Acórdão nº 01145/05 de Tribunal Central Administrativo Sul, 21 de Fevereiro de 2008

Magistrado ResponsávelJosé Correia
Data da Resolução21 de Fevereiro de 2008
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo (2º Juízo-1.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo: 1- RELATÓRIO Dulce ..., id. a fls. 2 dos autos, intentou no TAF de Sintra, contra o Ministério da Educação, acção administrativa comum, sob a forma comum, nos termos das alíneas b) e d) do n.º 2 do artigo 37º do CPTA, com vista a obter o reconhecimento que preenche todos os requisitos " para ser integrada no quadro da Escola Secundária ..." e a, consequente, condenação do R. a integra-la na referida escola.

A Mmª Juíza "a quo", por decisão de 04.03.2005, julgou a acção improcedente, absolvendo o R. do pedido.

Inconformada, a recorrente interpôs recurso jurisdicional para este Tribunal, formulando na alegação, as seguintes conclusões: " 1.

A douta sentença recorrida começa por defender a obrigatoriedade e impostergabilidade do concurso, para de imediato afirmar que: "Embora o concurso se apresente como processo normal de selecção de candidatos de acesso à função pública, o certo é que comporta excepções" (cfr. § 11° do ponto III.2 da douta sentença recorrida). Afirmando ainda que as excepções "devem justificar-se com base em princípios materiais" (§ 12°) e que o "critério material escolhido pelo legislador ...

foi o exercício ininterrupto de funções docentes".

(§14°). Deixando entender que tal critério contém os necessários princípios materiais, do que se dúvida.

  1. Concluindo sobre esta questão que o artigo 18° do Decreto-Lei n° 312/99 não viola o n° 2 do artigo 47° da CRP, porque o legislador entendeu "premiar os professores da área da Autora ...". Portanto, entende a douta sentença recorrida que o acto de premiar é um critério material. O que é inaceitável.

  2. Nunca a actividade legislativa e a actividade jurisdicional serviram para "premiar" cidadãos em relação a outros. O ordenamento jurídico serve para estabelecer regras de conduta social gerais e abstractas que se fundam no Estado de direito democrático (artigo 2° da CRP) e que, no caso concreto em apreço nestes autos, tem de assegurar o princípio da igualdade e da segurança do emprego (artigos 13°, 47° e 53° da CRP).

  3. Não é aceitável defender-se a validade do art. 18° do Decreto-Lei n° 312/99 com fundamento em tal argumento - premiar determinados cidadãos.

  4. A validade da disposição legal expressa no citado artigo 18° tem de ser obrigatoriamente analisada à luz do disposto no n° 1 do art. 47° da CRP. Através da citada norma foram criados lugares a extinguir quando vagarem para os professores de técnicas especiais, que à data possuíssem 10 anos de serviço ininterrupto. Tal configura uma restrição à liberdade de escolha de profissão inadmissível.

  5. O n° 1 do artigo 47° da CRP estabelece duas situações em que podem ocorrer restrições à liberdade de escolha de profissão: quando impostas pelo interesse colectivo, ou quando são atinentes à capacidade dos indivíduos.

    E mesmo assim, em qualquer destas situações as restrições devem obedecer aos limites impostos pelos n.° 2 e 3 do art. 18 da Constituição.

  6. Conforme ensina o Prof. Jorge Miranda sobre esta matéria In Manual de Direito Constitucional, tomo IV. 2a edição, revista e actualizada, pág. 441 e 442, a restrição constante no artigo 18° Decreto-Lei n° 312/99 não se enquadra no pensamento do legislador constituinte. Desconhece-se a fundamentação para a exigência dos 10 anos de serviço, e da exigência de que tal serviço tenha sido exercido ininterruptamente. Sabe-se no entanto que não existe qualquer motivo de interesse colectivo ou inerente à capacidade dos professores que justifique a existência de tal norma.

  7. Este artigo 18° do Decreto-Lei n° 312/99 também colide com o disposto no o n° 2 do artigo 18° da CRP. Norma que apenas permite restrições de Direitos, Liberdades e Garantias indispensáveis para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos. O único direito constitucionalmente protegido violado pelo Estado foi o direito à segurança no emprego (artigo 53° da CRP). Tal violação tanto operou nos docentes com mais do que 10 anos de exercício ininterrupto da actividade docente, como nos outros que não tinham estes dois requisitos.

  8. Esta norma, por ser restritiva da liberdade de escolha de profissão prevista no artigo 47° da CRP, também padece de inconstitucionalidade orgânica, por violação da al. b) do n° 1 do art. 165° da Constituição, na medida em que o artigo 47° da CRP está incluído no título II - Direitos, Liberdades e Garantias. E esta matéria é de reserva relativa da Assembleia da República (artigo 165° CRP). O Decreto-Lei n° 312/99 não refere a existência da necessária autorização legislativa. Assim, o Governo estava impedido de legislar sobre tal matéria (Ver neste sentido o Acórdão do Tribunal Constitucional n.° 188/92).

  9. Nos §'s 20° a 27° do ponto III.2 da douta sentença recorrida desenvolve-se um conjunto de afirmações que deixam a ideia de que a douta sentença recorrida não conseguiu entender/conhecer o pedido nem a causa de pedir.

  10. Não existe qualquer dúvida de que: com a presente acção a A. não pretendeu impugnar o concurso nem o contrato administrativo de provimento que celebrou; a acção foi interposta atempadamente; os pedidos de declaração de inconstitucionalidade são formulados junto dos Tribunais. Por tudo isto, se a douta sentença entende que "com a acção administrativa comum a autora não pode obter o efeito que resultaria da anulação de acto inimpugnável ".

    Por imperativo de coerência deveria concluir pela falta de idoneidade do meio utilizado. Contudo, a decisão foi no sentido de julgar improcede a acção, por não provada.

  11. Entende a A. que utilizou o meio adequado com vista à satisfação da sua pretensão. Ficou provado nos presentes autos que a A. é licenciada em Comunicação Social; exerce funções docentes na Escola Secundária Padre Alberto Neto há mais de 17 anos; tem exercido essas funções através de contrato administrativo de provimento, cuja celebração sempre foi antecedida da realização de concursos públicos. A factualidade provada cria uma clara situação de precariedade na relação de emprego, e por isso, estamos perante uma clara violação do artigo 53° da CRP. Ora, para além da acção administrativa comum, não existe outro procedimento processual que possa ser utilizado pela A. com vista a satisfazer a sua pretensão.

  12. No último parágrafo da fundamentação de direito a douta sentença afirma que "até porque o mesmo decorre da natureza da docência a ministrar pelos docentes em causa... que o legislador no art. 33°, n° 1 do ECD, quis distinguir dos demais concursos a nível nacional".

    Não se compreendendo o alcance de tal afirmação, entende-se que nunca poderá significar que os professores de técnicas especiais só podem exercer funções docentes através de contratos administrativos de provimento. O contrato administrativo de provimento só é admissível para assegurar, "a título transitório e com carácter de subordinação, o exercício de funções próprias do serviço público, com sujeição ao regime jurídico da função pública" (n° 1 do artigo 15° do Decreto-Lei n° 427/89). A ora recorrente exerce funções docentes há mais de 17 anos, ou seja, com carácter de permanência. A relação jurídica de emprego adequada para "assegurar, de modo profissionalizado, o exercício de funções próprias do serviço público que revistam carácter de permanência" é a nomeação em lugar do quadro (n° 1 do art. 4° do Decreto-Lei n° 427/89 e artigos 29° e seguintes do ECD).

  13. Afirma a douta sentença que...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT