Acórdão nº 09083/12 de Tribunal Central Administrativo Sul, 13 de Setembro de 2012

Magistrado ResponsávelANA CELESTE CARVALHO
Data da Resolução13 de Setembro de 2012
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I.

RELATÓRIO A...Seguros, Companhia de Seguros de Vida, SA, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, datada de 27/03/2012 que, no âmbito do processo de intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões, movido contra o Hospital B..., EPE, julgou improcedente a intimação requerida, absolvendo a entidade requerida do pedido, a facultar à requerente, através do seu médico conselheiro, a consulta do processo clínico de C..., em especial, o atestado médico, devidamente preenchido, acerca da doença que esteve na origem do seu óbito.

Formula a aqui recorrente nas respetivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem: “1. O presente Recurso vem interposto da douta sentença proferida nos autos em 27 de março de 2012, pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, a qual decretou improcedente a Intimação requerida pela Autora contra o Hospital B... EPE, já que C... não terá dado o seu consentimento expresso e especifico para que a Seguradora possa aceder à sua informação de saúde, consentimento esse imposto pelo n°2 do art. 7° da Lei de Proteção de Dados Pessoais (LPDP), pelo n° 3 do art. 3° da Lei 12/2005, de 26 de janeiro e pelo n° 5 do art.6° da Lei 46/2007, de 24 de agosto (LADA).

  1. Não se conformando com a douta sentença proferida, vem a Recorrente dela recorrer, defendendo que a Sentença proferida pelo Tribunal a quo apresenta também um erro de julgamento no que se refere à apreciação da matéria de facto e de direito: DOS FACTOS III) Com relevância para o presente recurso, há que referir os seguintes factos julgados provados pelo Tribunal a quo: a) Em 12 de setembro de 2011, a ora Requerente enviou ao Hospital B..., EPE, oficio subscrito pelo Dr. D..., médico conselheiro da ora Requerente, com o seguinte teor: “(…) venho pela presente solicitar a seguinte informação complementar: data de diagnóstico de cirrose hepática etanólica; b) Na ausência de resposta da Entidade Requerida e na sequência de queixa apresentada pela Requerente, em 22 de novembro de 2011 a Comissão de Acesso a Documentos Administrativos emitiu o Parecer n°349/2011, no qual se concluí que “deve ser facultado o acesso à informação de saúde requerida’ c) Notificado deste Parecer a Entidade Requerida não forneceu à Requerente a informação solicitada; d) Na cláusula 3. Das “Condições Gerais” do “Seguro de Vida Individual – Crédito ao Consumo” da A...Seguros pode ler-se “o tomador de seguro ou o segurado obriga-se aquando da celebração do contrato, a declarar com exatidão todas as circunstâncias que conheça e razoavelmente deva ter por significativas para apreciação do risco...”, sendo que “em caso de incumprimento doloso do dever referido no n°3.1, o contrato é anulável mediante declaração enviada pela Seguradora ao tomador de seguro”, e) Na cl. 9.1 das “Condições Gerais” do “Seguro do Vida Individual – Crédito ao Consumo” da A...Seguros pode ler-se “o pagamento de qualquer importância relativa a esta apólice só será exigível após solicitação à Seguradora, acompanhada dos documentos justificativos exigidos nas Condições Especiais da modalidade contratada.”; f) Na cláusula 1.7.2.3. das “Condições Especiais” do “Seguro de Vida Individual – Crédito ao Consumo” da A...Seguros pode ler-se: “o pedido de liquidação do capital seguro deverá ser acompanhado (...) de atestado médico onde se declarem as causas, início e duração da doença ou lesão que causou a morte”.

  1. Do erro no julgamento IV) Face à prova produzida nos autos, não pode a Recorrente conformar-se com a Decisão de absolvição da Ré da instância, já que os herdeiros da Segurada não se opuseram ao acesso aqui em causa, nos termos do n°2 do art7l° do CC, pelo que ficou prejudicada tal questão de alegada ilegitimidade; V) Na verdade, o acesso solicitado pela Requerida nestes autos deve ser analisado somente à luz da Lei 12/2005, de 26/01 e da Lei 46/2007, de 24/08, já que a LPDP não tem aqui aplicação; pelo que a eventual ilegitimidade da Recorrida para aceder aos dados de saúde de C... apenas poderia ser invocada pelas pessoas indicadas no n°2 do art.71° do CC (herdeiros da segurada) e não pela Recorrente.

Sem prescindir, VI) Atentos os requisitos impostos pelo n°3 do art.3° da Lei 12/2005, de 26 de janeiro e pelo n°5 do art.6° da LADA (consentimento escrito do titular dos dados e acesso ser realizado através de médico), ter-se-á que concluir que a ora Recorrente tem legitimidade para aceder ao relatório clinico onde conste a data de diagnóstico de cirrose hepática etanólica, já que:

  1. A segurada C...

    , ao ter subscrito um contrato de seguro de vida em cuja condição para liquidação das importâncias seguras passava pelo acesso da Seguradora aos seus dados clínicos (em especial ao atestado médico onde se declarem as causas, inicio e duração da doença ou lesão que causou a morte), terá que se entender qual tal subscrição, efetuada através de documento escrito, incorpora uma autorização de acesso aos seus dados de saúde, mesmo após a sua morte.

  2. tal acesso será efetuado através de médico conselheiro da Seguradora.

    Caso assim não se entenda, VII) A ora Recorrente é também titular de um interesse direto, pessoal e legitimo relevante, segundo o princípio da proporcionalidade, que a legitima a aceder aos dados de saúde da segurada, nos termos do n°5 do art.6° da LADA; isto porque, os objetivos de “(...) atestar a causa e circunstâncias em que ocorreu a morte do segurado, assim como se as suas declarações de saúde aquando da celebração do contrato eram verdadeiras (.,) constituem também um interesse direto, pessoal e legitimo, que legitima o acesso à informação.

    ” (vide Ac. TCA Sul, processo n° 8472/12).

    VIII) Face ao exposto, impõe-se a revogação da Douta Sentença do Tribunal a quo.”.

    Termina pedindo a procedência do recurso jurisdicional.

    * O Hospital recorrido, notificado, não apresentou contra-alegações.

    * O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto no art. 146.º do CPTA, emitiu parecer no sentido da procedência do recurso, nos exatos termos em que vem alegado, valendo a doutrina do Acórdão do TCAS de 08/03/2012, recurso nº 08472/12, revogando-se a sentença sob recurso.

    * Nenhuma das partes se pronunciou sobre o parecer emitido pelo Ministério Público.

    * O processo vai, sem vistos dos Exmos. Juízes-Adjuntos, à Conferência para julgamento, por se tratar de um processo urgente.

    II.

    DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela recorrente, sendo certo que o objeto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos arts. 660º, n.º 2, 664º, 684º, nºs 3 e 4 e 690º, n.º 1 todos do CPC ex vi artº 140º do CPTA.

    As questões suscitadas resumem-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida enferma de erro de julgamento, na apreciação da matéria de facto e de direito, quanto à existência de legitimidade da requerente para aceder à informação requerida e quanto à existência ou não de consentimento válido e eficaz para aceder aos dados de saúde da subscritora do contrato de seguro de vida.

    III.

    FUNDAMENTOS DE FACTO O Tribunal a quo deu como assentes os seguintes factos: “

  3. Em 12 de setembro de 2011, a ora Requerente enviou ao Hospital B..., E.P.E. ofício subscrito pelo Dr. D..., Médico Conselheiro da ora Requerente, com o seguinte teor: “Assunto: Seguro Vida Crédito ao Consumo Apólice 17/263146 – Sinistro 17/3418 Sinistro participado por óbito de: C... Data de Nascimento: 1953.01.23 Contribuinte: 120053020 Estimado colega, Como é do seu conhecimento, é essencial a uma companhia de seguros, sobretudo do Ramo Vida, o conhecimento de todos os factos do dossier clínico de um cliente, quando existe a possibilidade de um capital consequente do mesmo.

    Assim e tendo em atenção os termos do contrato de seguro celebrado entre a A...Seguros e a Sra. C..., e no seguimento da última informação clínica recebida, venho pela presente, solicitar a seguinte informação complementar: - Data de diagnóstico de Cirrose Hepática Etanólica.

    Aproveitamos para enviar em...

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