Acórdão nº 05538/09 de Tribunal Central Administrativo Sul, 07 de Fevereiro de 2013

Magistrado ResponsávelCOELHO DA CUNHA
Data da Resolução07 de Fevereiro de 2013
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção Administrativa do TCA-Sul 1.

Relatório José ……………., Rui ……………….., Jaime ………….., Joaquim …………….

e mulher Maristela ………… e Maria ………….

, intentaram no TAC de Sintra, contra a Câmara Municipal de Cascais, acção administrativa especial visando a anulação do acto administrativo proferido pelo Vice-Presidente da C.M. de Cascais, que determinou a demolição das construções efectuadas no terreno camarário a sul do Largo de S. ………, na Rua das ………., em …………...

A Mmª Juiz do TAC de Sintra julgou a acção improcedente.

Inconformados, os A.A. interpuseram recurso jurisdicional para este TCA-Sul, em cujas alegações enunciaram as conclusões seguintes: “1a.

A questão a decidir pelo Tribunal a quo consistia em apreciar e decidir da legalidade do acto administrativo proferido pelo Vice-Presidente da Câmara Municipal de Cascais que determinou a demolição das construções efectuadas no terreno camarário a sul do Largo de S………., na Rua das ………, em ………….

2a.

O douto acórdão recorrido julgou a "presente acção administrativa especial improcedente", e, em consequência, decidiu absolver a Entidade Demandada - a era recorrida - do pedido de anulação do acto administrativo que ordenou a demolição das edificações em causa nos autos.

3a.

As edificações onde habitam os AA., ora recorrentes, existem no local há mais de 20 anos, sendo que apenas em 28.10.1999, cfr. resulta dos autos, é que o terreno onde se localizam as aludidas edificações foi doado pela entidade privada "Quinta ……….. - Gestão …………….., SA" à Câmara Municipal de Cascais.

4a.

As construções dos AA. foram edificadas em terreno pertencente a empresa privada, iniciando-se desde então o decurso do prazo para a aquisição por usucapião.

5a.

Não pode proceder o argumento invocado pelo Tribunal a quo de que por estar em causa implantação de edificações em terreno do domínio municipal não poderia haver aquisição por usucapião, o que não se aceita.

6a.

Para além do supra vertido, sem conceder quanto ao supra exposto, dir-se-á ainda que não foi erigida qualquer edificação nova, além da que já existia naquele local, cfr. resulta dos autos.

7a.

Estas edificações já se encontram no local há mais de 20 anos, cfr. resulta dos factos provados.

8a.

Cfr. resulta da prova documental junta aos autos, tem sido entendimento da R., ora recorrida, que prescreve a possibilidade de demolição de construções clandestinas com mais de 20 anos, conforme despacho do seu então Presidente George …………, seguido o qual "A doutrina seguir é: passados 20 anos, a ordem de demolição prescreve".

9a.

Devia o Douto Tribunal ter ordenado fosse decretada a anulação do acto administrativo que ordena a demolição das edificações em causa. Porquanto: 10a. Dispõe o artigo 1287° do Código Civil o seguinte: A posse do direito de propriedade ou de outros direitos reais de gozo, mantida por certo lapso de termo, faculta ao possuidor, salvo disposição em contrário, a aquisição do direito a cujo exercício corresponde a sua actuação: é o que se chama usucapião; por seu turno, dispõe o art. 1296° do C.C. o seguinte: Não havendo registo do título nem da mera posse, a usucapião só pode dar-se no termo de quinze anos, se a posse for de boa fé, e de vinte anos, se for de má fé.

11a.

Vivendo os AA., ora recorrentes, nas edificações em causa há mais de vinte anos, de forma pública, pacífica e de boa fé, cfr. resulta dos autos, dúvidas não restam que os AA. adquiriram o respectivo direito de propriedade por usucapião.

12a.

E nem se diga que per se estar em sede administrativa não se pode aplicar o aludido do Instituto Jurídico; o mesmo aplica-se in casu! 13a.

Neste sentido, veja-se a seguinte jurisprudência: - Ac. TRP de 22.06.2006: "...

Na verdade, não valem contra isto os obstáculos legais para afastar afigura da usucapião, desde que, uma determinada situação de facto se tenha constituído em posse e estar se mantenha durante um período prolongado de tempo, pois, decorre das regras que lhe são aplicáveis, que o direito correspondente à posse exercida é um direito "ex novo” e, por isso, imune aos vícios que anteriormente lhe pudessem ser apontados. "; - Ac. TRP de 12.01.2006: -"Sendo a usucapião uma forma de aquisição originária (ex novo) do direito real - rompendo, por isso, com todas as limitações legais que tenham a coisa possuída por objecto, tornando o direito imune dos vícios que anteriormente pudesse ter —, a aquisição do direito de propriedade por usucapião pode incidir sobre una parcela de um terreno, mesmo em violação das normas respeitantes a fraccionamento de terrenos. "; - Ac. TRE de 02.11.2006: "I- A posse válida para usucapião assenta no exercício, durante certo período de tempo, do poder de facto típico de qualquer direito real, normalmente o de propriedade, ou seja, na prática de actos típicos do exercício desse direito real, como se e aparentando ser o titular de tal direito; a exteriorização de tais comportamentos e atitudes (corpus) patenteia, por sua vez, estados de espírito, intenções e vontades típicas de quem quer beneficiar e aproveitar desse direito (animus). II - A boa-fé na posse é, no actual Código Civil o desconhecimento pelo possuidor no momento da sua aquisição de que com isso lesava direitos alheios (artº 1260° nº1 CC); ...". - Ac. TRL de 17.11.2005: "1. Existindo, por parte do A. o domínio de facto sobre a coisa, através do exercício de poderes materiais sobre ela, eu seja o corpus, está estabelecida uma presunção de posse em nome próprio a favor do mesmo (art. 1252° nº2 do CC). 2. Não sendo ilidida essa presunção de posse, podem adquirir por usucapião os que exercem o poder de facto sobre a coisa, como foi fixado no Acórdão Uniformizador de 14.05.96 In DR nº 114/96, de 24.06.. Ou seja, em caso de dúvida sempre será de presumir a posse naquele que exerce o poder de facto (artº 1252° nº 2 do CC)...".

  1. O acto administrativo em causa que ordena a demolição das edificações em apreço nos autos consubstancia efectivamente uma situação de abuso de direito.

  2. No que concerne ao Instituto do Abuso de Direito, salientem-se as seguintes disposições legais que constam do Código Civil: Artigo 334°- É ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito; Artigo 335°- 1. Havendo colisão de direitos iguais ou da mesma espécie, devem os titulares ceder na medida do necessário para que todos produzam igualmente o seu efeito, sem...

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