Acórdão nº 07802/11 de Tribunal Central Administrativo Sul, 12 de Janeiro de 2012
Magistrado Responsável | CRISTINA DOS SANTOS |
Data da Resolução | 12 de Janeiro de 2012 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
C……………… P……….. SGPS, SA, com os sinais nos autos, inconformada com a sentença de fls. 753/792 proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, vem dela recorrer, concluindo como segue: 1. Ao decidir ser "prematura e deslocada, e portanto inoportuna" a invocação das ilegalidades que a recorrente imputou ao acto de adjudicação como reflexo da violação de normas de natureza ambiental, urbanística e de ordenamento do território, a decisão recorrida enferma de erro de julgamento, pois ao contrário do pressuposto pelo Tribunal a quo, o que se cuida ao compulsar tais normas é, ainda, o assegurar pelo respeito de princípios rectores do procedimento de concurso - maxime, os princípios da concorrência e da igualdade, por um lado, e a possibilidade legal do objecto do concurso, por outro.
-
Num procedimento de concurso, todas as propostas devem ser avaliadas e comparadas no pressuposto incontornavel do cumprimento da lei e da sua actual possibilidade legal de execução, não podendo tal parâmetro de legalidade deixar de ter em linha de conta as exigências ambientais, de ordenamento do território e do urbanismo quando se trata de apresentar a concurso propostas com reflexos na ocupação do território (são propostas para construção de uma UCDR!).
-
Os contratos administrativos também estão sujeitos ao princípio da legalidade (art. 266°, 2 da Constituição) e, assim, na mesma medida em que é nulo um acto que viole o regime da REN ou instrumentos de gestão territorial (cfr. art. 15° do DL n.o 93/90, de 19 de Março, na redacção do DL n° 180/2006, de 6 de Set. e artigo 103° do DL n° 380/99, de 22 de Set, na redacção do DL n° 316/2007, de 19 de Set.), é igualmente nula a mesma actuação administrativa pela via contratual (cfr.
sérvulo correia, Legalidade e Autonomia Contratual nos contratos administrativos, Coimbra, pág. 791).
-
Por isso, "é nulo o contrato administrativo, com objecto possível de acto administrativo, se a contraprestação do particular for incompatível com a lei, e essa incompatibilidade é sancionada com nulidade" - cfr. Ac. STA de 04/02/2008, no Proc. 01004/07, in www.dasi.pt -, sendo certo que uma das condições legais para a celebração de qualquer contrato é a possibilidade do seu objecto, sob pena de nulidade (cfr. arts. 133° n° 2 al. c), 134° nos l e 2 ex vi art. 185° no 3 al. a) do Código de Procedimento Administrativo e, actualmente, os arts, 284° e 285° do Código dos Contratos Públicos).
-
O que está em causa na alegação dos vícios em questão não é indagar da possibilidade legal dos projectos seleccionados, no futuro, se poderem vir a conformar com as normas urbanísticas (no limite, no futuro, poderá até vir a promover-se a alteração da própria lei, para assegurar a conformidade dos actos com a legalidade!), mas sim de indagar a sua possibilidade legal - real e efectiva - ao momento actual da apresentação das propostas que são objecto de comparação.
-
Contrariamente ao pressuposto na decisão sob recurso, não é possível adjudicar um concurso público tendente à celebração de um contrato cuja possibilidade legal esteja dependente da verificação de um evento futuro e incerto - uma autorização da Administração Central em derrogação do regime da REN - (para mais num concurso em que não se admitem propostas condicionadas), por a tal se oporem os princípios da igualdade e da concorrência - cfr. Ac. STA de 04/02/2008, no Proc. 01004/07, in www.dgsi.pt e Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira, in Concursos e Outros Procedimentos de Adjudicação Administrativa, Almedina, 2a Reimpressão de 1998, pág. 368, nota 17 - princípios que deste modo se mostram violados pela decisão recorrida.
-
A decisão recorrida viola por errada interpretação e aplicação a Directiva n° 2001/42/CE do Parlamento Europeu e do Conselho/ de 27 de Julho - cujo conteúdo é claro, preciso, suficiente e incondicional - pois ao contrário do entendimento expresso pelo Tribunal a quo, está em causa uma adjudicação num procedimento que visa a construção de uma Unidade Comercial de Dimensão Relevante, sem que tal programa de enquadramento de intervenção urbanística tivesse sido objecto de Avaliação Ambiental Estratégica, nos termos impostos pelos artigos 1°, 2° e 8° da Directiva no 2001/42/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de Junho.
-
A decisão sub judice, enferma de erro de julgamento e viola igualmente por errada interpretação e aplicação o artigo 3° do Decreto-Lei n° 232/2007, de 15 de Junho e o princípio da legalidade, que impõe que a legalidade do acto de adjudicação seja aferida pela legislação em vigor ao momento da prática dos actos e não ao momento em que o procedimento administrativo se iniciou como erradamente considerou o Tribunal a quo.
