Acórdão nº 03139/09 de Tribunal Central Administrativo Sul, 29 de Janeiro de 2013
Magistrado Responsável | BENJAMIM BARBOSA |
Data da Resolução | 29 de Janeiro de 2013 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL: 1 - Relatório a) - As partes e o objecto da acção Fundação EDP, com os demais sinais nos autos, veio intentar acção administrativa especial contra os Ministérios das Finanças e da Administração Pública (actualmente Ministério das Finanças), e o Ministério da Cultura (actual Secretaria de Estado da Cultura, integrada na Presidência do Conselho de Ministros) pedindo a anulação do despacho do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (SEAF) de 14-01-2009, que lhe indeferiu o pedido de reconhecimento do benefício fiscal relativo aos donativos atribuídos a título de dotação inicial pelo mecenas fundador e a condenação do Ministério das Finanças e do Ministério da tutela da cultura a reconhecerem o beneficio fiscal aos donativos efectuados com a dotação inicial da Autora, caso se venha a admitir que o beneficio fiscal em causa era condicionado.
Alega, em resumo, que o despacho impugnado padece de erro nos pressupostos de facto, na medida em que considerou que em caso de extinção os bens atribuídos a título de dotação inicial pelo mecenas fundador não revertiam para o Estado ou outras entidades, e erro nos pressupostos de direito, visto que não era exigível à data dos factos o reconhecimento do referido benefício fiscal, sendo este outrossim de aplicação automática. Alega ainda que o autor do acto era incompetente para a sua prática.
Contestaram ambos os réus, arguindo o Ministério da Cultura a sua ilegitimidade, por não ser parte na relação material controvertida relativa ao despacho do SEAF e no mais propendendo para a improcedência da acção.
Quanto ao Ministérios das Finanças e da Administração Pública contestou arguindo a ilegitimidade da autora, por o acto impugnado não produzir na sua esfera jurídica efeitos lesivos, já que a consideração como custo ou perda de exercício na sua totalidade dos donativos concedidos à entidade beneficiária (a autora) se repercute na esfera jurídica da EDP, Energias de Portugal, S.A., a entidade que concedeu os donativos, não existindo qualquer prejuízo para a autora, nem jurídico, nem financeiro, nem patrimonial, nem moral, nem obtém qualquer vantagem da eventual anulação do acto.
A autora replicou pugnando pela improcedência das excepções, mas requereu a intervenção provocada da EDP – Energias de Portugal, S.A.
Em despacho saneador foram julgadas improcedentes as excepções da ilegitimidade activa da autora e passiva do Ministério da Cultura, não tendo sido admitida a intervenção provocada da EDP – Energias de Portugal, S.A..
Esse despacho transitou em julgado.
Em alegações a autora formulou as seguintes conclusões: a. Encontram-se verificados todos os pressupostos processuais e não existem motivos que obstem ao conhecimento do pedido.
b. Tendo o Ministério da Cultura sido extinto em resultado da recente tomada de posse do XIX Governo Constitucional e integrando-se, actualmente, o Secretário de Estado da Cultura e a respectiva Secretaria, na Presidência do Conselho de Ministros, e considerando-se procedente a acção administrativa especial em apreço, deverão ser o Ministério das Finanças e o Ministério que agora detém a tutela da cultura os condenados à execução da decisão emitida.
c. Dos documentos anexos aos Autos e do comportamento das partes, nomeadamente do declarado no artigo 3.° da contestação do Réu Ministério das Finanças, a fls. 103 dos Autos, e do plasmado na contestação do Réu Ministério da Cultura nos artigos 9.º e seguintes, a fls. 80 e seguintes dos Autos, resultam provados com clareza os factos alegados na p.i. e ainda os seguintes: d. Que, na informação de Serviço n.° 06/07, de 1 de Março, do Ministério da Cultura, que mereceu despacho de concordância da Senhora Secretária-Geral, de 8 de Junho de 2007, e foi submetida à consideração da então Ministra da Cultura, propugna-se pelo deferimento do pedido da Autora - cfr. doc. n.° 2 em anexo à contestação do Réu Ministério da Cultura, a fls. 93 a 96 dos Autos.
e. Que, esta informação, juntamente com uma proposta de despacho conjunto, já assinada pela então Ministra da Cultura, que deferia o pedido de reconhecimento de benefício fiscal efectuado pela Autora foram remetidos ao Ministério das Finanças - cfr. doc. n.° 2 em anexo à contestação do Réu Ministério da Cultura, a fls. 93 a 96 dos Autos.
f. Posteriormente à apresentação da p.i. ocorreram vários factos que mesmo assumindo uma natureza instrumental e tendo carácter público, mostram-se relevantes para a resolução da questão sub judice - os quais, até, já tinham mesmo sido anunciados pelo Réu Ministério da Cultura no artigo 16.° da sua contestação, constante a fls. 82 dos Autos; vejamos: g. Pelos Exmos. Srs. Ministro da Cultura e Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, através do Despacho Conjunto n.° 21982/2009 datado de 1 de Setembro e publicado no Diário da República, II Série, n.° 192, de 2 de Outubro de 2009, foram reconhecidos os donativos concedidos em 2005 e 2006 à Fundação EDP para a realização do projecto «Actividades Culturais - 2005/2006», podendo estes usufruir dos benefícios consagrados no Estatuto do Mecenato - cfr. cópia que se junta como doc. n.° 1 em anexo às presentes alegações.
h. Pela Presidência do Conselho de Ministros, foi a Fundação EDP declarada como pessoa colectiva de utilidade pública, nos termos do Decreto-Lei n.° 460/77, de 7 de Novembro, com a redacção dada pelo Decreto-Lei n.° 391/2007, de 13 de Dezembro, através de Despacho do Exmo. Sr. Primeiro-Ministro publicado em Diário da República, 2.ª Série - n.° 243, em 17 de Dezembro de 2009 - cfr. cópia que se junta como doc. n.° 2 em anexo às presentes alegações.
i. Já em 2011, a Subdirectora-Geral dos Impostos, mediante o despacho n.° 6959/2011, reconheceu a isenção da Autora de IRC para os efeitos do artigo 10.°, n.° 2 do Código do IRC - cfr doc. n.° 3 em anexo às presentes alegações.
j. A Ministra da Cultura declarou, no âmbito do EBF, o interesse cultural dos donativos concedidos durante os exercícios de 2011 a 2013 à Autora, para a realização do projecto «Apoio e Desenvolvimento de Actividades Culturais, Educativas e Cientificas - 2011/2013» - cfr. doc. n.° 4 em anexo às presentes alegações.
Prossigamos então.
k. De acordo com o n.° 3 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.° 74/99, de 16 de Março (com redacção que lhe foi dada pela Lei n.° 160/99, de 14 de Setembro, aplicável à data dos factos), os benefícios fiscais associados aos donativos previstos no diploma dependem do prévio reconhecimento a efectuar por despacho conjunto dos Ministros das Finanças e da tutela.
l. No entanto, aquele mesmo preceito - i.e., n.° 3 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 74/99, de 16 de Março - exceptua da necessidade de reconhecimento dois tipos de donativos; a saber: os referidos no artigo 1.º do Estatuto do Mecenato; e, os concedidos às pessoas colectivas dotadas de estatuto de utilidade pública às quais tenha sido reconhecida a isenção de IRC nos termos do artigo 9.° (actualmente artigo 10.°) do Código do IRC.
m. Ao caso sub judice é directa e imediatamente aplicável uma das alíneas incluídas no dito artigo 1.º do Estatuto do Mecenato, mais precisamente, a alínea d) do n.° 1 do artigo 1.° do Estatuto do Mecenato, a qual considera como custos ou perdas do exercício, na sua totalidade, os donativos concedidos às fundações de iniciativa exclusivamente privada que prossigam fins de natureza predominantemente social ou cultural, como é o caso da ora Autora, quanto à sua dotação inicial.
n. Está em causa está um incentivo de natureza estática que visa «incentivar ou estimular determinadas actividades, estabelecendo, para o efeito, uma relação dentre as vantagens atribuídas e as actividades estimuladas em termos de causa efeito» (cit.) pelo que, ao contrário dos benefícios dinâmicos, não necessita a Administração, de acordo com a doutrina, de uma margem de livre decisão.
o. Apesar da limpidez dos argumentos supra plasmados, a Administração fiscal, perante a redacção menos feliz do n.° 2 do artigo 1.º do Estatuto do Mecenato (aprovado pelo Decreto-Lei n.° 74/99, de 16 de Março, e com redacção que lhe foi dada pela Lei n.° 160/99, de 14 de Setembro), indeferiu - mas erradamente - o requerimento apresentado pela ora Autora com base num entendimento segundo o qual: p. Ainda que fosse admissível a interpretação levada a cabo pelo Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais no sentido de que o n.° 2 do artigo 1.º Estatuto do Mecenato é aplicável in casu - o que não se concede -, a Administração fiscal teria, mesmo assim, falhado na sua aplicação, pois os estatutos da ora Autora garantem que, em caso de extinção, é dado aos seus bens o destino previsto no artigo 1.º, n.° 2 do Estatuto do Mecenato, pelo que, em qualquer caso, o beneficio deveria ter sido atribuído.
q. Tendo em conta os despachos juntos como docs. n.°5 2, 3 e 4 em anexo, a Autora preenche, igualmente, todos os requisitos da segunda excepção à necessidade de reconhecimento dos benefícios fiscais previstos no Estatuto do Mecenato, tal como esta se encontra ínsita no n.° 3 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 74/99, de 16 de Março, a qual determina que «os benefícios fiscais previstos no presente diploma, com excepção dos respeitantes a donativos concedidos às pessoas colectivas dotadas de estatuto de utilidade púbica às quais tenha sido reconhecida a isenção de IRC nos termos do artigo 9.° do respectivo Código [actualmente artigo 10.º], depende de reconhecimento» (cit.).
r. Os donativos concedidos relativamente à dotação inicial da ora Autora devem ser considerados como custos ou perdas do exercício, na sua totalidade, sem qualquer necessidade de reconhecimento, nos termos da primeira parte do n.° 1 do artigo 5.° do EBF, quer porque o preceito que os prevê se encontra expressamente excluído da necessidade de o requerer, quer porque os seus estatutos cumprem, na verdade, os requisitos exigidos pelo n.° 2 do artigo 1.° do Estatuto do Mecenato, pelo que...
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