Acórdão nº 01849/06.6BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 10 de Fevereiro de 2012

Magistrado ResponsávelAntero Pires Salvador
Data da Resolução10 de Fevereiro de 2012
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

IRELATÓRIO 1 .

O MUNICÍPIO ….

, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional do Acórdão do TAF do Porto, datado de 13 de Setembro de 2010, que julgou procedente a acção administrativa especial, instaurada pelo recorrido A. …, identif. nos autos, assim anulando a decisão do Vereador dos Recursos Humanos da Câmara Municipal ..., de 2/5/2006, proferida no uso de competência delegada do Presidente da CM …, que lhe aplicou a pena disciplinar de suspensão, graduada em 200 dias, confirmada em sede de recurso hierárquico pelo Presidente da CM., de 6/7/2006 e ratificada por deliberação da Câmara Municipal … de 18/11/2008.

*O recorrente Município … formulou alegações que finalizou com as seguintes conclusões:

  1. O acto administrativo objecto da presente acção trata-se de uma decisão do Exmo. Senhor Vereador dos Recursos Humanos, Dr. M. …, datada de 02.05.2006, que aplicou ao Recorrido uma sanção disciplinar de suspensão efectiva pelo período de 200 dias.

  2. Por sentença notificada ao município foi julgado anular-se a decisão impugnada com fundamento em vício de violação de lei decorrente de erro nos pressupostos de facto em que assentou e é relativamente a esta decisão de anulação que vem o presente recurso.

  3. No procedimento disciplinar que serviu de base à decisão impugnada nos presentes autos o Recorrido é acusado de duas condutas merecedoras de sanções disciplinares.

  4. Por um lado, o Recorrido, encontrando-se a cumprir uma sanção disciplinar de suspensão de funções, recebeu (por erro do Tribunal) várias notificações de processos em que havia sido mandatário (por ter sido revogado o mandato a seu favor) do município e não providenciou pela entrega das mesmas nos serviços deste atempadamente; E) Por outro, o Recorrido, tendo recebido uma notificação judicial onde o meritíssimo juiz ordena o desentranhamento de um requerimento elaborado em nome do município e, em consequência, condenou o requerente – município – em custas pelo incidente, aproveitou para, no momento em que deu entrada da notificação judicial no DMF., juntar um despacho onde visava denegrir a imagem do Departamento Municipal Jurídico e de Contencioso da Câmara Municipal … (doravante DMJC) e da sua Directora, Dra. G. ….

  5. Se no que diz respeito à primeira conduta o Tribunal recorrido entendeu não existirem motivos para aplicação de sanção disciplinar, já no que concerne à segunda, entendeu não existir erro nos pressupostos de facto: “Quanto a esta situação afigura-se-nos não ocorrer o invocado erro nos pressupostos de facto, uma vez que o comportamento do A. é de molde a configurar uma infracção disciplinar” (cfr. Acórdão recorrido, pág. 60).

  6. Tendo o Tribunal a quo confirmado a existência de uma infracção disciplinar levada a cabo pelo Recorrido, mal se compreende que, a final, tenha decidido julgar procedente o alegado erro nos pressupostos de facto em que assentou a decisão impugnada.

  7. Existindo um ilícito disciplinar, haverá lugar ao correspondente procedimento disciplinar e à consequente aplicação da sanção, motivo pelo qual a decisão impugnada não padece de qualquer vício.

  8. A infracção disciplinar que o próprio acórdão reconheceu existir é de per se suficiente para a prolação da decisão anulada nos exactos moldes em que foi tomada.

  9. Ao, não obstante considerar verificada a existência de infracção disciplinar, ter anulado a decisão de aplicação da pena, a sentença recorrida incorreu, no mínimo, erro de julgamento por violação dos artigos 3.º, n.º 1, n.º 4, alíneas b), c), d) e f), e n. os 6, 7, 8 e 10 do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Públicos, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 24/84, de 16 de Janeiro, que definem infracção disciplinar e elencam e definem os deveres de zelo, obediência, lealdade e correcção que impendem sobre os funcionários públicos e que foram violados pelo Recorrido, e bem assim, os artigos 1.º, 2.º e 5.º do mesmo diploma que, conjugadamente, determinam que os funcionários das autarquias locais são disciplinarmente responsáveis pelas infracções que cometam e estão sujeitos ao poder disciplinar.

