Acórdão nº 04957/11 de Tribunal Central Administrativo Sul, 09 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelPEDRO VERGUEIRO
Data da Resolução09 de Outubro de 2012
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo Sul: 1.

RELATÓRIO “P………. - …………….., LDA.”, devidamente identificada nos autos, inconformada veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Tributário de Lisboa, datada de 24-03-2011, que julgou improcedente a pretensão pela mesma deduzida na presente instância de IMPUGNAÇÃO, relacionada com IRC de 1995.

Formulou nas respectivas alegações (cfr. fls. 246-268), as seguintes conclusões que se reproduzem: “… A) A sentença recorrida, ao não conhecer do pedido principal formulado pela ora Recorrente na sua petição de impugnação, enferma de vício de manifesto erro de julgamento quanto a matéria de facto e de direito, nos termos do 659° e 668.° do Código de Processo Civil; B) Com efeito, em 1997, as Autoridades Fiscais realizaram um procedimento inspectivo à ora recorrente relativo ao exercício de 1995, tendo no seu âmbito concluído pela correcção da matéria colectável da ora recorrente, para efeitos de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (“IRC”), no montante de 18.935.938$00, ou seja, € 94.452,28 (noventa e quatro mil quatrocentos e cinquenta e dois euros e vinte e oito cêntimos), sendo que para o presente recurso, apenas, importa, a importância de 2.300.000$00, hoje convertido em € 11.472,35 (onze mil quatrocentos e setenta e dois euros e trinta e cinco cêntimos) relativa a custos com as prestações de serviços adquiridas pela recorrente à empresa P………… — SOCIEDADE ……………………………, LDA; c) Sucede que, a referida correcção resulta da desconsideração, por parte da administração fiscal, dos custos com as prestações de serviços adquiridas pela ora recorrente à empresa P……………durante o ano de 1995, evidenciadas em vários documentos juntos aos autos, como sejam: o contrato de empreitada/orçamento firmado a 30.10.1995; facturas n.° 305, 307, 308 e 309, emitidas por tal entidade a 02.12.1995, 11.12.1995, 19.12.1995, 11.01.1996 respectivamente, bem como, duas cartas escritas pela recorrente à empresa P…………. rescindindo o aludido contrato; D) A correcção efectuada em sede de IRC, impugnada nos presentes autos, foi efectuada sem que houvesse, in casu, prova de indícios sérios que traduzissem uma probabilidade elevada de que as operações referidas nas facturas em que tal imposto era mencionado não tivessem sido efectivamente realizadas, apoiando-se antes em meras presunções de ordem geral sobre a actividade da empresa P…………; E) Nos termos das disposições conjugadas do artigo 74.º da LGT, tal prova cabe prima facie à Administração Fiscal; F) A sentença recorrida, ao desconsiderar os aspectos enunciados nas alíneas anteriores, e ao concluir que a Administração Fiscal dispunha de motivos suficientes para considerar como simuladas as operações referidas nas facturas mencionadas na alínea b) supra, enferma de erro de julgamento; G) Perante a abundante prova documental e testemunhal produzida pela ora recorrente, evidenciadora de que José ……………, prestou diversos serviços para a ora recorrente em tal ano, actuando em nome e por conta da empresa P………………, e que estes foram pagos através de cheques à ordem daquele e desta, a sentença recorrida, ao haver concluído, dadas as presunções da administração fiscal, que “as facturas não correspondem a transacções reais. Ainda que as operações que lhe estão subjacentes possam ter ocorrido de facto, elas terão, quando muito, sido realizadas entre a P……………. e outra entidade (José ………..), pelo que a operação com a P……………. é, no mínimo fictícia. Poderá ainda admitir-se que os cheques tenham sido destinados a ser levantados e devolvidos, posteriormente à P…………”, enferma de um manifesto erro na apreciação da matéria de facto e de direito; H) Com efeito, ao bastar-se o Meritíssimo Juiz com meros juízos de valor generalistas, e com os meros indícios superficiais aduzidos pela administração fiscal, não procurando fazer a análise crítica da prova carreada para os autos, procedendo, inclusive ao desmerecimento de prova documental junta pela recorrente, enferma a sentença recorrida de um manifesto erro na apreciação da matéria de facto e de direito; I) A jurisprudência firme dos tribunais, apoiada na melhor interpretação da lei, sempre tem apontado para o sentido, à Administração fiscal pende o ónus de demonstrar a factualidade que a considerar determinada operação como simulada, factualidade essa que tem de ser susceptível de abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respectivos documentos de suporte (atento o princípio da declaração e da veracidade da escrita vigente no nosso direito), só então passando a competir ao contribuinte o ónus de prova de que as operações se realizaram efectivamente. – o que não aconteceu no caso em apreço! J) A sentença recorrida, ao desconsiderar a matéria de facto produzida nos autos de impugnação e ao desconsiderar a relevância da prova documental e testemunhal produzida nos autos de impugnação, para efeitos de comprovação da veracidade das operações constantes das facturas referidas na alínea c) supra, encerra um manifesto erro de julgamento quanto a matéria de facto e de direito.

