Acórdão nº 02297/08 de Tribunal Central Administrativo Sul, 24 de Junho de 2008

Magistrado ResponsávelJOSÉ CORREIA
Data da Resolução24 de Junho de 2008
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDA-SE, EM CONFERÊNCIA, NA 2ª SECÇÃO DO TCAS: 1.- B...., com os sinais dos autos, interpôs recurso da sentença do TAF de Lisboa que julgou improcedente a impugnação que deduziu contra a liquidação de IRC relativa ao exercício do ano de 2000.

Alegou para concluir do seguinte modo: A) A liquidação de IRC ora sindicada viola o disposto nos artigos 4° e 50° do CIRC e o artigo 7° do ADT celebrado entre Portugal e França; B) A questão material controvertida consiste em determinar se os fluxos financeiros entre uma sucursal em Portugal de uma entidade residente em França são susceptíveis de serem qualificados de juros; C) Não sendo a sucursal mais do que um prolongamento da sede enquanto parte da mesma organização empresarial e não dispondo de personalidade jurídica autónoma, fica de per si inviabilizada a qualificação dos pagamentos efectuados como sendo juros derivados de um contrato de mútuo; D) Os fluxos financeiros entre sede e sucursal correspondem a meras alocações internas de fundos para fazer face a um financiamento no mercado interbancária (negociado pela Sede em França), sendo as rendas de locação financeira percebidas pela sucursal e aqui incluídas na sua matéria colectável e sujeitas a tributação em Portugal; E) Torna-se, assim, evidente que não estamos perante juros na acepção constante do n° 3 do artigo 12° do ADT entre Portugal e França, o que foi, aliás, parcialmente concedido pelo Tribunal a quo na sentença ora recorrida; F) O montante de juros resultante da afectação do financiamento por parte da sede à sucursal nunca poderia estar sujeito a tributação por retenção na fonte liberatória em Portugal, uma vez que a sede é tributada em Portugal através do seu estabelecimento estável, pois conforme determina a alínea c) do n° 1 do artigo 3° do CIRC, o IRC incide sobre o lucro imputável a estabelecimento estável situado em território português; G) As entidades não residentes em Portugal que aqui possuam um estabelecimento estável são tributados pelo lucro que esse estabelecimento estável obtenha em Portugal (rendimentos imputáveis a esse estabelecimento) -de acordo com as regras de apuramento da matéria colectável aplicáveis à generalidade das entidades residentes, com pequenas particular; H) A Recorrente é assim tributada sobre o lucro tributável imputado à sucursal, o qual será dado pela diferença (positiva ou negativa) entre os encargos suportados com os juros cobrados pela sede e os proveitos gerados com a gestão dos contratos de locação financeira celebrados pela Sucursal em Portugal; l) As relações entre sede e sucursal não revestem a natureza de verdadeiras relações jurídicas, na medida em que este conceito pressupõe a existência de dois sujeitos de direito e no caso existe apenas um, o que determina a insusceptibilidade de qualificar o acordo existente entre a Recorrente e a sua casa -mãe como um verdadeiro contrato de mútuo; J) O artigo 7° do ADT estabelece que apenas os lucros imputáveis a um estabelecimento estável podem ser sujeitos a tributação no Estado da fonte, pelo que no caso em apreço, Portugal nunca se poderia arrogar a competência para tributar os rendimentos através de retenção na fonte; K) Não consubstanciando os fluxos internos entre Sede e sucursal rendimentos de capitais ou juros, parece claro que a admitir-se a tributação de tais pagamentos os mesmos seriam efectuados exclusivamente em França, ao abrigo do artigo 7 do respectivo ADT; L) Ainda que se admitisse que os fluxos financeiros existentes entre a sede e a sucursal poderiam ser qualificados como juros, o que por mero dever de raciocínio se admite, sempre se deveria entender que os mesmos deveriam ser isentos de tributação ao abrigo do disposto no artigo 29° do EBF; M) A decisão recorrida viola de forma frontal a liberdade de estabelecimento consignada no artigo 43° do Tratado da Comunidade Europeia; N) A Recorrente foi objecto de uma tributação menos favorável do que aquela que estaria sujeita, nas mesmas condições, se exercesse a sua actividade em Portugal através de uma filial; O) O que está em causa é determinar se um sujeito passivo pode ser sujeito a uma tributação mais gravosa em função da forma jurídica que adopta em Portugal: isenta no caso de uma filial de sociedade não residente ou um estabelecimento estável de uma sociedade não residente; P) O TJCE, em matéria de discriminação, já se pronunciou nos processos n° 270/93, de 28.01.1986 e C-311/97 ("Avoir Fiscal"), pela proibição da discriminação entre sociedades residentes e não residentes para efeitos de concessão de uma isenção fiscal, nomeadamente, introduzindo um regime menos favorável para as entidades não residentes pela circunstância de exercerem a sua actividade noutro Estado Membro por intermédio de uma sucursal e não de uma filial, dotada de personalidade jurídica e residente para efeitos fiscais nesse Estado Membro; Q) Caso estivéssemos perante o pagamento de juros resultantes de um financiamento contraído por parte de uma filial portuguesa junto da sua casa mãe (instituição financeira residente noutro Estado-Membro da União Europeia), nenhuma dúvida restará que se aplicaria a isenção do artigo 29° do EBF; R) A liquidação ora sindicada ser objecto de anulação em virtude da violação dos artigos 50° do CIRC, 29° do EBF e dos princípios da não discriminação e da liberdade de estabelecimento, tal como consagrados no artigo 43° do TCE; S) A violação do princípio da não discriminação não fica sanada pela aplicação do mecanismo do crédito de imposto previsto no ADT, pois a sucursal ver-se-ia sempre obrigada a proceder à retenção na fonte do rendimento; T) As diferenças de tratamento fiscal entre filiais e sucursais de entidades residentes noutros Estados-Membros, baseadas apenas no critério da nacionalidade têm sido entendidas pelas instâncias comunitárias como restritivas das liberdades comunitárias e impeditivas da consagração do mercado único europeu; U) A omissão de pronúncia do Tribunal sobre questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, bem como a falta de exame crítico das provas, constitui causa de nulidade da sentença nos termos do disposto no artigo 125° do CPPT e do número 2 do artigo 660° do CPC e n° 3 do artigo 659° do mesmo diploma legal; V) A sentença recorrida padece de vício de omissão de pronúncia, na medida em que o Tribunal não se pronuncia sobre todas as questões levantadas pela Recorrente em sede de impugnação judicial e que constituíram parte da causa de pedir, pois não se pronuncia sobre a violação do artigo 55° da LGT, em função dos entendimentos contraditórios da Administração Tributária sobre a questão material controvertida; W) A qualificação dos rendimentos decorrentes das operações desenvolvidas pela Recorrente foi objecto de diferentes enquadramentos por parte da Administração Tributária, situação que foi submetida à apreciação do tribunal a quo e sobre a qual este não se pronunciou, o que se invoca para os devidos efeitos legais.

X) Deve assim ser anulada a sentença ora recorrida, por violação do disposto no número 2 do artigo 660° do CPC e em sequência do artigo 125° do CPPT.

Nestes termos, entende que o recurso deve ser julgado totalmente procedente, por provado, revogando-se a Douta Sentença recorrida, bem como o acto tributário sindicado referente a IRC do exercício de 2000, tudo com as demais consequências legais.

Caso assim não se entenda, deve a sentença recorrida ser anulada por violação do disposto no artigo 660° do CPC, Assim fazendo, VOSSAS EXCELÊNCIAS, a costumada Justiça! Não foram apresentadas contra-alegações.

O EPGA suscitou a excepção da incompetência hierárquica do TCAS em virtude de, no seu entender, estar em causa nos autos matéria exclusivamente de direito para cuja sendo o STA o competente para dirimir o litígio nos termos das disposições combinadas dos artigos 12º, nº 5, 26º, al. b) e 38º, al. a) do ETAF.

Ouvidas as partes sobre essa matéria de excepcionalidade, veio a recorrente sustentar que também se discute no recurso matéria de facto, adrede porque foi arguida a nulidade da sentença por omissão de pronúncia e por falta de exame crítico das provas.

Os autos vêm à conferência depois de recolhidos os vistos legais.

* 2. -Na sentença recorrida foi fixado o seguinte probatório: Factos provados: a) A Impugnante exerce em Portugal a actividade bancária e de locação financeira, por intermédio de uma Sucursal, estando a sua sede localizada em França; b) A actividade da Impugnante em Portugal limitou-se, desde 1997, e em concreto no exercício de 2000, à celebração e gestão, através da Sucursal, de dois contratos de locação financeira para a construção de dois centros comerciais localizados em C... e em L...., no valor total de PTE 1.800.000.OOO$00, correspondente acerca de EUR 9.000.000,00 (nove milhões de euros).

c) O respectivo financiamento a montante, no mercado interbancário, no mesmo valor, foi negociado e celebrado em França pela sede, tendo sido os respectivos fundos afectos à Sucursal em Portugal.

d) Os juros de tal financiamento, suportados pela sede em França, são facturados à Sucursal em Portugal.

e) Durante o ano de 1996, a Impugnante reteve IRC na fonte, sobre os juros facturados pela sede, nos montantes de PTE 921.575$00 e PTE 64.900.572$00, à taxa de 12%; f) A partir do exercício de 1997, a Impugnante deixou de efectuar qualquer tipo de retenção na fonte; g) Na sequência de uma acção de inspecção interna à declaração Modelo 130, restrita ao ano de 2000, a Administração Tributária, por intermédio da Direcção de Serviços de Prevenção e Inspecção Tributária (DSPIT), notificou, a 29 de Julho de 2004, a Impugnante do respectivo projecto de relatório de conclusões, nos termos do qual se propunha a liquidação adicional de IRC no valor de EUR 42.499,12; h) No decurso da inspecção a impugnante enviou ao Director de Finanças a carta registada fotocopiada a fls. 41, com o seguinte teor: No que diz respeito à prova da participação directa no capital durante dois anos...

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