  10. Tal configura também uma causa de nulidade do acórdão judicial, por oposição dos fundamentos - no caso da confirmação judicial da verificação de um ilícito infraccional e da inexistência de erro nos pressupostos de facto da decisão punitiva nesse tocante - com a decisão de anulação, pura e simples, da decisão punitiva, nos do artigo 668.º, n.º 1, alínea c) do Código de Processo Civil (CPC) aplicável ex vi do disposto no artigo 1.º do CPTA.

  11. Independentemente do exposto e que justificaria a manutenção na ordem jurídica do acto impugnado por virtude da confirmação judicial da existência de uma infracção disciplinar quanto a uma das condutas do Recorrido, sempre se dirá que ao contrário do entendimento sufragado pelo Tribunal a quo, a conduta do Recorrido (no que diz respeito à não entrega das notificações por si recepcionadas) traduz-se inelutavelmente numa prática de infracções disciplinares que integram uma violação aos deveres de zelo, obediência, lealdade e correcção.

  12. O Recorrido tem especial conhecimento da tramitação dos processos judiciais, designadamente, da crucial importância da resposta tempestiva às notificações judiciais, bem como das nefastas consequências da sua falta N) Encontrando-se o Recorrido a cumprir uma sanção de suspensão de funções e tendo recebido várias notificações judiciais destinadas ao município, não obstante ter aberto a correspondência e de ter tomado conhecimento do decurso dos prazos peremptórios no âmbito do respectivos processos judiciais, o que é facto é que não promoveu a entrega das notificações judiciais ao DMJC, nem tão-pouco identificou (exceptuando o fax datado de 12.04.2005) os processos em causa.

  13. Esta conduta inviabilizou, entre outros, que o município tivesse consciência da urgência da resposta às notificações judiciais referidas nos respectivos processos.

  14. Estes factos revestem-se de maior gravidade se atentarmos nas funções que desempenhava o Recorrido no município (solicitador), - que lhe confere conhecimento e consciência que os prazos concedidos nas notificações judiciais são, muitas das vezes, exíguos para preparar e elaborar a respectiva defesa Q) O Recorrido bem sabia, por força dos 9 anos que esteve ao serviço do município, que sendo este um ente público com uma lógica organizacional complexa, onde a informação referente aos processos se encontra dispersa por diversos serviços, mais premente se torna o conhecimento atempado do teor das notificações, tendo em vista a preparação e elaboração da referida resposta.

  15. Tal comportamento do Recorrido apenas poderá dever-se a uma espécie de vingança, pelo facto de estar a cumprir uma pena de suspensão de funções que lhe foi legitimamente aplicada S) O Tribunal a quo, atento o facto do Recorrido se encontrar em suspensão de funções, entendeu que não era exigível a entrega da correspondência em mão, por considerar ser, nas suas palavras, “uma violência inaceitável para a sua pessoa”, porém não considerou, sequer por hipótese, que o Recorrido poderia ter enviado essa mesma correspondência, via fax, no momento em que avisou o município da sua existência.

  16. Era exigível e esperado que o Recorrido enviasse as notificações que recebeu, abriu e tomou conhecimento, até porque esta conduta não seria, de alguma forma, onerosa para si, quer do ponto de vista pessoal (uma vez que não tinha sequer que se deslocar pessoalmente às instalações do município enquanto cumpria a suspensão), quer patrimonial (dado o irrelevante valor pecuniário envolvido no envio das notificações [via fax, por hipótese], valor esse de que, refira-se, seria reembolsado ulteriormente pelo município).

  17. Tendo o Recorrido trabalhado 9 anos nos serviços do DMJC, bem conhecia os parcos recursos humanos existentes para proceder ao levantamento das notificações, o que confirma a ideia que a conduta do Recorrido não passou de uma vingança para com o Departamento onde exerceu funções, querendo, a todo o custo, obrigar a disponibilização de um funcionário para levantar as notificações que recebeu, quando bem sabia que tal seria extremamente oneroso para o Departamento em questão.

  18. Impendia, pois, sobre o Recorrido, o dever de dar conhecimento da identificação dos processos respectivos às...

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