Acórdão nº 03997/08 de Tribunal Central Administrativo Sul, 05 de Julho de 2012

Magistrado ResponsávelTERESA DE SOUSA
Data da Resolução05 de Julho de 2012
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam na 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul Vem interposto recurso do acórdão do TAF de Sintra que julgou improcedente a acção administrativa especial de anulação do despacho proferido pelo Ministro da Justiça, em 27.06.2008, que decidiu aplicar ao aqui Recorrente a pena disciplinar de demissão.

Em alegações são formuladas as seguintes conclusões: 1a. Ao contrário do que pretende o douto acórdão recorrido, todos os factos que constituem as infracções atribuídas ao, ora, recorrente durante os anos de 1993 e 1994 encontram-se prescritos, pois após a notificação da acusação (2/2/96) já decorreram os 10 anos previstos no art.° 118°, n.° 1, al. b), do C. Penal e art.° 23°, n.° 3, do D. L. 196/94. De 21/7..

2a. Efectivamente, face ao disposto no n.° 3, do art.° 22°, do RDPJ, e atentos os factos em presença, os prazos e as regras a aplicar são os constantes dos arts. 118° e 121°, do Código Penal, já que o n.° 1, do art.° 23° daquele diploma legal não respeita às infracções disciplinares previstas no n.° 3, do seu art.° 22°, ao contrário do pugnado pelo douto acórdão recorrido, pelo que ao decidir em sentido contrário o douto acórdão recorrido violou as referidas disposições legais.

3a. O mandatário do arguido, ora, recorrente, não foi notificado do dia e hora em que ocorreu a inquirição da testemunha Rosário de Oliveira Guilherme, pelo que não esteve presente, sendo que tal omissão constitui nulidade insuprível por ofensa do conteúdo do direito fundamental de defesa e teve repercussão no resultado da diligência, pois quem pode garantir que, com o mandatário presente e observado o princípio do contraditório, o depoimento da testemunha não seria diferente, ao contrário do que pretende o acórdão recorrido que, assim, violou o disposto no art.° 42°, do ED.

4a. Aliás, o arguido em processo disciplinar tem direito a um “processo justo” que passa pela aplicação de regras e princípios de defesa constitucionalmente garantidos, como é o caso do direito à assistência de um defensor e do princípio do contraditório (V. Acs. STA, de 11/2/99, Rec. 38989; de 21/5/91, Rec. 25912 e de 19/4/2005, Rec. 783/04).

5a. Acresce que a inquirição de testemunhas constitui extensão da audição do arguido, assumindo particular relevo e carácter de essencialidade, sendo que a presença do mandatário do arguido é um direito inalienável que assiste ao arguido, com vista a assegurar total objectividade e imparcialidade no cumprimento das diligências, constituindo uma das faculdades integradas no direito de defesa.

6a. Por outro lado, ao contrário do pugnado pelo douto acórdão recorrido, não tinha o recorrente que invocar expressamente que o depoimento da referida testemunha pudesse pôr em causa toda a matéria probatória, bastando alegar a sua essencialidade, nem tal nulidade se encontra sanada “ope legis”, pois para ser considerada insuprível não necessitava ser arguida até à decisão final do p.º disciplinar, para além de que só com a notificação desta decisão é que o recorrente tomou conhecimento de tal omissão.

7a. Ao contrário do defendido pelo douto acórdão recorrido não se podem considerar válidos depoimentos efectuados por remissão para depoimentos anteriores anulados, pois a confirmação de depoimentos anulados constitui nulidade insuprível do p.º disciplinar e não pode ter qualquer validade.

8a. Aliás, contrariamente ao invocado pelo acórdão recorrido, não se pode falar em aproveitamento do processado, pois se assim fosse não seria necessário chamar as testemunhas para prestar depoimento "ex novo".

9a. Acresce que, ao contrário do pugnado pelo douto acórdão recorrido, a decisão final do p.º disciplinar não pode ter por base uma Deliberação que não consta do p.º disciplinar, que o arguido desconhece e sobre a qual não pode exercer o direito do contraditório, quando tal documento esteve na base da decisão final, pelo que temos que considerar que tal falta constitui nulidade do p.º disciplinar.

10a. Quanto à aplicação da pena de demissão refira-se que o bom comportamento também se integra na classificação de muito bom, sendo que o recorrente, numa escala de 0 a 10, teve, sempre, ao longo de 29 anos, classificações de 9,25 a 10, o que consubstancia bom comportamento e o coloca acima da média, pelo que ao não considerar assim, o douto acórdão recorrido violou o art.° 17°, n.° 1, alínea b), do RDPJ.

11a. Por outro lado, a Administração incorreu em grosseira e manifesta omissão ao não fornecer ao recorrente todos os elementos e documentos necessários à cabal prova do seu comportamento exemplar e modelar, sendo que o douto acórdão recorrido não faz qualquer menção quanto a tal omissão.

12a. Assim, perante os elementos carreados para o processo e às omissões do recorrido, estamos perante um funcionário com comportamento e desempenho manifestamente acima da média e exemplar para os restantes funcionários, pelo que ao contrário do pretendido pelo douto acórdão recorrido, a pena de demissão é manifestamente excessiva, devendo, quando muito, ser-lhe aplicada a pena de inactividade.

13a. Finalmente, refira-se que o princípio da livre apreciação da prova e a discricionariedade da Administração na sua apreciação não podem determinar que se esqueça, em absoluto, de todas as provas produzidas posteriormente à resposta à acusação, como aconteceu "in casu".

Em contra-alegações são formuladas as seguintes conclusões: 1a - Não se verifica a prescrição das infracções que constam do processo, uma vez que a aplicação do n°3 do art°22° do RDPJ em nada exclui o regime previsto no n°1 do art° 23° do mesmo diploma. Com efeito, contrariamente, ao referido pelo Recorrente e como oportunamente referimos, o n° 3 desta última disposição legal em tudo corrobora este entendimento.

  1. - A falta de notificação do mandatário do Recorrente para a inquirição da testemunha Rosaria de Oliveira Guilherme, e seguindo de perto o douto acórdão Recorrido "não reveste (...) a característica de essencial para o apuramento da verdade, já que relativamente à prova produzida durante a instrução do processo disciplinar e que veio a suportar a acusação deduzida, totalmente irrelevante e juridicamente neutra, não acarretando por isso a essencialidade insuprível a que alude o n° 2 do a/f 42° do ED".

  2. - Os depoimentos das testemunhas Maria Matilde Ribeiro Coelho Magalhães, João António Lopes dos Santos e a própria Rosaria de Oliveira Guilherme não acarretam qualquer vício para o processo, pois as partes do procedimento para onde as mesmas foram remetidas foram expurgadas dos vícios que haviam sido cometidos e por sua vez a inquirição estava regularmente efectuada nos termos bem explanados no douto acórdão Recorrido.

  3. - A Deliberação do Conselho Consultivo da Polícia Judiciária, de 13.12.2004 foi tomada como resulta dos autos - alínea X) do Probatório -, pelo que não só a decisão final foi proferida tendo por base a citada deliberação como "foi seguido o procedimento previsto no art° 29° do RDPJ para aplicação da pena de demissão".

  4. - As classificações de serviço de Muito Bom e as duas menções obtidas em 1975 e em 1992, não servem de per si para integrar circunstância atenuante p revista no art° 29° do EDFAACRL, uma vez que este preceito exige que o curriculum anterior do arguido denote elementos que permitam qualificá-lo como modelar.

  5. - Na valoração das circunstâncias atenuantes ou agravantes a Administração goza de discricionariedade pelo que, só cumprirá aos Tribunais verificar se na sua aplicação existe desproporcionalidade manifesta ou grosseira.

  6. - Atenta a gravidade dos factos pelos quais o Recorrente foi punido, afigura-se ser inquestionável a inexistência de qualquer erro grosseiro na aplicação ao recorrente da pena de demissão.

O EMMP emitiu parecer a fls. 214/215, no sentido da improcedência do recurso.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

Os Factos O acórdão recorrido considerou provados os seguintes factos: A) Por despacho de 94.06.15 do Director-Geral da Polícia Judiciária foi determinada a instauração do processo disciplinar e nomeado o respectivo Instrutor, sendo que atenta a gravidade dos factos apurados foi também remetida cópia ao Procurador da República para instauração de processo crime - cfr. fls. 2 a 22 do I vol. do p.a, B) Em 30.08.1995, após várias prorrogações de prazo, atenta a complexidade do processo e a necessidade de realização de diligências probatórias, pelo instrutor do processo disciplinar foi deduzida acusação, cujo teor se dá por integralmente reproduzida, tendo por base 14 casos relativos a factos ocorridos em 1993 e 1994, designadamente: "CASO B...

2.1 Em data não determinada do final de Abril/ princípio de Maio de 1993, 8 arguido pelo seu punho, preencheu e enviou um aviso postal, notificando B... (...), para comparecer na Directoria de Lisboa da Policia Judiciária (...).

2.2. Bem sabendo que, por ser das suas relações pessoais, seria por de contactado no sentido de tentar saber o que se passava.

(...) 2.7. No domingo seguinte, o B... voltou a casa do arguido que lhe disse ter tido sorte em falar consigo, pois se não o "tivesse feito teria sido logo preso e dois anos de prisão ninguém lhe tirava".

2.8. Que teria de subornar cinco pessoas da Polícia Judiciária que lhe tinham pedido um milhão e quinhentos mil escudos cada, para 2.9 "Apagar" os ficheiros do computador e "limpar" o nome de B....

2.10. Porque este não tivesse esta importância o arguido propôs que adiantaria setecentos e cinquenta mil escudos, e 2.11. O restante milhão e setecentos e cinquenta mil escudos deveria ser depositado pelo B... numa conta do Banco Totta & Açores indicada pelo arguido, 2.12. O que veio a fazer no dia seguinte, na companhia de sua esposa (...) (...) 2.16. Nas diversas conversas, o arguido limitou-se a criar no B..., face aos seus antecedentes criminais que bem conhecia, as condições objectivas para que este sentisse receio de poder estar sob a acção da justiça (...) 2.18. Analisados os registos do D.C.R.I.P.C constata-se que não...

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