Acórdão nº 02035/06.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 08 de Março de 2012

Magistrado ResponsávelCarlos Lu
Data da Resolução08 de Março de 2012
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO M. …, A. na presente ação administrativa comum, sob forma sumária, para efetivação de responsabilidade civil extracontratual fundada em facto ilícito, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF do Porto, datada de 24/09/2010, que condenou o R. “MUNICÍPIO DE VILA NOVA GAIA” apenas no pagamento de indemnização no valor de 2.147,86 € acrescido de juros de mora desde a citação quando havia sido peticionado o valor de 5.345,47 €.

Formula o A. nas respetivas alegações (cfr. fls. 180 e segs. - paginação processo suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário) as seguintes conclusões que se reproduzem: “...

  1. Considerou o Meritíssimo Juiz a quo que a factualidade provada permitia concluir o sinistro seria de imputar também ao condutor do motociclo (o aqui recorrente), por circular a uma velocidade nunca inferior a 60 Km/hora, atuação esta que era objetivamente inadequada e reprovável face às condições do local existentes à data (negrito nosso).

  2. Inexiste nenhum elemento da sentença que esclareça se a Variante de Sermonde, se insere ou não numa localidade, pelo que, impõe-se concluir, à luz do art. 21.º, n.º 1 do Código da Estrada (C.E.), que a velocidade máxima permitida no local do acidente seria de 90Km/hora.

  3. A velocidade a que circulava o ciclomotor (vizinha dos 60km/hora), não ultrapassava o limite máximo de velocidade permitido na via.

  4. Além disso, o A./recorrente ainda não havia entrado na rotunda, ou seja, a manobra de redução de velocidade (a realizar em 3 ou 4 segundos) permitiria a entrada do motociclo na rotunda em perfeitas condições de segurança, até porque o piso da Variante se encontrava seco.

  5. Deste modo, como o motociclo circulava dentro da velocidade máxima permitida e adequada face às condições da via, o recorrente não desrespeitou nenhum dever de cuidado nem violou nenhuma norma estradal.

  6. O recorrente não cometeu nenhum ato que tenha concorrido para a produção do acidente.

  7. Na verdade, a travagem encetada pelo recorrente provocou a derrapagem e consequente queda do motociclo tão-só pela circunstância de o acesso à rotunda se apresentar com areia e gravilha.

  8. A decisão recorrida uma aplicação incorreta dos arts. 25.º, n.º 1 al. f), 27.º, n.º 1 do C.E., bem como do art. 570.º do Código Civil.

  9. Não obstante e sem prescindir, também se considera incorreta a repartição de culpas realizada na decisão recorrida.

  10. É que no caso concreto, a velocidade a que circulava o motociclo, numa via onde o piso se encontrava seco e antes de abordar a rotunda, teve uma contribuição muito pequena, pois o que provocou a derrapagem e queda do veículo foi a existência de areia e gravilha na via sem que estivesse sequer sinalizada. Deste modo, a conduta do lesado contribuiu em 10% e a da Ré em 90%.

  11. A Ré/recorrida não sofreu qualquer consequência com o sinistro ao passo que o lesado teve avultados danos patrimoniais e não patrimoniais.

  12. Perante o exposto, a indemnização a atribuir ao recorrente deveria ter sido totalmente concedida ou, quando muito, reduzida em apenas 10%.

  13. A sentença violou, por isso, o disposto no art. 570.º, n.º 1, 2.ª parte do Código Civil.

  14. Por outro lado, foi considerado provado que o recorrente, em virtude da queda supra descrita, sofreu escoriações no seu braço e perna direita (ponto xiv).

  15. Tais lesões provocaram dores e sofrimento que consubstanciam danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, deverão ser compensados com a fixação de uma indemnização - art. 496.º, n.ºs. 1 e 3 do Código Civil.

  16. No entanto, a sentença recorrida não atendeu pura e simplesmente a tais danos não patrimoniais.

  17. Padece, então, de nulidade nesta parte pois que deixou de se pronunciar sobre uma questão que tinha de decidir, o que configura tal vício, como prevê a al. d) do n.º 1 do art. 668.º do Código de Processo Civil. A sentença violou também os arts. 483.º, 494.º e 496.º, todos do Código Civil.

  18. Atendendo, contudo, a decisão em análise explanou os factos suficientes para ser proferida uma decisão, o Venerando Tribunal para que se recorre, poderá arbitrar a indemnização em falta, sugerindo-se a fixação do montante de € 750,00 …”.

