Acórdão nº 08836/12 de Tribunal Central Administrativo Sul, 14 de Junho de 2012

Magistrado ResponsávelANA CELESTE CARVALHO
Data da Resolução14 de Junho de 2012
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I.

RELATÓRIO Lisandra ……………….

, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Ponta Delgada, datada de 31/03/2012 que, no âmbito do processo cautelar de suspensão de eficácia movido contra o Município de , indeferiu a providência cautelar requerida, de suspensão de eficácia do ato de declaração de nulidade parcial da autorização de utilização da habitação, sita na Rua do ………, freguesia de S. …….., .

Formula a aqui recorrente nas respetivas alegações (cfr. fls. 162 e segs. – paginação referente ao processo em suporte físico, tal como as referências posteriores), as seguintes conclusões que se reproduzem: “I- O requerido executou indevidamente o ato negativo suspendendo, ao ordenar aos respetivos serviços que continuassem a considerar, com base no mesmo e numa “pretensão” de emissão de resolução fundamentada, parcialmente nula a autorização de utilização concedida à requerente.

II- É entendimento jurisprudencial, com assento na Lei, que para acionar o mecanismo previsto pela parte final do n.° 1 do art. 128.° do CPTA de modo válido, a resolução tem que ser levada ao conhecimento do Tribunal antes de qualquer ato de execução do ato administrativo suspendendo, mesmo que tudo se passe dentro do prazo máximo para tal de 15 dias.

III- O requerido levou ao conhecimento do Tribunal a quo resolução alegadamente fundamentada para evitar o diferimento da execução do ato fora do prazo legal de que dispõe para o efeito, sem que o Tribunal a quo daí retirasse as devidas consequências legais.

III- A resolução fundamentada apresentada pelo requerido é de conteúdo exclusivamente jurídico, não contendo quaisquer factos que demonstrem que resultaria grave atentado ao interesse público o adiamento da execução do ato, sendo por isso os seus fundamentos improcedentes, o que se invoca para todos os efeitos legais.

IV- O Tribunal a quo não decidiu o incidente de declaração de ineficácia de ato de execução indevida por considerar tal decisão inútil perante a decisão desfavorável que proferiu no âmbito dos autos cautelares.

V- A decisão do incidente de declaração de ineficácia do ato de execução indevida era e é útil visto que a discussão sobre o mérito do pedido cautelar se mantém pelo presente recurso jurisdicional e visto que se mantém o pressuposto de perigo de lesão séria dos direitos e interesses legalmente protegidos da requerente.

VI- O Tribunal a quo tinha o dever legal de decidir o referido incidente, pelo que ao não fazê-lo incorreu a douta sentença em omissão de pronúncia, que comina a sua nulidade nos termos do art. 668.°, n.° 1 al. d) do CPC, aplicável ex vi art. 1.º do CPTA.

VII- O Tribunal a quo não designou dia nem local para inquirição das testemunhas oferecidas pela requerente no pedido cautelar, como se lhe impunha nos termos do art. 118.°, n.° 4 do CPTA e art. 619.°, n.° 2 do CPC a contrario sensu por não ter havido desistência da inquirição.

VIII- O Tribunal a quo não fundamentou suficientemente a decisão de afastamento da inquirição das testemunhas regularmente indicadas pela requerente, o que em conjunto com a violação das normas legais referidas em VIII resulta numa notória violação de lei e falta de fundamentação da sentença de que ora se recorre, nos termos do art. 668.°, n.° 1, al. b) do CPC, da qual se devem extrair as necessárias consequências legais.

IX- A inquirição testemunhal teria permitido evidenciar o direito da autora mediante o apuramento de factos que se subsumem sem dificuldade nos normativos invocados e circunstanciar o perigo de aplicação de penalizações pela instituição bancária da requerente através do apuramento dos elementos que neste âmbito foram verbalmente transmitidos a uma das testemunhas, pelo que tendo sido preterida ficou frustrado o direito e o dever da requerente fazer prova sumária do que alegou em sede cautelar.

X- A requerente fez prova sumária suficiente da existência de perigo sério da lesão dos seus direitos por aplicação de penalizações pela instituição bancária perante a qual tem responsabilidades devido à impossibilidade causada pelo requerido de apresentar o alvará de utilização de conteúdo correspondente à autorização de utilização concedida.

XI- O Tribunal a quo considerou, erradamente, que a impossibilidade de quantificação prévia dos prejuízos constituía motivo para não verificação do periculum in mora, quando a lei dispõe precisamente o contrário e assim é jurisprudencialmente reconhecido.

XII- O Tribunal considerou que as alegações da requerente em matéria de perigo sério de aplicação de penalizações não eram suficientemente específicas, quando as alegações do requerente cautelar não são meios de prova e as mesmas alegações corresponderam a documento da instituição bancária junto aos autos e ao qual o Tribunal a quo não faz referência.

XIII- A restante prova sumária a cargo da requerente ficou prejudicada pelo afastamento da inquirição das testemunhas por si oferecidas com o pedido cautelar.

XIV- O ato de declaração de nulidade parcial da autorização de utilização concedida à requerente padece de vício de incompetência por o seu autor não ser um dos órgãos do requerido, mas apenas um membro do órgão executivo da autarquia, ao que não obsta a competência legal que lhe assiste de emitir a autorização pois a lesividade da declaração de nulidade de um ato positivo e consolidado no ordenamento jurídico não permite a operação de argumento maioria de razão quanto à competência para a sua remoção do mesmo ordenamento.”.

Termina pedindo a procedência do recurso jurisdicional, ser declarada nula a sentença ou se assim não se entender, ser revogada e ser ordenada a baixa dos autos à 1ª instância para ser proferida decisão sobre o incidente de declaração de ineficácia do ato de execução indevida e designado dia para a inquirição das testemunhas apresentadas.

* O ora recorrido notificado apresentou contra-alegações (cfr. fls. 191 e segs.), formulando as seguintes conclusões: “

  1. A edificação da recorrente foi apenas e exclusivamente licenciada com um acesso pelo lado Norte do prédio da Recorrente e não pelo lado Sul – tal como foi já, em dezembro de 2010, objeto de expressa decisão municipal nesse sentido e como bem sabe e sempre soube a Recorrente, decisão municipal aquela devidamente alicerçada em parecer desfavorável vinculativo emitido pela autoridade regional competente (a, então, Direção Regional do Ordenamento do Território e dos recursos Hídricos).

  2. Ainda assim, a Recorrente, com pleno conhecimento daqueles termos em que a operação urbanística foi licenciada construiu clandestinamente o acesso Sul que lhe havia sido indeferido e requereu, a final, autorização de utilização, teimando no mesmo acesso Sul.

  3. O Recorrido não respondeu, em tempo, àquele pedido de autorização de utilização, tendo-se, nos termos legais, formado um ato tácito de deferimento – da autorização de utilização, obviamente, não da pretensão da Recorrente em aceder ao prédio pelo lado Sul.

  4. A autorização de utilização destina-se, porém, nos termos legais (cfr. art. 62°/1 do RJUE, a verificar a conclusão da operação urbanística, no todo ou em parte, e a conformidade da obra com o projeto de arquitetura e arranjos exteriores aprovados e com as condições do licenciamento.

  5. Conformidade essa que, in casu, não se verificava nem verifica.

  6. Por isso, foi, pelo Recorrido, reposta a legalidade, através da prática do ato, posterior, ora impugnado.

  7. E, ao contrário do que pretende fazer crer a Recorrente, não está, nem nunca esteve em causa a utilização do seu prédio ou, muito menos, o direito a nele habitar, porquanto a Recorrente é quem se recusa, obstinadamente, a requerer a autorização de utilização nos precisos termos em que licenciou a construção, acedendo ao seu prédio pelo lado Sul – daí, também, o facto de a nulidade invocada no ato impugnado ter sido meramente parcial.

  8. O presidente da câmara (ou o vereador com competências delegadas) é o órgão municipal legalmente competente para a prática de atos de emissão de autorizações de utilização de imóveis – ou da sua revogação ou declaração administrativa de nulidade – como resulta inequivocamente do disposto nos arts. 4°/ n°s 1 e 5 e 5°/n° 3 do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação (RJUE), aprovado pelo DL n° 555/ 99, de 16/12, na redação do DL n° 26/2010, de 30/3.

  9. Quanto aos alegados prejuízos de que padecerá a Recorrente, a existirem, o que só em mera hipótese se concebe, não são os mesmos juridicamente atendíveis, muito menos para o efeito do decretamento da providência cautelar requerida, porquanto os mesmos sempre entroncariam direta e exclusivamente no comportamento/ actução ilegal da própria Recorrente.

  10. Por outro lado, a Recorrente, com a sua atuação ilegítima, estava também a comprometer o respeito devido ao que resulta dos regimes jurídicos do domínio público marítimo, da Reserva Ecológica e do Plano de Ordenamento da Orla Costeira da Ilha Terceira, que evidenciam interesses públicos absolutos e que absolutamente se sobrepõem aos alegados prejuízos ou interesses particulares ora controvertidos.

  11. Por outro lado, ainda, Recorrido é totalmente alheio ao alegado contrato de mútuo celebrado entre a Recorrente e uma instituição bancária, contrato que não pode, de modo nenhum, sustentar, ainda que a título meramente cautelar, a concessão de uma autorização de utilização de uma pretensão urbanística executada contra a lei.

  12. É totalmente irrelevante que a Recorrente tenha ou não apresentado testemunhas para serem inquiridas nos presentes autos cautelares a propósito desses alegados prejuízos – o que, em qualquer caso, só soberanamente ao tribunal a quo competiria, como competiu, julgar (quanto a serem ou não as mesmas testemunhas indispensáveis a uma boa decisão da providência).

  13. Finalmente, quanto à alegada não pronúncia, pelo...

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