria ter fixado à Recorrente, em cúmulo jurídico, uma coima única resultante do concurso de infracções.

26) Apesar de o art. 25° do RGIT actualmente prever o cúmulo material de sanções, o regime do cúmulo jurídico resultante da entrada em vigor da Lei n.° 64-A/2008, de 31-12, deve, ex vi do preceituado no art. 29° da CRP, bem como do preceituado no art. 2°-4 do Cód. Penal (aplicável por remissão do disposto no art. 32° do RGCO e do art. 3°/b do RGIT), ser aplicado ao caso sub judice, por redundar numa sanção mais favorável para a Recorrente.

27) Conforme referem Jorge Lopes de Sousa e Manuel Simas Santos em anotação ao art. 5° do RGIT (“Regime Geral das Infracções Tributárias Anotado”, 4ª Edição 2010, Áreas Editora, pág. 63), “se a lei vigente ao tempo da prática do facto for posteriormente modificada, aplicar-se-á a lei mais favorável ao arguido, salvo se este já tiver sido condenado por decisão transitada em julgado (nº 4 do art.º 2º do C. Penal e n.º 2 do art. 3. ° do RGCO)”.

28) É inequívoco, pois, que a ora Recorrente sempre teria direito a que se aplicasse o regime do concurso jurídico de infracções (art. 25° do RGIT, com a redacção que lhe foi dada pela Lei n.° 64-A/2008, de 31-12) ao processo de contra-ordenação que deu origem ao processo em epígrafe e aos restantes processos de contra-ordenação em que foram aplicadas coimas pela mesma conduta, devendo, para esse efeito, proceder-se à respectiva apensação.

29) Pelo exposto, sempre a Sentença recorrida deverá ser revogada e, em consequência, ser ordenada a baixa dos autos ao tribunal a quo para que aí seja efectuada a apensação de processos e proferida decisão de aplicação de uma coima única à Recorrente, nos termos do art. 25° do RGIT, com a redacção que lhe foi dada pela Lei n.° 64-A/2008, de 31-12.

30) Ao ter negado provimento ao recurso interposto pela Recorrente, a Sentença...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT