Acórdão nº 05204/09 de Tribunal Central Administrativo Sul, 04 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelANTÓNIO VASCONCELOS
Data da Resolução04 de Outubro de 2012
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

O Ministério Público, em representação do Estado Português, e a sociedade A...– ..., SA, inconformados com a sentença do TAC de Lisboa, de 10 de Dezembro de 2008, que julgou parcialmente provada a acção administrativa comum intentada pela sociedade A...e consequentemente condenou o R. Estado no pagamento à A. de uma indemnização no valor de € 326.788,62, dela recorreram, concluindo como segue: A - Recurso do Ministério Público, em representação do Estado Português: 1. Na sequência de anúncio feito pela Comunicação Social de que havia sido detectada a presença de nitrofuranos em aves de explorações portuguesas, o MADRP determinou a apreensão de todos os produtos de aves abatidas e congeladas anteriormente a 14 de Março de 2003 e a sua destruição.

  1. A referida crise de confiança só foi debelada após a ordem de apreensão e destruição dada pelo MADRP, na sequência da qual se verificou um aumento das vendas e do preço de mercado da venda de carne de aves, evitando-se também um embargo a Portugal por banda da União Europeia, à exportação destas carnes.

  2. A ordem lícita dada pelo MADRP visou debelar e na realidade debelou, a crise dos nitrofuranos.

  3. Encontram-se preenchidos os requisitos da responsabilidade civil extracontratual do Estado, por acto lícito.

  4. Porém, na sentença ora recorrida, ao fixar o montante indemnizatório devido, a Mma. Juíza incorreu em erro de julgamento, não só porque no cálculo da indemnização efectuou uma duplicação dos produtos, calculando-os uma vez pelo valor constante da contabilidade da Autora e, outra vez, pelo respectivo preço médio de venda, como ainda adoptou, para a fixação do quantum indemnizatório, o critério previsto para actuações decorrentes de facto ilícito.

  5. A situação característica do abate sanitário, sendo por um lado, de sacrifício especial do direito do particular, é aquela em que o lesado se encontra, também ele, envolvido especialmente na situação de risco, por actividade desenvolvida no seu interesse, cujas consequências são o dever de suportar uma parcela dos danos, a título de risco, e só a parte restante daqueles ser suportada ou rejeitada por terceiros.

  6. Pelo exposto, o montante indemnizatório fixado pela Mma. Juíza não pode deixar de ser considerado claramente excessivo.

    Deve, assim, a douta sentença ora recorrida ser alterada e substituída por outra em que o Estado seja condenado em indemnização de montante substancialmente mais reduzido.

    - Contra-alegações da sociedade A...– ..., SA: 1. O Réu Estado Português não referiu, em momento algum do douto recurso apresentado, quais os pontos concretos da matéria de facto que, na sua óptica, foram incorrectamente julgados.

  7. Tal como também não indicou quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão diversa da proferida.

  8. Por esta razão, entende a recorrente que no caso sub iudice se verifica uma violação do disposto nas alíneas a) e b) do n9 l do artigo 690.9-A do CPCivil que expressamente determinam que "quando se impugne a decisão proferida sobre matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) Quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida." 4. O incumprimento daqueles dois ónus impõe que o respectivo recurso - quanto à parte que se refere à sobre matéria de facto - seja imediatamente rejeitado.

  9. A questão da indemnização pelos lucros cessantes tem por base o requerimento de ampliação do pedido (articulado de fls 206 a 211) apresentado em 03/02/2006 por parte da ora recorrida.

  10. A esse pedido, o Réu Estado Português respondeu por articulado de 14/06/2006 onde se limitou a impugnar a tempestividade do pedido.

  11. Em sede de audiência de julgamento nunca o recorrente suscitou qualquer dúvida quanto à questão da forma de valorização destes bens.

  12. Nem confrontou as testemunhas com estas dúvidas, nem requereu a junção qualquer de prova que confirmasse as suas conclusões.

  13. Também em relação à parte do recurso que incidiu sobre matéria de direito entendemos existirem razões para concluir que ocorreu a violação de regras processuais, em concreto do disposto no artigo 690º, nº 2 do CPCivil.

  14. É que as respectivas conclusões deveriam conter indicação sobre as normas jurídicas violadas pela decisão impugnada, o sentido com que, no entender destes, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas ou, finalmente - e caso fosse invocado erro na determinação da norma aplicável - a norma jurídica que, sempre no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada.

  15. E cotejando as conclusões apresentadas por parte do recorrente não se vislumbra qualquer sinal dessa indicação.

  16. Razão pela qual deve o ora recorrente ser convidado a rectificar as respectivas conclusões, sob pena do seu não conhecimento, conforme prescreve o art. 690º nºs.2 e 4 do CPCivil, o que desde já se requer 13. Em relação à invoca existência de um pretenso erro de determinação da norma aplicável, na medida em que na responsabilidade sobre facto lícito a indemnização não deverá calculada "pelo valor dos danos especiais e anormais sofridos", entende a recorrida que, salvo o devido respeito pela opinião contrária, não assiste qualquer razão ao recorrente.

  17. Inexiste qualquer fundamento legal que apoie a tese da multiplicidade de critérios para apuramento do valor da indemnização, em função da natureza dos factos que estiveram na respectiva base 15. Nos números l e 2 do artigo 9º.2 do Decreto Lei nº 48051 de 21 de Novembro de 1967, o legislador ocupou-se, exclusivamente, em definir os critérios da determinação da natureza dos prejuízos causados por acto lícito.

  18. Dado que caso os mesmos não revestissem natureza especial e anormal, não eram susceptíveis de serem indemnizáveis, dado encontrarem-se compreendidos no âmbito da normal actividade do sujeito.

  19. A matéria do critério de determinação do valor a liquidar nas situações de responsabilidade civil, encontra a respectiva sede nos artigos 562º s e ss do Código Civil.

  20. E aí o legislador ocupou-se da obrigação de indemnização latu sensu, sem distinguir entre a origem do dano ou da natureza do facto.

  21. O princípio geral plasmado no artigo 562º do Código Civil prescreve unicamente que "quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação." 20. Foi nos artigos 483º e ss do Código Civil (em capítulo perfeitamente distinto do reservado à matéria da obrigação de indemnizar) que o legislador se ocupou da origem da responsabilidade civil, distinguindo então a responsabilidade por factos ilícitos da responsabilidade pelo risco.

  22. Finalmente, cumpre ainda dissecar o conceito de "abate sanitário" que amiúde é invocado pelo recorrente Estado Português.

  23. Ínsita à figura do "abate sanitário" encontramos duas ideias: a) A morte de animais vivos; b) O abate de animais por razões de salvaguarda de saúde animal ou humana.

  24. No caso sub iudice nenhuma destas duas concepções encontra qualquer acolhimento.

  25. Todos os bens destruídos correspondiam a carne de aves congelada, pertencente a animais mortos sob supervisão das autoridades veterinárias.

  26. Por outro lado, porque conforme se extrai dos pontos 5. e 6. da matéria de facto não provada, nem os produtos estavam contaminados por nitrofuranos, nem sequer existia a suspeita dessa contaminação.

    TERMOS em que deve negar-se provimento ao recurso do Recorrente Estado Português. Com o que se fará a tão costumada.... JUSTIÇA! * B - Recurso da sociedade A...– ..., SA: 1. O presente recurso é interposto em relação à parte da sentença proferida em 10 de Dezembro de 2008 que julgou improcedente o pedido da Autora, ora Recorrente, de condenação do réu Estado português no pagamento de uma indemnização de valor igual às 2. quantias correspondentes aos resultados de exploração negativos referentes aos meses de Março, Abril, Maio e Junho de 2003.

  27. Pese embora a totalidade dos prejuízos invocados tivesse sido dada como provada - e ao contrário dos demais valores peticionados - nesta situação concreta a Mma Juiz a quo entendeu que "não terão sido as ordens dadas que motivaram os resultados negativos da A., salvo aqueles que derivaram directamente da perda dos bens destruídos e da sua não venda." 4. Ou seja, julgou que pese embora se tratassem de prejuízos especiais e anormais, não ficou demonstrado o nexo de causalidade entre esses danos concretos e as ordens do MADRP.

  28. Para se obter uma resposta à questão que constitui o cerne fundamental do presente recurso, afigura-se-nos relevante destacar os seguintes factos da matéria provada: A."A A. é uma sociedade comercial que tem por objecto o exercício da actividade de transformação e comercialização de carnes de aves e preparados." B. "Com vista ao normal desenvolvimento da sua actividade adquire a terceiros carcaças de aves mortas para posteriormente as desmanchas ou submeter a processo de transformação" Q. "Na sequência da referida comunicação o Corpo de Inspecção Veterinária concretizou a apreensão dos bens que se encontravam as instalações da A." R. "Estavam armazenados nas instalações da A. e foram apreendidos 55. 956 Kg de frango inteiros, 11.757 Kg de perna de frango, 897 Kg de asas de frango e 6.633 unidades de codornizes (correspondentes sensivelmente a 663. 300 Kg)." KKK. "Após a destruição dos produtos acima referidos a A. ficou impossibilitada de desenvolver a sua normal actividade no que respeita à venda de produtos congelados com data anterior a 1403.2003." LLL. "Nos meses de Março a Junho a A. teve resultados líquidos negativos." MMM. "Que no mês de Março de 2003 se cifraram em € 324.682,38." NNN. "E em Abril de 2003 em € 468.657,91" 000...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT