Acórdão nº 01380/07.2BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 11 de Novembro de 2011

Magistrado ResponsávelAna Paula Soares Leite Martins Portela
Data da Resolução11 de Novembro de 2011
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

J…, com os sinais nos autos, inconformado, interpôs recurso jurisdicional da sentença proferida pelo TAF DE AVEIRO, em 30/05/2010, que julgou improcedente a Acção Administrativa Especial por si interposta contra o MUNICÍPIO DE VAGOS [MV], em que peticionava a anulação da deliberação proferida pela Câmara Municipal de Vagos,de 13/6/07, notificado ao Autor em 19 de Junho de 2007, através da qual lhe foi indeferido o pedido efectuado ao abrigo do disposto no artigo 21.° do Estatuto dos Eleitos Locais para pagamento de todas as despesas tidas até à data com a sua defesa judicial decorrente do processo crime n.º 326/00, do Tribunal de Judicial de Vagos, em relação aos 21 crimes de que foi ilibado, e de condenação à prática do acto administrativo legalmente devido para provimento do pagamento da quantia 89.814,76€ e dos actos administrativos necessários à concretização dos demais pedidos a final.

Para tanto alega em conclusão: “1. A douta sentença ao considerar a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo de Coimbra como o elemento que deve determinar a culpabilidade do ora recorrente no processo crime, no qual os próprios Juízes o não consideraram está a violar o artigo 21 do Estatuto dos Eleitos Locais; 2. Bem como ao considerar a referida matéria, ou seja, a dar tal sentença como provada, viola o art. 659, nº2 e 3º do Código de Processo Civil, cuja aplicação é subsidiária ao tipo de processo aqui em causa.

  1. Em parte alguma se pode duvidar de que os factos de que o recorrente foi acusado no processo crime foram praticados no exercício das funções de autarca, pela qualificação jurídica das crimes de que vinha acusado o A. tinha obrigatoriamente que ser autarca; 4. O ora recorrente não está a pedir o pagamento da sua defesa no processo que correu seus termos no Tribunal Administrativo de Circulo de Coimbra, mas sim no processo crime n.º 326/00 no Tribunal de Vagos; 5. A avaliação dos factos de que o recorrente foi acusado no processo crime, compete em exclusivo ao Tribunal Judicial de Vagos e ao Venerando Tribunal da Relação de Coimbra que julgaram o processo crime n.º 326/00; 6. O recorrente foi ilibado de 21 crimes, pelo que foi decidido que actuou sem culpa, ou seja; 7. Ao ilibar o A. dos crimes de que foi acusado é porque os Tribunais entenderam que o A. agiu sem dolo ou negligência.

  2. E só os tribunais em causa, o Tribunal de Vagos e o Venerando Tribunal da Relação tem competência para saber se houve ou não negligência ou dolo na actuação do recorrente como autarca.

  3. Não é necessário haver trânsito em julgado do processo crime para que o recorrente tenha direito aos montantes peticionados, pois este direito pode ser exercido durante o processo, sob pena de inutilidade total do mesmo.

  4. E, não pode ser argumentado que só se sabe se a final o recorrente teve ou não um comportamento culposo, pois até decisão final é inocente, sob pena de violação dos mais elementares princípios e normas constitucionais 11. Ao considerar a douta sentença que o recorrido não tinha o dever de ponderar os elementos de facto e de direito que o recorrente acarreou para o procedimento a quando da audiência de interessados, bem como ao considerar que a sua rejeição também não tem que ser fundamentada, está a douta sentença a violar os artigos 100º, 124º do Código de Procedimento Administrativo.

  5. Assim, o decidir como decidiu o Meritíssimo Juiz a Quo, viola a douta sentença ora recorrida os preceitos legais referidos, designadamente, os artigos 659,n.º 1 e 2 , 712 do C.P.C. e violação dos artigos 21º do Estatuto dos Eleitos Locais, Lei 29/87, de 30 de Junho, com as alterações constantes das Leis nº 97/89, de 15 de Dezembro, 1/91, de Janeiro, 11/91, de 17 de Maio, 11/96, de 18 de Abril, 127/97, de 11 de Dezembro, 50/99, de 24 de Junho e 86/2001, de 10 de Agosto; os artigos 3º,4º, 6º, 6ºA, 100º,do Código de Procedimento Administrativo e os artigos 3º, 20º, 202º,211º, 266º, 268º da Constituição da República, violando assim o direito do recorrente em lhe serem pagas as despesas peticionadas e não impugnadas; Termos em que, com base nas razões atrás expostas e nas que o Douto entendimento de Vossas Excelências suprirá, deve este Douto Tribunal conhecer do presente recurso, para lhe dar provimento e revogar a douta sentença recorrida, condenando o recorrido a praticar o acto administrativo legalmente devido para provimento do pagamento da quantia 89.814,76€ (oitenta e nove mil oitocentos e catorze euros e setenta e seis cêntimos), com juros à taxa legal desde a citação até integral pagamento pois só assim se fará a HABITUAL JUSTIÇA!”*O MV apresentou contra-alegações, concluindo da seguinte forma: “I: A entidade recorrida vem concordar com a douta sentença de que agora se recorra, para cujos fundamentos de facto e de direito remete, por entender que o presente recurso não põe em causa essa mesma fundamentação.

    II: Da mesma forma, por considerar que a argumentação vertida no presente recurso não põe em causa o decidido, reafirma todo o alegado, remetendo para o estabelecido e defendido quer no acto administrativo de indeferimento do pedido de honorários quer nas suas contra-alegações no processo de que se recorre.

    III: O recorrente foi condenado pelo Tribunal de Vagos, confirmado pelo Tribunal da Relação de Coimbra o que pressupõe dolo, decisão essa que transitou em julgado, tendo como consequência, o trânsito em julgado da condenação, por aquela Relação, dos dois crimes de prevaricação, cometidos, também, a título de dolo, pelo que não se verificam os pressupostos do art. 21º do EEL.

    IV: Havendo condenação no processo crime, por crime ou crimes cometidos com dolo, não há lugar ao pagamento de honorários pela autarquia mesmo em relação aos crimes pelos quais o eleito local foi absolvido, não sendo legítimo o seu pedido antes de se concluir pela actuação dolosa ou negligente, ou seja, antes do julgamento com trânsito em julgado.

    V: Neste sentido conclui o Parecer do Conselho Consultivo da PGR, nº 196, de 24 de Julho de 2008, in DR, II Série, de 9 de Outubro de 2009, onde, no nº 3 do respectivo sumário, se escreveu: “Só após a decisão final poderá apurar-se se estão preenchidos os pressupostos de que depende a concessão do apoio, pelo que só então deverá ser proferida a respectiva decisão”.

    VI: Ou seja, só não demonstrando a culpa ou negligência do eleito local no exercício das suas funções é que a decisão de conceder patrocínio é devida o que efectivamente só se verifica com o trânsito em julgado de uma decisão, o que no caso sub judice, consubstanciou na condenação efectiva por 2 crimes de prevaricação do recorrente agindo na sua qualidade de autarca.

    VII: Nos termos do citado art. 21º do EEL, para que a autarquia possa pagar ao eleito local as despesas processuais, incluindo os honorários ao seu advogado, é necessário que não se prove que o mesmo tenha actuado com dolo ou negligência.

    A circunstância de se ser absolvido de um crime não significa que a mesma conduta não tenha violado, com dolo ou negligência, outros bens jurídicos, sendo certo que a actividade ilegal de um eleito local, ainda que não constitua crime, é susceptível de violar outros bens jurídicos, como, por exemplo, os estatutários, constantes do art. 4º do EEL, para além de outros, quer legais quer regulamentares.

    VII: No caso vertente, o recorrente, violou, com dolo, através da mesma conduta, vários deveres do eleito local previstos no EEL, bem como várias normas legais e regulamentares, como claramente jorra da imensa quantidade de factos dados como provados pela Relação de Coimbra, cujo documento já se encontra junto aos autos, bem como a sua conduta como autarca já havia sido efectivamente sancionada tendo mesmo chegado a perder o mandato.

    VII: Consequentemente, e não obstante o recorrente ter sido absolvido de alguns crimes por que fora acusado, não lhe pode ser aplicável o disposto no art. 21º do EEL, porquanto agiu com dolo ou negligência e se tal conduta, de acordo com o acórdão da Relação de Coimbra, não foi criminosa relativamente aos crimes pelos quais foi absolvido, não deixa de ser violadora, por dolo ou negligência, de deveres constantes do EEL, da lei e dos regulamentos.

    VIII: Por outro lado, entende-se que a douta sentença, por confirmar a decisão de indeferimento impugnada baseou-se nos pressupostos do art. 21º do EEL, nos termos expostos, obedecendo aos normativos do Código do Procedimento Administrativo, pelo que se mostra fundamentada, não sofrendo das ilegalidades que o recorrente lhe aponta.

    IX: Por ter agido no estrito cumprimento da lei, a entidade recorrida não violou ou princípios gerais de direito administrativo invocados, tendo a sua actuação observado os preceitos constitucionais aplicáveis.

    Nestes termos e nos demais de direito, deve o douto tribunal negar provimento ao presente recurso e manter a douta sentença recorrida, com a consequente absolvição do pedido. Fazendo-se, assim, a habitual JUSTIÇA.”*O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado nos termos e para os efeitos do artº 146º, nº1, do CPTA, não emitiu parecer.

    *FACTOS FIXADOS EM 1ª INSTÂNCIA (e com relevância para os autos): A. O A. exerceu as funções de Presidente da Câmara de Vagos durante o período de 1986 a 1994 (3/11/1994), tendo assumido tais funções através das eleições autárquicas.

    B. No exercício das suas funções, no decorrer do ano de 1991, o Autor praticou actos que deram origem ao processo-crime n.º 326/00 contra si instaurado, no Tribunal Judicial de Vagos.

    C. Por Sentença do Tribunal Administrativo do Círculo de Coimbra de 22 de Agosto de 1995, já transitada em julgado, o Autor perdeu o mandato para o qual foi eleito em Dezembro de 1993, por ilegalidades consideradas graves cometidas entre 1991 e Dezembro de 1993.

    D. O Ministério Público acusou o A. em Processo Comum e com intervenção de Tribunal Colectivo, pela prática de 24 crimes:– 1 crime de burla agravada p.p. pelos art.° 218, 2 a do Código Penal/95 e artigo 5 da Lei 34/87, de 16 de Julho...

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