Acórdão nº 07264/11 de Tribunal Central Administrativo Sul, 09 de Fevereiro de 2012

Magistrado ResponsávelTERESA DE SOUSA
Data da Resolução09 de Fevereiro de 2012
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam na 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul Vem interposto recurso do Saneador/sentença do TAF de Loulé que julgou procedente a excepção de inimpugnabilidade do acto objecto da presente acção administrativa especial, ou seja, a deliberação da Assembleia Municipal de .................... de 27 de Abril de 2009, pela qual foi aprovada e emitida a declaração de interesse público da criação de um novo acesso ao CM 1236 sobre solos da Reserva Agrícola Nacional (RAN).

Em alegações são formuladas as seguintes conclusões: 1. Nos termos do disposto no art. 87° do CPTA, findos os articulados o despacho saneador deverá conhecer primeiro sobre todas as questões que obstem ao conhecimento do objecto do processo.

  1. O julgamento da excepção de inimpugnabilidade do acto impugnado poderia obstar, como obstou, ao conhecimento do objecto do processo, pelo que não caberia à Mm.ª Juiz conhecer da matéria de facto assente.

  2. Só depois de o Tribunal conhecer das excepções dilatórias, das nulidades e das excepções peremptórias é que caberia fixar a base instrutória, seleccionando a matéria de facto relevante para a decisão da causa, regime que se encontra estabelecido no art. 87.° do CPTA e nos arts. 510° e 511° do CPCivil, aplicáveis ex vi do art.° 1º do CPTA, o que não aconteceu no saneador sentença sob recurso em manifesta violação da lei.

  3. Como sufragado pelo insigne Professor Antunes Varela, no despacho saneador deverão ser sucessivamente e por esta ordem conhecidas: a) "em primeiro lugar, o conhecimento das excepções dilatórias"; b) "em segundo lugar, das nulidades mesmo que não envolvam a inutilização de todo o processo."; c) "em terceiro lugar, decidir-se no despacho saneador se procede alguma excepção peremptória"; d) "por fim, conhecer-se directamente do pedido" - in "Manual de Processo Civil", 2.a edição, revista e actualizada, págs.382 e segs.

  4. A Mm.a Juiz do Tribunal a quo não se pronunciou sobre a excepção de inimpugnabilidade do acto impugnado sob a epígrafe “II. Saneador", ultrapassando a fase processual correcta para o fazer, embora tenha reconhecido que esta excepção peremptória: "opera como condição de prosseguimento do processo (...), pelo que a sua não verificação determina que não se conheça as outras excepções e do mérito da acção." 6. O estado do processo não permitia o conhecimento imediato da matéria de mérito, uma vez que, por um lado, os factos que se consideraram assentes não permitem sustentar uma decisão de mérito cabal, e, por outro, existem factos controvertidos, essenciais ao bom julgamento da causa, que deveriam ter sido objecto de produção de prova e não o foram face ao julgamento desta excepção peremptória.

  5. Por conseguinte, o douto despacho saneador é nulo e de nenhum efeito, impugnando-se, para todos os efeitos legais, a matéria de facto assente ali vertida, porquanto a Mm.a Juiz a quo deixou de pronunciar-se sobre questões sobre as quais deveria tê-lo feito e, pelo contrário, pronunciou-se sobre questões de que não podia tomar conhecimento, nos termos da alínea d) do n.° 1 do art. 668° do CPCivil, aplicável ex vi do art. 1.° do CPTA.

  6. O saneador sentença sob recurso que julgou procedente a excepção de inimpugnabilidade do acto da Assembleia Municipal de .................... que emitiu a declaração de interesse público da criação de um novo acesso ao CM 1236 sobre solos da Reserva Agrícola Nacional, e absolveu a entidade demandada, não fez, padece de erro de julgamento e de uma errada aplicação do Direito.

  7. O art. 51° n° 1 do CPTA considera impugnáveis "os actos administrativos com eficácia externa", independentemente 'de serem ou não praticados no termo do procedimento administrativo em causa.

  8. O facto de o acto não ser definitivo, no plano horizontal, não impede que ele possa ser contenciosamente impugnável .

  9. "Incluem-se seguramente no conceito de acto administrativo impugnável as decisões que, por si, já produzem [os efeitos jurídicos, designadamente ablatórios, ainda que devam ser complementadas por actos jurídicos de execução vinculada. ", nas palavras do Prof. Vieira de Andrade.

  10. A declaração de interesse público da criação de um novo acesso ao CM 1236 sob os solos da Reserva Agrícola Nacional, é desde logo ilegal, nos termos da legislação do Regime Jurídico da RAN, pelo que não é um simples acto opinativo, é uma decisão jurídica de «ponderação de interesses, públicos e privados.

  11. Os solos classificados como de RAN prosseguem, defendem e acautelam o interesse público à biodiversidade, sustentabilidade da agricultura e boas práticas ambientais que beneficiam todos.

  12. Concluímos, assim, que o acto impugnado contém o requisito de eficácia externa, pelo que é objectivamente impugnável.

  13. Existe interesse directo e pessoal em impugnar este acto, dado que o mesmo é lesivo.

  14. A QUERCUS, ora Recorrente, prossegue e defende nos seus Estatutos o interesse público e o direito constitucionalmente garantido no art. 66° da CRP "a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado e o dever de o defender".

  15. Não é assim verdade o decidido na sentença sob recurso de que o acto "carece de lesividade própria".

  16. Após a emissão da declaração de interesse público, proferida pelo Município de ...................., aqueles solos de Reserva Agrícola Nacional, serão impermeabilizados, betonados, a sua vegetação será destruída, os materiais aí implantados contaminarão as águas do Aproveitamento Hidroagrícola do Sotavento Algarvio, pelo que tal declaração não é feita no interesse público e afecta os interesses defendidos pela ora Recorrente.

  17. A declaração de interesse público aprovada na deliberação constitui documento essencial na instrução do procedimento de desafectação de solos da Reserva Agrícola Nacional, nomeadamente para prova da verificação dos requisitos materiais do artigo 22.° do Regime Jurídico da Reserva Agrícola Nacional ("RJRAN"), exigida pela ER-RAN; 20. Ora, a deliberação sobre o pedido de parecer prévio vinculativo previsto no artigo 23.º e a comunicação prévia regulada no artigo 24.°, ambos do RJRAN (competências atribuídas às ER-RAN), quando em causa utilizações não agrícolas de áreas integradas na RAN, nos termos do disposto no artigo 22.°, n.° 1, constitui acto vinculado, pois uma vez reunidos os pressupostos fixados nessa norma, não cabe às ER-RAN qualquer margem de discricionariedade na decisão de aprovação ou rejeição dos pedidos; 21. O acto a proferir ao abrigo do disposto no artigo 25.° do RJRAN é igualmente um acto vinculado, que assenta precisamente no reconhecimento do relevante interesse público - reconhecimento esse que, ainda que atribuído à Administração Central, uma vez que está em causa obra de carácter municipal sempre será precedido de declaração de interesse público a proferir pelo Município; 22. Atendendo à vinculação legal do acto a proferir pelas ER-RAN, a declaração municipal de interesse público é claramente...

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