O R. apresentou contra-alegações (cfr. fls. 188 e segs.), nas quais pugnou pela improcedência do recurso jurisdicional deduzido pelo A., concluindo nos seguintes termos: “… I. Face à matéria de facto dada por assente, e aquisição processual, carece de fundamento o recurso, … Por um lado, II. Ao invés do sustentado pelo Recorrente, a apetecida repartição de culpas de 90% para o Município e 10% para o condutor do motociclo, não é criteriosa ou adequada; III. Circulando a velocidade nunca inferior a 60 Km, atento o local (entrada numa rotunda), essa imprimida velocidade e em concreto necessariamente que foi insuscetível de poder fazer imobilizar o veículo no espaço livre e visível à sua frente, e assim declarada e reconhecidamente excessiva.

  1. O critério sentenciado de 50% de culpa na produção do acidente e suas consequências aparece justo, senão mesmo generoso para o condutor.

    Por outro lado, V. Não se tendo provado danos morais, a simples constatação, levada ao probatório, do condutor ter sofrido escoriações no seu braço e perna direita, não releva para efeitos de indemnização, a esse título, pois não merece sequer a tutela do direito - artigo 496.º, n.º 1, do C. Civil.

  2. Aparecendo gratuita a alegação conclusiva inserta em o), devendo improceder, talqualmente as demais conclusões do Recorrente …”.

    O Ministério Público junto deste Tribunal notificado nos termos e para efeitos do disposto no art. 146.º do CPTA emitiu pronúncia no sentido da improcedência do recurso (cfr. fls. 219/221), pronúncia essa que objeto de contraditório não mereceu qualquer resposta (cfr. fls. 222 e segs.).

    Colhidos os vistos legais foram os autos submetidos à Conferência para julgamento.

    1. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo recorrente, sendo certo que se, pese embora por um lado, o objeto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, n.ºs 3 e 4 e 690.º, n.º 1 todos do Código de Processo Civil (CPC) “ex vi” arts. 01.º e 140.º do CPTA, temos, todavia, que, por outro lado, nos termos do art. 149.º do CPTA, o tribunal “ad quem” em sede de recurso de apelação não se limita a cassar a decisão judicial recorrida porquanto ainda que a declare nula decide “o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito” reunidos que se mostrem no caso os necessários pressupostos e condições legalmente exigidas.

      As questões suscitadas resumem-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida enferma, por um lado, de nulidade [art. 668.º, n.º 1, al. d) do CPC] e, por outro lado, de erro de julgamento dada a infração ao disposto nos arts. 25.º, n.º 1, al. f), 27.º, n.º 1 do CE, 483.º, 494.º, 496.º e 570.º, n.ºs 1 e 2 do CC [cfr. alegações e demais conclusões supra reproduzidas].

    2. FUNDAMENTOS 3.1. DE FACTO Resultou apurada da decisão judicial recorrida a seguinte factualidade: I) No dia 27.04.2004, pelas 16 horas e 30 minutos, na Rotunda da Variante de Sermonde, ocorreu um acidente de viação com o motociclo de matrícula 04-47-…, conduzido pelo A..

      II) A variante de Sermonde liga esta freguesia à de Serzedo.

      III) Esta ligação fazia-se e faz-se através de uma rotunda, que serve de placa giratória em quatro direções.

      IV) O entroncamento da Rotunda que corresponde a tal ligação é o da Rua Nova do Alquebre, que se situa no lado diametralmente oposto ao do entroncamento que recebe a Variante de Sermonde.

      1. Neste último, no limiar da entrada da Rotunda, existia um ilhéu direcional, que dividia a faixa de rodagem em duas hemi-faixas com a largura de 3,85 m cada.

        VI) O acesso à rotunda que recebe a Variante de Sermonde apresentava-se com areia e gravilha sem que a sua existência estivesse sinalizada por qualquer meio.

        VII) O piso da Variante e dos entroncamentos que paralelamente desenhavam o perímetro da Rotunda encontrava-se seco.

        VIII) O A. provinha da Variante de Sermonde e dirigia-se para Serzedo, pretendendo, para o efeito, dirigir-se ao entroncamento da Rua Nova de Alquebre.

        IX) O A. avançou em direção à rotunda.

      2. O motociclo conduzido pelo A., ao efetuar uma travagem aquando do acesso à rotunda, derrapou na areia aí existente, o que provocou sua queda.

        XI) O A. circulava a uma velocidade de 60/70 km/hora.

        XII) Em função do acidente dos autos o motociclo do A. sofreu danos cuja reparação importa o dispêndio da quantia de 3.719,73 €.

        XIII) O A. procedeu à reparação parcial...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT