Acórdão nº 08644/12 de Tribunal Central Administrativo Sul, 10 de Maio de 2012
Magistrado Responsável | COELHO DA CUNHA |
Data da Resolução | 10 de Maio de 2012 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam em conferência na Secção Administrativa do TCA-Sul 1.
Relatório Maria Fátima …………..
, Ana …………..
, Maria Conceição ………….
, Conceição ………………, Maria ……………..
, Teresa …………. e Eva ………………..
, intentaram no TAF do Funchal, contra a Região Autónoma da Madeira, acção administrativa especial, visando a impugnação do despacho proferido no dia 1 de Agosto de 2005, da autoria do Secretário Regional, publicado no JORAM de 24 de Agosto de 2005, nº162, que ordenou a reposição do pagamento indevido do abono a docentes do ensino e educação especializada, em regime de acumulação na DREER, nas gerências de 1999 até Novembro de 2003, data do processamento das gratificações, previsto nos números 1 e 2 do artigo 1º do Dec.-Lei nº232/87, de 11 de Junho.
A Mmª Juiz do TAF do Funchal, por sentença de 22.11.2011, julgou a acção improcedente e absolveu do pedido a entidade demandada.
Inconformadas, as A.A, interpuseram recurso jurisdicional para este TCA-Sul, em cujas alegações enunciaram as conclusões seguintes: “I- A sentença recorrida deve ser revogada e ser substituída por outra no sentido de julgar por procedente e por provada a pretensão das Recorrentes em virtude dos seus vícios de violação de lei e de interpretação claramente inconstitucional e por aplicar norma orçamental inconstitucional; II- A sentença recorrida viola as normas dos artigos 28 e 47 da LPTA e 18° da LOSTA, leis vigentes ao tempo do processamento de origem das gratificações "sub-judice" e até 1 de Janeiro de 2004, a norma do alínea b) do n°1 do artigo 140° e n°1 do artigo 141°, do CPA 3 e da alínea a) do n°2 do artigo 58° do CPTA vigente.
III- A sentença recorrida é contrária à jurisprudência mais recente e mais repetida pelo STA.
IV- A norma do n°3 do art°40° do D.L. 155/92, na redacção dada pela norma interpretativa do art°77° da Lei 55-B/2004, de 31 de Dezembro, "Lei do Orçamento de Estado para 2005", é material e formalmente inconstitucional por violar as normas do n°2 e 4 de art°105°; n°1 do art°106° e art°2°, todos da Constituição da República Portuguesa.
V- Salvo o devido respeito e melhor opinião, deve declarasse manifestamente inconstitucional a norma da al. a) do n°1 do art°152º do C.P.T.A., Sob epígrafe "Recurso de Uniformização de Jurisprudência", por violação das normas dos art°2°; n°2 do art°202° e n°2 do art°205" da Constituição da República Portuguesa, quando interpretada no sentido de que, se o acórdão impugnado estiver de acordo com a jurisprudência mais recente consolidada do STA sobre a mesma questão fundamental de direito e sem existência de contradição recente com essa mesma jurisprudência, o pedido de admissão de recurso para uniformização de jurisprudência é, mesmo assim, admitido e a sentença impugnada anulada e substituída por outra decidindo a questão controvertida com base num elemento fundamental de direito completamente novo, assente em norma jurídica não discutida nos autos do acórdão impugnado nem apreciada em qualquer acórdão jurisdicional anterior proferido e neste sentido o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência que serve de base à douta sentença recorrida.
VI- A orientação jurisprudencial e interpretativa do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência do STA reunido em plenário ao ter proferido acórdão de 22 de Janeiro de 2009 que decidiu ,"o despacho que ordena a reposição nos cofres do Estado de quantias indevidamente recebidas, dentro dos cincos anos posteriores ao seu recebimento, ao abrigo do artº40º, nº1 do D.L.155/92, de 28 de Julho, não viola o artº 141º do Código do Procedimento Administrativo, atento o disposto no n°3 do artº40º do D.L. 155/92, de 28 de Julho, preceito de natureza interpretativa introduzido pelo artº77° da Lei 55-B/2004, de 30 de Dezembro ", também está inquinada no seu sentido interpretativo por violação de lei e por interpretação materialmente inconstitucional face às normas e princípios anteriormente relevados.
VII- As gratificações aqui em questão a repor nos termos do ponto 2 do Despacho n°86/85, de 24 de Agosto, proferido pelo R. respeitam às gerências e ao processamento de abonos até aos anos 2000 (período Abril/Maio a Dezembro), 2001 e 2002.
VIII- O processamento dos abonos "sub-judice", durante o tempo constante do ponto 3 do despacho n°86/2005, de 24 de Agosto, constituiu um acto administrativo constitutivo de direitos (artigo140°,n°l,alínea a) do CPA por natureza não revogável) que se manteve desde a sua origem e não foi revogado em virtude de qualquer invalidade no prazo previsto no n°1, do artigo 141° do CPA.
IX- O Supremo Tribunal Administrativo no âmbito de um outro processo (Proc°n°217/05.1BEFUN do TAFF e Recurso n°1212/06, 5ª secção do Pleno) em que se discutiu a mesma questão em recurso extraordinário para uniformização de jurisprudência por introdução inesperada e ex novo da norma interpretativa do art°77° da Lei 55-B/2004, de 31 de Dezembro "Lei do Orçamento de Estado para o ano civil de 2005" que, gerou um novo inciso por acrescento o normativo do n°3 do art°40° do D.L. 155/92, de 28 de Julho.
X- Naquele acórdão de uniformização de jurisprudência o Plenário do STA decidiu contra a jurisprudência quase unânime, mais repetida e mais recente e também contra todas as sentenças e acórdãos proferidos em primeira e segunda instância neste Tribunal, com base num elemento de direito completamente novo e incerto em norma orçamental aprovada após a ocorrência dos fatos financeiros objecto da reposição de quantias "sub-judice", a norma de natureza interpretativa constante do n°3 do art°40° do D.L. 155/92, de 28 de Julho, na redacção introduzida pelo art°77° da Lei 55-B/2004, de 30 de Dezembro.
XI- A norma do n°3 do art°40° do D.L. 155/92, na redacção dada pela norma interpretativa do art°77°da Lei 55-B/2004, de 31 de Dezembro, "Lei do Orçamento de Estado para 2005", é material e formalmente inconstitucional por violar as normas do n°2 e 4 do art°105°; n°1 do art°106° e art°2°, todos da Constituição da República Portuguesa e os dos princípios normativos constantes das estatuições dos artigos 12°/1 e 13°/1 do Código Civil que são materialmente constitucionais, neste sentido Gomes Canotilho in Direito Constitucional, 3a edição, 1983, Almedina, pág.76, acerca da "constituição material" como o conjunto de normas que regulam a estrutura do Estado e da sociedade nos seus aspectos fundamentais, independentemente das fontes donde as normas são oriundas(ou seja, não é verdade que só constitucional o que está formalmente reduzido a escrito na constituição, como parece defender a sentença recorrida).
XII- A redacção da norma n°3 do art°40° dada não por alteração mas por introdução de novo inciso normativo de natureza interpretativa através do art°77° da Lei n°55-B/2004, de 31 de Dezembro (Orçamento de Estado para 2005), colide claramente com o preceituado nas normas da alínea b) do n°1 do artigo 140° e do n°1 do art°141° do C.P.A., neste sentido, ofende a norma constitucional constante do n°2 do art°105° da C.R.P. que, obriga a que o Orçamento, e em decorrência a sua Lei, seja elaborado de harmonia com as grandes opções em matéria de planeamento e tendo em conta as obrigações decorrentes de lei ou de contrato, ...
XIII- ...não podendo, por isso, a Lei do Orçamento alterar normas e leis preexistentes ao mesmo e em vigor para além do que seja objectivos das grandes opções do plano para aquele ano orçamental a que se destina o orçamento e não pode deixar de cumprir as obrigações decorrentes de leis em vigor de natureza intemporal - sendo certo que, não pode ser defendida a aplicação retroactiva duma norma de 2005 a factos ocorridos até Novembro de 2003, factos anteriores, o que é uma violação ao art°12°, n°1 e 2 do C.C. e art°2° da C.R.P...
XIV- A norma constante do art°77° da Lei do Orçamento de 2005 que introduz uma norma de natureza interpretativa relativamente aos efeitos jurídicos do art°141° do C.P.A., relativos à validade e revogabilidade de actos administrativos, como é o caso dos actos de processamento de remunerações, é materialmente inconstitucional porque viola as normas do n°2 e 4 do art°105° e n°1 do art°106°, todos da C.R.P., na medida em que, não faz parte do objecto mediato e material das Leis do Orçamento legislar, normas interpretativas com efeitos sobre direitos e efeitos jurídicos externos e retroagentes a fatos ocorridos muito antes das sua aprovação de normas constantes de outros regimes jurídicos que nada têm a ver com orçamentos ou com a sua execução, como é caso do Código de Procedimento Administrativo e na essência são constitutivas de direitos, como é o caso relativamente, às aqui Recorrentes, XV- A norma interpretativa do art°77° da Lei do Orçamento de Estado de 2005, que introduziu a norma do n°3 do art°140° do D.L. 155/92, ofende o princípio constitucional da anualidade do Orçamento, na medida em que, introduz uma interpretação autêntica acerca da reposição de créditos ao Estado vencidos independentemente do ano civil de execução orçamental a que se destinou aquela Lei do Orçamento, podendo gerar efeitos retroactivos a situações jurídicas já constituídas na esfera jurídica dos destinatários, in casu às Recorrentes, XVI- Acresce que, através daquela norma constante da Lei do Orçamento, o legislador acaba por alterar o efeito útil relativo à norma do nº1 do art°141° do C.P.A. quanto à não revogabilidade de actos administrativos constitutivos de direito.
XVII- Neste sentido, o despacho impugnado que, ordenador da reposição nos cofres do Estado de quantias indevidamente recebidas, dentro dos cinco anos posteriores ao seu recebimento, ao abrigo do art°40°, n°1 e n°3 do D.L.155/92, de 28 de Julho, e que viole o artº141º do C.P.A., mesmo face ao disposto no n°3 do artº40° do D.L. 155/92, de 28 de Julho, preceito de natureza interpretativa introduzido pelo art°77° pela Lei 55-B/2004, de 30 de Dezembro, é ilegal e inconstitucional por não ressalvar os efeitos já produzidas pelo cumprimento da obrigação relativa a atos resolvidos, atos administrativos...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO