Acórdão nº 07829/11 de Tribunal Central Administrativo Sul, 22 de Março de 2012

Magistrado ResponsávelPAULO PEREIRA GOUVEIA
Data da Resolução22 de Março de 2012
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul: I.RELATÓRIO I.1. Processo · MINISTÉRIO PÚBLICO intentou no T.A.C de LISBOA processo especial de oposição à aquisição de nacionalidade portuguesa contra · PAULO …………….., filho de Fernando ……………. e Cristina ……………., todos com os demais sinais nos autos, nascido a 6.09.1994, de nacionalidade brasileira, natural de São Paulo, Brasil, pedindo o arquivamento do processo conducente ao registo da nacionalidade portuguesa.

Por sentença de 28-2-11, o referido tribunal decidiu julgar o pedido procedente.

I.2. Alegações de recurso Inconformado, o réu recorre para este Tribunal Central Administrativo Sul, formulando nas alegações as seguintes conclusões: I. A inexistência de factos e a não alegação de factos de que tenha sido dado conhecimento ao Conservador dos Registos Centrais, obrigando-o, nos termos do artº 57º, nº 7 do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa (1) a adotar os procedimentos aí previstos, constitui exceção material inominada, que inviabiliza a instância, por dela ser impeditiva.

  1. Os factos dados como provados que decorrem dos documentos registrais, provam apenas o que nos registos se contém, não podendo dos mesmos extrair-se nenhuma outra conclusão, para além da que o próprio registo permite.

  2. Os factos constantes de declarações apresentadas pelos representantes legais do recorrente não são constitutivos de inexistência de uma ligação à comunidade nacional.

  3. Os factos provados não são, de modo e nenhum, indiciários de uma falta de ligação à comunidade nacional, podendo coexistir em existir em indivíduos que tenham um profunda ligação a essa comunidade.

  4. Tais factos não são impeditivos de uma forte ligação à comunidade nacional.

  5. Tais factos não permitem, por si só, fundamentar um juízo de indesejabilidade de receção dos indivíduos por eles marcados na comunidade portuguesa.

  6. A lei não exige que o candidato à aquisição da nacionalidade pelo casamento demonstre perante o conservador ou o tribunal que se encontra inserido na comunidade nacional.

  7. Ao pressupor essa exigência, a douta sentença recorrida ofende o disposto no artº 57º,3 do Regulamento da Nacionalidade, em que tal exigência não se encontra prevista.

  8. A partir da reforma da Lei da Nacionalidade introduzida pela Lei Orgânica nº 2/2006, de 17 de Abril, complementada pelo Regulamento da Nacionalidade Portuguesa, aprovado pelo Decreto-Lei nº 237-A/2006, de 14 de Fevereiro, deixou de ser exigível ao requerente da aquisição da nacionalidade por efeito da vontade a demonstração de que se encontra inserido na comunidade nacional.

  9. Em consonância com as obrigações assumidas no quadro da Convenção Europeia sobre a Nacionalidade, a Lei Orgânica nº 2/2006, de 17 de Abril, veio estabelecer a presunção de que os filhos menores dos que adquirem a nacionalidade portuguesa têm uma ligação efetiva à comunidade nacional, porém ilidível mediante a alegação e prova de factos que comprovem a inexistência de tal ligação.

  10. A ligação efetiva à comunidade nacional tem que ser aferida à luz dos princípios da Convenção Europeia sobre a Nacionalidade, não podendo ser discriminatória em razão de raça ou origem nacional ou étnica, em conformidade com o artº 5ª da referida Convenção (2).

  11. A obrigação de o requerente se pronunciar sobre a efetiva ligação à comunidade nacional resume-se, por força do modelo aprovado, à escolha de um SIM ou de um NÃO no formulário pré-estabelecido.

  12. A douta decisão recorrida, ao pressupor que o requerente tinha que apresentar provas adicionais ou fazer de declarações não contidas no formulário, ofende, também, o disposto no artº 32º,2 do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa (3).

  13. No quadro da versão da Lei da Nacionalidade aprovada pela Lei Orgânica nº 2/2006, cit. e do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa aprovado pelo Decreto-Lei nº 237-A/2006, de 14 de Dezembro a oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa passou a depender de participação do Conservador dos Registos Centrais, vinculada às regras do artº 57º,7 do Regulamento da Nacionalidade.

  14. A Conservatória dos Registos Centrais não participou ao Ministério Público quaisquer factos suscetíveis de fundamentarem a oposição à aquisição da nacionalidade por efeito da vontade.

  15. O processo está ferido, desde a sua origem, por violação do artº 57º,7 do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa.

  16. A inexistência de ligação efetiva á comunidade portuguesa não pode provar-se por documentos registrais ou por declarações dos interessados que não a indiciem.

  17. Para que possa ser promovida a oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa com fundamento na falta de ligação à comunidade nacional, é indispensável que o conservador dos Registos Centrais apresente factos concretos e provas concretas que permitam ilidir tal presunção e que permitam fundar um juízo de indesejabilidade do indivíduo na comunidade portuguesa.

  18. A oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa só pode ser deduzida em circunstâncias que indiciem de forma inequívoca a indesejabilidade de quem pretenda adquirir a nacionalidade portuguesa.

  19. A aquisição da nacionalidade portuguesa por parte de cônjuge de cidadão português é um direito fundamental, a que o Ministério Público não pode oferecer oposição sem que, para tanto, tenha a certeza e tenha provas da indesejabilidade da integração do indivíduo em causa na comunidade nacional.

  20. A oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa por parte de filho menor de quem adquire a nacionalidade constitui uma manifestação de censura à constituição da própria família concreta, implicando a rejeição de um elemento da mesma, pelo que só deve se deduzida quando, por razões de ordem pública, se conclua pela necessidade de um «divórcio» politico, relativamente ao filho menor, que declare inaceitável a integração de tal filho na comunidade portuguesa.

  21. O direito à aquisição da nacionalidade por parte de filho menor de quem adquire a nacionalidade portuguesa constitui um direito fundamental, a que se aplica o regime do artº 18º da Constituição.

  22. A douta decisão recorrida, tal como foi formulada, não encontra na lei nenhum suporte concreto, ofendendo o disposto no artº 9º, 1 e 2 do Código Civil, o artº 9º, al. a) da Lei da Nacionalidade (4), o artº 57º,7 do Regulamento da Nacionalidade, e os artºs 18º, 26º e 36º,6 da Constituição.

* Nas contra-alegações, o recorrido diz:

  1. O Ministério Público instaurou acção de oposição à aquisição de nacionalidade portuguesa contra Paulo Augusto ……………., nascido a 6 de Setembro de 1994, de nacionalidade brasileira, natural de São Paulo, Brasil, e aí residente.

  2. O Réu contestou, alegando, em suma, que, relativamente aos menores cujo pai ou mãe adquire ou tenha adquirido a nacionalidade portuguesa, a Convenção Europeia sobre a Nacionalidade, no seu artigo 6.°, n. 4, estabelece a obrigatoriedade de o Estado lhes permitir a aquisição da nacionalidade portuguesa. Alegou ainda, por um lado, que o Réu não apresentou, nem tinha que apresentar quaisquer provas de ligação à comunidade portuguesa, porque tal não lhe é exigível por lei e, por outro, que a aquisição da nacionalidade portuguesa por parte de filhos menores de cidadãos que adquiriram a nacionalidade portuguesa é problema de direitos fundamentais, pelo que deve ser enquadrado no regime do artigo 18.° da Constituição da República Portuguesa.

  3. Foi proferida sentença, julgando procedente a oposição deduzida pelo Ministério Público à aquisição da nacionalidade portuguesa.

    Fundamentação de facto e de Direito O Mmo. Juiz a quo considerou provada a matéria de facto, com base na análise crítica dos documentos constantes dos autos, nos termos da douta sentença que aqui se dá por reproduzida.

    Aderindo, no essencial, à fundamentação constante da sentença, salientamos o seguinte: 1 - O artigo 4.° da Convenção Europeia sobre a Nacionalidade (5) consagra que o direito interno de cada Estado permitirá a aquisição da sua nacionalidade, entre outros, dos filhos menores de um dos seus nacionais, aos quais seja aplicável a excepção prevista 6.°, n. 1, alínea a).

    (6) O Estado Português, na sua legislação, consagra a faculdade de qualquer estrangeiro menor obter a nacionalidade portuguesa, desde que preenchidos os requisitos para essa concessão de nacionalidade. Ora, sendo entendimento do Réu que não tinha que apresentar quaisquer provas de ligação à comunidade portuguesa, por tal não ser legalmente exigível, não resultou demonstrado e com o grau de intensidade exigido, que detenha já uma ligação efectiva à comunidade portuguesa, ou sequer que se encontra num processo estruturado e revelador de uma caminhada para adquirir a nacionalidade portuguesa.

    2 - Sendo este um problema de direitos fundamentais - como tal enquadrável no regime do artigo 18.oda Constituição da República Portuguesa -, não significa que se esteja perante um direito absoluto. Porém, desde que fique salvaguardado o núcleo essencial do direito fundamental em causa, a lei pode introduzir limitações aos exercícios dos direitos, liberdades e garantias e direitos análogos - como a lei da nacionalidade o faz.

    3 - O actual artigo 37.°, n. 1, do Regulamento da Nacionalidade, aprovado pelo Decreto-Lei n. 237-A/2006, de 14 de Dezembro (7), continua a consignar como ónus do interessado a instrução dos requerimentos com os documentos necessários para a prova das circunstâncias de que depende a atribuição, aquisição ou perda da nacionalidade.

    4 - A oposição a aquisição da nacionalidade - no que tange à falta de ligação efectiva à comunidade nacional - continua a derivar da existência de um requerimento feito por alguém que pretenda adquirir a nacionalidade portuguesa, considerando que lhe assiste um direito e devendo pronunciar-se sobre a existência dessa ligação.

    5 - A acção destinada à declaração de inexistência de ligação à comunidade portuguesa continua a configurar-se como uma acção de simples apreciação negativa.

    6 - De acordo com o disposto no artigo...

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