Acórdão nº 03944/10 de Tribunal Central Administrativo Sul, 26 de Junho de 2012
Magistrado Responsável | ANÍBAL FERRAZ |
Data da Resolução | 26 de Junho de 2012 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
IA...– VIAGENS E TURISMO, S.A., contribuinte n.º ...
e com os restantes sinais dos autos, requereu intimação, da Direção-Geral dos Impostos (Ministério das Finanças), para um comportamento.
No Tribunal Tributário de Lisboa, foi proferida sentença, decidindo indeferir o requerimento intimativo, ao que a requerente reagiu, com interposição de recurso jurisdicional, cuja alegação integra as seguintes conclusões: « i. Face aos documentos juntos com a petição inicial, foram considerados como assentes e consolidados os seguintes factos relevantes que, por razões de exposição, se deixam citados: i - A requerente enviou, via electrónica, a declaração periódica de rendimentos modelo 22/IRC relativa ao exercício de 2008, em 28.05.2009.
ii - Na referida declaração, no campo reservado a “Cálculo do Imposto”, no espaço relativo a “Total a Recuperar”, assinalou a importância de € 208.846,46.
ii. No entanto, entende a Recorrente que, com interesse para a decisão da causa, se encontra documentalmente provado, ademais, que: - Após o prazo legal de reembolso do imposto, a Intimante solicitou à Administração Fiscal a informação sobre o estado do procedimento e data previsível da sua conclusão» (doc. n.º 2 junto com a petição).
iii. Tal facto afigura-se relevante, porquanto do mesmo ressuma, simultaneamente: - a inércia da AF ao processamento do reembolso dentro do prazo legal, e; - a tentativa da Recorrente em lograr, extrajudicialmente, que a AF procedesse oficiosamente ao intimado reembolso de imposto, ou que justificasse a sua inércia no respectivo processamento -sem sucesso porém.
iv. De acordo com a técnica subjacente ao funcionamento do IRC, estamos perante um imposto autoliquidado - cujo montante é, portanto, definido pelo próprio sujeito passivo de imposto, resultando expressamente da lei (1) que a matéria colectável é, em regra, determinada com base em declaração do contribuinte, mas isto, como é óbvio, sem prejuízo do seu controlo por parte da AF.
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A AF é dotada de uma prerrogativa legal ao abrigo da qual pode desenvolver todas as diligências necessárias ao apuramento da situação tributária dos contribuintes (2), incluindo a confirmação dos elementos declarados pelo sujeito passivo (3).
vi. Posteriormente, também a liquidação de imposto - ou seja, a aplicação da taxa à matéria colectável - é efectuada pelo próprio contribuinte na sua declaração de rendimentos (4). tendo por base a matéria colectável fixada pelo mesmo (5), como supra se disse, e considerando ainda as deduções à colecta e/ créditos de imposto.
vii. Dessa liquidação pode resultar imposto a pagar ou a receber - sendo que, neste último caso, se fala de direito ao reembolso, o qual, nos termos do artigo 30.º n.º 1 c) LGT, integra a própria relação jurídica tributária.
viii. Estabelece, a este propósito, o artigo 96- do Código do IRC, na redacção dada pela Lei n.º 964/2008, de 5 de Dezembro, em vigor desde 01.01.2008, que: «(...) 2- Há lugar a reembolso ao contribuinte quando: a) O valor apurado na declaração, liquido das deduções a que se referem os nºs 2 e 4 do artigo 83, for negativo, pela importância resultante da soma do correspondente valor absoluto com o montante dos pagamentos por conta; O valor apurado na declaração, líquido das deduções a que se referem os nºs 2 e 4 do artigo 83, não sendo negativo, for inferior ao valor dos pagamentos por conta, pela respectiva diferença.».
ix. Estatui ainda o n º 3 do citado artigo 96.º CIRC que: «O reembolso é efectuado quando a declaração periódica de rendimentos for enviada ou apresentada no prazo legal e desde que a mesma não contenha erros de preenchimento, até ao fim do 32 mês imediato ao da sua apresentação ou envio.
(...).».
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Tal significa que o direito ao reembolso apurado resulta directamente da lei e deve ser processado oficiosamente por parte da Administração Fiscal, sem dependência de qualquer requerimento, sempre que se mostrem cumpridos os referidos pressupostos.
xi. Tal significa também, inversamente, que a AF só não terá a obrigação de proceder ao reembolso no prazo legal de três meses: - quando a declaração periódica de rendimentos não tenha sido apresentada no prazo legal e; - quando a mesma contenha erros de preenchimento.
xii. Em relação à tempestividade, como se encontra documentalmente provado nos autos, a declaração “Modelo 22” da Recorrente foi apresentada dentro do prazo legal.
xiii. Quanto à verificação da inexistência de erros na declaração e eventual controlo da legitimidade do reembolso - trata-se de tarefa que incumbe, indubitavelmente, à AF.
xiv. Isto é, tendo sempre presente que o ponto capital das funções da AF reside, hoje, essencialmente no controlo e fiscalização da veracidade das declarações dos contribuintes, a lei estabelece regras cujo escopo consiste em permitir à AF aquilatar da veracidade e legitimidade do crédito de imposto em que se concretiza o reembolso.
xv. Ora, nos termos da lei, para não proceder ao reembolso do imposto no prazo de três meses, cabe à AF identificar a existência de erros declarativos, pois que apenas a existência desses erros legitima que o reembolso não seja processado nesse prazo legal.
xvi.
In casu, a AF nem sequer apresentou contestação ao pedido de intimação, e, portanto, não invocou, e muito menos demonstrou, que o caso em apreço se enquadrava nas situações legais em que a AF está legitimada a não processar do reembolso no prazo legal de três meses, mormente demonstrando a existência de erros ou inexactidões na declaração de rendimentos da Recorrente.
xvii. Ou seja: competia à AF o ónus de provar que não tinha a OBRIGAÇÃO de reembolso, o qual constitui precisamente a contraface do DIREITO ao reembolso do contribuinte, nos termos do artigo 30.º LGT.
xviii. Em sinal contrário, decidiu o Tribunal a quo que: «(...) o pedido de intimação não pode proceder, por não ser evidente que a declaração não contenha erros de preenchimento (...)» (6).
xix. Salvo o devido respeito, a dupla negativa é perfeitamente ilustrativa do encargo que se pretende imputar ao contribuinte - a inversão do ónus da prova.
xx. Á Recorrente apenas competia invocar que apresentou a declaração de rendimentos e que dessa declaração resultou um reembolso, tendo em conta (i) que é a lei que define a competência do sujeito passivo para a liquidação, (ii) que é a lei que define que a AF tem a obrigação de proceder ao reembolso apurado nessa liquidação no prazo de três meses e (iii) que é a lei que estabelece que essa obrigação apenas cessa em caso de erro detectado na declaração.
xxi. Ora, sabendo-se que, nos termos da lei, cabe à AF controlar as declarações, é a ela que incumbe demonstrar que não processou o reembolso no prazo legal porque detectou...
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