Acórdão nº 02220/08.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 09 de Fevereiro de 2012

Magistrado ResponsávelCatarina Almeida e Sousa
Data da Resolução09 de Fevereiro de 2012
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte 1- RELATÓRIO F…, Lda., inconformada com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou improcedente a reclamação de actos do órgão de execução fiscal, interposta a coberto do disposto nos artigos 276º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), que teve por objecto o despacho proferido, em 20/09/08, no processo de execução fiscal nº 3337920020101737 e aps, instaurado no Serviço de Finanças do Porto 5, nos termos do qual foi alterada a modalidade de venda do bem penhorado e, bem assim, alterado o valor que havia sido inicialmente fixado, em auto de penhora, de € 200.000,00, para € 30.000,00, dele veio interpor o presente recurso jurisdicional.

Formulou, para tanto, as seguintes conclusões: “1.

A recorrente por discordância fundamentada, do teor do despacho proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças Porto 5, em 20.09.2008 no âmbito do processo executivo n° 3337920201021737, que ordenou a venda por Propostas em carta fechada do estabelecimento comercial sito na Rua…, 106 no Porto, pelo valor de € 30.000.00, apresentou reclamação do mesmo ao abrigo do art. 276.° do CPPT.

  1. A referida reclamação alicerçou-se na falta de fundamentação e violação da lei do despacho proferido e ainda em erro na avaliação da situação e dos critérios utilizados para sustentar a alteração/redução do valor atribuído ao direito do trespasse e arrendamento e bens de equipamento penhorados em 31.03.2003, de € 200.000.00 para 30.000,00.

  2. A douta sentença proferida labora, em erro, na apreciação dada como provada.

  3. Invocada a falta de fundamentação e violação da lei do despacho reclamado, por parte da ora, recorrente, a Meritíssima Juiz a quo entendeu, na douta sentença proferida que tal despacho “enuncia com clareza suficiente as razões que levaram à alteração do valor fixado para a venda dos bens penhorados, concluindo que as razões que determinaram a redução do valor dos bens penhorados são “transparentes e acessíveis à reclamante”.

  4. E ainda, não ser de proceder o argumento, invocado padece de ilegalidade.

  5. A fundamentação utilizada no despacho reclamado, é contraditória, já que os factos invocados não se harmonizam de uma forma lógica entre si, e são insuficientes para justificar a decisão tomada.

  6. O dever de fundamentação dos actos tributários constante do art. 77.° da LGT e 125.° do CPA, que recai sobre a A.F., constitui uma garantia específica dos contribuintes, pelo que, exige que a fundamentação seja clara e precisa, de forma a permitir conhecer as razões de facto e de direito que a sustentam, compreendendo o seu destinatário, sem margem para dúvidas, o raciocínio desenvolvido pela A.F., e o que a levou a decidir num determinado sentido e não num outro.

  7. “equivale à falta de fundamentação, a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição, ou insuficiência não esclareçam concretamente a motivação do acto” – art. 125º, nº 2 do CPA.

  8. Consta, do despacho reclamado a afirmação de que “diligências diversas não lograram o intento de consumar a venda”.

  9. Como se coaduna tal afirmação, com o facto de nunca sido marcada venda dos bens penhorados, por proposta em carta fechada, por causa imputável ao próprio exequente, que não deu cumprimento ao legalmente instituído? 11.

    E, ainda, como se coaduna com a ordem dada no despacho reclamado, para que se proceda à venda dos bens penhorados por propostas em carta fechada, por se considerar ser esta a modalidade que melhor salvaguarda os interesses das partes e garante o melhor preço? 12.

    Não é perceptível, sem margem para dúvidas, qual a fundamentação factual e legal que permitiu a alteração do valor do auto de penhora, e os exactos termos em que esta é feita.

  10. É invocado, no despacho reclamado, e aceite pela Meritíssima juiz a quo, como justificativo do valor alcançado para os bens penhorados, as informações prestadas por um negociador “Azeredo e Sousa Soc. Med. Imobiliária, Lda”, que afirma que o valor anteriormente definido era excessivo.

  11. Consta da al. I) dos factos provados que não chegou a ser celebrado qualquer contrato de mediação imobiliária com aquela sociedade.

  12. Foi alegado, como justificação para alteração do valor dos bens penhorados a alteração do quadro legal vigente em matéria de arrendamentos, mas, facto algum concretizou o que se pretendeu na realidade afirmar, ou seja em que medida tal alteração teve efeitos, em concreto, sobre o valor dos bens penhorados.

  13. As alterações legais focadas na douta sentença, que alegadamente terão sido as atendidas para efeitos do valor atribuído aos bens penhorados, não têm, suporte factual que as sustente.

  14. Não resulta dos autos qual a data do contrato de arrendamento, se estariam reunidas as condições para se proceder à actualização da renda, nem qual seria efectivamente o valor da actualização.

  15. A eventual insuficiência de fundamentação para a qual a Meritíssima juiz parece abrir portas, obstaculizou de facto, o pleno exercício de defesa da recorrente e como tal não se pode degradar em formalidade não essencial.

  16. Mas, mais, o imperativo da fundamentação do acto tributário, não se reduz apenas à vertente de protecção dos direitos dos seus destinatários, nomeadamente o direito de defesa, tem também uma clara função de proteger outros interesses, como seja, a racionalidade das decisões tomadas pela AF e a própria transparência da sua actuação.

  17. A racionalidade e transparência da decisão tomada, face a exposto, está, suficientemente posta em causa e mostrando-se de forma clara violados, pelo despacho reclamado, os arts. 77.° da LGT e o art. 125º do CPA.

  18. No despacho reclamado, surgem invocados factos, que analisados e ponderados em concreto, não podiam ter servido servir (sic) de sustentação e consequentemente ser o fundamento da decisão alcançada.

  19. Foi dado como provado que a venda ordenada por despacho de 31.05.2004, na modalidade de propostas em carta fechada, não se consumou.

  20. Resulta igualmente provado - al. E)- que por despacho de 12.04.2005, proferido pelo chefe do Serviço de Finanças do Porto 5, foi ordenada a venda dos bens penhorados por meio de negociação particular ao abrigo do disposto na al. a) do n° 1 do art. 252.º do CPPT.

  21. Tal normativo intitulado “ outras modalidades de venda” define que a excepção à regra do art. 248.° do CPPT, da venda dos bens penhorados mediante propostas em carta fechada, só ocorre, al. a) “quando a modalidade de venda for a de propostas em carta fechada e no dia designado para abertura de propostas se verificar a inexistência de proponentes ou a existência apenas de propostas de valor inferior ao valor base anunciado”.

  22. No caso em concreto, não se mostravam reunidos os pressupostos para a realização da venda na modalidade de negociação particular, erro reconhecido pelo próprio Serviço de Finanças.

  23. Não se pode aceitar que as diligências efectuadas ao abrigo de uma possível venda por negociação particular, que aliás nunca deveria ter sido ordenada, com características especificas e pressupostos bem diferentes da venda por propostas em carta fechada, possam justificar, ao ser fundamento de uma alteração do valor do auto de penhora elaborado para efeito da venda dos bens por propostas por carta fechada.

  24. O art. 250.° do CPPT nº1 al. c) dispõe que «o valor base para venda é determinado da seguinte forma: (…) os móveis, pelo valor que lhes tenha sido atribuído no auto de penhora (…)” 28.

    O art. 252.° do referido código no nº1 al. a) refere que “a venda por outra das modalidades previstas no código de processo civil só á efectuada nos seguintes casos: Quando a modalidade de venda for a de propostas em carta fechada e no dia designado para abertura de propostas se verificar a inexistência de proponentes ou a existência apenas de propostas de valor inferior ao valor base anunciado;” 29.

    Nunca poderia ser atendido, para efeitos de venda por proposta em carta fechada, o valor indicativo de venda por negociação particular, tipo de venda que assenta em pressupostos bem diferentes daquela outra.

  25. Andou mal, ainda a Meritíssima juiz ao entender não haver violação da lei, nos termos do invocado art. 250.° do CPPT, já que o valor de base a atender, no caso dos móveis, é em primeira linha o que for atribuído no auto de penhora.

  26. Prevê, tal preceito, o afastamento do valor constante do auto de penhora, no caso de apuramento de um outro valor por parte do órgão fiscal, no entanto, e face ao conteúdo da referida alínea, que inclusive fala na possibilidade de esse apuramento ser precedido de parecer técnico especializado, não poderá ser considerado suficiente, como foi, para o efeito a indicação do valor por parte de um negociador, que aliás nem sequer foi formalmente constituído como tal, e não é um perito com conhecimentos técnicos especializados.

  27. Face à disparidade entre valores sempre seria expectável, que o Chefe do Serviço de Finanças Porto 5, se socorresse de um parecer técnico, de forma a justificar, como lhe competia, cabalmente, a decisão tomada.

  28. Ao não fazê-lo o órgão fiscal, não actuou de acordo com a lei, ordinária e constitucional, que lhe impõe uma actuação de acordo com a confiança suscitada na contraparte — art. 266.º da CRP.

  29. No que aos pressupostos de facto, diz respeito, dizer que o facto alegado pelo recorrente e constante do artigo 4 da petição de reclamação, devia ter sido dado como provado, ao contrário do decidido pela Meritíssima juiz a quo.

  30. Já que se trata de um facto notório, e de conhecimento geral, pelo menos dos habitantes do Porto, que a Rua 31 de Janeiro é uma das principais artérias comerciais da cidade do Porto, cuja localização é em pleno coração da Cidade. Art. 514 n° do CPC aplicável subsidiariamente ex vi art. 2.° al. e) do CPPT.

  31. Ainda que se aceitasse a alteração do valor constante do auto de penhora, atribuído aos bens penhorados, sempre se dirá que os pressupostos em...

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