K) Pelo exposto, a correcção à matéria colectável de IRC e a correspondente liquidação adicional daquele imposto, efectuada pelos serviços da administração fiscal, impugnada pela ora recorrente, e mantida pela douta sentença em recurso, violou inequivocamente os artigos 23° do Código IRC e o artigo 74.º da Lei Geral Tributária.

Termos em que o presente recurso deverá ser julgado procedente por provado e, em consequência, declarada nula e anulada a decisão recorrida, CONFORME É DE INTEIRA JUSTIÇA!” A recorrida Fazenda Pública não apresentou contra-alegações.

O Ministério Público junto deste Tribunal pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso.

Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.

2.

DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO –QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que a realidade a apreciar abrange a relevância e alcance da impugnação dirigida pela Recorrente à matéria de facto apurada nos autos e bem assim a consideração da questão da bondade da correcção à matéria colectável de IRC com referência ao disposto nos artigos 23° do Código IRC e o artigo 74.º da Lei Geral Tributária.

3.

FUNDAMENTOS 3.1 DE FACTO Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte: “… 1. Em cumprimento das Ordens de Serviço n° 64133, 64134 e 64135, todas de 02/01/96, com o com despacho favorável de 06/05/97 do Exmo. Sr. Chefe da Equipa de Acções Especiais (Equipa 60) dos S.P.I.T. (Oriental), foi efectuada com inicio no dia 08/05/97, visita de fiscalização, aos exercícios de 1993, 1994 e 1995, ao contribuinte P…………….. - …………………, Lda. NIPC ……………8, na sua sede, sim na Rua ………………. no 5 - A, Lisboa (cf. relatório da inspecção a fl. 90 e seguintes que se dá por reproduzido); 2. As referidas Ordens de Serviço, segundo a os serviços de inspecção, tiveram na origem da sua emissão uma denúncia, na qual se refere que o contribuinte se encontra envolvido em “negócios” que envolvem facturação fictícia, quer na qualidade de emitente, através da sobrevalorização dos trabalhos realizados para terceiros (entidades públicas, para quem trabalhava quase exclusivamente) quer na qualidade de utilizador, porquanto terá recorrido a facturas não correspondentes a transacções reais, a fim de “compensar” os elevados lucros gerados pela facturação excessiva, a qual terá sido emitida por conluio com os clientes, (fl. 92); 3. Na sequência da referida denúncia foram emitidas Ordens de Serviço para os exercícios de 1992 a 1995 (nos. 64132 a 64135), mas, tendo sido dada prioridade ao exercício de 1992, o Relatório da fiscalização a esse exercício foi dado por concluído em 10/10/97; 4. O Objecto da sociedade, tal como se encontra definido no pacto social inicial, é a “indústria de construção civil e obras públicas ou qualquer outro ramo de actividade comercial ou industrial que os sócios resolvam explorar e que seja permitido por lei”; 5. No exercício em análise, tal como no decurso de toda a sua actividade, a Impugnante dedicou-se, à construção civil, tendo trabalhado quase exclusivamente para entidades públicas (fl. 95); 6. Os maiores clientes da Impugnante são as Câmaras Municipais, para quem efectua trabalhos de arruamentos saneamento básico, reparações etc., tendo merecido um particular destaque, pela sua dimensão a obra do “Saneamento Básico da ………..” (fl. 95); 7. A partir de finais de 1995, a Impugnante iniciou algumas obras privadas (fl. 95); 8. No que se refere ao IRC a impugnante é tributada pelo regime geral (fl. 95); 9. Na contabilidade da Impugnante são emitidos dois tipos de Balancetes: - Com acumulados e com saldos; - Só com movimentos do mês; (fl. 96); 10. Segundo a Administração Tributário o facto referido no ponto anterior “dificulta qualquer tipo de análise, já que cada um deles não é independente do outro, Para além disso, nos Balancetes inicialmente exibidos apenas aparecem as contas com saldo no final do ano, independentemente de terem ou não tido movimento no exercício, enquanto toda as contas que não têm saldo no fim do mês, mas que tiveram movimento no ano, somam os seus valores acumulados para uma linha de que aparece no final de todos os outros clientes ou fornecedores. Esta prática, além de incorrecta inviabiliza uma análise minimamente eficaz, o que obrigou “decomposição” dos referidos valores acumulados das “contas saldadas” só possível pelo facto de a empresa possuir, extra-contabilisticamente extractos manuais de fornecedores. Conclui-se, pois, que o sistema contabilístico existente não oferece credibilidade, enquanto, por um lado, a existência de contas correntes para/elas, a que, aliás...

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