Acórdão nº 02506/07 de Tribunal Central Administrativo Sul, 18 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelCRISTINA DOS SANTOS
Data da Resolução18 de Outubro de 2012
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

A Caixa Geral de Aposentações, com os sinais nos autos, inconformada com a sentença proferida pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra dela vem recorrer, concluindo como segue: 1. Salvo o devido respeito, entende a autoridade recorrida, ora recorrente, que o Meritíssimo Juiz a quo não interpretou nem aplicou correctamente os artigos 47° e 51° do Estatuto da Aposentação, ambos na redacção introduzida pela Lei n° 30-C/92, de 28 de Dezembro, bem como o artigo 10° do Código Civil, e o artigo 660°, n°2, do CPC, ex vi artigo 1° da LPTA, por omissão de pronúncia.

  1. Pouco antes de passar à aposentação, a interessada passou subitamente a auferir uma remuneração base no valor de Esc. 418.000$00 (2.084,98 €), ou seja, mais do dobro da remuneração auferida no ano anterior, valor que não tinha qualquer correspondência com a remuneração que vinha auferindo ao longo da sua carreira contributiva.

  2. O súbito aumento, superior a 100%, da remuneração da interessada pouco antes de passar à situação de aposentação e sem aparente fundamento consistiu num mecanismo, acordado entre a interessada e a sua entidade patronal, para a fazer beneficiar de uma pensão de aposentação muito superior às remunerações anteriormente percebidas, ou seja, de uma pensão que, não tendo correspondência com as quotas descontadas pela interessada nem com as contribuições efectuadas pelo estabelecimento de ensino, passaria assim a ser suportada pelo erário público.

  3. Com a sua conduta, a interessada pretendeu um resultado que a lei proíbe - beneficiar de uma pensão sem correspondência na carreira contributiva - mediante uma conjugação de actos que em si podem ser lícitos, mas praticados intencionalmente com o objectivo de alcançar um resultado não permitido pela lei.

  4. Trata-se de uma situação que faz suspeitar de fraude à lei e em relação à qual o Mm° Juiz a quo deveria ter-se pronunciado, o que não fez, havendo assim uma omissão de pronúncia nos termos do artigo 660°, n°2, do CPC, ex vi artigo 1° da LPTA.

  5. O regime de aposentação da função pública aplica-se, em primeira linha, aos funcionário públicos com uma relação jurídica de emprego público, a qual assenta no princípio da estabilidade e da permanência da carreira, o que leva a que a pensão de aposentação calculada com base na última remuneração auferida reflicta a regularidade dos descontos efectuados pelo subscritor ao longo da sua carreira.

  6. A extensão do regime da aposentação da função pública a trabalhadores sujeitos ao regime do contrato individual de trabalho suscita sérias dificuldades de coadunação entre normas de direito privado e de direito público e situações não reguladas pela lei, cumprindo à Administração a tarefa de integrar as lacunas normativas existentes nesse regime jurídico.

  7. A regulação da situação dos subscritores da CGA sujeitos ao regime do contrato individual de trabalho, com possibilidade de súbitas oscilações nas suas remunerações e na sua carreira contributiva, era, até à Lei n° 1/2004, de 15 de Janeiro, um caso omisso na lei, havendo assim uma lacuna legislativa nesta matéria.

  8. Contrariamente ao decidido pelo Mm° Juiz a quo, entende a ora Recorrente que, na presente situação, as razões justificativas do artigo 51º, nº 2, do Estatuto da Aposentação procediam relativamente ao caso omisso, ou seja, à situação de elevação brusca, acentuada e infundada das remunerações de subscritores sujeitos ao contrato individual de trabalho pouco antes da sua passagem à aposentação.

  9. Pela analogia aplica-se uma disposição legal para além do que esta efectivamente determina, por se entender que se o caso omisso tivesse sido considerado pelo legislador este a teria resolvido de igual maneira.

  10. E, na realidade, na situação dos subscritores sujeitos ao regime do contrato individual de trabalho, o legislador veio, por fim, resolver a situação de maneira semelhante à prevista nos n°s l e 2 do artigo 51°, aditando um nº 3 a esta disposição (Lei n.° 1/2004, 15 de Janeiro).

  11. Assim, contrariamente ao decidido na sentença recorrida, entende a ora Recorrente que não houve qualquer erro ao aplicar, por analogia, o artigo 51°, nº 2 do Estatuto da Aposentação ao cálculo da pensão de aposentação da interessada considerando-se não a última remuneração auferida, mas sim a média mensal das remunerações auferidas nos últimos três anos que antecederam a aposentação.

  12. Nestes termos, e com o douto suprimento de Vossas Excelências, deverá ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional e revogada a douta decisão recorrida, com as legais consequências.

    * A Recorrida contra-alegou, concluindo como segue: 1. A Recorrida impugnou o despacho datado de 16 de Outubro de 2002 da Direcção da Caixa Geral de Aposentações, pretendendo com esta impugnação decisão de declaração de nulidade do acto recorrido ou se assim não se entendesse deveria o mesmo ser anulado por padecer do vício de violação de lei.

  13. Em causa estava pois nos autos a existência de divergência entre Recorrente e Recorrida relativamente aos normativos a aplicar na determinação do cálculo da pensão requerida pela Recorrida. Ou seja, a Recorrida entende que à sua situação concreta aplica-se o disposto nos artigos 47°, n° l e 53º do Estatuto da Aposentação e, a Recorrente entende que à mesma situação concreta aplica-se o disposto no artigo 51° do Estatuto da Aposentação, na redacção dada pela Lei nº. 30-C/92, de 28.12.

  14. No caso dos autos a situação em crise reporta-se à aplicação por analogia, pela autoridade recorrente do preceituado no artigo 51° do Estatuto da Aposentação, invocando tratar-se de caso omisso na lei.

  15. Não é, nem pode a Recorrida aceitar este entendimento.

  16. A aplicação à situação da recorrida, por analogia, o disposto no artigo 51° do Estatuto da Aposentação, consubstancia a elaboração de um erro pela ora recorrente na interpretação e aplicação do preceito legal em referência.

  17. Consequentemente, o despacho impugnado está ferido do vício de violação de lei, por violação do disposto nos artigos 51° e 47°, n° l, ambos do Estatuto da Aposentação, resultando daí a violação do princípio da legalidade previsto no artigo 3° do CPA.

  18. O regime jurídico da aposentação na função pública foi aprovado pelo Decreto-Lei n° 498/72, de 9 de Dezembro e, a pensão de aposentação devida ao pessoal docente do ensino particular, como é o caso da recorrida, é determinada e paga, por aplicação do disposto no artigo 6° do Decreto-Lei n°. 321/88, de...

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