-
Como se admite na decisão impugnada, a proposta escolhida através do acto impugnado contempla a execução de obras - trabalhos de construção - em solos integrados em Reserva Ecológica Nacional, em Zona Ameaçada por Cheias, zona incluída no Plano da Bacia Hidrográfica do Lis e no Perímetro de Rega do Vale do Lis, pelo que, ao contrário do entendimento expresso pelo Tribunal a quo, essa proposta e o correspondente projectado contrato, viola os pertinentes instrumentos de planeamento e de gestão territorial.
-
A decisão recorrida enferma de erro de julgamento e viola por errada interpretação e aplicação as regras de repartição do ónus da prova ao impor à Autora aqui recorrente o ónus de demonstrar que não se mostram reunidos pressupostos legais que a lei contempla para excepcionalmente poderem ser derrogados os regimes legais proibitivos ív.g. REN) quando da Autora só poderia ser exigido o ónus de alegar e provar que a intervenção projectada prevê obras em zonas protegidas, o que logrou demonstrar, cabendo à Ré demonstrar a excepcionalidade que seria legitimante da sua actuação.
-
Ao contrário do decidido na decisão recorrida, resulta claro das próprias plantas trazidas aos autos pela Contra-interessada (does. n° 2 e n° 3 juntos com a contestação) que a respectiva proposta contempla a implantação da UCDR para além dos limites da área sujeita a concurso prevista no ponto 1.2 do P.C., no anexo I ao P.C. e no art. 1° do C.E, pelo que a deliberação impugnada enferma de erro de julgamento e viola os pontos 1.2 do PC e artigo l°/2 do CE e pontos 15.2 e 15.3 do PC.
-
São os próprios elementos desenhados que a contra-interessada juntou aos autos com a contestação que identificam e delimitam a "localização do centro comercial" a cor azul clara (v. legenda da planta) e identificam e delimitam o "limite do concurso - UOPG- U8" a cor azul escura (v. legenda da planta), sendo claramente visível que o Centro Comercial se implanta parcialmente fora da zona colocada a concurso - cfr. plantas juntas como does. n° 2 e n° 3 com a contestação - pelo que não pode exigir-se da Autora maior esforço de alegação e prova no sentido de ter de proceder à "indicação da parte ou partes da UCDR que caem fora da área de intervenção delimitada" (sic), quando o juízo a fazer pelo Tribunal é do tipo meramente comparativo fazendo a "leitura das plantas" que estão nos autos, não sendo exigível à Autora 'uma demonstração da demonstração' da realidade dos factos, indo para além de documentos auto-explicativos.
-
Ao contrário do decidido na decisão recorrida, a deliberação adjudicatória impugnada enferma de ostensivo erro já que a proposta escolhida foi erradamente classificada no critério "contrapartidas em espécie facultativas" (18.3.2 do PC) - e com a pontuação máxima (20 Valores) -, quando essa proposta não se encontra acompanhada de elementos que permitam aferir os valores aí indicados por forma a poder ser objecto de avaliação (identificação concreta dos terrenos e dos equipamentos), com reflexos decisivos para o resultado do concurso.
-
Contrariamente ao decidido pelo Tribunal a quo na decisão recorrida, ao adjudicar o contrato à proposta da contra-interessada quando esta não identifica e delimita em planta anexa as parcelas que se propõe pagar (exigência resultante do modelo de proposta e dos pontos 10.1 e Anexo II do PC e art. 4° do CE e imposta pela própria natureza da prestação objecto do contrato), o acto impugnado viola o disposto nos pontos 10.1, Anexo II (modelo da proposta), 15.2 e 15.3 do PC e coloca em causa a própria comparabilidade das propostas frustrando os objectivos que presidem ao concurso (é impossível avaliar contrapartidas em espécie sem que tal espécie se mostre identificada).
-
A decisão recorrida enferma de erro de julgamento, pois ao contrário do decidido pelo Tribunal a quo, a deliberação de adjudicação é ilegal por violação princípios da legalidade, transparência, igualdade e sã concorrência, violando ainda o disposto no ponto 15.3 do PC que imporia a exclusão da proposta, já que a mesma apresenta duas soluções alternativas para a conclusão do "Edifício do Topo Norte" do Estádio Municipal Magalhães Pessoa, deixando à consideração da Entidade Adjudicante a escolha da solução mais adequada.
-
Ao contrário do entendimento expresso na decisão recorrida, a deliberação impugnada viola os princípios da legalidade, transparência, igualdade e sã concorrência, bem como o disposto no ponto 15.3 do PC que imporia a exclusão da proposta, já que o edifício previsto na proposta escolhida situado fora do centro histórico não cumpre os rácios de estacionamento previstos no artigo 70° do RPDML, o que gera a ilegalidade da proposta (aliás, a sua nulidade por violação de instrumento de gestão territorial ex vi do art. 103.° do DL n.° 380/99 citado) e constitui fundamento da sua exclusão por força do disposto no ponto 15.3. do PC.
NESTES TERMOS, deve o recurso ser julgado provado e procedente, com as legais consequências.
* Os Contra-Interessados e ora Recorridos Multi Development Portugal-Promotora Imobiliária, SA e Lena -Engenharia Construções, SA ofereceram resposta à primitiva reclamação, junta a fls. 840/854, convolada em contra-alegação por despacho de fls. 935, na sequência do...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO